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sábado, 18 de julho de 2015

Omissões benéficas



"Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora" (Evangelho de João 16:12; versão e tradução ARA)

Geralmente consideramos as omissões como sendo condutas equivocadas, medrosas e, em determinados casos, mal intencionadas. Acreditamos, se alguém deixa de compartilhar uma informação que tem conhecimento, estará prejudicando uma outra pessoa ou até à sociedade da qual pertence.

No entanto, as regras podem ter exceções e, no referenciado capítulo 16 do 4º Evangelho, encontramos um esclarecedor exemplo nas palavras de Jesus. Ali o Mestre, durante a última noite em que esteve com os seus seguidores antes da crucificação, decidiu confortá-los acerca dos acontecimentos futuros. Coisas que ele não havia falado no começo do discipulado, tipo a hostilidade dos próprios compatriotas, vieram a ser reveladas (verso 4). Porém, ainda restavam outros assuntos para comunicar e estes seriam ensinados posteriormente pelo "Espírito da verdade" (v. 13).

Em seu livro Coragem para evoluir, o administrador de empresas e estudioso da consciência Luciano Vicenzi descreve aquilo que chamou de "omissões superavitárias". Estas, segundo o autor, ocorrem

"Quando a consciência possuidora de maior lucidez e maturidade, conhecendo mais a fundo a realidade consciencial e um contexto e, portanto, com maior visão de conjunto, compreende que a revelação de determinada informação a outrem não ajudaria. Conforme a situação, poderia até causar um estupro evolutivo no outro, fato possível de ocorrer quando alguém recebe um nível de informação além do que é capaz de absorver, colocando-a num conflito íntimo desestabilizador. A omissão, neste caso, é pautada pelo uso do discernimento na dosagem correta da informação, visando a melhor assistência possível para aquele contexto, demonstrando maturidade na comunicabilidade." (1ª ed. Rio de Janeiro: IIPC, 2001, págs. 95 e 96) 

Refletindo acerca desses pensamentos, lembrei-me da inutilidade que há no excesso de críticas dirigidas a uma pessoa do nosso convívio, ainda que de maneira amorosa ou pretensiosamente com fins edificantes. Muitas vezes queremos corrigir o nosso próximo e resolvemos dizer-lhe tudo o que achamos a seu respeito. Porém, toda aquela carga de informações acaba sendo danosa pois, ao invés de auxiliarmos, geramos uma paralisadora perplexidade a ponto de bloquearmos o discernimento do receptor. Aí aquela palavra que fora dita buscando o bem acaba não produzindo o fruto esperado prejudicando mais o aprendizado do nosso irmão.

Voltando ao 4º Evangelho, observamos ali que a obra de transformação é operada pelo Espírito de Deus no coração do ser humano. Nós não convertemos e nem salvamos ninguém! É cada um em seu auto-aprendizado que se convence dos erros, daquilo que é justo e do triunfo do bem sobre o mal. E aí entendo que o próprio Jesus soube reconhecer a sua limitação como homem, admitindo que o trabalho por ele empreendido teria continuidade pela experimentação espiritual dos discípulos. Pois estes, na ocasião oportuna, seriam capazes de se lembrar das lições do passado e interpretariam as boas novas para as necessidades presentes (conf. Jo 14:26), compreendendo as mudanças que viriam no futuro.

Durante a nossa curta passagem por este mundo, percorremos um ou mais níveis de maturidade, sendo certo que todos temos o direito de progredir ou estagnar o próprio crescimento espiritual (cada qual é responsável pelas escolhas que faz). E podemos até ser ultrapassados por quem antes considerávamos um retardatário, surpreendendo-nos com as primeiras colocações dos últimos. Todavia, o sábio magistério da Vida mostra o quanto precisamos agir com sensibilidade diante das variadas situações, aguardando o tempo da colheita e o momento certo de falar na medida certa. Pois como bem ensina o capítulo 3º do livro bíblico de Eclesiastes, existe ocasião certa "para cada propósito debaixo do céu"...

Uma ótima semana para todos!


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