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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Como parar Kim Jong-un?



Após o míssil disparado pela Coreia do Norte haver passado pelos céus Japão no dia 28/08, o mundo mais uma vez se preocupa sobre como resolver a crise provocada pelo ditador Kim Jong-un.

Creio que, desde a chamada "Crise dos Mísseis", um confronto de 13 dias (16-28 outubro de 1962) entre os Estados Unidos e a extinta URSS relacionado com a implantação de mísseis balísticos soviéticos em Cuba, nunca o mundo esteve tão perto de uma temível guerra nuclear. E agora o perigo encontra-se no Extremo Oriente, com o risco de se tornar algo de alcance global, na hipótese de potências como os EUA, China e Rússia se meterem.

Fato é que a Coréia do Norte não pode ser alvo de uma intervenção militar como os EUA fizeram no Iraque (2003 - 2011), no Afeganistão (2001), na ex-Iugoslávia (década de 90), Somália (1993-95), Panamá (1989-90), Líbia (1986), Granada (1983) e em tantas outras operações que tiveram ou não ocupação territorial. Pois em todos esses episódios, o adversário pôde ser abatido apenas com o uso de armas convencionais onde a tecnologia e o poderia de fogo superiores dos norte-americanos aniquilaram qualquer resistência armada.

Entretanto, no caso da Coréia do Norte, a situação torna-se muito delicada visto que o país de Kim Jong-un não só produziu a letal bomba atômica como vem desenvolvendo mísseis de alcance cada vez maior, capazes de não só destruir a vizinha Coréia do Sul como o Japão. E, se continuar nesse belicismo ameaçador, não demorará muito para que o ditador consiga construir uma arma que tente cruzar o Oceano Pacífico, com o fundado potencial de atingir cidades da Costa Leste dos EUA a exemplo de Los Angeles, situada na Califórnia.

Ocorre que, se Donald Trump mandar atacar o governo de Pyongyang de uma só vez, mesmo que não seja através de bombardeios nucleares como se fez sobre as duas cidades japonesas na 2ª Guerra, ainda assim poderá matar milhões de pessoas e provocar uma resposta que causaria destruições avassaladoras nos países vizinhos, havendo o risco da China declarar uma guerra aos EUA. Isso sem contabilizar a perda dos investimentos econômicos das empresas norte-americanas no Oriente.

Diante de tantos interesses em jogo, creio que é preciso buscar logo um acordo que possa solucionar essa crise trazendo paz ao mundo por mais que custe aos EUA terem que tolerar a ditadura norte-coreana, a qual, na verdade, mais parece um absolutismo monárquico do que uma república socialista. Talvez Trump não seja o líder certo para tais negociações devido à sua arrogância e soberba.

Segundo a porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores, Hua Chunying, é preciso retomar as negociações de paz, tendo afirmado que as "pressões e as sanções" contra o regime de Pyongyang "não podem resolver o problema", apontando ser a única via de saída "através do diálogo e as consultas". a representante da China lembrou que o seu país se opõe aos programas nucleares e balísticos da Coreia do Norte, mas afirmou os Estados Unidos e a Coreia do Sul terem realizado uma e outra vez manobras militares e exercido pressão militar sobre Pyongyang

Creio que ceder às pretensões norte-coreanas possa ser um caminho, mas é preciso haver garantias de que Kim Jong-un, em troca, abandonará o seu belicismo nuclear. Para tanto, o mundo poderia lhe oferecer proveitosas vantagens econômicas progressivamente, mas prevendo no acordo uma cláusula de que a Coréia do Norte permitiria que Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) tenha total liberdade de inspecionar e desarmar o arsenal bélico do país.

Que haja mais bom senso no mundo!


domingo, 27 de agosto de 2017

É preciso valorizar mais os psicólogos!



De uns anos para cá, depois que precisei depender essencialmente de meu trabalho para ganhar o pão de cada dia, tornei-me um firme defensor das profissões, buscando compreender melhor as demandas específicas de cada uma delas. Passei a reconhecer tanto o mérito dos trabalhadores de nível básico quanto os de curso superior, chegando à conclusão que a grande maioria não é valorizada aqui no Brasil.

Neste domingo (27/08), em que é comemorado o Dia do Psicólogo, data em que o então presidente João Goulart sancionou a Lei Federal n.º 4.119/62, nem todos sabem o que faz  esse profissional da área da saúde mental que é o responsável por estudar e orientar o comportamento humano. Alguns até hoje ignoram ou estimam em pouco a Psicologia, em que chegam a considerá-la como "ciência inútil" destinada a "gente fresca", justamente por não atentarem para a necessidade cada vez maior de se conhecer a misteriosa mente humana.

Verdade é que o psicólogo, na atualidade, cumpre um papel que é importantíssimo. Hoje ele pode fazer muito mais do que contribuir para cada paciente aprender a lidar com os próprios sentimentos, traumas e crises. Tanto é que a Psicologia vem sendo aplicada a ambientes de trabalhos, escolas, treinamentos militares, audiências judiciais, práticas esportivas, nos testes vocacionais, no trato das empresas com os seus clientes, no cuidado com os animais, etc. Inclusive, nos litígios, muitos acordos são obtidos graças à atuação dos psicólogos, conseguindo eles conciliar conflitos que se arrastavam por anos entre as partes num processo.

Todavia, o que muito me preocupa hoje em dia é o progressivo aumento das doenças psicológicas. Na postagem Tentando compreender a felicidade, publicada aqui dia 25/08, comentei, com base em dados da OMS, que a depressão já atinge 4,4% da população global e 5,8% dos brasileiros. Porém, há outros distúrbios que devem ser considerados também como a ansiedade, a anorexia, o TOC e o transtorno bipolar.

Sinceramente, acredito que todo mundo tem um pouco desses problemas ainda que não se situem dentro de uma condição doentia. Até quem não sofre de anorexia, muitas das vezes se torna um compulsivo por comida e daí temos hoje um surto de obesidade de modo que as clínicas de emagrecimento costumam ter tanto um nutricionista quanto um psicólogo.

Ora, se melhor refletirmos, quantos problemas incapacitantes e que afetam a saúde da coletividade não poderiam ser prevenidos com o apoio da Psicologia?!

Pois bem. Embora hoje as indústrias de medicamentos estejam lucrando horrores com o fato de muita gente andar "surtando", fato é que os governos, instituições, empresas e fundos previdenciários sofrem graves prejuízos financeiros com os trabalhadores dentro de uma faixa etária considerada ativa mas que deixam o mercado de mão-de-obra. Repentinamente, quando milhões profissionais encontram-se no auge da carreira, eles adoecem precisando se afastar de suas atividades laborais e muitos até se aposentam cedo por invalidez.

Minha conclusão é que, juntamente com a valorização dos psicólogos (os salários pagos em várias prefeituras chegam a ser pouco acima do mínimo), os governos precisam de políticas públicas verdadeiramente amplas e presentes. Há que se investir muito mais na área da saúde mental, oferecendo acessivelmente terapias até para quem não se acha numa situação clínica ter a oportunidade de avaliar a si mesmo, corrigindo rotas doentias em seus comportamentos habituais.

Portanto, quero aproveitar este momento para não somente homenagear os nossos psicólogos e também esclarecer a sociedade sobre a importância dos serviços por eles prestados, os quais são da mais alta relevância diante dos desafios a serem enfrentados neste século XXI.

Ótima semana a todos!

sábado, 26 de agosto de 2017

Pé na estrada novamente



Neste último sábado de agosto, tirei o dia para caminhar explorando novos destinos aqui na região. Desta vez, encarei os 21 quilômetros da Estrada da Represa de São João Marcos que liga a localidade de São Roque, situada na rodovia RJ-149, até Passa Três, um outro Distrito de Rio Claro. Foi uma travessia inédita para mim, apesar de não ter sido em trilhas na floresta.

Há tempos eu intencionava fazer esse percurso, o qual já havia visualizado no Google e obtido umas poucas informações disponíveis na internet acerca do roteiro. Porém, para que eu pudesse fazer essa caminhada, era preciso acordar bem cedo, tomar o primeiro ônibus que passa por Muriqui rumo ao Centro de Mangaratiba cerca de seis e meia da manhã, chegar a tempo para embarcar no coletivo local que parte às sete horas para a Serra do Piloto e então prosseguir numa terceira condução que conecta a divisa dos municípios com a cidade de Rio Claro. Isto porque os horários pra lá são bem escassos (caso perdesse este ônibus só teria outro por volta do meio dia).

Assim, apesar de quase haver perdido o segundo ônibus (o que vai do Centro de Mangaratiba para a Serra do Piloto, na divisa com Rio Claro), consegui chegar a São Roque mais ou menos às nove da manhã. Desembarquei e pus logo os meus pés naquela estrada de chão, a qual hoje em dia é uma via bem desconhecida pelos turistas.


Entretanto, não demorou muito para que um casal morador da região oferecesse uma carona, o que me poupou de caminhar seis quilômetros, significando uma hora a menos. Não recusei e fomos conversando sobre o local e a respeito da Represa Ribeirão das Lages que seria o meu primeiro ponto de observação. Gentilmente, eles pararam o carro para que eu pudesse fazer umas fotos do lugar.





Fiquei perplexo em saber que, em décadas passadas, aquela represa ficava lotada de banhistas durante o verão, principalmente na virada de Ano Novo e no Carnaval. Pessoas vinham do Rio de Janeiro e de outros lugares para acamparem, tomarem banho no rio e até venderem uns produtos. Só que, com o tempo, acredito que por causa do surgimento de novos roteiros ecológicos e da falta de políticas públicas voltadas para o turismo em Rio Claro, acabou ocorrendo um certo desinteresse do público.

Contudo, há algumas ruínas de São João Marcos nas proximidades da represa, anteriores à inundação, e que não estão dentro do Parque Arqueológico e Ambiental da antiga cidade. E esses detalhes o casal me explicou falando sobre a paisagem, sendo que, dali, fui direto com eles tomar um café na fazenda.

Resolvi não demorar muito e outra vez botei os pés na estrada porque ainda teria que encarar uns 15 quilômetros pela frente e um percurso inicial de subida. Bebi bastante água da nascente que há na propriedade porque não encontraria nenhuma fonte no caminho. Então, dentro de uma hora andando, eu já estava no alto da serra a contemplar a paisagem que havia ficado para trás.

No meio dessa estrada, dá muito bem para ver no outro lado as serras que fazem a divisa entre Macundu e Lídice, ambos localidades de Rio Claro que já conhecia de outras caminhadas passadas. Só que desta vez, eu estava caminhando em direção oposta, mais para o sentido de Piraí.




A descida até Passa Três foi bem tranquila, apesar do sol que estava mais quente e queimando o meu rosto. Passei pela entrada de muitos sítios e fazendas, sendo que as pastagens de gado nos morros predominam a paisagem. Também observei a falta da mata ciliar nos rios e córregos da região, inclusive na área da represa. Aliás, esta estrada já se situa um pouco distante do Parque Estadual do Cunhambebe.




Em minhas reflexões, pensei na possibilidade dos governos ampliarem os espaços ambientalmente protegidos em Rio Claro, considerando a baixa densidade populacional desse Município. Claro que para isso precisa haver um debate democrático com a população, políticas de incentivo à preservação e recursos públicos que se destinem às ações de preservação. Porém, mesmo o lugar não sendo ainda o meu ideal naturalista, procurei apreciar cada pedacinho daquela paisagem transformada pelo homem, chamando-me a atenção as flores plantadas na estrada, em frente à entrada de uma fazenda.


Minha chegada a Passa Três se deu um pouco depois do meio dia. Procurei logo por um restaurante onde almocei uma costela bovina com arroz, feijão, fritas e salada. Informei-me sobre o próximo horário do ônibus que partiria dali rumo ao município de Piraí de modo que tive só alguns minutos para fotografar o pequeno povoado, devido à necessidade de pegar quatro conduções até voltar pra casa.






A distância de Passa Três até Piraí é menor do que até o Centro de Rio Claro. A viagem se faz numa rodovia asfaltada percorrendo, salvo engano, apenas uns 11 quilômetros. Por isso, não demorei a chegar no próximo destino. Ao desembarcar, teria mais de uma hora para dar uma volta pela cidade até a partida do ônibus seguinte para Seropédica.

Sinceramente, o Centro de Piraí me agradou bastante. Achei a cidade aconchegante, com um clima agradável, sossegada, com uma praça arborizada, alguns prédios antigos preservados e um comércio satisfatório. Ao que me pareceu , tudo ali fica perto a exemplo dos bancos, dos restaurantes, das lojas, da Prefeitura, do Fórum, da Igreja, da unidade de ensino profissionalizante da FAETEC, do hospital e da Casa de Cultura (inexplicavelmente fechada num final de semana).











Por acaso, pessoas do local mostraram-me qual seria a residência do governador Luiz Fernando Pezão, o qual havia sido prefeito da cidade. Trata-se de um pequeno castelinho e, em frente, fica permanentemente uma viatura da Polícia a fim de proteger o imóvel. Não perdi a chance de fotografar mesmo não sendo algo relevante.


Assim, passei o restante da tarde de sábado viajando até regressar para o lar. Só que o meu retorno foi por um caminho diferente do que utilizado na ida, pegando a Dutra e descendo pela Serra das Araras ao invés de ir pela RJ-149. Antes de chegar em Seropédica, peguei um ônibus no seu ponto final rumo a Itaguaí, continuando depois numa quarta condução (a sétima do dia) até Muriqui.

Mesmo tendo caminhado em outras vezes mais do que o dobro dos quinze quilômetros, senti um certo cansaço já que estou um pouco fora de forma e com uns dez quilos a mais que em meados de 2016. Porém, valeu a pena para fazer uma higiene mental, esquecendo um pouco dos meus compromissos profissionais e me reanimando para uma nova semana de batalhas.

Ótimo domingo a todos e aproveitem!

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Tentando compreender a felicidade




Na manhã desta sexta (25/08), eu estava lendo um pouco do livro bíblico de Provérbios com minha esposa e achei bem interessante este versículo que assim diz, segundo a tradução para o português de João Ferreira de Almeida:

"Até no riso tem dor o coração,
e o fim da alegria é tristeza." 
(Pv 14:13; ARA)

Em que pese este dito de sabedoria ter saído um pouco do padrão que norteia os aforismos predominantes dos capítulos de 10 a 15 de Provérbios, os quais consistem basicamente em conceitos opostos entre o "justo" e o "ímpio" ou do "sábio" versus o "insensato", considerei uma reflexão bem reveladora feita pelos antigos. E, por coincidência, o escritor sagrado falou de algo muito comentado nos debates atuais acerca do que vem a ser a felicidade.

Nesses tempos em que a depressão assola a vida de um número bem significativo de pessoas, sendo já 322 milhões de deprimidos no mundo, segundo dados da OMS referentes a 2015 (4,4% da população global e 5,8% dos brasileiros), pode-se afirmar que o estado de felicidade está se tornando algo cada vez mais raro. Pacientes gastam fortunas em tratamentos diversos a fim de saírem de crises que os tornam incapacitados para a vida laboral, para a convivência familiar-social e até mesmo os deixam próximos de um suicídio.

Por outro lado, sem me arrogar em dar uma especialista em saúde mental, tenho a impressão de que muita gente acaba desenvolvendo uma ideia fantasiosa da felicidade, supondo que poderão gozar de um estado eterno de alegria ou querendo abolir qualquer sentimento de tristeza das suas emoções. Porém, lendo uma nota teológica presente na Bíblia de Estudo de Genebra, de orientação calvinista, notei um comentário super pertinente sobre o versículo em questão:

"A alegria externa e uma tristeza oculta podem coexistir, mas a tristeza pode ser a realidade a ser enfrentada no fim" (1999, pág. 745)

Refletindo um pouco mais sobre o assunto, pondero que, sem a tristeza, jamais notaríamos a alegria porque simplesmente não a perceberíamos pela ausência de um estado oposto. Ou, usando de outras palavras, seria nos momentos tristes que tomamos a consciência do que significa estar alegre.

Com isso, penso que a tal coexistência com a tristeza faz com que valorizemos mais a alegria e a encontremos até nas pequenas coisas. E, pelo que vejo por aí, as pessoas sofridas são as que geralmente consideram precisar de muito pouco para se sentirem felizes.

Para terminar, reflito que o fato de nossos momentos alegres terem limites nesta vida, sendo obviamente sucedidos pela tristeza (ainda que esta também não venha a ser algo eterno), leva-nos a pensar que devemos curtir o momento feliz aqui e agora da maneira mais intensa que pudermos, mesmo sabendo ser impossível eliminarmos toda a dor existente no nosso coração. E aí cito uma frase atribuída ao Dalai Lama que, certamente, tem a ver de maneira geral com o tema aqui em debate:

"Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver."

Ótimo final de semana a todos e sejamos felizes!


quinta-feira, 24 de agosto de 2017

O direito de acesso dos consumidores cadeirantes no transporte público rodoviário



Aqui em Mangaratiba, após a saída das empresas de ônibus Expresso Mangaratiba e Viação Costeira do transporte intermunicipal de passageiros, as quais foram substituídas pela Expresso Recreio, muita gente comemorou a mudança tendo em vista que passamos a usufruir de veículos mais novos, confortáveis e com uma frequência muito menor de defeitos. Porém, um grupo minoritário de consumidores, que são os usuários cadeirantes (e seus familiares), tem se queixado da falta de acessibilidade ao serviço prestado à população, a exemplo da reclamação de uma mãe que foi divulgada pela edição de 03/07 do blogue Notícias de Itacuruçá:

"Revoltante e ter que passar por isso toda as vezes que preciso sair de Mangaratiba para outra cidade. Cheguei aqui em Mangaratiba, ponto final, com o meu filho que é cadeirante e fui informada que não tem ônibus de duas portas para ele viajar. E agora o que fazer? Será que Mangaratiba não tem pessoas com necessidades especiais ou o meu filho é uma raridade? Agora eu pergunto, para que serve esse ônibus da Expresso Recreio que atua em Mangaratiba? E para completar acabei de saber que a Costeira em breve vai deixar de circular no município. Depois que isso acontecer, ai mesmo que eu estou ferrada. Aí mas uma pergunta ,cadê os meus direitos de ir e vir? Me sentindo de saco cheio no ponto final de Mangaratiba!" (clique AQUI para ler a postagem em sua origem)

Acontece que, de acordo com o artigo 5º da Lei Federal n.º 10.048, de 08 e novembro de 2000, os veículos de transporte coletivo produzidos após doze meses da publicação da referida norma, deveriam ter sido planejados de forma a facilitar o acesso a seu interior das pessoas portadoras de deficiência, sendo que, segundo o parágrafo 2º do dispositivo em questão, os proprietários dos ônibus em utilização tiveram o prazo vencido de cento e oitenta dias, a contar da regulamentação, "para proceder às adaptações necessárias ao acesso facilitado das pessoas portadoras de deficiência". E, por sua vez, pelas determinações contidas no artigo 16 da Lei Federal n.º 10.098, de 19 de dezembro de 2000, os veículos de transporte coletivo passaram a ser obrigados a cumprir "os requisitos de acessibilidade estabelecidos nas normas técnicas específicas".

Com o Decreto Federal n.º 5.296, de 02 de dezembro de 2004, o qual veio regulamentar ambas as leis, foram estabelecidas as seguintes disposições quanto ao transporte coletivo rodoviário:

"Art. 38.  No prazo de até vinte e quatro meses a contar da data de edição das normas técnicas referidas no § 1o, todos os modelos e marcas de veículos de transporte coletivo rodoviário para utilização no País serão fabricados acessíveis e estarão disponíveis para integrar a frota operante, de forma a garantir o seu uso por pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

§ 1o  As normas técnicas para fabricação dos veículos e dos equipamentos de transporte coletivo rodoviário, de forma a torná-los acessíveis, serão elaboradas pelas instituições e entidades que compõem o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, e estarão disponíveis no prazo de até doze meses a contar da data da publicação deste Decreto.

§ 2o  A substituição da frota operante atual por veículos acessíveis, a ser feita pelas empresas concessionárias e permissionárias de transporte coletivo rodoviário, dar-se-á de forma gradativa, conforme o prazo previsto nos contratos de concessão e permissão deste serviço.

§ 3o  A frota de veículos de transporte coletivo rodoviário e a infra-estrutura dos serviços deste transporte deverão estar totalmente acessíveis no prazo máximo de cento e vinte meses a contar da data de publicação deste Decreto.

§ 4o  Os serviços de transporte coletivo rodoviário urbano devem priorizar o embarque e desembarque dos usuários em nível em, pelo menos, um dos acessos do veículo.

Art. 39.  No prazo de até vinte e quatro meses a contar da data de implementação dos programas de avaliação de conformidade descritos no § 3o, as empresas concessionárias e permissionárias dos serviços de transporte coletivo rodoviário deverão garantir a acessibilidade da frota de veículos em circulação, inclusive de seus equipamentos.

§ 1o  As normas técnicas para adaptação dos veículos e dos equipamentos de transporte coletivo rodoviário em circulação, de forma a torná-los acessíveis, serão elaboradas pelas instituições e entidades que compõem o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, e estarão disponíveis no prazo de até doze meses a contar da data da publicação deste Decreto.

§ 2o  Caberá ao Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO, quando da elaboração das normas técnicas para a adaptação dos veículos, especificar dentre esses veículos que estão em operação quais serão adaptados, em função das restrições previstas no art. 98 da Lei no 9.503, de 1997.

§ 3o  As adaptações dos veículos em operação nos serviços de transporte coletivo rodoviário, bem como os procedimentos e equipamentos a serem utilizados nestas adaptações, estarão sujeitas a programas de avaliação de conformidade desenvolvidos e implementados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO, a partir de orientações normativas elaboradas no âmbito da ABNT."

Apesar das leis em comento terem quase dezessete anos e o regulamento praticamente treze, eis que as concessionárias do transporte coletivo continuaram adquirindo ônibus sem adaptação para usuários cadeirantes! Até hoje as frotas das empresas não estão totalmente acessíveis sendo uma verdadeira afronta o descumprimento da legislação aplicável que foi até muito tolerante com os prazos de adaptação.

Assim sendo, tendo em vista que a Expresso Recreio em Mangaratiba, tal como muitas outras empresas que operam no Estado do Rio de Janeiro, encontra-se em mora quanto às exigências legais, resta ao usuário do transporte intermunicipal requerer ao Ministério Público a adoção de providências através de suas Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva. E, no plano individual, considero possível a propositura de ações judiciais protegendo os interesses do consumidor com necessidades especiais, inclusive formulando pedidos de indenização pelos danos morais sofridos em decorrência da violação.

Além do mais, nada impede que as associações de moradores, de defesa dos direitos dos deficientes físicos, de defesa do consumidor, bem como os Procons, as câmaras municipais e as assembleias legislativas tomem as medidas cabíveis nas esferas jurídica e política. Por isso, a expedição de ofícios, a realização de reuniões transparentes com os empresários do transporte, a convocação de audiências públicas e a abertura de uma CPI numa casa legislativa também são possibilidades de atuação capazes de produzir um acordo com força executiva.

Tendo em vista que já estamos quase em 2020, creio que chegou a hora de haver uma política inclusiva firme de acessibilidade em todo o país que obrigue os empresários de ônibus ao cumprimento inegociável das leis. Já não podemos mais protelar isso pois se trata de uma flagrante injustiça sendo a qualidade dos serviços de transporte rodoviário incompatível com o nível de desenvolvimento já alcançado pelo Brasil.

Lutemos pela causa com determinação! 


OBS: Imagem acima extraída de http://smtu.manaus.am.gov.br/a-smtu-e-proamde-realizam-acao/

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

A responsabilidade por quedas de árvores sobre residências e veículos




Como se sabe, incumbe às prefeituras, que são os órgãos administrativos dos municípios, o cuidado com a conservação e a segurança das vias públicas, bem como do patrimônio urbanístico. Porém, não raramente, nos dias de chuvas fortes e de vendavais, ocorrem quedas de árvores ou mesmo de galhos pesados sobre residências, veículos estacionados e até sobre mesmo pessoas. Por isso, a realização de podas regulares torna-se um dever da Administração Pública Municipal ou do contrário o gestor público estará cometendo uma omissão.

Certamente que, no caso de uma queda de árvore que provoque danos aos patrimônio e à vida de alguém, não ficando demonstrada a exclusividade da ocorrência de caso fortuito ou força maior a fim de ilidir a responsabilidade da Administração Municipal, deve o ente público responder pelo prejuízo. Ainda mais quando estiver comprovado que houve uma solicitação de poda e a Prefeitura não a efetuou.

Por sua vez, estando a árvore situada num terreno privado, cabe, a princípio, ao proprietário o dever de indenizar por eventuais danos causados a terceiros. E, igualmente, o mesmo ocorre num condomínio em relação ao síndico, muito embora a reparação dos prejuízos acabe sendo suportada pelos demais condôminos.

Mas se a árvore com risco de queda estiver dentro do imóvel de um particular e este não puder cortá-la sem autorização do órgão ambiental? Como proceder? Poderá a Prefeitura ser responsabilizada?

Neste caso, a poda e/ou supressão de uma árvore protegida, ainda que dentro dos limites da propriedade privada, precisa ser permitida pelo Poder Público que, por óbvio, tem o dever de ser diligente em relação ao pedido feito pelo morador e/ou dono do terreno. E aí, se a árvore do seu vizinho apresentar risco de cair sobre a sua residência, você não somente pode notificá-lo como também reclamar direto com a Prefeitura, a qual tem o poder de fiscalizar e de decidir sobre a conveniência do corte.

Para melhor se resguardar, é fundamental que o cidadão produza provas de seu contato com a Prefeitura. Ao utilizar-se de qualquer canal de comunicação, quer seja um requerimento formal apresentado no setor de protocolo ou uma mensagem eletrônica enviada para a Ouvidoria, é fundamental conservar uma segunda via da mensagem. E, se o site não reproduziu o inteiro teor da solicitação e nem enviou para o seu e-mail uma resposta mesmo que automática, tire uma foto do número de protocolo, através do qual será possível requerer uma cópia depois.

Quanto aos contatos com o particular, o ideal é que você notifique o seu vizinho pela via postal, se o bom senso não surtir efeito. Ou seja, se ele se mantém inerte ou se recusa expressamente a podar a árvore, a solução é enviar uma carta registrada com AR, podendo também ser postado um telegrama com os serviços adicionais de cópia e de confirmação de recebimento. Algo que, aliás, chega a ser muito mais prático porque você pode contratar este serviço dos Correios sem sair de casa através do pagamento com cartão de crédito.

Dependendo da situação, você pode precisar de uma perícia técnica para provar que a árvore apresenta real risco de queda com o potencial de danificar o seu patrimônio. Para tanto, torna-se recomendável envolver a Prefeitura, a qual terá o dever de enviar um agente público para vistoriar o lugar e emitir um laudo. Porém, caso vá demandar na Justiça, não há necessidade de apresentar no processo um documento oficial atestando o risco, bastando ser assinado por um profissional habilitado.

A importância de se obter um laudo técnico é que esta prova possibilita a propositura de uma ação no Juizado Especial Cível e também o deferimento de uma tutela de urgência, a qual se trata de uma decisão proferida no processo antes do julgamento da lide. E, diante de um grave risco de dano irreparável, ou de difícil reparação, há que se agir com rapidez porque a nossa Justiça é bem morosa. Pois, afinal, ninguém quer sofrer um prejuízo econômico, ou pagar com a vida de seus entes queridos, para depois correr atrás de indenização.

Recordo que, tão logo recebi minha carteira da OAB, no ano de 2005, um dos primeiros casos que peguei foi sobre o risco de queda de um eucalipto de mais de trinta metros de altura numa área rural de Nova Friburgo chamada de Stucky. Meu cliente portava um laudo emitido pela Prefeitura de lá e não foi difícil que o magistrado do Juizado Especial Cível deferisse a antecipação da tutela jurisdicional, após o oficial não haver encontrado o réu na residência. E, assim, foi colocado um ponto final num desentendimento entre vizinhos que durava há anos de modo que, em questão de dias, o problema foi resolvido, muito embora ambas as partes tivessem permanecido descontentes e brigando entre si.

De lá para cá, nunca mais defendi casos assim, porém continuo orientando as pessoas a resolverem os seus problemas com compreensão, bom senso, maturidade, sem picuinhas pessoais e, acima de tudo, buscando se colocar no lugar do outro. Afinal, por mais que amemos a natureza ou uma árvore tenha para nós um valor sentimental, há valores mais importantes como a vida, a segurança e o bem estar dos outros seres humanos, o que nos leva a abrir mão de certas pretensões.

Quanto às prefeituras, aconselho o cidadão a não dar bobeira porque muitos são os gestores omissos ou que demoram a tomar decisões. Então, se a Administração Municipal não adota as medidas cabíveis, registre logo sua reclamação e insista através de todos os meios até conseguir uma solução satisfatória.


sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Minhas companheiras de inverno



Para não escrever todos os dias sobre política, hoje vou compartilhar um pouco os meus hábitos pessoais. Quero, nesta mensagem, falar de uma aquisição que fiz há vários anos atrás quando morava ainda na cidade serrana de Nova Friburgo, situada no centro-norte do estado do Rio de Janeiro. Um lugar onde vivi por mais de uma década e que me inspirou um modo de vida, digamos, mais estiloso.

Na postagem Um inverno relativamente brando, porém gostoso..., de 22/07/2010,  ao descrever um pouco do inverno daquela região relativamente fria (Friburgo seria uma geladeira para quem vive no litoral), não pude deixar de comentar sobre como comprei as pantufas que tenho até hoje, apesar de estarem agora mais velhinhas:

"(...) Por este motivo, desde o começo do outono, foi que encomendei não apenas o poncho boliviano como também uma pantufa de pele de ovelha que calço mais à noite quando assisto TV com minha esposa na sala. E, falando novamente na pantufa, como foi difícil encontrar um número que coubesse no meu pé, visto que calço 45. Rodei muitas lojas na cidade e não encontrei nenhum lugar que vendesse este tipo de calçado no meu número incomum. Então, procurei na internet. Entrei em sites estrangeiros e fiquei com medo de solicitar um produto baseado numa medida de calçado diferente da nossa, o que, provavelmente, poderia me causar perda de tempo e de dinheiro se precisasse trocar depois a mercadoria. Aí, graças ao Google, achei uma loja situada na cidade mineira de Monte Verde que leva o nome da cidade (Alpina Monte Verde) e comercializa pantufas feitas com pele de ovelha que envolvem todo o pé. Adquiri então um modelo bem flexível que se amolda aos pés da numeração 45 até 48 e que tem ajudado a me aquecer quase todas as noites."

Confesso que, vivendo desde 2012 no litoral sul fluminense, onde são poucos os dias frios, hoje raramente tenho a necessidade de colocar as pantufas em meus pés, motivo pelo qual elas devem estar durando esse tempo todo assim como minhas calças de moletom e outros agasalhos mais. Aliás, guardo coisas que estão comigo desde o início do atual século XXI e não descarto ter algo até do anterior.

E, por lembrar das roupas de frio, eis que, no semestre passado, minha mulher comprou para mim num brechó um casacão super quente que até agora só vesti por duas vezes. Ontem, porém, fui com ele ao aniversário do meu amigo Renato Bondim, comemorado à noite na quadra de esportes do Iate Clube Muriqui, situado uns três quarteirões daqui de casa. Estava chovendo e fazendo um pouco de frio de modo que eu e Núbia saímos bem agasalhados. Vesti o casaco que havia ganhado de presente enquanto ela enrolou o seu cachecol colorido no pescoço. E a indumentária caiu bem para um ambiente que, embora seja coberto, não é totalmente fechado, o que permitia a entrada ocasional de ventos.


Hoje amanheceu com chuva, embora não esteja lá muito frio. Porém, para me sentir confortável, estou neste momento dentro de casa com um casaco (mais fino que o de ontem), com a calça de moletom azul da primeira foto e, como não poderia deixar de ser, com as velhas pantufas nos pés. Ao acordar, tomei um café com leite quentinho na minha caneca do Flamengo, o que, certamente, cai muito bem nestes dias.

Sabendo que, no mês que vem, acabará o nosso inverno e que temos no litoral do Rio de Janeiro apenas alguns dias razoavelmente frios, é preciso saber aproveitar um momento raro desses. Afinal, não demorará muito e começará a esquentar de modo que, no verão, quando nossos corpos não suportam nenhum tecido sobre a pele, ainda que debaixo de um ventilador de teto ligado no nível mais forte, sentiremos muitas saudades das temperaturas amenas que fazem entre maio e setembro. Então, quando chegar janeiro, nem conseguirei nem lembrar das pantufas a fim de não derreter a minha psiquê.

Tenham todos um ótimo final de semana e aproveitem cada instante dessa gostosa época!

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Uma reforma política vergonhosa




Nesta terça-feita (15/08), a Comissão especial da Câmara que analisou nos últimos meses uma proposta de reforma política concluiu a votação do relatório que estabelece o chamado "distritão" já para as eleições de 2018, bem como cria um fundo a fim de custear as campanhas com dinheiro público.

Para quem não sabe o que vem a ser esse "distritão", trata-se de uma regra excepcional adotada pelos parlamentares para a escolha dos deputados e vereadores nas duas próximas eleições (2018 e 2020). Neste sistema, cada estado ou município viraria um grande distrito eleitoral em que seriam eleitos os candidatos mais votados, mas sem que sejam considerados os votos para o partido ou a coligação.

Atualmente, o sistema eleitoral adotado para a escolha dos deputados e vereadores é o da proporcionalidade com lista aberta. Ou seja, o eleitor vota nos candidatos ou nos partidos, estes podem se juntar em coligações, sendo que é calculado o quociente eleitoral, o qual leva em conta os votos válidos no candidato e no partido. E, deste modo, são eleitos os mais votados das coligações ou partidos. 

Entretanto, com as regras propostas, caso sejam aprovadas, o que teremos em 2018 será uma eleição majoritária para a Câmara Federal, tal como já acontece na escolha de presidente da República, governador, prefeito e senador.  E aí, só serão eleitos os candidatos mais votados e acabará ocorrendo o nefasto favorecimento das campanhas individuais nas quais candidatos com mais recursos podem ser beneficiados, dificultando a tão desejada renovação do Congresso Nacional.

Fato é que os atuais deputados, muitos deles investigados/réus nas ações da Lava Jato, sabem que terão dificuldades de reeleição no sistema vigente da proporcionalidade. Assim, para que consigam se manter no poder e continuarem usando o cargo como um habeas corpus, devido ao foro privilegiado, os caras estão já tratando de mudar as regras a fim de favorecerem os candidatos mais conhecidos, sejam as celebridades (jogadores de futebol, artistas e pessoas famosas) ou os parlamentares atuais que tentam a reeleição.

A fim de que as mudanças passarem a valer já nas eleições de 2018, elas precisam ser aprovadas nas duas Casas até 7 de outubro do corrente ano. Só que para isso, os nossos excelentíssimos deputadores e senadores sabem priorizar o que melhor lhes interessa. Mesmo que para tanto enfraqueçam as agremiações partidárias e descredibilizem ainda mais as instituições republicanas tão abaladas com os escândalos sobre corrupção.

Que o povo tome conhecimento do que anda acontecendo em Brasília e se mobilize para barrar essa vergonhosa reforma!

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Qual o direito dos servidores estatutários ao vale transporte?




Apesar de muitos sindicatos de servidores públicos estatutários posicionarem-se para que as normas favoráveis da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), mais precisamente a Lei Federal n.º 7.418/1985, sobre o vale transporte, sejam analogicamente aplicadas aos servidores estatutários, uma vez que são trabalhadores iguais aos demais, tal não é o entendimento do Judiciário brasileiro. Aqui no Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, o Tribunal de Justiça já decidiu de maneira contrária como se observa na jurisprudência a seguir transcrita, sendo meus os destaques:

"APELAÇÃO CÍVEL. FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO ORDINÁRIA, OBJETIVANDO A CONCESSÃO DE VALE TRANSPORTE, MOVIDA POR GUARDA DO MUNICÍPIO DE MACAÉ, QUE INGRESSOU NA ATUAL AUTARQUIA EM 2004 NA CONDIÇÃO DE EMPREGADO CELETISTA. EDIÇÃO DE LEI MUNICIPAL QUE CONVERTEU O REGIME JURÍDICO PARA ESTATUTÁRIO. NÃO HÁ QUALQUER DIREITO ADQUIRIDO QUE NÃO GUARDE RELAÇÃO COM O NOVO REGIME JURÍDICO PELO QUAL LIVREMENTE OPTOU O DEMANDANTE, ATÉ PORQUE, COMO SE SABE, O REGIME ESTATUTÁRIO ESTÁ FINCADO NO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. SOMENTE A LEI Nº 3.478 DE 2010 PASSOU A PREVER O AUXÍLIO TRANSPORTE AOS SERVIDORES DO MUNICÍPIO RÉU E DESDE QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS NELA PROPOSTOS, O QUE ORA NÃO SE VERIFICA. DESPROVIMENTO DO RECURSO." (Apelação Cível n.º 0001432-14.2013.8.19.0028 - 1ª Ementa - Rel. Des(a). JACQUELINE LIMA MONTENEGRO - Julgamento: 13/08/2015 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL)

Fato é que vários municípios carecem de normas jurídicas locais que assegurem ao servidor o direito ao vale transporte cobrindo todas as despesas de deslocamento no trajeto residência-trabalho e vice-versa, através do sistema de transporte coletivo público, mesmo para quem more em outros municípios. Cá em Mangaratiba, lugar onde moro, o funcionário não conta com nenhuma lei municipal tratando do assunto ainda que o parágrafo único do artigo 163 da nossa Lei Orgânica Municipal (LOM) faça menção menção à manutenção do "direito ao recebimento de Vale transporte" quando se refere à gratuidade no transporte público Guardas Municipais, os Agentes de Trânsito e os Agentes da Defesa Civil.

Com isso, o que temos até hoje em meu Município sobre o vale transporte são apenas alguns decretos. O último então limitou o benefício apenas dentro dos limites de Mangaratiba, através do sistema de transporte coletivo público. E, embora isso não signifique que os servidores vindos de outras cidades tenham ficado sem receber créditos em seus cartões da RioCard, até mesmo porque um entendimento assim violaria o princípio da isonomia que deve existir entre todos os agentes públicos, eis que os trabalhadores vindos de outros lugares acabam tendo que complementar as passagens tirando do próprio bolso. Isto porque quem mora fora da órbita municipal simplesmente acaba recebendo o equivalente ao valor pago aos funcionários residentes no território de Mangaratiba.

Ora, se refletirmos sobre os baixos salários pagos em muitos municípios, seria mais do que justo as prefeituras arcarem com o deslocamento do servidor, desde que através do sistema de transporte coletivo público, quer seja urbano ou intermunicipal e/ou interestadual, excluídos. obviamente, os serviços seletivos e os especiais. Ou seja, acompanhando a CLT, o benefício só não cobriria a viagem feita no ônibus do tipo rodoviário.

De qualquer modo, considerando que nem todas as soluções podem ser obtidas pela via judicial, cabe ao servidor lutar politicamente através de suas reivindicações junto aos Poderes Executivo e Legislativo a fim de que sejam criadas leis justas em seu benefício. Inclusive pressionando os prefeitos e também os vereadores, pensando até numa previsão na Lei Orgânica Municipal para ser expressamente reconhecido o direito ao vale transporte, de acordo com o previsto na Lei Federal n.º 7.418, de 16 de dezembro de 1985. E, para tanto, eis que o fortalecimento das entidades sindicais se faz necessário através do ingresso de novos associados e da participação dos integrantes das categorias do funcionalismo nas manifestações de rua.


OBS: Imagem acima extraída de http://www.maceio.al.gov.br/2015/01/prefeitura-libera-creditos-de-vale-transporte-nesta-segunda/

domingo, 13 de agosto de 2017

Depois de lançadas as sementes da intolerância...




Após o lamentável confronto de sábado (12/08), na cidade universitária de Charlottesville, no Estado americano de Virgínia, onde militantes de extrema-direita protestavam contra negros, imigrantes, gays e judeus, causando a morte e o ferimento de pessoas, Donald Trump usou a sua conta oficial no Twitter para manifestar-se sobre o ocorrido. Em curtas palavras, assim disse o presidente dos EUA: 

"Nós todos devemos estar unidos e condenar tudo o que representa o ódio. Não há lugar para esse tipo de violência na América. Vamos continuar unidos" 

Apesar deste posicionamento emitido, Trump foi duramente criticado por não haver nomeado esses grupos especificamente após os confrontos. E, nesta data, a Casa Branca declarou que o presidente, ao condenar todas as formas de "violência, intolerância e ódio", teria incluído "supremacistas brancos, Ku Klux Klan, neonazistas e todos os grupos extremistas". 

Refletindo sobre o que aconteceu ontem nos EUA, chego à conclusão de que Trump hoje está colhendo aquilo que plantou durante a sua campanha política em 2016. Isto porque o seu discurso xenófobo e de construção de muros (ao invés de pontes) só tem contribuído para a radicalização de grupos extremistas da sociedade de seu país. E a expectativa criada no inconsciente das pessoas quanto à formação de um mundo ilusório, como se os partidários de Trump pudessem voltar a viver na América desigual de tempos passados, certamente gera um sentimento de frustração que, por sua vez, direciona-se para condutas de violência.

Mas o que nós brasileiros podemos aprender com isso para os dias de hoje?

Ora, tal como os norte-americanos e muitos outros povos, sofremos nestes tempos de uma crise de representação na política nacional onde o eleitor comum já não se identifica com mais nenhum dos principais partidos. Legendas como o PT, o PMDB ou o meu PSDB não significam mais nada para a grande maioria, sendo que várias agremiações já intencionam mudar os nomes de suas siglas. Lula ainda é o forte dentre os fracos pré-candidatos à Presidência, porém existe a possibilidade de que, em 2018, ele acabe indo para o segundo turno com o radical de extrema-direita Jair Bolsonaro.

Devido ao que estamos vivendo na atualidade, é bem possível que, no ano que vem, consiga ganhar o presidenciável que melhor personificar a mudança que o povo tanto deseja tal como foi nas eleições de 1989 e de 2002, respectivamente com Collor e Lula. E aí não podemos descartar o desastre social que pode sobrevir ao Brasil com uma eventual vitória de Bolsonaro, considerando ser hoje muito maior o desgaste institucional do que nas décadas anteriores.

Fato é que, da mesma maneira como Trump precisou despir-se de seu personagem de campanha quando pôs as suas patas na Casa Branca, Bolsonaro terá que fazer o mesmo na hipótese de algum dia subir a rampa do Planalto. Pois, ao invés de ser aquele presidente que irá combater a corrupção, não poderá deixar de fazer acordos para conseguir governar seguindo a velha cartilha do toma-lá-dá-cá. Desagradará com isso os seus apoiadores fascistas da mesma maneira como os movimentos sociais progressistas desaprovarão os retrocessos que ele tentará impor em relação aos índios, quilombolas, mulheres, homossexuais, ambientalistas, ativistas de direitos humanos, trabalhadores da cidade e do campo, etc. Sem contar que choverão ações judiciais questionando a inconstitucionalidade de seus atos no Supremo Tribunal Federal.

E o que o Brasil poderá esperar de Bolsonaro em relação à violência urbana?! Por acaso ele irá pacificar as favelas e eliminar o poder do tráfico nessas comunidades carentes, deixando de combater os motivos que levam tantos jovens para a delinquência?! Fará alguma mágica para corrigir os problemas sociais dessas áreas abandonadas pelo Estado ignorando que a instalação do crime organizado nelas foi fruto de um processo de décadas de degradação?

Verdade é que essas inclinações para o radicalismo não resolvem os nossos problemas, os quais precisam ser encarados com racionalidade e sem fantasiarmos a realidade. Pois um líder que consegue levar o seu povo a compreender as causas e os efeitos é o que poderá conseguir ser bem sucedido mesmo sem inaugurar grandes feitos, mas apenas assumindo o seu papel temporário de gestor da coisa pública.

Sinceramente, gostaria muito que o governo estivesse bem, não houvesse essa crise provocada pela corrupção e um nome íntegro viesse dentre os ministros de Temer para a sucessão de 2018. Ou então, que, na esquerda moderada, surgisse alguém com sensibilidade pelo social, respeito pelas medidas de austeridade e averso à corrupção a fim de tentar equilibrar as coisas no Brasil depois da Lava Jato e da impopular reforma trabalhista aprovada este ano no Congresso.

Talvez, creio eu, que um dos graves erros do nosso eleitor é não querer procurar esse bom gestor que existe mas não aparece entre os principais nomes listados pelos institutos de pesquisa de opinião pública. E, já que os políticos tradicionais não andam lá tão bem estimados, que tal a mídia começar a mostrar quem seriam os profissionais melhor preparados na área de Administração Pública, com conhecimentos sobre Política e reconhecida experiência de trabalho?! Pois será que na USP, na FGV, na UNB, na PUC, ou na UERJ não acharíamos esse cérebro?

Vamos acordar, povo!


OBS: Créditos autorais da foto acima atribuídos a AP Photo/Steve Helber, conforme extraído de http://g1.globo.com/mundo/noticia/apos-criticas-casa-branca-diz-que-comentarios-de-trump-sobre-protestos-incluia-supremacistas-brancos.ghtml

sábado, 12 de agosto de 2017

Em favor da causa dos quilombolas




Está marcado para o dia 16/08 (próxima quarta-feira), no Supremo Tribunal Federal, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de n.º 3239, a qual discute a constitucionalidade do Decreto Federal n° 4887/2003, que regulamenta o procedimento de titulação dos territórios quilombolas no Brasil. 

Tal ação foi ajuizada em 2004 pelo então Partido da Frente Liberal (PFL), atual Democratas (DEM), objetivando declarar a inconstitucionalidade do referido Decreto. E o julgamento, iniciado no ano de 2012, segue empatado até o momento aguardando-se o proferimento de voto de ainda nove ministros.

Pode-se afirmar que o julgamento dessa ADI será decisivo para o futuro das comunidades quilombolas de todo o Brasil. Isto porque, na hipótese da norma atacada vir a ser julgada inconstitucional, os remanescentes de quilombos enfrentarão enormes dificuldades para obterem a titulação de suas terras devido à ausência de um marco normativo regulamentador. Porém, caso o Supremo entenda pela constitucionalidade do Decreto, essas populações tradicionais do país sairão fortalecidas de modo que poderão pressionar o governo federal a fim de que a titulação de seus territórios tramite mais rapidamente.

Buscando mobilizar a nossa sociedade para a causa, eis que o Instituto Socioambiental (ISA) criou a campanha "O Brasil é Quilombola, Nenhum Quilombo a Menos" juntamente com uma petição online em defesa das comunidades (clique AQUI para assinar). Em seu portal, a ONG faz o seguinte alerta ao público na internet:

"Todos os títulos de quilombos no país podem ser anulados. O futuro das comunidades está em perigo. Novas titulações não serão possíveis sem o decreto. Mais de 6 mil comunidades ainda aguardam o reconhecimento de seu direito.

As comunidades quilombolas são parte da nossa história, do nosso presente e também do nosso futuro."

Torço para que, no julgamento dessa ADI, o Supremo não se dobre aos interesses da elite ruralista e venha a reconhecer a constitucionalidade do Decreto a fim de que justiça histórica seja feita em relação aos afrodescendentes e suas comunidades remanescentes de quilombos.

Portanto, vamos assinar essa petição do ISA e dizer à nossa Justiça para que rejeite a ação movida pelo reacionário Democratas.


Ótima semana a todos!


OBS: Imagem acima extraída da Fundação Cultural Palmares, conforme consta em http://www.palmares.gov.br/?p=36497

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

O que esperar das tropas federais no RJ?




Neste domingo (06/08), Michel Temer e Rodrigo Maia (DEM-RJ) divulgaram vídeos no Twitter para falar sobre as ações de segurança no Rio de Janeiro. Na gravação de pouco mais de 2 minutos, o presidente relembrou o anúncio do plano nacional de segurança, prometendo a presença das tropas do Exército até o final de 2018:

"Para o Rio de Janeiro, há uma programação extensa, que vai, inicialmente, até 31 de dezembro deste ano e, depois, será ampliada também para o ano que vem." 

Por sua vez, Maia afirmou ser "fundamental" o combate ao crime organizado no estado. Segundo ele, "muitas pessoas" foram presas nas recentes operações e os governos federal e estadual "vão continuar esse trabalho", tendo considerado que, com essas ações de segurança, os índices de violência cairão "brevemente" em todo o estado.

Inicialmente, considero que foi necessária a intervenção federal no RJ através de tropas do Exército nas ruas a fim de se devolver à população os espaços perdidos para a criminalidade que as polícias sozinhas já não conseguiam mais recuperar. Pessoas estavam morrendo nas comunidades carentes por causa da violência reinante sendo que os assaltos nas rodovias estavam já incontroláveis (aqui perto de onde eu moro já não era mais seguro trafegar pelo Arco Metropolitano).

Entretanto, há muito mais coisas a serem feitas além de colocarem os militares nas ruas para que de fato haja sucesso na execução desse plano de segurança do governo federal. Pois é necessário eliminar as causas da criminalidade no RJ. E para tanto, torna-se indispensável iniciar e manter um processo de pacificação de médio e longo prazo.

Fato é que, nos seis anos que antecederam o Mundial de 2014, tivemos no Rio de Janeiro um programa de implantação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). A ideia era instituir polícias comunitárias em favelas, principalmente na capital do estado, como forma de desarticular quadrilhas que, antes, controlavam estes territórios como verdadeiros estados paralelos. Só que, infelizmente, o projeto deixou de avançar e, mesmo durante o ano da realização dos Jogos Olímpicos, aquela que já foi cantada como a Cidade Maravilhosa experimentava um retrocesso.

Não discordo que medidas assim podem, de imediato, proporcionar algum alívio como o fim dos tiroteios e da circulação de armas de fogo na mão de traficantes. Porém, o que na verdade ocorre é que as organizações se escondem durante a ocupação militar para depois ressurgirem com força. O crime torna-se discreto e tenta se rearticular posteriormente.

A meu ver, a presença das tropas deve ser oportunizada para o governo estadual implantar um programa sério de pacificação onde haja continuidade não só através da presença da polícia como também de benefícios à população capazes de promover a dignidade das pessoas, tais como serviços básicos de saúde, educação, transportes, geração de trabalho e renda, lazer ocupacional e cultura. E, por si só, tais ações não surtirão o efeito desejado se não houver uma coordenação estratégica e um respeito às vozes da comunidade (uma relação de proximidade entre o Estado e o cidadão).

Enfim, apesar de ter minhas críticas e desconfianças, torço para que tudo dê certo dessa vez e que não seja mais um plano imediatista que tenha por objetivo as eleições do próximo ano, ou simplesmente tranquilizar a opinião pública. Afinal, os cariocas têm direito a ser felizes no lugar onde vivem da mesma maneira como os habitantes de Medelim e Bogotá, os quais reconquistaram suas respectivas cidades na exemplar Colômbia.

Que haja paz no Rio!


OBS: Créditos autorais da imagem acima atribuídos a Fernando Frazão/Agência Brasil, conforme consta em http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-07/militares-ja-estao-operando-nas-ruas-e-avenidas-do-rio

O direito de acesso e permanência numa UTI dos pacientes em estado grave




Neste ano, depois que passei a ter mais contatos profissionais com servidores públicos da área de saúde, conheci um outro ponto de vista acerca da questão ética da eutanásia, a qual vai além do direito individual de escolha do paciente e/ou de seus familiares. Recentemente, enquanto o mundo acompanhava a polêmica sobre o caso do bebê britânico Charlie Gard (foto), já num estado terminal, em que a família perdeu em última instância na Justiça a briga contra o hospital devido à pretensão deste em querer desligar aparelhos que mantinham o menino vivo, fui considerando novas ideias a respeito do assunto.

Fato é que nós, quando estamos do lado de fora do sistema de saúde, não compreendemos como se administra um hospital e quais os critérios que devem ser adotados nas admissões de pacientes em unidades de terapia intensiva (UTI) bem como a permanência dos mesmos ali. Se temos um parente ou amigo que necessita ser removido para um setor desses, ficamos indignados pela dificuldade de encontrar vagas disponíveis no caótico SUS sendo que eu, na condição de advogado, nunca deixei de indicar a propositura de ações judiciais para que um magistrado, que não é médico, determinasse ao Estado e ao Município a imediata internação do enfermo em algum de seus hospitais.

Confesso que não me arrependo em momento algum de prestar essas orientações aos parentes dos pacientes graves até porque a gestão do sistema de saúde brasileiro não inspira a mínima confiança. Ainda mais quando ouvimos falar de desvios de verbas, do superfaturamento nas compras dos insumos hospitalares, do uso politiqueiro dos serviços prestados à população, dentre inúmeras outras irregularidades mais. Sabemos que as filas de atendimento muita das vezes não são respeitadas sendo corriqueiro pessoas apadrinhadas por algum administrador influente conseguirem ser atendidas na frente de quem deveria ser chamado primeiro para ingresso numa UTI, ou passar por uma cirurgia. E não raramente os gabinetes dos parlamentares recebem solicitações informais desse tipo dentro das nossas casas legislativas...

Acontece que os direitos à saúde e à vida são coisas sérias! E, se tudo funcionasse com transparência e racionalidade, dificilmente alguém precisaria demandar na Justiça em favor de seu ente querido por estar necessitando de remoção urgente para uma UTI. Porém, tirando de lado os problemas da má gestão e da corrupção dentro do SUS, consideremos que a escassez de leitos especializados em cuidados intensivos para atender a demanda de pacientes trata-se de um problema a ser enfrentado com a maior racionalidade tendo em vista os elevados custos despendidos com recursos de alta tecnologia, o que torna necessário atentarmos para a necessidade de ocupação de tais leitos com pessoas em reais probabilidades de recuperação.

Não nego que tanto o direito à vida como à saúde encontram-se presentes em nossa Carta Magna (artigos 5º e 196). Porém, há que se pensar no fato de que muitas pessoas em situação grave nos hospitais do Brasil encontram-se indefinidamente aguardando a remoção para uma UTI porque boa parte dos leitos estão ocupados por pacientes terminais cujos aparelhos não podem ser desligados. Ou seja, prolonga-se o sofrimento de quem praticamente não tem mais chances de cura (só se houver um milagre) enquanto o estado de outros vai só se agravando dentro de uma enfermaria.

Recordo que há cinco anos atrás, quando minha avó materna esteve internada no CTI do Hospital Municipal Ronaldo Gazola, situado num bairro da zona norte do Rio de Janeiro, ela mesma havia me pedido para voltar para a casa uns dois dias antes de falecer, embora não estivesse a meu ver totalmente consciente para decidir. No papel de seu curador e acreditando que deveria lutar até o fim pela vida dela, mantive-a naquela fria unidade do nosocômio onde as visitas são restritas (leiam AQUI a postagem feita neste blogue após o falecimento dela). Hoje, porém, reavalio que uma escolha melhor poderia ter sido tomada em seu caso a fim de que ela tivesse direito a uma morte mais digna e chego a essa conclusão sem culpar nem a mim e a ninguém da família porque não estávamos capacitados para decidir nada e nem o sistema de saúde brasileiro oferece condições/orientações para as pessoas terem uma boa morte.

Quanto ao caso do menino Charlie Gard, falecido no dia 28/07, em que pesem os argumentos do papa Francisco e de Donald Trump, é possível que a Justiça britânica tenha decidido com um considerável grau de acerto quando o juiz Nicholas Francis determinou a transferência do bebê para uma clínica de cuidados paliativos, onde seria feito o desligamento dos aparelhos que o mantinham vivo. E, embora os pais nesta circunstância desejassem levar o filho para casa onde ele passaria os seus últimos momentos ali, a decisão pareceu-me justificável diante da impossibilidade de se transportar o equipamento hospitalar para uma residência.

Vou terminando essa breve postagem sem deixar de reconhecer a minha carência de conhecimentos técnicos para concluir cabalmente acerca de quais critérios precisam ser adotados pelos gestores quanto à recusa de vagas na admissão/permanência de pacientes em UTI, pois caberá aos profissionais especializados da área médica estabelecerem isso. Porém, apenas estou propondo aqui um debate de ordem ética em que a maneira como lidamos com o basilar direito à vida precisa ser repensada a fim de que o seu exercício não acabe se tornando um sério equívoco por lesar a coletividade.


OBS: Postagem original feita no blogue da Confraria dos Pensadores Fora da Gaiola em http://cpfg.blogspot.com.br/2017/08/o-direito-de-acesso-e-permanencia-numa.html