Para o dia 21 deste mês (próxima segunda-feira), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Movimento Advogados Unidos (MAU) estarão organizando um ato público previsto para acontecer às 11 horas em frente ao Fórum Central do Rio de Janeiro. O objetivo é lutar pelo fortalecimento/valorização da advocacia, protestando contra aquilo que está sendo chamado de "banalização de sentenças", referindo-se ao fato de que o Tribunal de Justiça do Estado, de uns tempos pra cá, teria passado a arbitrar valores irrisórios a título de indenização por danos morais nas ações movidas em face de grandes empresas:
"(...) De 2015 até o atual momento, o TJ/RJ decidiu proteger as grandes empresas em detrimento do que diz a Constituição Federal, o NCPC e o Código de Defesa do Consumidor. Ganhar uma ação contra uma grande empresa virou um ato de fé, pois no TJ/RJ a lei foi rasgada e ainda sim, quando se ganha, o valor é tão irrisório, que chega a dar vergonha de nossa profissão. Nos Juizados Especiais chega a ser pior, pois as sentenças já são menores que as propostas das grandes empresas e se ACASO a sentença for maior que R$ 3.000,00 (três mil reais), a empresa RECORRE e as TURMAS RECURSAIS sentenciam como MERO ABORRECIMENTO. Os absurdos cometidos pelas Turmas Recursais são tão graves, que o CNJ deveria fazer uma intervenção na atual composição, bastando para isso, assistir uma sessão da 1ª ou da 5ª Turma Recursal. Existe uma total clareza por parte dos advogados e de quem olha de fora, que o projeto do TJ/RJ é extinção do Dano Moral nos Juizados Especiais e diminuir ao máximo na justiça comum, fazendo com que os Autores não busquem mais a justiça, pois existe a certeza que não vai ganhar e SE ganhar, será um valor ínfimo (...)" (extraído da postagem de 12/10/2016 do MAU no sítio de relacionamentos Facebook)
Embora a bandeira levantada pelo digníssimo movimento possa em algum momento esbarrar no chamado princípio do livre convencimento, segundo o qual o magistrado forma o seu entendimento livremente acerca de um assunto na análise das provas, eis que de modo algum eu deixaria de apoiar esse ato do dia 21/11 por diversas razões. Isto porque, em que pese o direito do juiz poder considerar nas suas sentenças que certas violações praticadas contra os consumidores não geram dano moral, ou que este deva ser compensado por valores módicos, também os advogados e a sociedade em geral têm o direito de sustentar uma posição num sentido oposto.
Ademais, como vem noticiando a OAB/RJ, tratam-se de cinco questões que vêm travando o bom funcionamento do Judiciário estadual, com prejuízos diretos para advogados e para a sociedade em geral. Seriam estes:
- o alto valor das custas;- as sentenças de baixo montante que vêm sendo proferidas nos juizados especiais, classificadas como "mero aborrecimento" pelos juízes;- o péssimo atendimento prestado pela agência do Banco do Brasil;- a morosidade no andamento dos processos (lembrando que o TJ do Rio é o quinto tribunal do país em congestionamento); e- as sucessivas greves.
Quanto às greves, considero que a Ordem deveria era ser mais solidária com os servidores tanto do Judiciário quanto dos demais órgãos do Estado do Rio de Janeiro pois se trata de um direito constitucionalmente assegurado e que precisamos respeitar. Aliás, era para toda a população acampar a partir de amanhã próximo à ALERJ e exigir mudanças profundas nesse corrompido ente federativo do país, visto que as paralisações no serviço público só ocorrem porque os gestores contribuem para a formação de um quadro caótico. Desta maneira, precisamos saber direcionar corretamente nossas reivindicações para a verdadeira causa do problema.
Porém, no que se refere aos demais itens, estou de acordo com a OAB e percebo que esse movimento de valorização do dano moral poderá abrir um produtivo debate na nossa sociedade como vem sendo suscitado pelo MAU em sua página no Facebook. E aí, ainda que certas críticas possam ser dirigidas a alguns detalhes relativos aos argumentos expostos pelo movimento, a discussão me parece bem interessante. Até porque tem a ver com um tema que comecei a pesquisar por interesse próprio já nos tempos da faculdade.
Aliás, recordo que, em 2004, ano em que me formei, apresentei um trabalho visando discutir a aplicação do instituto da reparabilidade do dano moral nas relações de consumo (clique AQUI para ler), enfrentando os freqüentes questionamentos sobre a responsabilização do fornecedor nos casos em que não há sequer uma lesão à dignidade pessoal do ofendido que se manifeste através de dor, sofrimento ou humilhação. Elaborei um breve histórico da sua evolução (desde os tempos das leis mesopotâmicas e o Código de Hamurábi) e introdução no direito brasileiro até o atual momento marcado com a promulgação da Carta Republicana de 1988, defendendo, ao final, a criação de um novo mecanismo normativo para a composição de determinadas espécies de conflitos decorrentes da relação de consumo.
A meu ver, nem todos os aborrecimentos devem ser considerados como dano moral, a exemplo de um voo atrasar meia hora, uma chamada telefônica cair no curso da ligação ou de uma pizza queimar, sem que traga maiores consequências para o consumidor. Defendo que esse instituto jurídico deve resguardar valores mais elevados como aqueles que estão exemplificativamente determinados no artigo 5º, inciso X, da nossa Carta Magna, os quais são a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Porém, quando de fato ocorrer uma violação a ponto de atingir os bens da personalidade do indivíduo, deve o Judiciário aplicar uma sentença que de fato tenha um caráter compensatório para a vítima.
Voltando aos exemplos, enquanto o atraso de um voo, por si só, deveria representar apenas uma punição pecuniária para a empresa de aviação, a qual seria em parte recebida pelo consumidor junto com o órgão de fiscalização, a inscrição indevida do nome do devedor nos cadastros de restrição ao crédito precisa ser compensada com importâncias que realmente sejam proporcionais ao agravo sofrido. Aí, ao invés do Tribunal sair distribuindo muitas indenizações de pequeno valor, por reconhecer o dano moral de maneira ampliada, os magistrados só julgariam procedente o pedido quando de fato os bens da personalidade fossem atingidos e fixariam valores bem mais elevados dos que os atualmente praticados nas decisões, cabendo ao cidadão exigir dos seus representantes no Parlamento que criem leis prevendo a adoção de penas civis privadas contra os diversos atos ilícitos das empresas.
Para concluir, vale lembrar que a atividade jurisdicional do Estado deve buscar a promoção da paz social sendo o reconhecimento do dano moral um instituto valioso para se alcançar esse objetivo nas relações de consumo, ao mesmo tempo em que a sua aplicação não pode se tornar banalizada. Afinal, trata-se aí de proteger a dignidade da pessoa humana que é a base de nossa República, a qual, por coincidência, completa hoje 127 anos. Logo, nem os valores das indenizações devem ser baixos e tão pouco qualquer ato ilícito capaz de gerar mera contrariedade no indivíduo servir para a caracterização da lesão imaterial.
É como penso...
OBS: Imagem acima extraída da página do Movimento Advogados Unidos (MAU) no sítio de relacionamentos Facebook.
OBS: Imagem acima extraída da página do Movimento Advogados Unidos (MAU) no sítio de relacionamentos Facebook.
Que pena pessoas do Brasil não o comentarem pois os seus escritos são fabulosos que mereciam mais leitura e comentários por quem entenda o que escreve
ResponderExcluir.
Deixo carinhos
Olá, Raquel.
ExcluirObrigado pela sua visita e comentários.
Algumas pessoas daqui ainda comentam meus artigos sim, mas não tanto quanto no começo do blogue. É que a blogosfera brasileira perdeu audiência para outras redes sociais como o Facebook, Twitter, WhatsApp, Instagram, etc. Logo, não temos mais tantos movimentos por aqui quanto era na década passada e até o comecinho desta. Um exemplo foi a Confraria dos Pensadores Fora da Gaiola, u, blogue de postagens coletivas do qual faço parte como colaborador:
http://cpfg.blogspot.com.br/
De qualquer modo, agradeço por sua solidariedade e elogios.
Beijos.