Desde esta última terça-feira (13/05/2013), passou a vigorar o Decreto Federal n.º 7.962/13 que estabeleceu novas regras para o comércio eletrônico na internet ao regulamentar disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90).
A norma que, a meu ver, chegou tarde, trás coisas muito positivas e um ponto que considero preocupante. Buscando incentivar o desenvolvimento da nossa economia, a presidenta soube perceber a necessidade de que haja informações mais claras acerca do produto e do serviço oferecidos bem como da empresa ou da pessoa física vendedora. Também agiu com acerto em buscar assegurar um atendimento mais facilitado ao consumidor. Porém, equivocou-se quanto à banalização do direito de arrependimento pela falta de justificativa.
O direito de arrependimento já era previsto pelo artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, permitindo que o consumidor possa desistir da compra no prazo de até sete dias "sempre que a contratação de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio". E, embora na época do então presidente Collor não existisse ainda o comércio eletrônico varejista, tal como se vê amplamente nos dias de hoje, obviamente que o citado dispositivo veio a se aplicar também às transações realizadas na internet haja vista a atualização das leis.
Todavia, tanto a doutrina quanto a jurisprudência já vinham esclarecendo a sociedade brasileira sobre os limites da norma que não deve ser tomada de maneira absoluta para toda e qualquer situação. Criou-se o entendimento de que este dispositivo da lei só se aplicaria quando o cliente não tivesse condições de certificar-se quanto às especifidades do bem que está adquirindo. É o que leciona o jurista Nelson Nery Júnior, um dos autores do anteprojeto do CDC:
“(...) O Código protege o consumidor contra toda e qualquer contratação realizada fora do estabelecimento comercial, concedendo-lhe o prazo de sete dias para arrepender-se do negócio, sem nenhum ônus. O caso concreto é que vai determinar o que seja venda fora do estabelecimento comercial sujeita ao direito de arrependimento ou não. Se for dos usos e costumes entre as partes a celebração de contratos por telefone, por exemplo, não incide o dispositivo e não há direito de arrependimento. O consumidor pode ter relações comerciais com empresa que fornece suporte para informática e adquirir, mensalmente, formulários contínuos para computador, fazendo-o por telefone. Conhece a marca, as especificações, e o fornecedor já sabe qual a exigência e preferência do consumidor. Negociam assim há seis meses continuados, sem reclamação por parte do consumidor. Nesse caso, é evidente que se o contrato de consumo se der nas mesmas bases que os anteriores, não há o direito de arrependimento. Havendo mudança da marca do formulário, ou das especificações sempre exigidas pelo consumidor, tem ele o direito de arrepender-se dentro do prazo de reflexão. O direito de arrependimento existe, independentemente de o produto haver sido encomendado por pedido expresso do consumidor. O Código lhe dá esse direito porque presume, juris et de jure, que possa não ter ficado satisfeito e ter sido apanhado de surpresa quanto à qualidade e outras peculiaridades do produto ou serviço.” (Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, págs. 550 e 551)
Considero fundamental que as compras realizadas na internet tenham um regramento próprio afim de que haja o estabelecimento de um padrão uniformizador nas relações virtuais capaz de proporcionar mais segurança ao consumidor e dando maior solidez às relações de compra e venda. Porém, se analisarmos cuidadosamente o texto do decreto da Dilma, veremos que tudo isso já está satisfatoriamente contemplado pelas múltiplas exigências dos artigos 2º ao 4º. E aí, se o site da empresa atende a todos esses requisitos, não vejo razões plausíveis para o cliente arrepender-se da compra. Causa-me preocupação o que diz, por exemplo, o parágrafo 2º do artigo 5º da norma infra-legal:
"O exercício do direito de arrependimento implica a rescisão dos contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumidor" (destaquei)
Como já garante o código, segundo o parágrafo único do artigo 49, os valores eventualmente pagos devem ser devolvidos de imediato e monetariamente atualizados. E o caput diz que o termo inicial para a contagem do prazo de sete dias começa da assinatura do consumidor ou do ato de recebimento do produto. Logo, se a compra é feita à distância, é inegável que houve da parte do fornecedor uma despesa postal. Então, sendo exercitado o arrependimento, além da empresa devolver a quantia paga, ainda terá que suportar os gastos com os Correios para enviar o produto e depois tê-lo de volta ressarcindo assim ao consumidor.
Ora, se o empresário induziu o consumidor em erro na aquisição de produtos, não há o que se discutir. Deve indenizar o cliente até pela devolução porque o teria ludibriado ou faltado com as informações básicas que deveriam constar no site. Porém, se for mero capricho da pessoa que, agindo de má-fé, decide pegar de volta o dinheiro só porque achou outra promoção mais barata na loja do concorrente, ou percebeu que andou gastando em excesso, não vejo razões plausíveis para o Direito encobertar comportamentos assim.
O que vai acabar acontecendo no mercado com essas novas regras? Sinceramente, temo que as vendas na internet acabem ficando mais caras por causa da inclusão do fator risco nos preços e penso que isto acabará favorecendo as grandes empresas, as quais poderão dispor de preços melhores e de funcionários para proporcionarem um atendimento mais amplo. O pequeno comerciante poderá se meter em terríveis encrencas caso resolva entrar nesse meio onde a formalidade prevalece sobre a acessibilidade dos contatos presenciais entre as pessoas propiciando atitudes dissimuladas.
Mais do que nunca deve ser lembrado à sociedade brasileira que o arrependimento de uma compra é situação de excepcionalidade. Quem deseja adquirir um produto ou contratar um serviço, deve primeiramente pesquisar, procurar todas as informações necessárias, ver os prazos máximos de entrega, conferir preços, modalidades de pagamento, taxas de juros do financiamento, e, se necessário, entrar em contato com o vendedor antes de confirmar a compra. Pois esse é o comportamento de pessoas maduras e as políticas governamentais devem sempre priorizar a educação do consumidor. Jamais favorecer a irresponsabilidade.
OBS: Ilustração acima extraída do site do SEBRAE em http://www.sebraefinancas.com.br/?p=10
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