Vez ou outra precisamos monitorar as atividades dos nossos parlamentares para sabermos o que eles andam propondo. Nem que sejam só os vereadores e deputados de nossa região ou da categoria profissional a que pertencemos e, deste modo, fiscalizarmos os seus respectivos mandatos a fim de seja promovido um sadio debate no meio social.
Por curiosidade, resolvi espiar hoje o que fez o Exmo. Sr. Dr. Wadih Nemer Damous Filho (PT/RJ), ex-presidente da OAB do Rio, durante o relativo espaço tempo em que atuou na Câmara dos Deputados em Brasília na condição de suplente. Sua Excelência, como o Brasil inteiro sabe, foi um dos maiores defensores da presidente Dilma contra o seu processo de afastamento e chegou a ameaçar com um pedido de impeachment o ministro Gilmar Mendes. Numa de suas falas, disparou contra a instância máxima do Poder Judiciário brasileiro, declarando que o "STF está no golpe pela omissão".
Pois bem. Deixando de lado as questões ideológicas, resolvi verificar os assuntos das proposições de sua autoria no Legislativo e, dentre os projetos de lei encontrados no site da Câmara (alguns até interessantes para a advocacia), houve um que despertou a minha atenção. Trata-se do PL n.º 4372/2016, que propõe alterações à Lei 12.850, de 2 de agosto de 2013, a qual "define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal; altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); revoga a Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995; e dá outras providências".
Em minha análise sobre a parte normativa desse referido projeto, o que Wadih está propondo importa no enfraquecimento do instituto da colaboração premiada, além de prejudicar o acompanhamento da sociedade através da mídia sobre as ações em curso envolvendo os revoltantes casos de corrupção das nossas autoridades. Senão vejamos o que o nobre deputado pretende ao modificar uma lei sancionada pela própria presidente afastada durante o calor das manifestações de 2013.
O primeiro item polêmico do projeto seria sobre a aceitação da colaboração premiada que, segundo a proposta, só poderá ser homologada caso o réu esteja em liberdade. Caso haja aprovação pelo Congresso Nacional, assim ficará a redação do parágrafo 3º do art. 3º da Lei 12.850:
"No caso do inciso I, somente será considerada para fins de homologação judicial a colaboração premiada se o acusado ou indiciado estiver respondendo em liberdade ao processo ou investigação instaurados em seu desfavor."
Bem, o que faz um acusado colaborar com a Justiça não seria justamente o temor de ser condenado a uma pena de reclusão ou querer escapar da cadeia? Mas o fato é que, como o sentimento de impunidade se tornou algo tão banalizado no país, os corruptos só passaram a tomar consciência da seriedade da coisa quando tiveram os seus direitos de liberdade preventivamente restritos por meio da decretação da prisão cautelar. Pois muitos desses bandidos estando aqui fora continuam acobertando os demais membros da quadrilha e negando o fato criminoso.
Sustenta o autor do projeto nas suas justificações que o objetivo da medida proposta seria o de "preservar o caráter voluntário" do instituto da colaboração premiada e evitar "que a prisão cautelar seja utilizada como instrumento psicológico de pressão sobre o acusado ou indiciado" porque feriria a dignidade da pessoa investigada. Entretanto, ao se considerar tais argumentos, melhor seria acabarmos de vez com algo que tem ajudado surpreendentemente o Brasil na desigual luta travada contra a corrupção. Afinal, é justamente pelo receio de perder um dos bens mais caros ao ser humano (a liberdade) que esses pilantras covardes acabam entregando os esquemas de roubo dentro do Poder Público. E graças a isso, Sérgio Moro já recuperou bilhões desviados da Petrobrás...
No que diz respeito ao acréscimo do parágrafo 17 ao artigo 4º da lei, o qual diz que a denúncia apresentada não poderá se basear somente nas declarações do delator, considero-o desnecessário tendo em vista a vedação que já consta no dispositivo anterior da norma em vigor. Pois prescreve o parágrafo 16 que a sentença condenatória não pode ser proferida "com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador". Logo, considerando o papel imparcial do Ministério Público, o qual deve até pedir a absolvição do réu inocente, entende-se que de maneira alguma um promotor ou procurador irá oferecer algo sem um pingo de justa causa. Do contrário, o membro do MP poderá ser internamente penalizado pelo abuso de poder.
Como se já não bastasse tudo isso, Wadih parece querer que os processos criminais sejam mantidos às escondidas da sociedade e do eleitor. Com a redação do parágrafo 18 do artigo 4º da lei mais o acréscimo do artigo 21-A, o nobre jurista da Dilma não apenas cria embaraços para as autoridades judiciárias/policiais que colhem os depoimentos de colaboração premiada. Senão vejamos o texto da proposição em curso na Câmara dos Deputados:
"§ 18. As menções aos nomes das pessoas que não são parte ou investigadas na persecução penal deverão ser protegidas pela autoridade que colher a colaboração.
(...)
Art. 21-A. Constitui crime divulgar o conteúdo dos depoimentos colhidos no âmbito do acordo de colaboração premiada, pendente ou não de homologação judicial."
Se for assim, meus amigos, ninguém mais vai querer ser juiz criminal, delegado ou promotor com atuação na área penal. Até porque, mesmo quando existe sigilo num processo (a regra deve ser a da publicidade), não há como se evitar eventuais vazamentos. Principalmente quando o réu for pessoa do meio político com pretensões de se candidatar a futuros cargos eletivos. Pois muita gente tem acesso aos autos, inclusive maus funcionários da Justiça e os próprios advogados dos ladrões envolvidos de modo que, se uma lei dessas passar, magistrados correrão o risco de ser responsabilizados por atos de terceiros.
Data venia, doutor Wadih, mas essa proposição de Vossa Excelência deve interessar muito ao senhor Lula que, certamente, se beneficiaria com a aprovação do mesmo juntamente com inúmeros safados (tanto da "esquerda" quanto da "direita") que também andam envolvidos nos escândalos da Lava Jato. Pois, com todo respeito ao direito de opinião do parlamentar, essa proposição em comento de nada aproveita à sociedade que, desde o ano de 2013, vem comparecendo às ruas pedindo um basta na corrupção. Aliás, vai na contramão das "10 medidas" que o MPF defende, tendo a instituição obtido ate agora mais de 2 milhões de assinatura em favor de um projeto de iniciativa popular (clique AQUI para entrar no Portal de Combate à Corrupção)
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Nunca é demais alertar o eleitor para o fato de que Wadih Damous poderá ser o candidato do PT para sentar-se no lugar de Eduardo Paes na Prefeitura do Rio de Janeiro. Afinal de contas, ele se saiu muito bem para os interesses de seu partido na luta contra o "golpe" por conhecer melhor do que muitos dos seus pares as regras desse sistema apodrecido e rapidamente ganhou notoriedade nacional entrando para o "alto clero" da Casa. Por isso, não descarto que o ex-presidente da OAB fluminense poderá até surpreender nas urnas devido ao desgaste do governo municipal e à simpatia patológica que muitos cariocas ainda têm pelo populismo de esquerda.
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ResponderExcluirPois é, e além destes há também o projeto de lei do atual ministro da agricultura Sr. Blairo Maggi, sob o número 233/2015 que pretende estabelecer prazo de dois para as investigações por parte do Ministério Público em matérias de direito ambiental, do consumidor e nos casos de improbidade administrativa.
ResponderExcluirSoube que há outros e assim que conferir a fonte volto para publicar.
Precisamos impedir que tais projetos prossigam sob pena de esvaziarmos as medidas que estão permitindo que tanta sujeira venha à tona e seja limpa pela justiça.
Precisamos ainda pressionar ainda mais para que as dez medidas contra a corrupção do MP Federal seja aprovada.
Vamos nos mobilizar? Criei slogan assim: #roubarsemserpunidojamais#
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ResponderExcluirOlá, Quenia.
ResponderExcluirPrimeiramente agradeço por sua visita e comentários.
Realmente são projetos que vão na contramão das Dez Medidas apresentadas pelo MPF e que precisam ser combatidas, sendo certo que tais proposições carecem do mesmo respaldo de apoio popular, apesar dos parlamentares que as apresentaram terem recebido voto de seus eleitores.
A meu ver, os movimentos contra a corrupção não podem se acomodar depois do impeachment! Precisamos voltar às ruas para que ocorra o mesmo efeito em 2013 quando tentaram impor a PEC n.º 37. Aliás, chamo a atenção para este outro artigo que escrevi dias atrás aqui no blogue:
http://doutorrodrigoluz.blogspot.com.br/2016/06/o-brasileiro-quer-mais-do-que-um-ou.html
Abraços