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domingo, 16 de junho de 2013

Como resolver o problema dos transportes urbanos nas cidades brasileiras?



Em que pese o direcionamento partidário-ideológico dado às manifestações de rua contra os reajustes nas tarifas dos transportes das principais cidades do país, os protestos evidenciam uma situação muito mais profunda - a maneira inadequada como o serviço está sendo prestado.

Atualmente, o que se vê nos transportes urbanos são monopólios ou oligopólios privados. Não raramente os donos dessas empresas são ligados a políticos e "almoçam junto com o prefeito". Também é comum que parte da arrecadação seja destinada às prefeituras, alimentando o interesse dos governantes por reajustes abusivos. Ou então, quando se quer reduzir/congelar o preço da passagem para beneficiar a população, os vereadores (ou os deputados estaduais em se tratando de linhas intermunicipais) aprovam vergonhosos subsídios ao particular em que, no final das contas, todos pagamos para a iniciativa privada continuar lucrando.

O regime de concessões nos transportes públicos possui vantagens e desvantagens em termos administrativos, mas não se presta para atender às demandas de uma nação cuja renda per capta do usuário ainda é baixa. Em algumas cidades, só de ida e de volta o trabalhador gasta mais de 1% do salário mínimo no deslocamento diário casa-em presa-casa. No mês, essas despesas podem muito bem ultrapassar 25% do valor de sua renda líquida. E, mesmo que o patrão pague a passagem, sabemos que, na contabilidade de uma empresa, tal variável vai influenciar na contratação de novos funcionários e no total da remuneração que poderia ser maior para o bolso do empregado.

Infelizmente, não dá para estimular uma livre concorrência nos transportes urbanos como muitos pensam. Isto porque não se trata de uma atividade econômica comum e sim de um serviço público que deve atender todas as localidades de um município. Assim, ainda que determinadas linhas causem prejuízos por causa do longo percurso, ou da pequena quantidade de passageiros, é preciso oferecer condições de mobilidade às pessoas, promover a expansão imobiliária das cidades e manter o produtor rural no campo onde o povoamento é baixo. Logo, não é possível que algo tão estratégico desenvolva-se ao mero sabor do mercado sem cumprir com sua função social.

Por outro lado, não proponho que haja um estagnante monopólio estatal. Penso que municípios e estados deveriam ter suas empresas públicas sem impedirem o funcionamento de cooperativas de vans e de companhias privadas, as quais prestariam um serviço complementar opcional ao cidadão com maiores recursos. Por exemplo, ônibus de luxo fariam o trajeto concorrente entre um bairro da classe média e o centro urbano, ou da rodoviária ao aeroporto. Aí, se o usuário quisesse pagar alguns reais a mais para ter um conforto extra, seria por pura escolha dele porque o governo lhe disponibilizaria a locomoção por meio de um transporte público, integrado, economicamente acessível e com horários previamente determinados. Tudo isso sem esquecer logicamente da inclusão dos idosos, das crianças, dos estudantes de baixa renda, das gestantes e das pessoas portadoras de deficiência em todos os veículos que circularem. Algo que seria rigorosamente observado desde o início com a aquisição de uma frota totalmente nova por meio de um processo transparente de licitação.

Vale lembrar que as empresas públicas não são necessariamente "elefantes brancos". Elas não precisam dar lucros porque esta não é a finalidade delas e, no caso dos serviços de transportes, estes destinam-se a pessoas de baixa renda em que a lógica da atividade diferencia-se, por exemplo, da exploração do petróleo.  Entretanto, a prestação de uma atividade de caráter mais social não significa acúmulo de altos prejuízos comprometedores das contas municipais a ponto da entidade tornar-se um "cabide de empregos", coisa que só ocorre quando falta transparência, há um excesso de corporativismo e abusos político-eleitorais da máquina estatal.

Em minha proposta de empresas estatais de transportes, defendo uma exceção dentro desse sistema de economia de mercado e que contemple não só os anseios do usuário como os direitos do trabalhador. A abertura de concursos públicos para a contratação de funcionários admitirá não somente  motoristas como trocadores. Este cargo, que as empresas de ônibus estão praticamente extinguindo pelo uso da bilhetagem eletrônica, sempre teve a função de desocupar o condutor para este trafegar com maior atenção e segurança. Sem a ajuda de um auxiliar, as viagens têm demorado mais porque os veículos ficam um tempo maior parados nos pontos das vias públicas já que nem todo mundo paga a sua passagem com cartão. Aí se torna necessário conferir dinheiro, separar o troco, depositar as quantias em excesso no cofre e o embarque condicionado acaba impondo a criação de desumanas filas externas.

Assim, com a presença direta dos municípios e dos estados na execução dos serviços de transporte urbano, toda essa lógica de exploração mudaria e a atividade seria acompanhada por uma participação democrática da sociedade. Ao invés de cometermos os erros do passado, em que os governantes administravam com exclusividade as estatais, sugiro que os velhos presidentes das empresas sejam substituídos por um conselho gestor com representantes dos sindicatos dos trabalhadores, das associações de moradores e dos diversos tipos de ONGs (de defesa do consumidor, dos deficientes, ambientalistas), além da própria prefeitura. Com isto, o coordenador geral do organismo, mesmo sendo nomeado pelo chefe do Poder Executivo, passaria a submeter determinadas decisões de interesse coletivo ao colegiado. Este teria o poder de contribuir com seus pareceres, sugestões, encaminhamentos de demandas e, caso necessário, convocaria audiências populares afim de informar o público promovendo um amplo debate democrático.


OBS: Foto acima extraída do Blog da Ubes.

2 comentários:

  1. Solução racional para o transporte coletivo
    Transporte coletivo vem sendo um dos problemas mais sentidos pela população do Brasil e origem de reações violentas, perturbadoras da ordem pública. A tarifa zero é perfeitamente justificável para quem necessita deste recurso para usufruir o direito constitucional de liberdade de locomoção. Torna-se, entretanto, muito injusta se usufruída por quem dela não necessita. Praticar o transporte gratuito através de empresas estatais tem sido um erro que não precisa ser novamente testado para se confirmar. Transporte é uma prestação de serviço e não um negócio para gerar lucro ou ser custeado por impostos gerais, pois estes são socialmente injustos. Partindo desta concepção, elaboramos uma alternativa para solução racional deste problema e sugerimos o acesso ao blog http://nossobrasilja.blogspot.com.br/ no qual está apresentada e disponível para ser implantada.

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    1. Prezado Carlos Reinaldo,

      Primeiramente, obrigado por comentar.

      Respeito sua opinião e pretendo ler o artigo que postou na internet. Porém, a atual crise dos transportes tem mostrado que, quer seja o serviço prestado diretamente pelo Poder Público, ou por meio de um concessionário, fica difícil manter uma tarifa acessível sem o dinheiro dos nossos impostos. Ou seja, o sistema não é financeiramente auto-sustentável a ponto de garantir a gratuidade aos que dela necessitam. Numa economia não existe cafezinho grátis e alguém vai ter que pagar a conta. Atualmente, é o usuário e o contribuinte os que têm custeado porque o lucro das empresas continua assegurado, sendo, portanto, um dos componentes do valor real da tarifa.

      Entretanto, quero ler e analisar a sua proposta.

      Abraços e obrigado mais uma vez por participar.

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