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quinta-feira, 25 de dezembro de 2025

Quando o Natal tinha dia, lugar e um Papai Noel de verdade



Houve um tempo em que o Natal no Rio de Janeiro não chegava em notificações de celular, nem se resumia a vitrines apressadas. Ele tinha data marcada, expectativa acumulada por semanas e um ponto de encontro quase sagrado: o velho Maracanã.

Para milhares de crianças — e também para adultos que se permitiam sonhar — o Natal ganhava forma quando José Antônio Rodrigues (1918–1990) aparecia. Ele não era apenas alguém vestido de vermelho. Era o Papai Noel. Aquele que parecia existir desde sempre e que, por alguns instantes, tornava o mundo mais simples e mais justo.

As famílias saíam cedo de casa. Ônibus cheios, mãos dadas, sanduíches embrulhados em papel-alumínio. O estádio ia sendo tomado por vozes infantis, risadas, balões, músicas natalinas ecoando nos alto-falantes. Havia calor, havia multidão — mas havia, sobretudo, uma sensação rara: a de pertencimento.

E então vinha o momento esperado. O olhar se voltava para o céu ou para o túnel do gramado. Quando José Antônio surgia — muitas vezes descendo de helicóptero — o Maracanã parecia suspender o tempo. O aplauso era espontâneo, quase infantil também. Não importava a idade: todos aplaudiam como se aquele gesto confirmasse algo essencial — o Natal chegou.

Com sua barba branca, a voz serena e os gestos amplos, ele falava às crianças, desejava paz, felicidade, um ano melhor. Palavras simples, ditas sem pressa. E talvez por isso mesmo tão poderosas. Não havia ironia, não havia desconfiança. Havia escuta.

José Antônio Rodrigues foi reconhecido oficialmente como Papai Noel do Brasil, mas o título mais importante veio do povo. Ele se tornou parte da memória emocional de uma cidade e de um país. Em um Brasil sem neve, mostrou que o Natal não precisava de frio europeu para existir — bastava encontro, imaginação e afeto coletivo.

Hoje, quando essas histórias são contadas, elas vêm acompanhadas de fotos um pouco desbotadas, de lembranças fragmentadas, de frases como “lembra disso?”. Mas também vêm com algo raro: um brilho nos olhos. Porque, por alguns anos, acreditamos juntos. E isso deixa marcas boas.

Talvez o mundo tenha ficado mais rápido. Talvez o Natal tenha mudado de forma. Mas para quem esteve ali, sentado nas arquibancadas do Maracanã, esperando o Papai Noel aparecer, fica a certeza de que a infância foi real, foi compartilhada — e foi feliz.

E enquanto essas lembranças forem contadas, José Antônio Rodrigues continuará chegando. Não mais de helicóptero, mas pela memória — onde o Natal ainda é possível. 🎄✨


📷: José Antônio Rodrigues em sua última aparição como Papai Noel, ao microfone, no Maracanã, em 1989 | Cesar Guimarães/Agência O Globo

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