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sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Sobre o andamento da ação popular contra o prefeito de Mangaratiba



Nesta terça-feira (23/08), finalmente houve uma decisão do MM. Juiz de Direito Tabelar, Dr. Guilherme Grandmasson Ferreira Chaves, quanto á ação popular que movi em face do prefeito interino de Mangaratiba, Sr. Vitor Tenório Santos, o "Vitinho".

Conforme já relatado na minha postagem de 18/08 (clique AQUI para ler), devido ao fato do governante interino do Município responder a processo criminal, entendo que o mesmo não deve suceder o prefeito na hipótese de haver vacância do cargo deste e do seu vice. Por isso, requeri a sua destituição do cargo de Prefeito Municipal interino até o julgamento final da ação criminal.

Em 17/08, após um parecer favorável do Ministério Público ao pedido de liminar formulado na ação, o magistrado titular da Comarca, Dr. Marcelo Borges Barbosa, posicionou-se considerando impedido de julgar e encaminhou o processo para o seu tabelar que é o juiz da 1ª Vara da Comarca de Seropédica:

"A lei orgânica Municipal não estabelece a ordem de sucessão no caso de vacância do cargo de Prefeito, além do Presidente da Câmara. Por outro lado, pela aplicação simétrica do artigo 80 da CRFB é possível concluir que após a retirada do Presidente da Câmara, caberia ao juiz da Comarca o ingresso no cargo de forma interina. Desse modo, há evidente impedimento deste juiz no presente processo. Assim, DECLARO-ME IMPEDIDO, Encaminhe-se ao Juiz Tabelar." - destaquei

No entanto, ao apreciar o requerimento, o magistrado tabelar manifestou entendimento diverso de seu colega daqui de Mangaratiba, considerando que o juiz titular da Comarca não se encontraria na linha sucessória do prefeito municipal uma vez que "os Municípios não possuem Poder Judiciário":

"Em que pese o entendimento do Magistrado prolator da decisão ora impugnada, este Magistrado possui entendimento diverso. A Constituição Federal dispõe, em seu artigo 80, que nos casos de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão chamados sucessivamente ao exercício da Presidência, o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal. Ora, como sabido, os Municípios não possuem Poder Judiciário. Assim sendo, incabível qualquer interpretação simétrica do referido dispositivo constitucional ao presente caso. Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal possui entendimento pacifico de que a sucessão e a substituição da chefia do Poder Executivo municipal é matéria adstrita ao âmbito da autonomia política do município, por tratar-se tão somente de assunto de interesse local, não havendo dever de observância do modelo federal" (o destaque é meu)

Após citar um precedente de 2014, que é o acórdão no agravo regimental do recurso extraordinário n.º 655647, no qual a 1ª Turma do STF entendeu que, em caso de dupla vacância, a matéria se submete ao que dispõe a Lei Orgânica Municipal, eis que o julgador fez referência à ordem sucessória prevista nos artigos 86 e 87 da LOM de Mangaratiba. Pois esta "nada dispõem quanto a sucessão e substituição do cargo de Prefeito e Vice-Prefeito por Magistrado Estadual":

"Art 86 - Em caso de impedimento do Prefeito e do Vice - Prefeito, ou vacância do cargo, assumirá a administração municipal o Presidente da Câmara.
Parágrafo único - A recusa do Presidente da Câmara, por qualquer motivo, a assumir o cargo de Prefeito, importará em automática renuncia à sua função de dirigente do Legislativo, ensejando, assim, a eleição de outro membro para ocupar, como Presidente da Câmara, a chefia do Poder Executivo."
Art 87 - Verificando a vacância do cargo de Prefeito e inexistindo Vice-Prefeito, observa- se-á o seguinte:
I - ocorrendo a vacância nos três primeiros anos do mandato, dar-se-á eleição noventa dias após sua abertura, cabendo aos eleitos completar o período de seus antecessores;
II - ocorrendo a vacância no ultimo ano de mandato, assumirá o Presidente da Câmara, que completará o período."

Além disso, o magistrado considerou que, mesmo se a LOM previsse a substituição do prefeito e do vice-prefeito por um magistrado estadual, "tal norma seria inconstitucional", pelo que citou outro precedente do STF, a saber a ADI n° 687/PA, da relatoria do Ministro Celso de Mello. E, com isso, suscitou um conflito negativo de competência, requerendo que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de janeiro declarasse a competência do Juízo de Mangaratiba.

No entanto, em que pese o entendimento bem fundamentado do magistrado de Seropédica, considero que caberia aí a aplicação do artigo 80 da Constituição por simetria. Isto porque a disciplina normativa sobre a sucessão no caso de vacância, nos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, cabe ser definida, privativamente pelo Município, sendo lícita a adoção de regime diverso do adotado pela Constituição Federal para a vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, ainda que a investidura do sucessor não ocorra mediante processo eletivo.

É certo que existem posicionamentos contrários a isso na jurisprudência, tendo o STF já entendido na referida ADI não caber ao Estado-membro disciplinar, mesmo no âmbito da sua Constituição Estadual, a ordem de vocação das autoridades municipais, quando configuradas situações de vacância ou de impedimento cuja ocorrência justifique a sucessão ou a substituição nos cargos de Prefeito e/ou de Vice-Prefeito do Município. Só que, contrariamente a isso, defendo que a condição do Juiz de Direito da Comarca como substituto eventual do Prefeito Municipal de modo algum violaria a autonomia municipal.

Ora, se bem refletirmos, os Tribunais de Conta Estaduais são órgãos estaduais criados por deliberação autônoma dos respectivos Estados-Membros, com a finalidade de auxiliar as Câmaras Municipais na atribuição de exercer o controle externo. Ou seja, eles têm a incumbência de análise de contas do respectivo estado e de todos os municípios jurisdicionados e, da mesma maneira que a Constituição Federal veda que os Municípios criem seus próprios Tribunais, Conselhos ou órgãos de contas municipais, a Carta Magna também impede que tenhamos uma espécie de "Justiça Municipal".

Assim sendo, embora a autonomia municipal seja princípio constitucional, ela é limitada em inúmeros pontos. E, nesse contexto, da mesma maneira como o TCE ajuda a controlar as contas municipais sem ferir a autonomia do Município, o mesmo se admite quando o Juiz de Direito da Comarca passe a ser substituto eventual do Prefeito.

De qualquer modo, caberá agora ao Tribunal de Justiça decidir não só quem será o Juiz competente para processar e julgar a ação popular como também, consequentemente, precisará enfrentar a questão jurídica que se tornou controversa entre os magistrados. Logo, caberá à segunda instância determinar se deve ou não dar posse ao Juiz de Direito da Comarca como substituto do Prefeito, com fundamento no princípio da simetria, em interpretação analógica dos artigo 80 da Constituição Federal, ou exigir que a Câmara de Mangaratiba eleja novo presidente sem responder a processo criminal para responder interinamente pelo Executivo.

Vamos aguardar e ver qual será o posicionamento do Tribunal de Justiça.

Ótima sexta-feira a todos!

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