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quarta-feira, 15 de abril de 2015

O plano de saúde mais acionado do Rio




Taí os fatos que não me deixam mentir! Através de um sistema de consultas da página do Tribunal do Rio de Janeiro, qualquer internauta pode conferir os nomes das empresas mais acionadas na Justiça fluminense. Basta acessar diretamente este endereço: http://www4.tjrj.jus.br/MaisAcionadas/

Pois é, meus amigos. Ao verificar como andam as insatisfações dos consumidores em meu estado, observei que o plano de saúde mais reclamado judicialmente vem a ser justamente o UNIMED, do qual eu e minha esposa Núbia somos usuários.

Problemão, não?! Mas o fato é que, nas reclamações do Juizado Especial Cível (JEC), que tramitam pelo rito sumaríssimo da Lei Federal n.º 9.099/95, a operadora consta em 20º lugar dentre todas as companhias dos variados setores (bancos, concessionárias de telefonia, grandes varejistas, etc), com 4.946 ações distribuídas só nos últimos 12 meses. Já na Justiça comum, a empresa sobe mais onze posições no ranking ficando em 9ª com 2.855 reclamações judicializadas no mesmo período entre abril/2014 e março/2015. E há cinco anos tem sido o plano de saúde campeão de processos: 26º no JEC e 15º nas Varas Cíveis entre todos os réus acionados na Justiça do Rio.

Por duas vezes, Núbia já precisou processar o UNIMED. A mais recente ação foi por causa da sua cirurgia bariátrica marcada pra janeiro como relatei no artigo Blogueiro ainda tentando retornar, publicado em 03/02 do corrente ano. Na ocasião, conseguimos que o juiz daqui de Mangaratiba concedesse uma liminar em seu favor. Eis a decisão do magistrado conforme extraída do site do Tribunal, sendo meu o destaque em negrito:

"PROCESSO Nº 000064-90.2014.8.19.0041 DECISÃO Trata-se de requerimento de antecipação de tutela em que a parte autora objetiva a realização de cirurgia bariátrica para tratamento de obesidade mórbida. Inicialmente, DEFIRO A GRATUIDADE DE JUSTIÇA, já que o pedido neste sentido preenche os requisitos legais. Ante ao quadro de risco de morte da requerente comprovado pelo laudo de fls. (...) Presente a verossimilhança das alegações da autora, consubstanciada nos documentos que acompanham o requerimento inicial (fls. 24/30), dando conta que o requerente apresenta obesidade mórbida, esteatose hepática, osteartrose e osteoporose, que indicam a realização do procedimento cirúrgico pretendido, segundo as diretrizes do Sistema de Saúde. Note-se que o documento de fls. 39 apresentado pelo réu como Diretrizes de Utilização na Saúde Complementar trazem no Grupo I, alínea 'a' todas as indicações para que a parte autora seja submetida ao referido procedimento cirúrgico, sendo certo que pelos documentos acostados a parte autora comprova todos os requisitos pedidos pelo réu, o que torna, em princípio, sem fundamento idôneo a negativa de autorização por parte do réu. O periculum in mora, vale dizer, o receio de dano irreparável ou de difícil reparação, está óbvio em razão do risco de agravamento da saúde da autora e da demora em recuperar sua saúde e assim ter uma vida digna, ao que faz jus. Ante o exposto, CONCEDO A TUTELA ANTECIPADA, para determinar que os réus autorizem a realização do procedimento cirúrgico bariátrico na autora, conforme prescrito pelos médicos que a acompanham. Citem-se e Intimem-se, expedindo as Cartas Precatórias necessárias. Mangaratiba , 09 de janeiro de 2015 MARCELO BORGES BARBOSA Juiz de Direito"

Talvez alguém me questione por que eu e Núbia ainda continuamos como clientes dessa companhia. Mas é simples de responder. A verdade é que ruim com o UNIMED, pior sem ele. Pois como moramos no interior do Rio, quem melhor oferece cobertura médica na região a um preço mais ou menos acessível para as nossas condições é justamente essa complicada empresa. Daí, se formos depender somente do SUS, fica inviável cuidarmos adequadamente da nossa saúde. Basta qualquer cidadão abrir os jornais, ou assistir um pouquinho de TV, para ver o estado crítico dos hospitais públicos brasileiros...

Diante de uma situação dessas, cabe à Justiça pesar a caneta fixando indenizações por danos morais em patamares mais elevados do que as importâncias hoje em dia arbitradas nas decisões dos senhores magistrados. Diante da recalcitrância do UNIMED no cumprimento da lei e dos contratos, geralmente de forma imotivada, tem-se a necessidade de que o Judiciário estabeleça o correto equilíbrio nas relações jurídicas entre fornecedor e consumidor, de maneira que o instituto do dano moral precisa ser valorizado, em prol do consumidor, nas hipóteses em que este vier a ser ilegalmente lesado.

Infelizmente tenho verificado o oposto nos julgados do Rio, tanto nos Juizados Especiais, nas Turmas Recursais, nas Varas Cíveis e nas Câmaras do Tribunal de Justiça. Certamente que há variações nas decisões entre magistrados e os diversos colegiados do TJ. Contudo, não considerei suficientes os valores arbitrados para os casos em que ocorre uma negativa injustificada por parte do plano de saúde em fornecer medicamentos específicos, disponibilizar o atendimento home care, autorizar certos exames, cirurgias necessárias ou materiais solicitados pelos médicos para o tratamento de seus pacientes. Senão vejamos as seguintes ementas de alguns julgados entre 2014 e 2015:

"AGRAVO INOMINADO. APELAÇÃO. CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO DE EXAME. PRAZO DE CARÊNCIA. ABUSIVIDADE DA CONDUTA DA PRESTADORA DE SERVIÇOS. CADEIA DE PRESTAÇÃO. SOLIDARIEDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Cuida-se de ação de obrigação de fazer c/c indenizatória fundada na recusa de exame necessário ao restabelecimento da saúde do segurado, ao argumento de que a carência prevista no contrato não fora cumprida. Registre-se que, ao contrário do que defende a apelante (UNIMED), as rés formaram evidente cadeia de prestação de serviços, exsurgindo daí a responsabilidade solidária. Posição do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "a operadora do plano de saúde está obrigada ao cumprimento de uma boa-fé qualificada, ou seja, uma boa-fé que pressupõe os deveres de informação, cooperação e cuidado com o consumidor/segurado. (REsp 418.572/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2009, DJe 30/03/2009). Recusa ilegítima da operadora em autorizar o exame. Falha na prestação do serviço. Dano moral inconteste. A quantia de R$ 8.000,00 se afigura suficiente e adequada a compensar os danos extrapatrimoniais causados ao consumidor, idoso, que teve negada a autorização para a realização do exame necessário ao restabelecimento de sua saúde, sem que para tanto tivesse contribuído, atendendo ao caráter punitivo-pedagógico da medida. Ausência de argumento capaz de ilidir os termos da decisão monocrática. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (0020262-83.2013.8.19.0042 - APELACAO - DES. MARIA LUIZA CARVALHO - Julgamento: 24/02/2015 - VIGESIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR)

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. PLANO DE SÁUDE. UNIMED. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. SOLIDARIEDADE. RECUSA EM AUTORIZAR PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO CARACTERIZADA. INFRINGÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANO MORAL CONFIGURADO. - Autor, que apresentava quadro clínico grave, com necessidade de se submeter a procedimento cirúrgico. - Ausência de autorização da operadora de plano de saúde. - Autorização que se deu mediante decisão antecipatória dos efeitos da tutela. - Demora injustificada do plano de saúde, causando maior expectativa e angústia no paciente, que tinha urgência na realização da cirurgia, como diagnosticado por médico especialista. - Dano moral in re ipsa configurado. Enunciado nº 209 desta Corte. Quantum indenizatório que não se coaduna com os princípios norteadores do instituto da reparação civil e ao grau de reprovabilidade da conduta da ré. - Majoração da condenação dos danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais), estando este valor dentro dos parâmetros usualmente aplicados por este Colegiado. - Recurso da parte autora provido. Recurso da parte ré a que se nega seguimento." (0119356-64.2012.8.19.0001 - APELACAO - DES. TEREZA C. S. BITTENCOURT SAMPAIO - Julgamento: 23/03/2015 - VIGESIMA SETIMA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR)
"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA CUMULADA COM DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. UNIMED. NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE PRÓTESE PARA REALIZAÇÃO DE CIRURGIA. PROCEDIMENTO QUE É NECESSÁRIO PARA A MANUTENÇÃO DA VIDA DO AUTOR. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS AUTORAIS. DANOS MORAIS ARBITRADOS EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS) QUE ORA SE MANTÉM. RECUSA ILEGAL APLICAÇÃO DA SÚMULA 209 DO TJERJ. RECURSO QUE SE CONHECE E NEGA-SE PROVIMENTO. (0480099-64.2012.8.19.0001 - APELACAO - DES. ANDREA FORTUNA TEIXEIRA" - Julgamento: 02/03/2015 - VIGESIMA QUINTA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR)
"Apelações cíveis. Parceria firmada entre CAARJ e UNIMED. Alteração do plano de saúde que não se limitou à extensão da rede credenciada. Ação de obrigação de não fazer, em que se discute a legalidade da negativa contratual acerca da cobertura do serviço médico denominado home care, anteriormente autorizado. Paciente vitimada por um quadro grave de deficiência respiratória. Tratamento domiciliar que se mostrava adequado ao caso, tanto que inicialmente o serviço foi autorizado pela seguradora, porém cancelado. Finalidade específica de melhorar a qualidade de vida da paciente, evitando riscos de sua morte. Cláusulas limitativas que devem ser interpretadas restritivamente. Ilegitimidade passiva da empresa prestadora de serviço de home care, que figura como segunda apelada. Falecimento da autora no curso do processo. Dano moral in re ipsa. Valor indenizatório arbitrado em R$6.000,00 (seis mil reis) que observa os precedentes desta Câmara Cível, principalmente porque a autora era pessoa idosa e enfrentou a angústia do desamparo contratual no momento em que mais necessitava. Apelos improvidos." (0094947-29.2009.8.19.0001 - APELACAO - DES. CELSO PERES - Julgamento: 09/03/2015 - DECIMA CAMARA CIVEL)

"Agravo Interno. Ação de Obrigação de Fazer versando sobre fornecimento de medicamentos específicos. Unimed no polo passivo. Sentença que julgou procedente o pedido, mas não reconheceu o dano moral. Apelo ofertado pela autora. Decisão monocrática dando provimento parcial ao recurso fixando o dano moral em R$5.000,00. Inconformismo por parte da autora. Agravo Interno apreciado nesta oportunidade. Tentativa por parte da agravante de reabrir matéria de mérito, pretendendo a reforma da decisão sob a ótica que melhor lhe convém. Argumentos trazidos para nova apreciação que não ensejam modificação na decisão monocrática, que se encontra bem fundamentada, razão pela qual, NEGA-SE PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO." (0057440-29.2012.8.19.0001 - APELACAO - DES. SIRLEY ABREU BIONDI - Julgamento: 19/11/2014 - DECIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL) 

Bem sei que há decisões no TJ de casos semelhantes a esses com valores que chegam a 20 mil reais e até um pouquinho mais. Porém, entendo que situações assim deveriam justificar o arbitramento de indenizações no patamar de pelo menos uns R$ 50.000,00 afim de melhor disciplinar as operadoras de plano de saúde. Pois só doendo no bolso é que tais empresas passarão a respeitar o paciente, cumprindo as disposições do contrato e acatando as leis.

Ora, será que as associações de defesa do consumidor, os advogados interessados e atuantes na área, bem como a própria OAB não poderiam fazer um movimento em prol da valorização do instituto do dano moral?! Porque da maneira como as coisas vão, se a Ordem não se mexer, o exercício da advocacia no campo da responsabilidade civil tende a ficar cada vez menos atrativo com profissionais recusando casos de relevância social a exemplo das ementas acima transcritas. Ou então as pessoas lesadas começariam a desistir de procurar a Justiça quando não puderem ser atendidas gratuitamente ela Defensoria Pública. Por exemplo, se a indenização do consumidor for fixada apenas em 10 mil reais mais sucumbência de 10% sobre a condenação (verba paga pela parte vencida ao patrono do vencedor), a totalidade remuneração do causídico acabará sendo algo de três a quatro mil reais, o que é pouco nos padrões de hoje tendo em vista o tempo de duração de um processo. E, por outro lado, se os honorários passarem disso, quanto sobraria então para o cliente que sofreu o dano recebendo uma indenização tão pequena?! Logo uma situação dessas favoreceria mais ainda as empresas.

Além das decisões dos tribunais brasileiros a respeito dos abusos cometidos pelos planos de saúde, também a própria ANS, agência reguladora do governo federal, deve começar a cumprir com a sua parte. E vou mais longe ainda! Ressalto que, se algum dia o SUS passar por uma considerável melhora, recebendo os prometidos royalties do pré-sal (sem haver roubalheiras), teremos uma concorrência de peso da saúde pública que, por fim, obrigaria companhias como o UNIMED, a GOLDEN, a AMIL e o BRADESCO a investir melhor na qualidade de seus serviços.

Lutemos por isso!


OBS: Ilustração acima extraída de http://www.novafriburgoemfoco.com.br/noticia/p-veja-a-lista-das-empresas-mais-questionadas

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