Chego hoje à conclusão de que foi um tremendo erro histórico a canonização do Apocalipse pelos antigos padres, algo que, durante a Reforma Protestante, Lutero chegou a questionar, apesar de não ter se negado a traduzir Revelação (outro nome do livro) para o idioma alemão.
Numa análise psicológica, o autor do Apocalipse expõe traços de uma personalidade doentia. O céu e o inferno talvez reflitam uma preocupante flutuação no seu humor. O fato de pessoas serem lançadas para sempre num terrível lago de fogo, que seria a "segunda morte", pode revelar a sua dificuldade de perdoar multidimensionalmente condutas injuriosas, difamatórias ou insultuosas, bem como indicia um repugnante apelo ao medo na causa do proselitismo religioso.
Além disso, o João do Apocalipse (que para mim pode ser uma pessoa distinta do amável apóstolo de Jesus) não considera os seus opositores como mentes divergentes, mas, sim, como inimigos que devem ser abatidos com a vinda de Jesus. Isto evidencia uma incapacidade de conviver com o diferente, algo que também se repete na expulsão do diabo do céu, como se lê no capítulo 12:
"Houve então uma guerra no céu. Miguel e seus anjos lutaram contra o dragão, e o dragão e os seus anjos revidaram. Mas estes não foram suficientemente fortes, e assim perderam o seu lugar no céu. O grande dragão foi lançado fora. Ele é a antiga serpente chamada diabo ou Satanás, que engana o mundo todo. Ele e os seus anjos foram lançado à terra." (Ap 12:7-9; NVI)
Outro aspecto de sua personalidade é que ele se considera o portador de uma mensagem profética, a ponto de ameaçar quem alterar o seu escrito (Ap 22:18-19), prometendo também aniquilar os que não se enquadrarem em seu modelo comportamental:
"O vencedor herdará tudo isto, e eu serei seu Deus e ele será meu filho. Mas os covardes, os incrédulos, os depravados, os assassinos, os que cometem imoralidade sexual, os que praticam feitiçaria, os idólatras e todos os mentirosos — o lugar deles será no lago de fogo que arde com enxofre. Esta é a segunda morte (...) Felizes os que lavam as suas vestes, para que tenham direito à árvore da vida e possam entrar na cidade pelas portas. Fora ficam os cães, os que praticam feitiçaria, os que cometem imoralidades sexuais, os assassinos, os idólatras e todos os que amam e praticam a mentira. (Ap 21:7-8;22:14-15)
Assim, ele demonstra um senso pessoal que não se harmoniza com os direitos dos outros, rejeitando as diferenças que possam existir no comportamento plural da humanidade, e ainda aparenta ter seus problemas com o sexo feminino (não sei se era um gay que vivia no "armário" da repressão ou um padreco misógina frustrado) a ponto de idealizar os 144 mil eleitos como rapazes virgens que "não se contaminaram com mulheres":
"Estes são os que não se contaminaram com mulheres, pois se conservaram castos e seguem o Cordeiro por onde quer que ele vá. Foram comprados dentre os homens e ofertados como primícias a Deus e ao Cordeiro." (Ap 14:4)
Bem, essa foi a breve análise crítica e psicológica que fiz desse livro que, embora esteja na Bíblia, pouco nos edifica (não nego que haja uma ou outra frase interessante de ser trabalhada fora do contexto). Peço favor aos leitores religiosos que não me apedrejem como herege. Na qualidade de livre pensador, tenho o direito de duvidar da organização do cânon bíblico e propor alterações. Aliás, há livros muito melhores do que Revelação, tanto atuais como antigos, mas permanecem fora da Bíblia...
OBS: A ilustração acima refere-se à obra João na ilha de Patmos, cuja autoria é atribuída aos Irmãos Limbourg (em neerlandês, Gebroeders Van Limburg, Herman, Paul, e Johan), os quais foram três famosos pintores neerlandeses renascentistas de iluminuras. Quanto ao texto, a sua postagem original se deu inicialmente no blogue da Confraria Teológica Logos e Mythos dia 27/02/2016.
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