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segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

Os Direitos das Pessoas Autistas no Brasil: Inclusão, Respeito e Cidadania



Nos últimos anos, o Brasil avançou de forma significativa na proteção dos direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Mas, apesar dos progressos, ainda é comum que famílias, educadores e até profissionais de saúde desconheçam a extensão das garantias legais já existentes. Informar é a primeira etapa para transformar a realidade — e este texto tem exatamente esse propósito.


Reconhecimento legal: autismo é deficiência para todos os efeitos

Desde 2012, com a promulgação da Lei 12.764, conhecida como Lei Berenice Piana, a pessoa autista é reconhecida como pessoa com deficiência, assegurando acesso a todos os direitos previstos nas políticas de inclusão. Isso significa prioridade de atendimento, proteção contra discriminação, garantia de acesso à saúde, educação, assistência social e inclusão no mercado de trabalho.

A Lei foi regulamentada pelo Decreto 8.368/2014, que detalha as responsabilidades do poder público e fortalece as diretrizes de cuidado integral.


Direito à saúde: atendimento integral e multiprofissional

O Sistema Único de Saúde (SUS) tem a obrigação de oferecer:

  • diagnóstico precoce,
  • acompanhamento especializado,
  • terapias multiprofissionais,
  • apoio às famílias,
  • reabilitação contínua.

A atenção deve ser humanizada, sem práticas abusivas e com respeito às necessidades individuais. Também faz parte da rede de cuidados a RAPS — Rede de Atenção Psicossocial — que integra CAPS, unidades básicas e serviços especializados.


Direito à educação: inclusão sem discriminação

A Lei brasileira é clara: toda criança e adolescente autista tem direito à escola regular, sem cobrança adicional e com o suporte necessário.

Isso inclui:

  • profissional de apoio escolar, quando comprovada a necessidade;
  • Atendimento Educacional Especializado (AEE);
  • adaptação curricular;
  • acessibilidade sensorial e comunicacional.

A escola não pode negar matrícula, sugerir transferências ou dificultar a permanência do aluno — atitudes consideradas crime nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência.


Direito à assistência social e ao BPC

Para famílias de baixa renda, existe o Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto na LOAS, que garante um salário mínimo mensal à pessoa autista que comprove impedimentos de longo prazo e vulnerabilidade social.

Centros de Referência de Assistência Social (CRAS e CREAS) também devem oferecer:

  • apoio social,
  • orientação profissional,
  • inclusão em benefícios e programas do governo.


Direito à acessibilidade e prioridade

A legislação assegura:

  • atendimento prioritário em serviços públicos e privados;
  • fila preferencial;
  • gratuidade ou desconto em transporte público (de acordo com normas locais);
  • acessibilidade em ambientes urbanos, prédios públicos e espaços culturais.

Desde 2020, a CIPTEA — Carteira de Identificação da Pessoa com TEA facilita esse atendimento, funcionando como documento oficial de prioridade.


Direito ao trabalho e à vida adulta

Adultos autistas também possuem garantias importantes:

  • reserva de vagas em concursos e empregos públicos;
  • adaptações no ambiente de trabalho;
  • proteção contra discriminação e assédio.

A inclusão profissional é fundamental para garantir autonomia e dignidade.


A força da Convenção da ONU e da Lei Brasileira de Inclusão

A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao Brasil com status constitucional, estabelece que a pessoa com deficiência tem direito à vida independente, participação plena na comunidade e igualdade de oportunidades.

Esses princípios são reforçados no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), que direciona políticas públicas e assegura mecanismos de proteção jurídica.


Avanços, desafios e a importância da cidadania ativa

O Brasil possui uma das legislações mais avançadas do mundo no campo da inclusão. Entretanto, muitas famílias ainda enfrentam:

  • filas longas para diagnóstico,
  • falta de terapias pelo SUS,
  • resistência de escolas,
  • preconceito e desinformação.

Por isso, conhecer e reivindicar os direitos é essencial. Quando a sociedade se informa, o poder público é pressionado a garantir o que já está previsto em lei — e a inclusão deixa de ser um discurso para se tornar realidade.


CONCLUSÃO

O Brasil possui um dos conjuntos de leis mais avançados do mundo em matéria de proteção às pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A Lei Berenice Piana, a Lei Brasileira de Inclusão, a Constituição, a CIPTEA, as normas da educação inclusiva e da saúde pública formam um arcabouço robusto, moderno e, no papel, inspirador.
Mas a pergunta incômoda — e inevitável — é: quantos desses direitos se cumprem de fato no cotidiano das famílias autistas?

A distância entre o que está escrito e o que se vive diariamente é tão grande que chega a ser ofensiva. E o problema não está apenas na omissão dos governos, mas também na negligência de uma sociedade que ainda não aprendeu a incluir.


Leis exemplares, práticas vergonhosas

Conforme explicado acima, não faltam garantias. A legislação assegura:

  • diagnóstico precoce,
  • atendimento multiprofissional,
  • inclusão escolar plena,
  • profissional de apoio,
  • acessibilidade sensorial,
  • prioridade em serviços,
  • proteção contra discriminação,
  • suporte no trabalho,
  • benefícios assistenciais e programas sociais.

No papel, o autista brasileiro é amparado como raras vezes se vê no mundo.
Na prática, contudo, falta quase tudo.

O diagnóstico precoce demora meses — às vezes anos. O SUS não oferece terapias suficientes ou especializadas. Há cidades onde não existe sequer um profissional capacitado para acompanhar uma criança autista. Famílias peregrinam de porta em porta em busca de atendimento e, quando não suportam mais a espera, acabam arcando com custos privados impossíveis.


O drama da inclusão escolar

A lei determina que a escola regular é o espaço legítimo de todos. Aponta a proibição explícita de cobrança adicional. Permite profissional de apoio sempre que necessário. Prevê adaptação pedagógica e acessibilidade.

E mesmo assim:

  • escolas negam matrícula,
  • empurram para instituições segregadas,
  • chamam a família “porque a criança não se adapta”,
  • culpam o aluno por sua própria necessidade de apoio.

Há casos em que o preconceito não está escondido: ele aparece na fala, na recusa, na omissão.
Muitas escolas cumprem a lei apenas quando pressionadas — e algumas, nem assim.


Sociedade que se diz acolhedora, mas resiste ao diferente

É confortável apontar o dedo apenas para os governos. Mas a verdade é que parte da exclusão nasce dentro de casa, nos olhares das ruas, nos comentários nas redes sociais e nas atitudes cotidianas.

O autista que sofre preconceito na escola encontra outros tantos no supermercado, na praça, no transporte público. A criança que faz movimentos repetitivos recebe olhares de julgamento. O jovem que usa fone antirruído é alvo de curiosidade invasiva. O adulto que precisa de rotina é chamado de “fresco”, “mal educado” ou “esquisito”.

A sociedade, muitas vezes, só respeita aquilo que entende. E como não entende o autismo, prefere exigir que a pessoa autista se adapte ao mundo — em vez de permitir que o mundo se adapte a ela.


A cidadania plena ainda é uma promessa

O Estado promete diagnósticos, terapias, inclusão escolar, apoio social, transporte, acessibilidade e participação no trabalho.
A população autista recebe:

  • filas,
  • burocracia,
  • ausência de profissionais,
  • desinformação,
  • preconceito,
  • invisibilidade.

E cada uma dessas falhas tem consequências graves: atraso no desenvolvimento, impacto emocional nas famílias, evasão escolar, desemprego e marginalização social.


O desafio que ninguém quer encarar

Cumprir a lei é apenas o começo. A verdadeira inclusão exige:

  • respeito,
  • paciência,
  • empatia,
  • formação de profissionais,
  • políticas públicas contínuas (e não eleitoreiras),
  • comunidade participativa,
  • combate ao capacitismo.

Não é o autista que deve se esforçar para caber na sociedade.
É a sociedade que deve se esforçar para acolher o autista.


Entre o discurso e a prática, quem perde é sempre a pessoa autista

O Brasil tem leis admiráveis. O que falta é transformar esse marco jurídico em práticas reais, consistentes e universais. Enquanto governos se omitem e parte da sociedade se acomoda, crianças, jovens e adultos autistas continuam lutando por direitos que já deveriam ser garantidos — não mendigados.

Defender o autismo não é uma causa de um grupo específico:
é uma pauta de direitos humanos, civilizatória e urgente.

É responsabilidade das instituições públicas, das escolas, dos profissionais, da comunidade e de cada cidadão. Um país verdadeiramente inclusivo é aquele que acolhe todas as diferenças, garante oportunidades reais e respeita a dignidade humana.

E só haverá inclusão verdadeira quando compreenderemos que diversidade não é problema — é riqueza.

Se você conhece alguém com TEA ou convive com uma família atípica, compartilhe essas informações. A inclusão começa com um gesto simples: espalhar conhecimento.

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