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domingo, 23 de junho de 2013

Nossa crise de representação e de comunicação



Quando protestos ocorre no meio social geralmente é porque não está fluindo o diálogo. Alguém quer ser ouvido.

Atualmente, os governos, bem como os órgãos do Legislativo, têm se utilizado de vários instrumentos de comunicação e de participação sem promoverem um diálogo satisfatório com a sociedade. Os conselhos de gestão, as ouvidorias, a presença das instituições públicas nas redes sociais da internet, as consultas populares, os eventos sobre assuntos específicos, as notícias oficiais e muito menos as sessões nas Câmaras de Vereadores alcançam esse objetivo.

Falta confiança! E a ausência desse sentimento trás desmotivação e desinteresse. As pessoas não querem perder mais tempo com blá-blá-blá das autoridades. Acompanhar as discussões sobre o orçamento pra quê, se depois os recursos podem ser remanejados pelo prefeito desrespeitando a vontade popular? Como o cidadão poderá contribuir com seriedade se o dinheiro dos tributos pagos continua sendo mal investido e, não raramente, desviado de maneira ilícita?

Existe um interesse público evidente na sociedade, o qual nada mais é do que o somatório dos anseios individuais de cada brasileiro. Quado os cidadãos se identificam a este respeito, eles expressam o que querem. Se não encontrarem a devida correspondência estatal (a receptividade em ouvir e o recebimento de uma resposta adequada às necessidades), uma alternativa que surge é ir às ruas protestar.

Noto que hoje o cidadão deseja ser também ator no cenário político e isto precisa ser visto com bons olhos. Precisamos criar uma maneira para que as pessoas sejam  atraídas para um diálogo permanente com o Poder Público e passem a acompanhar com maior interatividade os acontecimentos de nossa vida política. Os recursos tecnológicos de hoje já permitem a inclusão de todos numa grande assembleia sem precisarmos mais sair de casa. Existem  meios de se tornar a democracia brasileira menos indireta e dar ao cidadão um espaço maior.

Para que isso ocorra, as pessoas precisarão tomar consciência da agenda política de seus municípios, o que deve ser organizado com seriedade. Os principais assuntos entrariam em pauta duas vezes, com ampla divulgação. Uma ocasião para serem apresentados e outra para a aprovação pela Câmara Municipal (ou pelo conselho gestor). No intervalo entre a apresentação e a aprovação, o povo teria a oportunidade de debater e de definir aquilo que pretende, cabendo aos governos, junto com a imprensa, promover a consulta popular.

O grande desafio dessa proposta seria justamente a condução do período de debates. Como garantir que o cidadão será realmente ouvido? De que maneira a sua voz chegará até às instâncias de decisão?

Além dos instrumentos de pesquisa e de consulta, os quais seriam anexados ao processo administrativo ou legislativo em curso, entrariam em cena a atuação dos partidos políticos bem como das entidades de representação da sociedade (associações de moradores, sindicatos e ONGs). Todas elas ganhariam direito de voz, mas não de voto, nas sessões do Legislativo, podendo apresentar qualquer proposição com os mesmos direitos que um vereador, solicitar inclusão em pauta, etc. Nas cidades menores, então, idêntica oportunidade poderia ser concedida a todo o colégio eleitoral, permitindo a qualquer munícipe entrar com projetos de lei e com emendas orçamentárias.

Entretanto, nas grandes cidades, não consigo ver outro caminho senão pela via da representação popular e aí teremos que resolver alguns problemas quanto a este aspecto. Ou melhor, muitos. Pois do que adianta democratizarmos ao máximo o processo decisório se as entidades da sociedade civil e seus partidos políticos continuam sendo verdadeiros feudos? Que voz o militante partidário tem em sua agremiação? As Executivas Estaduais sabem respeitar sempre os Diretórios Municipais nas escolhas destes? E no âmbito municipal, os partidos são realmente abertos para dialogarem o tempo inteiro com as respectivas bases? Quantas reuniões costumam fazer por ano com os seus afiliados? E qual a sujeição dos vereadores e dos deputados às legendas pelas quais foram eleitos?

Sendo os partidos políticos entidades livres da intromissão estatal nos seus assuntos internos, cabe a cada um desses grupos saber se reorganizar conforme os ideais de seus membros. Neste aspecto, as leis se auto-limitam. Daí, se num PX da vida falta democracia e maior transparência em suas convenções, quem precisa cuidar disso são os próprios afiliados, os quais jamais devem se acomodar. Se procurarem o Judiciário, valerão as normas estatutárias na solução do litígio em lugar das leis.

Pois é. Duro constatar isso, mas a verdade é que vivemos num Estado mais democrático do que a sua sociedade. Insatisfeitos nós estamos com os governos e parlamentares que elegemos. Contudo, onde está a nossa disposição real para nos reorganizarmos com a devida qualidade? Por que permitirmos que os nossos partidos, sindicatos, associações de moradores, uniões estudantis e ONGs fiquem abandonados nas mãos de poucos? Seria por deficiência na formação política, falta de interesse ou porque, no fundo, ainda pensamos ser mais cômodo deixar o outro decidindo no nosso lugar?

Acontece que não vejo outro caminho. No artigo que escrevi dia 19/06, Por que esse negócio de "sem partido"?!, comentei que

"(...) se os manifestantes estivessem melhor organizados sob o comando de entidades, sejam partidos políticos que disputam eleições ou não, independentemente da ideologia que seguem, de fato seria muito mais fácil de negociar com eles. Tenho pra mim que a rejeição da sociedade aos partidos políticos enfraquece o regime democrático brasileiro. Uma democracia forte é feita com partidos fortes, sindicatos fortes, associações de moradores fortes e ONGs fortes (...)" 

Assim sendo, não vejo outro caminho senão encararmos a tarefa de fortalecimento dos partidos políticos brasileiros, tornando-os transparentes, democráticos e de atuação dinâmica. É bom que as pessoas se filiem e participem, não se esquecendo de reverem as normas estatutárias.

Nesta última sexta-feira (21/06), a presidenta Dilma fez o seu respeitável pronunciamento e precisamos agora acompanhar quais serão os próximos passos. Deve-se então dar uma pausa nos protestos mas sem tirarmos os olhos do que será feito. As reivindicações populares precisam ser melhor conhecidas e, se o governo decidiu elaborar uma pauta, aguardemos com atenção.

Torço para que as promessas da nossa presidenta corram com a devida velocidade para a felicidade geral da nação. E que seja bem rápido!

4 comentários:

  1. Rodrigo, muito bom o seu texto. Com relação a questão do brasileiro não se organizar em suas representações, acho que era puro comodismo mesmo. Mas, essas manifestações vieram para, além de mostrar a insatisfação, quem sabe acordar as pessoas para suas responsabilidades com o país e a sociedade. Com essa sacudida que o Brasil levou, acho que muitos começarão a se perguntar qual é o seu papel na sociedade e o que temos que fazer para ajudar a melhorar. Também espero mudanças e que sejam boas.

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    1. Olá, Nina.

      Bom dia!

      Excelentes os seus comentários, amiga. Creio que essa indagação sobre qual o nosso papel na sociedade e como podemos contribuir ainda devem ser feitas já que os protestos foram dirigidos verticalmente aos que se encontram no poder e não na horizontal.

      Muitos passam a vida inteira na insatisfação de desejar algo e não fazer. Em certas horas, as pessoas querem ser atores e atrizes na política mas, na maior parte do tempo, deixam isso de lado. Reclamam dosa governos mas não participam sequer de uma reunião de bairro ou quando convocados para uma eleição de síndico do condomínio. Falta a capacidade ou a iniciativa de construir! Acho que estamos chegando à rais do problema: a terceirização das próprias escolhas.

      Que mudanças venham e elas dependem de nós também. A orientação que eu daria agora é que devemos lutar pelo surgimento de oficinas de debates capazes de construir soluções para o Brasil e suas cidades, com foco principalmente no município que é o lugar onde a participação popular pode ser efetivamente exercida, sendo fundamental a promoção de uma democracia de proximidade capaz de reforçar a influência de seus cidadãos sobre o seu cotidiano e nas atividades comunitárias.

      Abraços e obrigado pelo enriquecedor comentário.

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  2. Por falar em debates, o Blog Política de Itaguaí, no dia 27/06, às 19h, fará um debate on line sobre a questão das manifestações. Poderíamos copiar a ideia e fazer um nosso também.
    Abraços e obrigada pelas considerações.

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    1. É uma boa ideia, Nina. Bom que seja em data e horário diferente. Em qual blogue sugere que seja? Ou poderia ser pelo Facebook?

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