"Onde não há conselho, fracassam os projetos,
mas com os muitos conselheiros há bom êxito."
(Pv 15:22; ARA)
Os antigos hebreus, embora não tivessem conhecido a democracia, deram ao diálogo um grande valor. É o que podemos observar através da leitura bíblica do livro de Provérbios. Os reis de Israel não deveriam tomar decisões sozinhos, mas, sim, cercarem-se de conselheiros sábios que os auxiliassem no comando da nação como fizeram Davi e Salomão.
Dispor-se a ouvir deve ser a característica de todo governante, gestor empresarial, diretor de escola, pastor de igreja, líder de associação e também do chefe de família. Não podemos confundir a autoridade com o autoritarismo! Logo, mesmo numa casa, sendo o marido o cabeça, ele precisa ser capaz de escutar o que a esposa e os filhos têm a lhe dizer. E, não raramente, encontramos mulheres mais sábias do que muitos homens...
O pastor de uma igreja que submete suas ideias e projetos a reuniões do conselho e ainda dialoga com a membresia, através de assembleias gerais (ou mesmo no culto), tem boas chances de brilhar em seu ministério. Pois, ao invés do líder apenas comunicar aquilo que pretende fazer, considerando ser já uma direção divina, por que não perguntar às pessoas o que elas acham? E verdade seja dita, a participação é umas das coisas que menos encontro nas congregações cristãs existentes no Brasil ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos.
Recentemente, a Câmara dos Deputados jogou fora uma oportunidade de ouro de promover um avanço da nossa democracia quando, no apagar das luzes, decidiu derrubar o Decreto n.º 8.243 /2014 da presidente Dilma Rousseff que cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS). Embora a sua proposta tenha sido formar conselhos na administração pública (não dentro do Legislativo), nossos parlamentares reacionários não quiseram que o povo participasse da gestão pública. Aliás, fizeram daquela votação ridícula uma espécie de resposta política ao governo (certamente visando futuras negociatas) após a apertada vitória do PT nas eleições. E os mais obtusos resolveram atacar Dilma de ser "bolivarianista" como se os organismos colegiados criados pelo decreto imitassem o regime venezuelano.
Conforme eu já havia escrito no artigo Um governante deve estar disposto a ouvir!, postado aqui em 19/10, as críticas ao decreto não têm passado de um oportunismo demagógico, sendo certo que os conselhos propostos pela Dilma não seriam nada novo no cenário político brasileiro visto já existirem aos montes, no âmbito dos municípios, organismos colegiados de participação (uns consultivos e outros deliberativos). Pois há décadas que tanto o PT quanto os partidos da própria oposição já criaram espaços em suas prefeituras para as lideranças sindicais, patronais, comunitárias e estudantis contribuírem para a formulação de políticas públicas por meio de seus posicionamentos. Um ótimo exemplo seria a área da saúde assim como a política de recursos hídricos estabelecida pela Lei Federal nº 9.433/97, sancionada durante o tucano governo FHC.
A meu ver, o Planalto pode muito bem ir ao STF contra essa absurda derrubada do decreto presidencial. Pois não pode o Legislativo querer se meter no Executivo quanto ao seu modo participativo de gestão assim como seria incorreto a presidenta, por exemplo, resolver proibir uma iniciativa da Câmara dos Deputados em fazer algo semelhante na sua organização interna, tipo permitir que representantes de ONGs ou de instituições de ensino tenham uma participação técnica dentro das comissões da casa legislativa. Entendo que pode haver pontos no decreto que precisam ser modificados para democratizar ainda mais o governo, mas já é um bom ponto de partida as entidades da sociedade civil poderem contribuir com maior proximidade dialogal para a elaboração de políticas públicas.
Como este meu texto não se encerra no assunto sobre o decreto, concluo o artigo focando numa questão cultural que são os comportamentos autoritários do brasileiro. Estamos muito mal acostumados a ouvir e a dialogar com o outro. Nossa história está recheada de decisões obscuras das autoridades e que, devido a isso, nunca lhes interessou consultar a população sobre o que ela pensa. Assim sendo, acredito ser fundamental criarmos no país a chamada "cultura do diálogo" sobre a qual o papa Francisco muito bem falou durante sua visita ao Rio de Janeiro em julho de 2013. Eu, embora não seja católico romano, considero bem sábias as palavras do respeitável pontífice cristão, pois, infelizmente, tanto os governantes quanto as pessoas da sociedade (inclusive líderes religiosos) ainda se encontram bem distantes de trocarem conselhos. Mas tomara que isso um dia mude!
Um ótimo final de semana para todos!
OBS: A ilustração acima foi extraída de uma notícia da Agência Brasil de Notícias com créditos autorais da imagem a Antonio Cruz conforme consta em http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-05/governo-lanca-politica-para-estimular-participacao-social-nas-decisoes
Rodrigo, o legislativo, na prática quase não existe. Serve apenas de instrumento para reeditar e editar as medidas provisórias do governo. Medidas provisórias essas, que deveriam só ser usadas em caso de extrema necessidade. É consenso entre advogados, ministros do supremo, cientistas políticos, que está havendo abuso no uso desse expediente. Medidas provisórias que só favorecem o goveno em sua sanha de gastar com projetos os mais absurdos, criminosos e fascistas.
ResponderExcluirPara ficar em uma, entre as centenas de medidas absurdas de iniciativa do inepto governo do PT, cito esta: "Uma medida provisória ditatorial foi editada por Dilma em julho de 2013 para obrigar um aluno de uma faculdade, inclusive particular, a trabalhar dois anos para o SUS no Amapá, no Piauí, em Rondônia, no interior de Minas, do Rio Grande do Sul ou onde seja?"
Não estamos em Cuba, na Bolívia, nem na Coreia do Norte, não é Rodrigo?
Boa tarde, Levi.
ExcluirEsse uso excessivo de medidas provisórias já é usado há tempos, antes mesmo do PT chegar ao poder. Foi assim com FHC e continuou sendo com Lula e Dilma. Na prática as MPs acabaram substituindo os antigos decretos-lei do regime militar afim de se garantir governabilidade...
Bem, eu acompanho o Congresso Nacional indo além das reportagens mostradas na TV e nos jornais. E, sendo assim, posso dizer que o Legislativo brasileiro até que tem bons quadros, projetos interessantes e trabalhos que dão gosto nas respectivas comissões da Câmara Federal. Ainda assim, a maioria dos congressistas é formada por gente conservadora e mais preocupada com os interesses próprios, de seus grupos corporativos, etc. Porém, se houvesse mais condições do cidadão interagir com os parlamentares, creio que haveria uma mudança significativa para melhor. Por exemplo, se os representantes das entidades sindicais, de ONGs, igrejas e das instituições de ensino/pesquisa pudessem estar presentes nas comissões da Câmara, tendo ainda direito a voz, o colorido ficaria ainda mais nítido, não acha? E penso também que os projetos de lei de iniciativa popular deveriam ficar condicionados a um número menor de assinaturas, o que facilitaria bastante o acesso do cidadão ao poder.
Finalmente, quanto ao fato de um estudante de Medicina ter que trabalhar dois anos para o SUS, considero benéfico. Seria uma espécie de serviço militar, porém exercido em instituições civis de saúde. Muito bom para o aluno e para o usuário carente que necessita tanto desses profissionais já que temos no Brasil uma quantidade bem pequena de médicos para o número de habitantes quando comparado com EUA, Canadá e Europa. Não somos Cuba, nem Bolívia e nem Coréia do Norte. Somos uma democracia em construção e que precisa ser ainda bem consolidada com responsabilidade cívica e compromisso com o social.
Um abraço.
Ótima postagem. Concordo plenamente com tudo que você escreveu. Inclusive com o comentário-resposta.
ResponderExcluirBoa noite, Lacerda!
ExcluirObrigado aí por sua visita e comentários ao blogue.
Participe sempre que desejar!
Um abraço.