Páginas

terça-feira, 29 de abril de 2014

O Deus que deu "uivos" por Moabe



"Por isso, uivarei por Moabe, sim, gritarei por todo o Moabe; pelos homens de Quir-Heres lamentarei. Mais que a Jazer, te chorarei a ti, ó vide de Sibma" (Jr 48:31-32a; ARA)

O capítulo 48 do livro de Jeremias é dedicado ao julgamento de Deus sobre a nação dos moabitas.

Moabe era um país à leste de Israel, situado às margens orientais do Mar Morto. De acordo com a Bíblia, seu povo descendia de Ló, sobrinho de Abraão, da mesma maneira como eram os amonitas (Gn 19:30-38). Porém, essa consciência sobre ser uma nação-irmã de Israel foi perdida tempos depois. Nos anos que seguiram ao êxodo egípcio, quando os hebreus preparavam-se para conquistar Canaã, Balaque, rei dos moabitas, adotou uma política hostil ao povo de Deus. Contam os capítulos 22 a 24 do livro de Números ter o monarca contratado o mercenário Balaão para que este amaldiçoasse o acampamento dos israelitas, mas o Eterno impediu que qualquer palavra negativa fosse proferida neste sentido.

Por tal motivo teria se criado uma inimizade histórica entre Israel e Moabe a ponto dos moabitas serem excluídos de participação na santa assembleia do Senhor (Dt 23:3-6). E, após a posse da Terra Prometida, muitas foram as guerras entre os dois países havendo nas Escrituras Sagradas o relato de domínio sob outro rei moabita de nome Eglom (Jz 3:12-14) bem como o registro de diversos conflitos no período da dinastia davídica. A rivalidade foi tanta a ponto do salmista chamar pejorativamente Moabe de "bacia de lavar" (ler Sl 60:8; 108:9).

Mesmo na época de Jeremias, no século IV a.C, os moabitas permaneciam orgulhosos e arrogantes (Jr 48:29). No oráculo do profeta dá para entendermos ter Moabe exultado com a destruição de Israel devido à comparação feita no versículo 13. Algo que se esclarece melhor quando avançamos na leitura:

"Moabe se revolverá no seu vômito e será ele também objeto de escárnio. Pois Israel não te foi também objeto de escárnio?" (Jr 48:26b-27a)

Ora, mas será que agradou ao coração do Senhor ver a destruição das cidades de Moabe pelo exército dos caldeus? Certamente que não! Pois o próprio texto inicialmente citado revela-nos que Deus teria uivado por Moabe, o que significava um gesto de lamentação na cultura do antigo Oriente Próximo. E o verso 36 assim nos diz:

"Por isso, o meu coração geme como flautas por causa de Moabe, e como flautas geme por causa dos homens de Quir-Heres" (Jr 48:36a)

Meu amigo leitor, não creio que esses sentimentos de Deus pelos inimigos de Israel, conforme captados pelo autor bíblico, sejam explicados pelo simples fato de Moabe descender do sobrinho do patriarca Abraão. Tão pouco seria porque Obede, o avô de Davi, foi gerado de um ventre moabita (Rute) ou ter esse herói israelita procurado refúgio entre o povo de sua bisavó quando escapava da implacável perseguição de Saul (1Sm 22:3-4). Porém, acredito que a resposta reside no amor misericordioso do Altíssimo. Isto porque o Criador bendito não se compraz com a morte do perverso, mas deseja que todos se arrependam e vivam eternamente diante de sua Presença.

Assim como Moabe deixou de existir como nação, muitos têm hoje se perdido por não darem ouvidos à voz de Deus. Caminham obstinados para o abismo pois a escuridão cega-lhes os olhos. Tornam-se com isso escravos das próprias compulsões egoístas esquecendo-se dos bons princípios éticos escritos pelo Criador antes da fundação do mundo afim de que fossem observados pelo homem.

Entretanto, Jesus Cristo veio salvar o perdido!

Vivendo numa época tão opressora quanto foram os dias de Jeremias, o Mestre anunciou suas boas novas aos pecadores. Falou ao coração das ovelhas desgarradas de seu povo sobre uma nova oportunidade para que se reconciliassem com Deus porque o Reino "é chegado". A sofrida morte na cruz veio a se tornar a maior prova desse amor sem fim que o Pai Eterno sente por todos nós. Pois, na teologia cristã, trata-se do próprio Ser Divino fazendo-se presente na figura humana de seu Messias para sofrer substitutivamente aquilo que seria a pena de todos nós abolindo-a de uma vez por todas. Logo, dentro desta nova maneira de ver a realidade, todos passam a se encontrar debaixo da graça, por mais que se tenha cometido no passado os piores delitos.

Quer alguém entenda o sacrifício de Cristo como um evento histórico-literal ou meramente simbólico, pouco importa desde que se assimile a essência do seu rico significado. Vale é que temos aí uma inegável expressão graciosa da bondade divina, a qual também se encontra no precioso oráculo de Jeremias. Pois apesar do juízo profetizado contra Moabe, nota-se, no texto bíblico, o amor incondicional por uma nação pagã capaz que é capaz superar qualquer consequência dolorosa decorrente das veredas errantes. Por isso o capítulo encerra com a promessa da mudança sorte de Moabe (verso 47), algo que se torna extensivo também aos perversos amonitas (Jr 49:6). Ou seja, Deus não desiste de nenhum de seus filhos!


OBS: A ilustração acima refere-se ao mapa em inglês, licenciado pela Creative Commons, sobre os antigos reinos de Judá e de Israel por volta de 830 a.C., no qual consta o território da nação de Moabe em coloração marrom. Extraí a imagem do acervo virtual da Wikipédia em http://en.wikipedia.org/wiki/File:Kingdoms_around_Israel_830_map.svg

domingo, 27 de abril de 2014

A terrível quebra de diálogo entre as gerações




"E como é importante o encontro e o diálogo entre as gerações, principalmente dentro da família" 
(palavras do papa Francisco nos dias de sua visita ao Brasil em 2013)


Neste último sábado (26/4), estava a ler o Salmo 78, quando os seus primeiros oito versículos me fizeram refletir acerca da nossa atual condição crítica no Brasil e no Ocidente em geral. Em seu poema, Asafe assim teria declarado ao seu povo:

"Em parábolas abrirei a minha boca, proferirei enigmas do passado; o que ouvimos e aprendemos, o que nossos pais nos contaram não os esconderemos dos nossos filhos; contaremos à próxima geração os louváveis feitos do Senhor, o seu poder e as maravilhas que fez. Ele decretou estatutos para Jacó, e em Israel estabeleceu a lei, e ordenou aos nossos antepassados que a ensinassem aos seus filhos, de modo que a geração seguinte a conhecesse, e também os filhos que ainda nasceriam, e eles, por sua vez, contassem aos seus próprios filhos. Então eles porão a confiança em Deus; não esquecerão os seus feitos e obedecerão aos seus mandamentos." (Salmos 78:2-7; NVI)

Provavelmente o autor bíblico deveria estar se recordando das palavras de Deuteronômio 6, onde está a importante confissão monoteísta do Shemá Yisrael ("Escuta, Israel"), recitada todas as manhãs e finais de tarde pelos judeus afim de relembrarem a aliança estabelecida entre Deus e o povo no monte Sinai. Ali pode-se afirmar que Moisés teria aconselhado a geração que entraria na Terra Santa a gastar tempo conversando com os filhos, estimulando o interesse da criança pelo passado glorioso de sua nação afim de infundir-lhe a fé e a esperança de seus antepassados.

É interessante observar que, também entre os indígenas, transmite-se o saber às novas gerações, emergindo de cada etnia as relações de poder, coletivo, baseando-se no diálogo para a solução dos problemas por eles enfrentados. Pois, mesmo desconhecendo a escrita, os povos que julgamos "primitivos" guardam um rico conhecimento sobre a vida e de respeito pela natureza. São guardiões de uma ética que a nossa sociedade acabou perdendo com o seu progresso civilizatório multiplicador de necessidades.

Contudo, entre nós, a ausência desse indispensável diálogo tornou-se patente nos últimos tempos. Há quem considere ter isso ocorrido entre o final da década de 1960 e os anos 70, colocando a geração nascida no pós-guerra como a grande vilã da rebeldia. Só que a responsabilidade pela educação e transmissão do conhecimento sempre foi dos pais. Daí, se os filhos não quiseram mais ouvi-los, não seria por causa de um excesso de autoritarismo e da falta de conexão dialogal?

Como resultado de todo esse processo trágico, temos hoje pais vazios em conteúdo e que nada têm a passar para os filhos. As pessoas tornaram-se vítimas do comodismo e das próprias distrações do cotidiano. E, desta maneira, sem dúvida que o secularismo contribui decisivamente para essa perda de princípios porque os bons hábitos de uma tradição são esquecidos e passam a ser substituídos por atividades nem um pouco construtivas. Ou seja, a criança acaba sendo "educada" pela TV, pela internet, pelos joguinhos eletrônicos e pelas más companhias da rua.

Mas não vamos ficar culpando os pais "por tudo", como diz aquela música cantada pelo grupo Legião Urbana! Cada ser humano pode exercer o seu direito de escolha e procurar as coisas boas por mais que o ambiente externo seja desfavorável. Logo, cabe a nós invertermos todo esse processo negativo dentro da cultura brasileira, a qual tem o cristianismo em suas origens e deve se fortalecer novamente com base nos saudáveis valores bíblicos. E, nesta redescoberta, precisamos estar disposto a dialogar sempre com as crianças, ouvindo suas dúvidas, perguntas e inquietações. Como pais, avós, professores ou pastores espirituais precisamos dar a elas essa liberdade durante as nossas conversas, presentificando-nos a respondê-las e indo sempre além daquilo que os pequeninos esperam ouvir.

Concluo este artigo incentivando o meu leitor a elaborar uma educação entusiasmada em seu trato com as gerações de seus filhos e netos. Cuida-se de um trabalho que exigirá de nós paciência e também fé, cientes de que estamos ainda plantando boas sementes as quais a seu tempo germinarão no solo dos corações dos infantes. Talvez não colheremos agora os frutos, mas estaremos criando condições para o surgimento de um novo Brasil diferente do seu quadro atual de corrupção, dependência química, criminalidade e injustiças sociais. Afinal, as mudanças que desejamos para um país requerem tempo para amadurecimento, mas precisam que alguém idealista trabalhe hoje para que elas ocorram. Alguém como Moisés que, mesmo sem entrar na Terra Santa, transmitiu aos israelitas uma inspiradora constituição escrita enquanto esteve buscando a Deus na montanha do Sinai.


OBS: Imagem acima extraída de http://radios.ebc.com.br/radioteatro-contos-no-radio/edicao/2014-04/amigo-do-rei-episodio-de-contos-no-radio

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Quando as pessoas negam a realidade...



"tínhamos fartura de pão, prosperávamos e não víamos mal algum. Mas, desde que cessamos de queimar incenso à Rainha dos Céus e de lhe oferecer libações, tivemos falta de tudo e fomos consumidos pela espada e pela fome" (Livro de Jeremias 44:17b-18; ARA)

Encontramos nas narrativas bíblicas de Jeremias importantes lições sobre a queda da Jerusalém antiga, a qual foi destruída pelo rei Nabucodonosor no século IV a.C., fato este confirmado pela História. Entretanto, as Escrituras Sagradas não se aprofundam tanto nas circunstâncias políticas que deram causa ao evento e dão uma ênfase maior nas questões de ordem ética, tendo por base as injustiças cometidas pelos governantes e também pelo próprio povo.

Ao invadirem a cidade, os caldeus levaram para a Babilônia uma boa parte da população, deixando na terra os mais pobres (Jr 39:9-10), provavelmente para que o espaço conquistado não ficasse vazio. Porém, devido a certos acontecimentos expostos no livro, a permanência desse remanescente em Judá tornou-se instável e insegura, pelo que tanto os líderes quanto os liderados resolveram migrar dali para o Egito, mesmo contrariando as sábias orientações do profeta (Jr 43:4-7).

Ocorreu que, estando já em território egípcio, Jeremias continuou advertindo o seu povo sobre a decisão insana que fora tomada, criticando duramente a conduta infiel que esses refugiados passaram a praticar lá (Jr 44:1-14). Da mesma maneira como Israel tinha sido arrasada pelos caldeus, Nabucodonosor faria o mesmo com o Egito. Os destinatários da mensagem continuavam relutantes em obedecer à Palavra de Deus igualmente aos que tinham sido mortos ou levados para o exílio na Babilônia, tal como foram os seus antepassados em outras épocas.

"Esquecestes já as maldades de vossos pais, as maldades dos reis de Judá, as maldades das suas mulheres, as vossas maldades e as maldades das vossas mulheres, maldades cometidas na terra de Judá e nas ruas de Jerusalém? Não se humilharam até ao dia de hoje, não temeram, não andaram na minha lei nem nos meus estatutos, que pus diante de vós e diante de vossos pais." (Jr 44:9-10)

Contudo, o profeta deparou-se com a mais escancarada rebeldia. Pois, ao invés do povo reconhecer que havia deixado o Senhor e os seus mandamentos, resolveram deturpar a realidade, respondendo eles que a causa da queda de Jerusalém teria sido o abandono do culto idólatra à "Rainha dos Céus" (Jr 44:15-19). Tanto os homens quanto as mulheres desafiaram Jeremias a ponto de justificarem o erro que vinham cometendo impenitentemente.

É provável que esse culto à Rainha dos Céus fosse uma devoção à Astarote ou Astarte, personagem do panteão fenício conhecida como a "deusa da fertilidade" e do "amor". Correspondia à Ishtar na antiga religião mesopotâmica, sendo identificada pelo planeta Vênus. E, como se verifica na passagem bíblica de Jr 7:18, sabe-se também pelas pesquisas históricas que era feita uma celebração incluindo uma pitada de incenso, um bolo em forma de mulher, uma lua crescente (ou uma estrela) e uma libação. Não só as esposas como todos os membros da família tomavam parte no evento que contava com a proeminência das mulheres. Até as crianças colaboravam!

Triste, mas as pessoas da época de Jeremias permaneciam cegas quanto à própria realidade. Não queriam reconhecer seus erros e menos ainda se arrependerem. Se o profeta falasse o que fosse do interesse deles, certamente escutariam. Só que como a mensagem anunciada contrariava os planos obstinados daquela geração (além do pecado da idolatria outras situações eram juntamente denunciadas), o povo preferia tapar os ouvidos atolando-se cada vez mais num auto-engano. Pois, afinal de contas, a lendária "Rainha dos Céus" não iria lhes comunicar nenhuma advertência de modo que para seus corações corruptos era muito mais cômodo seguirem as fábulas da mente humana do que se confrontarem com a verdade.

Amados, pode-se afirmar que a essência da idolatria consiste em alguém colocar outra coisa como alvo do amor que deve ser exclusivamente dedicado a Deus. No passado, os povos pagãos inventavam seus deuses e deusas, mas não podemos negar que hoje existem formas mais modernas de se idolatrar coisas. Basta que direcionemos o nosso sentimento para determinados bens, dinheiro, cargos, pessoas, fama, o alcance do prestígio social e até a projeção dos ministérios exercidos no meio religioso cristão com fins pessoais.

Que sejamos atentos quanto a tudo isso, meus irmãos! Enquanto uns ficam perdendo tempo para fazerem dessas referências do livro de Jeremias um ataque ao catolicismo, como se a exemplar mãe de Jesus fosse a representação dessa "Rainha dos Céus" (não nego que as devoções prestadas a Maria tornaram-se um substitutivo de antigas práticas pagãs), vejo situações bem mais graves acontecendo no meio evangélico. Principalmente entre os que andam trocando a mensagem simples das boas novas do Reino de Deus por uma perversa teologia de prosperidade. Algo incapaz de produzir a indispensável conversão sem a qual a vida em Cristo torna-se inoperante.

Já dizia Moisés que "não só de pão viverá o homem" (Dt 8:3), frase citada mais tarde por Jesus quando o Mestre se sentiu tentado no deserto (conf. Mt 4:2-4). E, se retornarmos ao texto de Jeremias, veremos que a resposta dada pelos refugiados rebeldes ao profeta fazia menção de fartura de alimentos e de prosperidade (Jr 44:17). Ou seja, a história continua a se repetir nos dias de hoje e dentro de igrejas ditas cristãs, mesmo com os "cultos" em seus ambientes sendo aparentemente dirigidos a Deus. Porém, não passam de reuniões onde as pessoas também negam a realidade.


OBS: A figura acima refere-se a uma versão modificada de autor desconhecido sobre o célebre afresco A Criação de Adão pintado por Michelangelo no começo do século XVI e que figura no teto da Capela Sistina. Trata-se de uma obra de domínio público.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Magistrados que vilipendiam a advocacia


Recentemente, o Conselho Federal da OAB ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF) com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5110, afim de questionar a adoção de diferentes critérios para a fixação de honorários nas causas envolvendo a Fazenda Pública.

A ação questiona a aplicação de um dispositivo do artigo 20 do Código de Processo Civil (CPC). Pois, nos casos em que a Fazenda Pública é vitoriosa, a lei vigente fixa os honorários entre 10% e 20% do valor da condenação. Porém, quando a Fazenda resta derrotada, a decisão sobre os valores acaba sendo totalmente discricionária, a critério do juiz de modo que muitos magistrados fixam verbas de sucumbência ínfimas em favor dos advogados, ignorando todo o empenho que tiveram na defesa de seus clientes. Senão vejamos o que disse Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidente nacional da OAB:

"A fixação de honorários contra a Fazenda Pública em caráter irrisório vilipendia a profissão, ao contrário do que quis o constituinte originário, desqualificando publicamente o advogado face aos relevantes serviços prestados."

De acordo com José Luis Wagner, procurador nacional de Defesa das Prerrogativas, estes seriam os fundamentos básicos da ADI movida pela Ordem:

"Em primeiro lugar percebe-se o desrespeito ao princípio da isonomia na medida em que, nas ações em que a Fazenda Pública é vencedora, tem seus honorários dentro dos padrões estabelecidos no CPC, e quando ela sai vencida, os valores são fixados ao livre arbítrio do juiz. O que temos visto são honorários irrisórios em ações cujo valor é muito grande. Em segundo lugar, atenta-se contra outro princípio, o da razoabilidade"

Concordo plenamente com essa iniciativa e defendo que todos os advogados devem acompanhar essa causa e lutarem por todos os meios para que os honorários sejam mais valorizados. Recordo que, no ano passado, tive uma ação contra o Estado julgada monocraticamente pela segunda instância da Justiça Estadual do Rio de Janeiro em que a desembargadora relatora diminuiu a minha sucumbência de R$ 800,00 para míseros R$ 300,00. Um tremendo desrespeito! Recorri, por meio de agravo regimental, assim como a Procuradoria do Estado também fez, mas a Justiça entendeu que se tratava de hipótese de sucumbência recíproca porque minha cliente havia saído derrotada em seu pleito sobre danos morais quando cumulou este pedido com o de tratamento de saúde na rede pública do SUS.

Na OAB/RJ, eis que, desde 2013, os advogados já podem contar com o apoio da Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas (CDAP). O colega que precisar do auxílio do núcleo deve encaminhar seu caso à comissão, tanto pessoalmente, na sala 310, corredor D, do Fórum Central, ou pelo e-mail cdap@oabrj.org.br , o que tem sido mais acessível para nós profissionais que atuamos no interior. Após a analisar, a OAB poderá pedir o ingresso nos autos do processo em questão na qualidade de amicus curie. já que a entidade tem legitimidade para isso. Porém, considero indispensável que o advogado também recorra das decisões que forem desfavoráveis neste sentido.

Assim, mais do que nunca a nossa categoria precisa lutar de todas as maneiras pelos seus direitos profissionais. Há anos que a advocacia tem deixado de ser atrativa devido ao aviltamento dos honorários (tanto dos sucumbenciais quanto dos contratados) e está na hora de nos valorizarmos mais. Afinal, qualquer formação acadêmica é um investimento de tempo e de dinheiro, importando também em uma dedicação ao trabalho posteriormente desenvolvido, quando se trata de profissionais sérios devidamente compromissados. Logo, não temos que nos conformar com a atual situação como grande parte dos juízes brasieiros tratam a atuação honrosa dos advogados.

Parabéns, OAB!

quarta-feira, 23 de abril de 2014

O "santo" da liberdade religiosa




Confesso que nunca fui devoto do São Jorge e nem de qualquer santo cristão, popular ou de outros credos. Minha formação evangélica de base bíblica ensinou-me a adorar e venerar somente a Deus, sem conferir poderes de intercessão a alguém já falecido por mais que tenha sido uma pessoa justa, caridosa ou ainda realizado milagres em vida.

No entanto, não sendo hoje mais um religioso fundamentalista e tendo ampliado contatos com as doutrinas de igrejas protestantes mais tradicionais (tipo os luteranos e os anglicanos), passei a ver muitos santos sob um prisma diferente. Ou seja, comecei a admiti-los como homens e mulheres exemplares, pessoas dignas de serem prestigiadas ainda que jamais tenham alcançado a perfeição.

Sendo assim, neste dia 23 de abril, resolvi pesquisar sobre a vida do quase lendário São Jorge sem me ater tanto à historicidade dos atos e fatos a ele atribuídos. Deixei de lado alguns contos populares a seu respeito, os quais julguei por demais fantasiosos, e procurei valorizar aquilo que pudesse ser aproveitado para fins de edificação, pelo que encontrei o seguinte relato na Wikipédia em português:

"De acordo com as lendas, Jorge teria nascido na antiga Capadócia, região do centro da Anatólia que, atualmente, faz parte da República da Turquia. Ainda criança, mudou-se para a Palestina com sua mãe após seu pai morrer em batalha. Sua mãe, ela própria originária da Palestina, Lida, possuía muitos bens e o educou com esmero. Ao atingir a adolescência, Jorge entrou para a carreira das armas, por ser a que mais satisfazia à sua natural índole combativa. Logo foi promovido a capitão do exército romano devido a sua dedicação e habilidade — qualidades que levaram o imperador a lhe conferir o título de conde da província da Capadócia. Aos 23 anos passou a residir na corte imperial em Nicomédia, exercendo a função de Tribuno Militar.
Nesse tempo sua mãe faleceu e ele, tomando grande parte nas riquezas que lhe ficaram, foi-se para a corte do Imperador Diocleciano.
Em 302, Diocleciano (influenciado por Galério) publicou um édito que mandava prender todo soldado romano cristão e que todos os outros deveriam oferecer sacrifícios aos deuses romanos. Jorge foi ao encontro do imperador para objetar, e perante todos declarou-se cristão. Não querendo perder um de seus melhores tribunos, o imperador tentou dissuadi-lo oferecendo-lhe terras, dinheiro e escravos. Como Jorge mantinha-se fiel ao cristianismo, o imperador tentou fazê-lo desistir da fé torturando-o de vários modos. E, após cada tortura, era levado perante o imperador, que lhe perguntava se renegaria a Jesus para adorar os deuses romanos. Todavia, Jorge reafirmava sua fé, tendo seu martírio aos poucos ganhado notoriedade e muitos romanos tomado as dores daquele jovem soldado, inclusive a mulher do imperador, que se converteu ao cristianismo. Finalmente, Diocleciano, não tendo êxito, mandou degolá-lo no dia 23 de abril de 303, em Nicomédia (Ásia Menor)." 

Assim, tendo feito as minhas reflexões particulares, concluí que, além de servir como um exemplar soldado cristão, Jorge da Capadócia pode ser visto como um crente fiel ao Senhor bem como um ícone na luta contra a intolerância religiosa ainda reinante no mundo. Trata-se de um cara que não se vendeu ao rei após ter resolvido se declarar cristão na frente de todos, desafiando a política imperial da época.

Confesso que, se estivesse no lugar dele, teria feito diferente. Talvez mantivesse a minha fé discretamente e não tomaria a iniciativa de declarar-me cristão publicamente, exceto se fosse consultado por alguém. Entretanto, suponho ter havido algum contexto específico que o levou a se posicionar radicalmente. Talvez passasse em sua cabeça que o imperador poderia voltar atrás quanto ao decreto e, neste caso, uma eventual revogação beneficiaria inúmeros outros soldados cristãos, evitando que muitos irmãos viessem a ser presos, torturados, mortos ou negassem a Deus.

Seja como for, nada justifica o fato de um ser humano sofrer perseguição pelo credo religioso que professa. Mesmo que o indivíduo resolva anunciar a sua fé aos quatro cantos e pratique inconvenientemente o proselitismo, considerando a crença que segue como a única verdadeira no mundo, temos sempre o dever ético-jurídico de respeitar. Pois, independente de haver normas constitucionais ou legais neste sentido, cuida-se de um direito baseado no livre arbítrio, o qual é concedido a todos por Deus, em que nem o Criador obriga o homem a aceitá-Lo como seu único Senhor.

Penso que nós evangélicos (ou que recebemos uma formação evangélica) precisamos aprender um pouco com essa história do "santo guerreiro". Neste feriado regional de 23/04, ainda que muitos não reconheçam qualquer valor na data comemorada, devemos saber tolerar e respeitar os costumes culturais de quem é católico romano, católico ortodoxo, anglicano e até umbandista. Sair atacando a religião alheia seria uma burra atitude de imaturidade espiritual.


OBS: A ilustração acima refere-se ao quadro São Jorge (1472) do pintor renascentista Carlos Crivelli (c. 1435 - c. 1495). Extraí a figura do acervo virtual da Wikipédia, conforme consta em http://en.wikipedia.org/wiki/File:Saint_George_-_Carlo_Crivelli.jpg

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Saborosos dias de outono




O mês que geralmente mais gosto costuma ser abril. É uma época que para mim tem sabor de doce. Afinal, além da achocolatada Páscoa e dos feriados, os quais concediam-me um alívio restaurador nos tempos de estudante, eis que tenho em minha família alguns aniversários: o de minha mãe (4), o meu (12) e o de Núbia (26). E, na escola, costumava haver ainda as festinhas de alguns colegas sendo que, por coincidência, sempre encontrava alguém nascido também no décimo-segundo dia.

Mas abril também me atrai por suas temperaturas amenas. O calorão do verão ainda não se foi totalmente, porém o ambiente ainda não está frio. Dá tranquilamente para andar de bermuda e chinelão pelas ruas. Se bobear, encaro até um banho frio. Pois, se fizer sol durante o dia, a água fica deliciosa à tardinha.

Nesse período pascal, tem feito dias agradáveis aqui em Muriqui/Mangaratiba. As profecias dos meteorologistas não se cumpriram conforme a intensidade por eles prevista de modo que as nuvens e o sol têm sabido compartilhar o mesmo espaço da atmosfera. Hoje mesmo está uma manhã de outono linda chamando-me para ir à praia. Praia esta que fica uns três quarteirões de casa e que tem sido o meu sustento financeiro desde novembro de 2012, ano quando vim morar aqui.

O movimento em abril, mesmo nesta junção de feriados de 2014 (no caso do Rio de Janeiro ainda teremos o de São Jorge quarta-feira), certamente não se compara com a temporada de verão. Não chego a vender nem a metade de um domingo ensolarado de janeiro, mas confesso que me sinto mais tranquilo podendo dividir as horas do dia com a família e o trabalho. E também não tenho sofrido mais com a terrível falta d'água ocorrida no verão e que foi a pior seca no Sudeste vista pelos meus olhos de 38 anos de idade (ler o artigo Sentindo os efeitos da falta d'água, de 24/02).

E assim vou caminhando um dia após o outro, procurando também contemplar a paisagem enquanto dou minhas passadas no tempo e no espaço. Pois uma das coisas que a vida tem tentado me ensinar seria justamente isso - que a nossa trajetória pode ser tão bela quanto o ponto de chegada. Aliás, na verdade, todo o percurso é saboroso como também são os gostosos dias outonais de abril no nosso hemisfério terrestre.


OBS: A ilustração acima refere-se ao quadro Outono (1875) do pintor e paisagista norte-americano Frederic Edwin Church (1826 – 1900) conforme extraído do acervo virtual da Wikipédia em http://en.wikipedia.org/wiki/File:Frederic_Edwin_Church_-_Autumn.jpg

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Quais devem ser os limites da publicidade infantil?




Em 01º/05/2013, ao escrever o artigo A multa do McDonald's e os limites da publicidade infantil, cheguei a tratar desse polêmico tema aqui no blogue, o qual tem sido debatido no Congresso Nacional ultimamente por tramitar na Câmara Federal o Projeto de Lei n.º 702/11 de autoria do deputado Marcelo Matos (PDT).

Uma das organizações não-governamentais do país que mais tem se posicionado contrariamente à publicidade infantil é o Instituto Alana cujo conselheiro e advogado Dr. Pedro Afonso Hartung considera nocivo o estímulo desenfreado para comprar determinado produto porque, em sua opinião, acaba "transformando os pais em vilões". No entendimento da ONG, torna-se abusivo o direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço.

Felizmente, a visão do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) tem sido outra. Durante a audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio, o vice-presidente da entidade, Edney Narchi, destacou que somente o Congresso Nacional pode legislar sobre publicidade e propaganda, afirmando que proibir a publicidade infantil seria uma forma de censura. Para ele, já existem mecanismos próprios para evitar abusos, como o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, o qual veda o apelo imperativo de consumo infantil. Durante a audiência pública promovida pelo Poder Legislativo, disse ele que "a mão pesada do Estado constitui uma afronta à liberdade de expressão e vilipendia o direito de cada família brasileira de criar seus filhos da maneira que acha correta".

Já o diretor-geral da Associação Brasileira de Anunciantes (Abert), Luís Roberto Antonik, considerou que, ao proibir a publicidade infantil, as crianças vão ser banidas da televisão brasileira. Em sua opinião, o sistema brasileiro é sustentado pela publicidade que veicula sendo suficiente aperfeiçoar a legislação já existente para que as normas, como seria o caso do Código de Defesa do Consumidor, passe a coibir abusos, mas não proibir a publicidade.

Atualmente, a Resolução 163 do CONANDA, de 13 de março de 2014, considera abusiva toda publicidade direcionada às crianças, de acordo com os seguintes aspectos caracterizadores:

-       linguagem infantil, efeitos especiais e excessos de cores;
-       trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança;
-       representação de criança;
-       pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil;
-       personagens ou apresentadores infantis;
-       desenho animado ou de animação;
-       bonecos ou similares;
-       promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil;
-       promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil.

Particularmente, além de eu não reconhecer o poder jurídico dessa norma infra-legal que o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente tenta impor à sociedade como se fosse uma lei, verifico que há nela uma indiscutível censura capaz de ferir frontalmente a liberdade de expressão que é assegurada pela Constituição Federal.

Verdade é que a obrigação de educar a criança é dos pais, não da televisão e muito menos das empresas que vendem seus produtos no mercado!

Considero também que, ao se restringir demasiadamente a publicidade infantil, o comércio terá cada vez mais dificuldades para apresentar alimentos, roupas, calçados, brinquedos, livros, DVDs, dentre outras coisas que interessem tanto às crianças como aos seus tutores. Aliás, a própria criatividade do empreendedor ficará de algum modo bloqueada pois ele não poderá mais desenvolver maneiras inteligentes de atrair o público consumidor para o seu negócio. Inclusive no que diz respeito à decoração do ambiente de um estabelecimento quando o local é agradavelmente organizado para recepcionar crianças.

Do jeito que a coisa vai sendo conduzida neste país, em breve as nossas crianças já não poderão contar mais com espaços de convivência em shoppings, lanchonetes, sorveterias e, se bobear, até em consultórios médicos ou odontológicos. O Conanda pelo seu radicalismo está tirando o sabor da infância dos nossos pequeninos de modo que não vai demorar muito para alguma ONG maluca querer banir até o Coelhinho da Páscoa e o Papai Noel da porta de uma loja, o que, no fim das contas, acabará mexendo com a nossa cultura excluindo as coisas interessantes ainda existentes nela. Enfim, é preciso haver uma dose maior de bom senso no trato dessas questões.


OBS: Foto acima extraída do Portal EBC com atribuição de autoria a Sam Shiraishi / Creative Commons, conforme consta em http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2013/03/novas-recomendacoes-para-publicidade-em-programas-infantis-comecam-a-valer

terça-feira, 15 de abril de 2014

Lançadas as pré-candidaturas de Campos e Marina!




Fiquei feliz em saber ontem da notícia sobre o lançamento em Brasília das pré-candidaturas de Eduardo Campos e Marina Silva para concorrerem à Presidência da República pela aliança partidária PSB/REDE/PPS/PPL.

Finalmente temos agora uma alternativa política democrática, representativa e de base popular para se opor ao degenerado governo petista. Uma coligação que, embora dialogue com toda a sociedade (o que inclui os empresários e as elites), dará mais espaços tanto para o cidadão mais humilde como também para os ambientalistas, já que o PT foi uma verdadeira decepção em termos de proteção da natureza.

Surpreendi-me em saber que dessa vez o PPS de Roberto Freire conseguiu se afastar do conservadorismo dos tucanos retornando às raízes do socialismo democrático, o que considero bastante construtivo. Afinal de contas, trata-se de um partido herdeiro das lutas heroicas de Luís Carlos Prestes (1898-1990) e que deve se conduzir com a devida atenção afim de manter atualizada a mensagem por uma sociedade mais justa.

Contudo, uma das coisas mais importantes que verifico nesta coligação seria o novo olhar sobre a política. Algo que a sociedade brasileira aguarda acontecer sendo enorme o desgaste do nosso eleitor com as promessas feitas em campanha que quase sempre são descumpridas depois pelos candidatos quando estes chegam ao poder. Por isso as palavras de Marina Silva, proferidas ontem, fazem um real sentido quando a ex-senadora disse que:

"A política não pode ser orientada pela lógica da governabilidade baseada na distribuição de cargos. A política não pode ser empecilho para o avanço do país. A política precisa ser a força impulsionadora das mudanças e das transformações (...) Vamos fazer um processo politico aonde não exista a necessidade de destruir ninguém, apenas de construir o Brasil que queremos. Vamos participar desse processo apenas com a consciência de que temos de dar o melhor de nós para que o Brasil possa dar o melhor de si (...) Vamos dialogar com o quinto partido da aliança, que é o povo brasileiro"

Dialogar permanentemente com o povo é o que precisa ser feito! Eis aí o grande desafio da política do século XXI em que o cidadão deseja ser ouvido e ter as suas demandas básicas prontamente atendidas. Pois não dá para ver tanto desperdício de dinheiro público com a construção de estádios enquanto pacientes sofrem aguardando atendimento nos hospitais, as escolas encontram-se em péssimas condições e o transporte urbano nas principais metrópoles do país funcionam de maneira precária com trens e metrôs super lotados. Isto quando não têm os seus processos de licitação direcionados com cartas marcadas para beneficiar determinadas empresas.

Marina, Marina. Tô contigo, mulher! Votei em você nas eleições passadas e considero seu nome como a melhor opção para o povo brasileiro. Sei que, em matéria de política, muitas vezes é preciso ceder daqui e dali, fazer acordos e, enfim, negociar espaços. Como grande parte do eleitor brasileiro, ando também desgastado com tanta corrupção e safadeza. Porém, diante de mais uma eleição, não posso covardemente anular o meu posicionamento. Por isso estou nessa porque precisamos caminhar e continuar buscando o melhor para o Brasil.



OBS: As fotos e a citação acima transcrita foram extraídas do blogue da Marina Silva , conforme consta em http://www.marinasilva.org.br/blog/2014/04/festa-democratica-lanca-pre-candidaturas-de-campos-e-marina/

domingo, 13 de abril de 2014

Os limites de uma pena



"Em havendo contenda entre alguns, e vierem a juízo, os juízes os julgarão, justificando ao justo e condenando ao culpado. Se o culpado merecer açoites, o juiz o fará deitar-se e o fará açoitar, na sua presença, com o número de açoites segundo a sua culpa. Quarenta açoites lhe fará dar, não mais; para que, porventura, se lhe fizer dar mais do que estes, teu irmão não fique aviltado aos teus olhos. Não atarás a boca ao boi quando debulha." (Dt 25:1-4; ARA - destaquei)

Tive uma reflexão neste último sábado (12/04) quando, acidentalmente, abri a minha Bíblia no capítulo 25 de Deuteronômio e li a citação acima transcrita. Observei que o texto sagrado, embora fale de uma pena de castigo corporal hoje não mais utilizada pelas nações ocidentais, eis que a orientação das Escrituras trás em si um importante princípio de humanidade sobre a limitação do castigo, o qual precisamos assimilar em nossas ações.

Pode-se afirmar que a penalidade dos açoites foi um corretivo que os antigos magistrados (hebr. shofetim) aplicavam em casos considerados graves. Entre os israelitas, o condenado sofria no máximo até trinta e nove golpes determinados conforme a danosidade do delito e as condições físicas que possuía para suportar o castigo. Isto porque a medida não deveria jamais perder o seu caráter de misericórdia. Senão vejamos os pertinentes comentários teológicos do rabino Meir Matzliah Melamed que constam na versão da Torá - A Lei de Moisés, editada pela editora Sêfer, pág. 575, esclarecendo como os judeus do passado passaram a interpretar e aplicar essa instrução bíblica:

"Apesar de a Torá escrever o número de quarenta açoitadas, o Talmud (Macot 22) traduz a palavra Bemispar (em número) como Sefar (limite dos quarenta), isto é, trinta e nove. Por isso, era proibido exceder este número. O Malcut era executado na presença de três juízes. Um deles pronunciava as seguintes palavras durante a execução da pena: "Se não guardares para cumprir todas as palavras desta Lei, escritas neste livro para temeres este Nome glorioso e temível, o Eterno, teu Deus; e fará o Eterno com que as tuas feridas e as feridas da tua descendência sejam diferentes das outras feridas grandes e fiéis e das doenças más e fiéis" (Deuteronômio 28:58-59). "E guardareis as palavras desta aliança e as cumprireis, para que prospereis em tudo quanto fizerdes" (Deut. 29:8). Finalmente, pronunciava este versículo dos Salmos que contém 13 palavras hebraicas: "O Eterno é misericordioso, perdoa a iniquidade e não destrói, retém muitas vezes a Sua cólera e não manifesta nunca toda a Sua ira." (Salmos 78:38). Em cada treze golpes, repetia-se este versículo. Os primeiros treze golpes eram dados sobre o peito, e os outros, metade sobre uma costa e metade sobre a outra. O condenado era examinado previamente se podia suportar os trinta e nove golpes; do contrário, davam-lhe menos, segundo a sua constituição física."

No Brasil, a penalidade dos açoites aos que eram considerados homens livres só veio a ser extinta com a Constituição Imperial de 1824, mas continuou valendo contra os escravos, desde que não condenados à pena capital, bem como na hipótese de galés, limitada até cinquenta açoitadas por dia, conforme era previsto no artigo 60 do Código Criminal de 1830. Também se aplicava essa penalidade aos casos de insurreição contra o Império. Até então vigorava o rigoroso Livro V das Ordenações Filipinas, o qual impunha à população da Colônia suplícios e horrores semelhantes aos da Inquisição.

Atualmente, com o artigo 5º, inciso XLVII, alínea e da Constituição de 1988, são proibidas as penas "cruéis", dentre as quais se incluem, obviamente, qualquer castigo corporal ou psicológico. Tanto é que hoje até o preso deve ter a sua integridade física e moral respeitada (item XLIX do art. 5º da CRFB).

É certo que, se viajarmos ao moderno Estado de Israel, também encontraremos uma legislação criminal mais adequada às concepções sobre os direitos humanos dos nossos tempos embora as penas de prisão por lá sejam mais duras do que aqui. Em todo caso, é assegurado o contraditório e a ampla defesa aos acusados num processo penal. Até um terrorista tem os seus direitos preservados ainda que passe o resto da vida morando numa cadeia.

Contudo, em todo caso sempre haverá limites para a aplicação de qualquer pena pois esta não pode perder o seu caráter de ressocializar o indivíduo trazendo-o de volta ao convívio normal com as demais pessoas. Uma vez cumprida a obrigação, o ex-condenado encontra-se livre de sua dívida para com o Estado e a sociedade, não podendo esta exigir-lhe mais nada. Tanto é que, se o cidadão vier a permanecer  preso além do tempo fixado na sentença, ele passa a ter o direito constitucional de receber uma indenização (art. 5º, LXXV da CRFB), tendo em vista o princípio da inocência maculada.

Só que não é bem isso o que ocorre no meio social brasileiro! Na prática, o egresso do sistema penitenciário acaba sofrendo inúmeros preconceitos. Pois além de não conseguir com facilidade um trabalho, a sociedade continua "açoitando-o". É como se carimbassem em sua testa: "Esse cara é bandido!"

Acredito que muitas dessas reações talvez sejam explicadas pelo sentimento de impunidade que toma conta de grande parte das mentes. Ora, mas se as penas ainda são brandas e propiciam a reincidência dos delitos, então que mudemos as normas criminais do país. E sugiro começarmos isso ainda este ano de 2014 quando serão eleitos os novos deputados federais e senadores. Porém, alerto para que não nos tornemos cidadãos hipócritas criando obstáculos à recuperação ética do nosso semelhante. Aliás, como bem ensinava Nietzsche, "nosso crime em relação aos criminosos consiste em tratá-los como patifes". Logo, devemos sempre nos recordar que todas as penalidades aplicadas têm seus limites e que o apenado continua sempre como um ser digno pela sua condição humana.


OBS: Ilustração acima extraída do acervo virtual da Wikipédia, conforme consta em http://it.wikipedia.org/wiki/File:Karwats.jpg

quarta-feira, 9 de abril de 2014

E os nossos aeroportos, hein?!




Nesta manhã, ao invés de vir direto para o computador, parei um pouco para assistir o Bom Dia Brasil, que é o mais longo telejornal da Rede Globo cuja programação vai ao ar por volta das sete e meia e dura cerca de uma hora. Enquanto os apresentadores exibiam as notícias, percebi que algumas delas eram direcionadas aos problemas dos aeroportos brasileiros, focadas principalmente na segurança das pistas de pouso/decolagem e também nos injustificáveis atrasos nas obras de ampliação dos terminais.

Acho lamentável que muitas dessas obras não deverão ser concluídas antes do Mundial em certas capitais sedes dos eventos esportivos, o que podemos considerar fruto da incompetência e da corrupção dos nossos gestores públicos. No caso de Fortaleza, a situação chega a ser vergonhosa com os materiais que seriam utilizados na reforma se deteriorando pela exposição às intempéries do ambiente. É o que consta também nesta notícia do G1, publicada na tarde de 08/04 na internet:

"Os pré-moldados das obras de ampliação do Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza, estão sob as águas das chuvas que caíram recentemente na capital cearense. Com apenas 15,62% do projeto concluído, segundo a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), a obra que deveria ser entregue em março de 2014 é a mais atrasada do país (...) Em janeiro deste ano, o Ministro da Aviação Civil, Moreira Franco visitou as obras e constatou o atraso e pediu agilidade. Mas, de janeiro a abril, os trabalhos avançaram menos de 1%. Em nota, a Infraero esclareceu que a questão relativa ao atraso foi submetida à análise da diretoria jurídica da empresa que deve orientar sobre as providências que deverão ser tomadas. O aeroporto de Fortaleza aguarda a conclusão da instalação de uma estrutura provisória e improvisada avaliada em R$ 3,5 milhões, a montagem começou dia 2 e deve ficar pronta até 30 de abril. Enquanto os trabalhos não são retomados, estruturas, como os corredores sanfonados para embarque e desembarque de passageiros esperam ao relento e, de acordo com funcionários, alguns itens já estão comprometidos pela ferrugem." - o destaque em negrito é meu

No decorrer da edição de hoje do BDB, pude ouvir depois os comentários da Miriam Leitão sobre as baixas expectativas de crescimento da economia brasileira, bem abaixo da média mundial, em que, segundo ela, a causa se explicaria fato do país ter apostado mais no aumento do consumo do que em outras áreas. Então foi aí que comecei a refletir. Pois, além da carência de investimentos em infraestrutura (com obras se atrasando e dinheiro sendo desviado pelos governantes), falta ao nosso país fazer o seu dever de casa. Isto porque pouco se investe também nas áreas tecnológica e educacional, o que considero fundamental para qualquer nação prosperar de verdade caminhando com suas próprias pernas visto que não basta termos somente recursos naturais se não o sabemos utilizar agregando o devido valor à matéria prima.

Vale acrescentar também que, quando falamos em educação, deve-se incluir aí uma formação principiológica das nossas crianças e adolescentes, coisa que a escola em regra não fornece na atualidade. E, quando assistimos a tantos escândalos de corrupção, pergunto que exemplos de vida nossos jovens estão hoje recebendo das gerações mais velhas? Qual o referencial ético dessa garotada que nasceu após a promulgação da Carta Republicana de 1988? Pois tanto em conteúdo, quanto em termos de educação para a vida, a rede de ensino do país tem deixado a desejar.

Mas com esses e outros absurdos vindo à tona no corrente ano, não me conformo em saber por que Dilma e tantos outros governadores que concorrem à reeleição continuam sendo cotados em primeiro lugar nas pesquisas de opinião pública. Será que depois dessa última roubalheira da PETROBRÁS, em que mais de um bilhão foi torrado na compra de uma refinaria falida nos Estados Unidos, o eleitor brasileiro ainda acha que a presidenta é a melhor opção para o Brasil?!

Estão nas nossas mãos o destino do país. Os jogos da Copa vão passar e meses depois estaremos comparecendo obrigatoriamente às urnas afim de escolhermos nossos próximos governantes e legisladores. Cabe então a cada um, na hora de apertar o botão da maquinha, ter em sua memória as lembranças de todos esses fatos, não se esquecendo dos pacientes sofrendo nos hospitais públicos, dos trens e ônibus lotados, bem como de inúmeros outros descasos que todos os dias presenciamos sem que a TV precise mostrar.


OBS: Foto acima extraída da Agência Brasil de Notícias com atribuição de autoria a Marcelo Camargo.

domingo, 6 de abril de 2014

A mensagem do profeta verdadeiro



"Eu é que sei que pensamentos tenho a vosso respeito, diz o SENHOR; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que desejais. Então, me invocareis, passareis a orar a mim, e eu vos ouvirei. Buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração. Serei achado de vós, diz o SENHOR, e farei mudar a vossa sorte." (Jr 29:11-14a; ARA)

O ministério de Jeremias foi muita das vezes marcado por conflitos que ele teve com os falsos profetas, os quais falavam de si mesmos coisas agradáveis aos ouvidos do povo e dos governantes, atribuindo-as a Deus.

Pode-se considerar que a mensagem entregue por Jeremias contrariou fortes interesses por denunciar as injustiças cometidas e também por expor os enganos existentes nos corações das pessoas. Ao invés de dizer à sua geração "vocês vão sair desse problema com facilidade", aquele valoroso profeta de Israel anunciava a iminência de um castigo disciplinar bem amargo, mas que favoreceria a conversão dos que se voltassem para Deus.

Refletindo sobre a carta que Jeremias havia enviado aos exilados de Judá, os quais encontrava-se no cativeiro da Babilônia (vivendo em assentamentos construídos em terras estrangeiras), pude então estabelecer uma ligação com o nosso momento atual. Pois vivemos numa época em que as pessoas de algum modo acabam se vendo presas em angustiosas situações que as condicionam, quer sejam dificuldades financeiras, enfermidades, crises de relacionamento conjugal/familiar, dentre outras necessidades. É quando surgem aqueles pregadores oportunistas na mídia propondo imediatas soluções em nome de Deus. Fazem tudo conforme o gosto do freguês, falando aquilo que seus destinatários gostariam de escutar.

Ora, o Rei do Universo, que criou os céus e a terra, sabe das coisas que de fato precisamos. E, antes de nos encher de bens, Deus quer que tenhamos com Ele um relacionamento cultivado na sinceridade de coração em que a vida oracional de seus filhos torne-se algo autêntico, profundo e frutífero. Nunca uma mera rotina religiosa como costuma ocorrer com o nosso comportamento quando nos acomodamos e deixamos de buscar o Pai Celestial, bem como no tocante à sua vontade e orientação para nossas vidas.

Sem dúvida que o foco do profeta verdadeiro é esse: trazer o coração do povo de volta para o Deus Eterno. Por isso a mensagem profética não exclui as bênçãos, mas irá sempre contextualizá-las afim de que possamos compreender o sabor e o significado do que vem a ser realmente a felicidade. Afinal, não há bem maior do que viver na Presença Santa do Senhor.

Uma ótima semana para todos!


OBS: A ilustração acima trata-se da obra do artista francês Paul Gustave Doré (1832-1883) onde ele retratou as profecias de Jeremias sendo registradas por seu escriba Baruque. Extraí a imagem do acervo virtual da Wikipédia conforme consta em http://he.wikipedia.org/wiki/%D7%A7%D7%95%D7%91%D7%A5:BaruchWritingJeremiah_sProphecies.jpeg

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Afinal, que "gigantes" eram esses da época de Noé?



"Ora, naquele tempo havia gigantes [hebr. nephilim] na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade." (Gênesis 6:4; ARA)

Como quase sempre ocorre, todo diretor de cinema que realiza um trabalho cultural com uma certa margem de liberdade em relação ao texto da Bíblia acaba sendo excessiva e duramente criticado pelas mentes religiosas mais fechadas. E dessa Darren Aronofsky, um dos autores do filme Noé, estrelado por Russell Crowe, também não escapou. Vejam abaixo o que comenta uma resenha publicada no jornal New York Times, atribuída a Anthony Oliver Scott:

"o Sr. Aronofsky, que escreveu o roteiro com Ari Handel, tomou algumas liberdades com o texto. Por exemplo, enquanto a Bíblia observa que 'havia gigantes naqueles dias', as Escrituras não especificam que eles eram colossos de pedra de seis braços com as vozes de Nick Nolte e Frank Langella" (traduzido com a ajuda do Google)

Mas atire a primeira pedra quem nunca fantasiou as narrativas bíblicas!

Quem garante que os exegetas e intérpretes também não deram asas à imaginação e foram transmitindo um valioso ensino de geração em geração? Pois, se bem refletirmos, os nephilim (prefiro usar o original transliterado da Palavra) não teriam sido chamados assim necessariamente por causa de uma suposta estatura física muito grande? Isto porque outros possíveis significados para o vocábulo hebraico em nosso idioma seriam os termos "poderosos", "caídos" ou ainda "aqueles que causam a queda de outros", de maneira que uma interpretação contextualizada faz-se necessária para melhor entendermos o assunto.

Ora, nos capítulos 4 e 5, Gênesis fala sobre os perversos descendentes de Caim e a boa linhagem de Sete, o qual foi o terceiro filho de Adão e Eva, nascido após a morte de Abel. Enquanto os filhos de Caim tornaram-se violentos homicidas e maridos polígamos, os de Sete invocavam o nome do Senhor (Gn 4:26), dando a entender o texto que eles desenvolveram um relacionamento de oração com Deus. Provavelmente repetiram a oferta dada por Abel reconhecendo a si mesmos como dependentes da bondosa graça do Criador e do perdão do Altíssimo.

Todavia, se meditarmos nos quatro primeiros versos de Gênesis 6, poderemos admitir a seguinte interpretação em que os "filhos de Deus", isto é, os da semente de Sete, passaram a tomar para si como esposas aquelas que "entre todas, mais lhes agradavam" (versículo 2). Daí admitir-se a suposição de que a descendência de Sete também teria se corrompido num momento posterior, seja pela quebra da ordem monogâmica estabelecida no Jardim do Éden e/ou originada pelos desvirtuosos casamentos com as mulheres da linhagem de Caim. E assim surgiram os terríveis "gigantes" pré-diluvianos, os quais podem muito bem ter sido os antigos governantes de reinos formados pela mistura das duas sementes.

Segundo o mestre judeu medieval Rashi (1040-1105), a expressão "todas", embora aparentemente supérflua, significa ainda perversão sexual, o que incluiria uniões com mulheres casadas e o matrimônio/cópula realizado contra a vontade da mulher. Porém, numa visão mais aprofundada, podemos entender que a tragédia humana narrada na Bíblia consistiria na sedução pelo comportamento depravado em todos os sentidos (não apenas no aspecto sexual) juntamente com o abandono da fé em Deus, algo que trouxe a destruição da espécie humana a ponto de somente uma família de oito pessoas conseguir se salvar do dilúvio. É o que podemos conferir no livro apócrifo Sabedoria de Salomão, onde o autor associa os gigantes ao orgulho (suponho que caracterizado pelo sentimento de autossuficiência de direcionamento em relação ao Criador):

"Pois quando, nas origens, pereciam os gigantes orgulhosos,
a esperança do mundo se refugiou numa jangada
que, pilotada por Tua mão,
aos séculos futuros deixou o germe de uma geração nova." (Sb 14:6; BJ)

Uma outra obra judaica antiga, também encontrada na versão da Bíblia de Jerusalém, o escritor assim comenta acerca dos nephilim, sendo meus os destaques em negrito:

"É lá que nasceram os gigantes, famosos desde as origens,
descomunais na estatura e adestrados na guerra.
Mas não foi a eles que Deus escolheu,
nem a eles indicou o caminho do conhecimento.
Por isso pereceram, por não terem a prudência;
pereceram por sua irreflexão
" (Baruque 3:26-28)

O que podemos aprender dessa lição bíblica é que todo ser humano seria capaz de tropeçar nos seus princípios éticos e decair a ponto de cometer as piores monstruosidades por mais que se agigante em poderio político-militar, quer tenha ele uma boa origem religiosa ou não. Para os israelitas antigos, Moisés estava de algum modo lhes advertindo que, embora fossem filhos legítimos do patriarca Abraão, poderiam sofrer um juízo de condenação caso andassem nas obras erradas dos cananeus quando viessem a tomar posse da Terra Prometida. E, neste sentido, a mensagem das Escrituras Sagradas permanece atual para a nossa geração e todas as demais que vierem a nos suceder futuramente.

"Qual a mosca morta faz o unguento do perfumador exalar mau cheiro, assim é para a sabedoria e a honra um pouco de estultícia" (Eclesiastes 10:1; ARA)

Para finalizar ressalto que o mal não está necessariamente no outro, mas se trata de uma realidade existente dentro de nós. Pois se os descendentes de Sete teriam mesmo se unido às mulheres perversas da linhagem de Caim, em tal caso não foi porque os chamados "filhos de Deus" teriam estabelecido um elo de identificação com a vida errante delas? Assim sendo, há em nosso interior tanto a boa quanto a má semente, mas cabe ao homem procurar escolher com prudência o caminho correto, jamais se curvando em seus valores éticos superiores visto que o agigantamento de poder não raramente se faz acompanhar pela baixeza de caráter.


OBS: A ilustração acima trata-se de um poster utilizado para a divulgação do filme Noah (Noé).

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Ser correto e verdadeiro é questão de maturidade!



"Por isso deixai a mentira, e falai a verdade cada um com o seu próximo" (Efésios 4:25a)

Ontem (01º/04/2014) foi comemorado o "dia da mentira", o qual, embora longe de virar mais um feriado, sempre trás a tona algum debate e também aquelas velhas pegadinhas entre amigos, muitas das vezes indispensáveis para elevar o humor nos ambientes de convivência.

Embora considere tolerável contar mentiras de brincadeira, desde que sejam obviamente de leve impacto, devemos sempre lembrar que a pior coisa seria alguém viver na mentira. Pois tal comportamento é capaz de bloquear o nosso desenvolvimento espiritual impedindo que enfrentemos (ou entendamos) certos sentimentos capazes de escravizar nossas escolhas. Daí ser possível estabelecer uma ligação forte entre o medo e a inverdade.

Neste domingo passado (30/03), estava eu a conversar com um casal na praia de Muriqui e abordamos o assunto da honestidade por ser vista como "coisa rara hoje em dia" já que muitos enganam seu próximo para se dar bem, conforme o imediatismo em que vivem. Na minha resposta, mesmo defendendo o ideal elevado do comportamento íntegro, busquei ao mesmo tempo ser compreensível com os que ainda se utilizam do recurso da mentira, recordando-me de que eu mesmo, em outras épocas, tinha uma enorme dificuldade de superação nessa área.

Mas qual deve ser a motivação para alguém não mentir e agir corretamente? Seria o medo de um castigo humano ou divino? A vergonha por ser descoberto? Ou uma questão de maturidade pessoal?

Sem dúvidas, elejo a maturidade como a justificável motivação que deve caracterizar as nossas escolhas porque é a busca da justiça e da santidade que nos faz realmente felizes. Pois não faz sentido pra mim obter determinadas conquistas trapaceando prejudicialmente outras pessoas. Mesmo se ficasse bilionário como o Bill Gates, não me faria bem saber que fui dominado pela cobiça e que, devido a isso, causei mais mal a este mundo já tão devastado pelas ações humanas.

Entre os advogados chega a ser conflituoso exercer a profissão sem mentir, mas creio que é possível defender com integridade um cliente acusado da prática de qualquer delito. Como se sabe, não cabe ao causídico entregá-lo e sim agir parcialmente em favor do assistido. Quem tem que fazer prova dos fatos seriam a Polícia e o Ministério Público! Porém, pode-se buscar na apresentação da defesa os caminhos corretos, tipo recursar-se a colocar a cupa em outra pessoa ou jamais criar provas falsas com a finalidade de induzir em erro o julgador. Basta ao profissional agir conforme os recursos disponibilizados pela legislação do país.

Uma ótima quarta-feira a todos!


OBS: A ilustração acima trata-se da obra Pinocchio (1883) do artista Enrico Mazzanti (1852-1910), conforme extraído do acervo virtual da Wikipédia em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Pinocchio.jpg