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sexta-feira, 26 de julho de 2013

O exercício da fé no ministério da Igreja



"No dia seguinte, ao descerem eles do monte, veio ao encontro de Jesus grande multidão. Eis que, dentre a multidão, surgiu um homem, dizendo em alta voz: Mestre, suplico-te que vejas meu filho, porque é o único; um espírito se apodera dele, e, de repente, o menino grita, e o espírito o atira por terra, convulsiona-o até espumar; e dificilmente o deixa, depois de o ter quebrantado. Roguei aos teus discípulos que o expelissem, mas eles não puderam. Respondeu Jesus: Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco e vos sofrereis? Traze o teu filho. Quando se ia aproximando, o demônio o atirou no chão e o convulsionou; mas Jesus repreendeu o espírito imundo, curou o menino e o entregou a seu pai. E todos ficaram maravilhados ante a majestade de Deus. Como todos se maravilhassem de quanto Jesus fazia, disse aos seus discípulos: Fixai nos vossos ouvidos as seguintes palavras: o Filho do Homem está para ser entregue nas mãos dos homens. Eles, porém, não entenderam isto, e foi-lhes encoberto para que o não compreendessem; e temiam interrogá-lo a este respeito." (Lucas 9:37-45; ARA)


Dando continuidade ao estudo sequencial do Evangelho de Lucas, iniciado em junho neste blogue, chegamos agora a mais um caso de assédio espiritual em que Jesus liberta um menino da obsessão maligna.

Como podemos ler em seu contexto a passagem bíblica citada, o Senhor havia descido do monte da Transfiguração, onde passara a noite orando na companhia de Pedro, Tiago e João e tiveram uma experiência marcante com a aparição de Moisés e de Elias. Os outros discípulos, porém, permaneceram na planície à espera do Mestre e, pelo que dá para supormos, eles teriam sido procurados pelas multidões para atenderem seus pedidos de cura conforme a autoridade que lhes fora concedida anteriormente (Lc 9:1-2).

Se comparado com o relato original de Marcos 9:14-29, o texto de Lucas é bem mais breve, o que nos dificulta entender certos detalhes não explicados como, por exemplo, o motivo pelo qual os discípulos não conseguiram expulsar o demônio. Desconhecemos pelo 3º Evangelho os ânimos das multidões e a contenda formada anteriormente com os escribas. Porém, se o autor sagrado optou por uma versão mais curta, talvez foi porque desejou focar somente em alguns aspectos ao invés de todos.

Da mesma maneira como Moisés havia encontrado descrença entre os filhos de Israel, quando desceu do monte Sinai (Êxodo 32), algo semelhante sucede com Jesus aqui. Dentre a multidão, vem um pai atribulado por causa da doença espiritual de seu filho e relata ao Senhor o que sucedia ao menino bem como o insucesso dos discípulos diante da causa apresentada. Tratava-se, pois, do seu unigênito (verso 38), o que, certamente, aumentava todo o sofrimento numa situação capaz de deixá-lo impotente para resolvê-la. Provavelmente o filho significasse todo o sentido da vida daquele homem e ele não desistia de procurar a solução mesmo com o fracasso dos discípulos.

Em sua resposta (v. 41), Jesus parece impaciente. Sua admoestação é dura e não dá para precisar se ele dirige tais palavras às multidões ali presentes, aos discípulos, aos escribas não mencionados por Lucas ou ainda ao pai do menino (este é o que parecia ainda acreditar). Não descarto a possibilidade de que a todos ali estivessem faltando uma fé suficiente para enfrentarem as forças do mal. Seus seguidores que, anteriormente, foram comissionados para pregarem com êxito nas cidades e aldeias de Israel, desta vez mostraram inabilidade ao lidarem com o novo caso. Suponho até que aquela frustração tenha feito parte do ensino do Mestre, estando implícita nas palavras destacadas a predição de sua morte que é mais uma vez mencionada a partir do versículo 44.

Jesus encarou o desafio e curou o menino daqueles ataques espirituais sendo notada pelo evangelista a reação do demônio à sua presença e autoridade como no episódio de Gerasa (Lc 8:26-34). O novo caso de possessão era também uma prisão da comunidade onde Jesus se encontrava devido à falta de fé das pessoas. O espírito maligno é expulso como nas outras situações já vistas e, desta vez, não fala nada. No final, todos se maravilham dando crédito a Deus pelo milagre (v. 43).

Ainda assim, Jesus vai preparar os discípulos para a sua partida. Não era para eles continuarem na eterna dependência do Mestre. Quando se ausentassem, aqueles seguidores precisariam lidar com outras situações também difíceis em que não poderiam deixar de exercer liderança e serem persistentes no combate ao mal.

O Filho do Home estava para ser entregue (v. 44). Naquele momento, até a predição da morte de Jesus não era entendida ainda pelos discípulos. O versículo 45 não diz claramente como "foi-lhes encoberto para que não o compreendessem", isto é, o que teria impedido a cognição ou aceitação por eles quanto ao que falou nosso Senhor e vejo que o medo parece tê-los bloqueado. Os seus seguidores não queriam nem saber como ficaria a vida deles sem a presença física do Mestre. Até para tocarem no assunto faltava coragem!

Entretanto, como o mais brilhante professor/treinador que o mundo já conheceu, Jesus soube como ir trabalhando nas mentes dos discípulos para que eles dessem continuidade ao processo de construção do Reino de Deus após a sua inevitável partida. Ele sabia que o medo é um dos sentimentos que se opõe à fé e que esta seria o ingrediente necessário para a Igreja enfrentar os mares com suas ondas de lutas e de dificuldades. Como um bom líder, ele sabia que o ambiente da "planície" não era o mesmo do "monte" onde se refugiava nos braços do Pai nos íntimos momentos de oração.

Aprendemos, assim, várias lições com este episódio. Tanto para o exercício da liderança como em relação ao uso da fé. Em todos os casos, esta sempre precisará estar junto. Quem conduz um ministério, deve confiar permanentemente no Pai todas as vezes em que descer do "monte" e não encontrar as coisas fluindo como deveriam. Terá que acreditar sempre no sucesso do trabalho, não se esquecendo de que a obra não é de um homem só, mas de Deus. O pastor humano um dia deixa o rebanho, mas o Eterno continuará cuidando das ovelhas, ensinado a todas elas para que saibam apoiar umas às outras.

Tenhamos sempre fé!


OBS: A ilustração usada neste artigo refere-se a uma das gravuras do livro ilustrado Les très riches heures du duc de Berry (em português As três mui ricas horas do duque de Berry) do século XV. Extraí da imagem do cervo virtual da Wikipédia em http://en.wikipedia.org/wiki/File:Folio_166r_-_The_Exorcism.jpg

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