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segunda-feira, 13 de julho de 2015

Quadros de um bisavô que não conheci




Neste último final de semana, fui a Juiz de Fora (MG) visitar a Sra. Diva Lopes Ancora Luz, a qual considero como minha segunda mãe, visto ter sido ela quem ajudou a me criar a partir da época em que entrei na 2ª série do ensino fundamental. Viúva há uma década de meu saudoso avô paterno Sylvio Ancora da Luz, ela completou recentemente seus 88 anos e esbanja muita saúde e disposição. Durante esse rápido passeio em Minas, aprovei para fotografar uns quadros que meu bisavô Francisco Ancora da Luz (pai desse avô) havia pintado, os quais encontram-se muito bem conservados na residência de Diva.

Não cheguei a conhecer esse bisavô, por ter ele falecido bem antes de meu nascimento, mas sei que foi oficial da Marinha durante a República Velha e também morou numa fazenda na localidade de Formoso (divisa entre o Rio de Janeiro e São Paulo), o que talvez ajude a explicar o seu gosto artístico por embarcações e paisagens campestres. Tal como o interessante navio à vela na foto acima pois, ao que parece, mesmo no começo do século XX, a nossa Marinha ainda deveria fazer uso da força dos ventos apesar de já existir o navio à vapor desde os tempos do Império.

Já neste outro navio do quadro abaixo, meu biso o teria pintado quando viajou para o Chile e passado pela chamada "Terra do Fogo", nome meio que incoerente para uma região tão gelada. E, naquele tempo da República Velha, fazia-se muito mais viagens pela Marinha do que na atualidade. Creio que por isto este bisavô sabia falar vários idiomas. Segundo vovô contava, seu Francisco era um homem culto, escrevia em jornais da época, muito embora tenha deixado as Forças Armadas e vivido seus últimos anos pobre.



Mas ele não andou apenas por lugares frios. Dentre os quadros que estão na casa da Diva (há mais pinturas com outros parentes meus), achei um que talvez se refira a um pedacinho de Fernando de Noronha. A paisagem retratada abaixo parece ser o Morro do Pico, ponto mais alto do arquipélago, com 323 metros, numa época em que os políticos brasileiros nem pensavam em transformar aquela colônia penal num parque ecológico como é hoje.



O vovô contava que o pai dele não suportava a vida militar pois gostava tanto da liberdade a ponto de um dia ter fugido do quartel para assistir a uma apresentação de ópera. Além disso, esse bisavô tinha uma paixão pelo campo de modo que resolveu pedir exoneração das Forças Armadas a fim de trabalhar na fazenda que pertencia à sogra. Conforme me relataram, morou por aproximadamente meia década nesta propriedade que se situava em Formoso, perto da divisa entre Rio de Janeiro com São Paulo. Nesto quadro a seguir, temos a bucólica paisagem do meio rural, porém numa época em que não havia tantos agrotóxicos nas lavouras e o gado pastava livre pelos campos sem que a carne desses animais fosse tão castigada pelas doses de hormônio.



Devido a uma controvérsia familiar, seu Francisco acabou deixando a fazenda e retornou ao Rio de Janeiro onde passou a trabalhar no extinto Lloyd. Foi morar com a esposa e os cinco filhos numa casa na Tijuca (acho que pagando aluguel) dependendo de um salário bem restrito. No entanto, não deixou de lutar para que seus filhos vencessem na vida. O primogênito Arnaldo tornou-se empresário. Já meu avô e o irmão mais novo Mário ingressaram no Exército e seguiram a carreira militar até o final. As duas irmãs foram pessoas honestas e de respeito na sociedade. E, apesar de todas as dificuldades, esse meu bisavô continuou pintando quadros e de modo algum não perdeu o gosto pelas artes. Continuou caminhando. Ou melhor dizendo, navegando...



OBS: Imagens feitas dia 11/07/2015 na casa da Diva, sendo todos quadros pintados pelo meu bisavô Francisco Ancora da Luz, alguns com restaurações posteriores feitas por terceiros amigos da família, inclusive por Jurema que foi minha fonoaudióloga quando tinha oito anos. Seu pai Francisco Carlos Ancora da Luz (1858-1888), assim como o meu Francisco Carlos Ancora da Luz (1946-1983), foi também engenheiro e faleceu prematuramente em Minas Gerais quando construía uma estrada de ferro do governo imperial. Devido a isso, o bisavô Francisco veio a ser criado também pelo avô dele, o rigoroso militar, político e ex-combatente da guerra do Paraguai, Francisco Carlos da Luz (1830 - 1906), mais conhecido na história de Santa Catarina como o Marechal Luz, onde existe até hoje um forte em sua homenagem. Todavia, nos primeiros anos da República Velha, a família já morava há tempos numa chácara situada nos subúrbios da então capital federal que era o Rio de Janeiro, considerando que Brasília não passava de um sonhado projeto.

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