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sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Até que ponto um "agrado" caracterizará ou não suborno?



"O presente que o homem faz
alarga-lhe o caminho
e leva-o perante os grandes."
(Provérbios 18:16; ARA) 

No dia 14 deste mês, escrevi aqui no blogue o artigo A pedra mágica do suborno na sociedade brasileira, no qual critiquei esse danoso comportamento em nosso país. Hoje, porém, dando sequência à minha leitura devocional da Bíblia, cheguei ao intrigante versículo acima que se refere ao "presente" dado às autoridades.

Como se sabe, as Escrituras foram escritas originalmente em língua semita (maior parte em hebraico) e o que temos ao nosso alcance são termos traduzidos para o idioma português. Assim, no verso 8 do capítulo 17 (assunto debatido na outra postagem), a escolha do tradutor foi a palavra "suborno", mas que também pode significar "presente"...

Situação controversa, não? Porém considero que a questão em estudo pode ir bem além das interpretações bíblicas tratando-se de algo muito atual para a sociedade em que vivemos.

Desde os tempos antigos, era comum os moradores de uma cidade presentearem uma autoridade qualquer quando esta chegava ao lugar. Tratava-se de uma prática amistosa e que não configurava suborno se, por exemplo, um juiz recentemente nomeado, viesse a ser recepcionado por um caminhão de frutas, legumes, móveis para sua futura casa, artesanatos feitos pelos moradores locais, uma cachacinha da roça, imagens religiosas, etc. E não duvido que as coisas ainda sejam assim em alguns municípios interioranos do nosso imenso Brasil, apesar dos magistrados hoje ganharem muito bem e muitos até recusarem presentes.

Entretanto, agrados desse tipo não costumam ser presentes totalmente desinteressados. No fundo, o ofertante deseja ganhar a simpatia da autoridade e quem sabe até a sua amizade, esperando ter um melhor diálogo e quem sabe até contar com a sua simpatia nas decisões tomadas. E o que os cidadãos davam aos juízes dificilmente faziam por um pobre.

A meu ver, as circunstâncias de cada caso é que definirão se o "agrado" será ou não um suborno. Realisticamente falando, embora a prática de dar presentes ajude na obtenção de resultados favoráveis, é preciso sempre haver limites. Pois, a partir do momento em que a pessoa busca influenciar as decisões administrativas e judiciais em favor de seus interesses específicos, tenham estes valor econômico ou não, aí a corrupção fica caracterizada.

No versículo 14 do capítulo 21 de Provérbios, o autor sagrado diz algo que me pareceu bem interessante, sendo pertinente a esta reflexão:

"O presente que se dá em segredo abate a ira,
e a dádiva em sigilo, uma forte indignação."

Como se vê acima, embora ambas as palavras corram juntas, as duas linhas deste dito de sabedoria são sinônimas tendo o mesmo significado. Isto é, o termo "presente" aqui cuida-se, na verdade, de um inequívoco suborno. E nós brasileiros, sofrendo há mais de 500 anos de corrupção, sabemos muito bem o quanto tais "agrados" nos deixam indignados uma vez que coisas do tipo interferem nos direitos coletivos da maioria beneficiando sempre uma minoria privilegiada. Por essas e outras, observo que a Bíblia condena expressamente o fato de uma autoridade aceitar vantagens ilícitas, tendo Moisés considerado que "o suborno cega até o perspicaz e perverte as palavras do justo" (Ex 23:8).

Caro leitor, embora a nossa nação esteja tão decepcionada com os escândalos que a todo momento são noticiados pela mídia, vale a pena lutarmos por um país sem corrupção. Ao invés de assimilarmos a ideia de que seja preciso pagar propina, mesmo que para uma empreiteira calçar com paralelepípedos a rua de uma cidade (lembrando aqui das declarações ditas recentemente à imprensa pelo advogado de uma empresa), penso que essa cultura precisa mudar. E, se o empreendedor começar a denunciar as condutas ilícitas ao invés de se mostrarem coniventes, as coisas certamente vão começar a mudar. Lutemos por isso!

Tenham todos um excelente descanso semanal!


OBS: Ilustração acima extraída de http://kronosekairos.blogspot.com.br/2012/04/o-doce-suborno-confunde-ate-os-mais.html

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