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domingo, 10 de abril de 2011

Nós temos o direito de construir a usina de Belo Monte?


Achei super correto a OEA (Organização dos Estados Americanos) ter criticado o Brasil pelo projeto de construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA). Sua Comissão de Direitos Humanos enviou um pedido afim de que “el Gobierno de Brasil suspenda inmediatamente el proceso de licencia del proyecto de la Planta Hidroeléctrica Belo Monte y que impida la realización de cualquier obra material de ejecución”.

Para a OEA, o governo brasileiro deve suspender as obras na área do empreendimento, caso as demandas das populações indígenas afetadas não sejam satisfeitas. Segundo especialistas e lideranças locais, um trecho de aproximadamente 100 quilômetros do rio, onde estão situadas algumas tribos, poderá secar com a construção da usina.

Adicionalmente, la CIDH solicitó al Estado garantizar que (...) las comunidades indígenas beneficiarias tengan acceso a un Estudio de Impacto Social y Ambiental del proyecto, incluyendo la traducción a los idiomas indígenas respectivos”, acrescentou o comunicado da OEA.

De fato é uma insanidade o governo brasileiro investir bilhões de reais do dinheiro público num empreendimento danoso para o meio ambiente e populações indígenas locais da Amazônia. Algo que não suprirá satisfatoriamente a demanda energética do país já que as indústrias estão concentradas na região centro-sul, de modo que parte significativa da produção de Belo Monte acabará sendo dissipada durante a sua transmissão até às unidades consumidoras.

Ao tomar conhecimento dos telejornais sobre a reação do Brasil quanto ao posicionamento da OEA, não pude deixar de condenar a prepotência nacionalista do nosso governo, o que chegou a lembrar os arrogantes presidentes militares da época da ditadura. Pois estes foram causadores de muitos males ao meio ambiente com as perdulárias obras faraônicas a exemplo da Transamazônica, das hidrelétricas de Itaipu e Tucuruí, da usina atômica de Angra dos Reis e a Ferrovia do Aço. Porém, mentalidade tanto dos parlamentares governistas quanto os da oposição continua mantendo a mesma visão estreita dos generais, como se pode verificar nas palavras deste senador tucano, ao considerar "absurda" a recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA:

A OEA está entrando numa questão que diz respeito à soberania do Brasil, não há sentido. A OEA poderia dar uma contribuição sobre os pontos que, ao juízo dela, deveriam ser melhor avaliados", afirmou Flexa Ribeiro (PSDB-PA), presidente da subcomissão de acompanhamento das obras de Belo Monte no Senado

A meu ver, nós, brasileiros, precisamos nos libertar do nacionalismo aprisionador de uma era passada e buscarmos um novo olhar para os recursos naturais. Falo de uma visão que seja livre de conceitos ultrapassados como a “soberania nacional” afim de nos tornarmos adeptos de uma globalização solidária e que esteja baseada numa consciência planetária.

Neste sentido, entendo que o Brasil e os demais países do norte da América do Sul são apenas guardiões de um dos maiores patrimônios naturais da biosfera – a Amazônia. Pois para mim as florestas e os demais ecossistemas em geral (tanto os terrestres quanto os aquáticos) não devem ser destinados apenas a uma nação ou mesmo à humanidade, mas sim à coletividade de seres vivos que povoam o planeta.

O que defendo vai além do principal argumento da OEA que preocupou-se com as populações indígenas, pois proponho que tenhamos uma visão naturo-centrista que supere as limitações do antropocentrismo, visto que nem os brasileiros, os índios da América do Sul ou o Homo sapiens são donos da Amazônia. Aliás, se o cacique Seattle ainda estivesse vivo nos dias de hoje para dar uma entrevista, certamente ele diria aos jornalistas o seguinte:


Nós não somos donos da pureza do ar ou do brilho da água. Como pode então comprá-los de nós? Decidimos apenas sobre as coisas do nosso tempo. Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada folha reluzente, todas as praias de areia, cada véu de neblina nas florestas escuras, cada clareira e todos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na crença do meu povo. Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um torrão de terra é igual ao outro. Porque ele é um estranho, que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, nem sua amiga, e depois de exauri-la ele vai embora. Deixa para trás o túmulo de seu pai sem remorsos. Rouba a terra de seus filhos, nada respeita. Esquece os antepassados e os direitos dos filhos. Sua ganância empobrece a terra e deixa atrás de si os desertos. Suas cidades são um tormento para os olhos do homem vermelho, mas talvez seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que nada compreende (…) O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo quanto acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo quanto fere a terra, fere também os filhos da terra” (trecho da carta do cacique Seattle, da tribo Suquamish, ao presidente norte-americano Francis Pierce, em 1855, depois de o governo dos Estados Unidos ter demonstrado que pretendia comprar o território ocupado pelos índios)


Igualmente pode-se dizer que o governo brasileiro e nem a sua elite política são donos da Amazônia. E o mal que o país faz à floresta atinge a todos os brasileiros, a humanidade e os seres vivos do planeta, pois basta vermos as terríveis enchentes e secas que temos enfrentado. Assim, levar adiante o projeto da usina de Belo Monte é atentar contra a vida do planeta, equivalendo a um criminoso biocídio.


OBS: A foto do ministro Edson Lobão foi extraída do site do Ministério das Minas e Energia em http://www.mme.gov.br/mme/noticias/destaque_foto/destaque_163.html com os créditos atribuídos a Antônio Cruz.

12 comentários:

  1. Essa usina não me convence de jeito algum. Já tentei compreendê-la e ver se era realmente necessária, mas há um problema essencial: ela só produzirá seus 11 mil megawats durante metade do ano. Na outra metade não produzirá 10% disso.

    Daí que quando fala-se em energia eólica e solar, dizem que elas não servem pois não produzem energia constantemente. Ora! Tão pouco Belo Monte a produzirá!

    Com o dinheiro investido em Belo Monte, poderíamos estar desenvolvendo novas tecnologias e aí sim, ficarmos à frente do mundo, nas energias alternativas. O problema é que, mais uma vez, ficaremos para trás, e daqui a algumas décadas, estaremos importando tecnologia para produzirmos energia solar, eólica...

    O custo ambiental de Belo Monte é deveras alto. Não só do impacto direto de sua construção, mas da população que se instalará naquelas regiões de forma agressiva, novos bolsões de favela se formarão, sem quaisquer tratamento de esgoto, sem quaisquer planejamento. Infelizmente, o futuro da Amazônia está traçado, e fadado à desgraça.

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  2. Boas observações, Gabriel! O que expôs vem complementar as colocações do meu texto e mostram também uma visão imparcial.

    Realmente se o dinheiro de Angra 3, Belo Monte e outros empreendimentos faraônicos fossem destinados para as novas tecnologias sustentáveis, bem como para a educação, o país trilharia o rumo certo em direção ao desenvolvimento, respeitando a natureza.

    Estamos ferindo a Terra e também a nós mesmos...

    Abraços.

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  3. rodrigo, penso que uma coisa é uma coisa outra coisa é outra coisa...

    achei impositivo demais a declaração da oea. não se esqueça que "soberania nacional" é um termo desgastado, combatido e enfraquecido pela globalização mas ainda não foi extinto. as fronteiras ainda não foram abertas, muito pelo contrário. já viu como ficou difícil viajar para os eua atualmente?

    a discussão sobre belo monte deve ser nossa; somos nós que temos que criticar ou não a obra, sem que oea, onu ou qualquer outra agência internacional queira dizer o que deve ser feito.

    não é segredo que para os americanos o território da amazônia não pertence ao brasil, mas é "patrimônio mundial"; ora, isso não passa de balela, o que os gringos querem mesmo é tomar pose da amazônia e usam a incompetência do governo brasileiro em cuidar dela como desculpa.

    meu amigo, não existe esse negócio de "globalização solidária" ou coisa parecida.

    esse papo do obama dizendo que o "brasil é um parceiro, é um igual" aos eua, convence a alguém?

    como eu disse, uma coisa é uma coisa...

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  4. Olá, Eduardo.

    Entendo quando diz que a soberania nacional é um termo que "ainda não foi extinto", mas eu te digo que isto é algo que precisa acabar. Não somente para o Brasil, mas também para os USA, a França, a Venezuela, o Irã, Cuba, Líbia, Coréia do Norte, Espanha e muitos outros Estados. E aí, quando falo numa globalização solidária, refiro-me a um novo momento de planetização através da consciência de que somos "filhos da terra" e que devemos andar unidos pela sobrevivência de todos os seres que habitam a biosfera.

    Não acho que a discussão sobre Belo Monte deva ser só nossa, visto que a destruição da Amazônia é algo que interessa também aos demais povos porque, sem a maior floresta tropical do mundo, haveria consequências danosas para o clima de outros países, piorando mais ainda o atual quadro de desequilíbrio ecológico que vem matando milhares de vida anualmente em todo o mundo.

    Penso que hoje em dia não há mais uma tendência como supostamente teria sido demonstrada na ECO-92 de que o mundo queria administrar a Amazônia dentro do território brasileiro, numa época em que ainda era comum dizerem que o Brasil deveria aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia.

    Penso que, na atualidade, o mundo só quer participar da administração da floresta, mas os países estão usando os instrumentos legais cabíveis para que o Brasil considere certas posições, o que acho muito pouco eficaz no meu ponto de vista. Aliás, acho até que a OEA não foi tão firme porque ela apenas está pressionando o governo brasileiro a atender demandas das populações indígenas. Ou seja, estão fazendo com que as compensações fiquem mais caras...

    No meu ponto de vista a Amazônia não é o único ecossistema do mundo e, obviamente, pressões semelhantes deveriam existir sobre outros países. Porém, o meio ambiente, tanto na política internacional quanto dentro do nosso país, não é tratado com a seriedade que deveria ter. Por exemplo, fiscais e autoridades encobertados por políticos usam as leis ambientais para chantagearem empresários durante o processo de licenciamento. E, igualmente, países utilizam como pressão os argumentos ambientais para roubarem mercados uns dos outros nas suas guerras comerciais.

    Por outro lado, conheço um pouco do coronelismo da Amazônia e sei que lá é terra de ninguém. O Pará, fora de Belém ainda, é o lugar onde "o filhinho chora e a mamãe não ouve", um estado onde muitas lideranças já foram covardemente assassinadas, inclusive a norte-americana Irmã Dorothy Stang. Lá a corrupção impera onde os Jader Barbalhos da vida mandam e desmandam.

    Sem querer alimentar nenhum preconceito contra um estado, mas nós mesmos sabemos que se não houve uma pressãod a federação sobre as unidades federativas da Amazônia, eles acabam com tudo e o mesmo pensa o mundo em relação ao Brasil.

    Para o momento, em que as ONGs e entidades da sociedade civil travam uma luta de Davi contra Golias para impedirem esta hidrelétrica de ser construída, acho que as posições da OEA ajudam bastante e eu prefiro aplaudir do que criticar. Até porque a OEA não é uma representante só dos USA, mas também do Brasil, da Argentina, da Colômbia, da Venezuela, do México, do Equador, do Paraguai, do Canadá, do Haiti e de tantos outros países.

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  5. Em tempo!


    "esse papo do obama dizendo que o 'brasil é um parceiro, é um igual' aos eua, convence a alguém?"


    A meu ver, Eduardo, acho que hoje o Brasil consegue inserir-se de um modo mais ativo na economia globalizada. É certo que os USA e a China são gigantes e, nas relações comerciais com eles, ainda estamos em maior desvantagem, exceto pela crise econômica que os nossos parceiros da América do Norte hoje se encontram. Mas, como não podemos viver isolados, às vezes é preciso que o país se sujeite a perder em algumas coisas quando faz suas parcerias e acordos. Só que a diferença encontra-se na ética dos governantes porque, se temos um presidente corrupto e comprometido com empresas e govenos internacionais, eles vendem a pátria...

    Concordo que hoje em dia ain da não exista a globalização solidária. Porém, é sonho pelo qual precisamos lutar afim de que aconteça. Uma globalização que não seja ditada pelas potências e nem pelos Estados, mas sim pela sociedade civil. Algo que seja construído de baixo para cima dentro de uma visão ecológica imparcial, verdadeira e de amor à vida.

    Penso que se, nos libertarmos da gaiola do nacionalismo, conseguiremos compreender melhor o que vem a ser esta globalização solidária e não nos ofendermos tanto com as posições da OEA. Pelo contrário, passaremos a implodir todos os sistemas de exploração que tentam estabelecer, construindo um universalismo revolucionário com os valores de defesa da vida que o Evangelho de Cristo prega muito bem.

    Abraços e participe sempre.

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  6. Acho que a sociedade brasileira deveria participar mais desta luta e se opor à construção da usina de Belo Monte e também de Angra 3. Chega de jogar fora o dinheiro público! Vamos investir em energias alternativas que é o que o país tanto precisa.

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  7. rodrigo, creio que você está argumentando a partir de uma coisa que não existe e talvez nunca venha a acontecer, a "globalização solidária", vinda "de baixo para cima".

    seria muito bom se os donos do mundo começassem a construir essa tal globalização, só que não é isso que eu vejo acontecer; para essa globalização solidária acontecer, as extrurturas econônicas e políticas do mundo teriam que convergir para o mesmo ponto e isso só seria possível com o consentimento de todas as nações do mundo e isso iria de encontro a tantos interesses que se tornaria inviável; por aí dá prá ver como isso hoje em dia é uma utopia.

    eu não sou contra a ideia, muito pelo contrário; só acho que ela não e´factível pelo menos pelos próximos 500 anos...(tomara que eu esteja enganado).

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  8. Edu,

    Eu concordo que a globalização solidária ainda parece utópica para o momento, visto que, em política internacional, não existe a ética, mas somente interesses.

    Porém, analisando a crise climática em que o planeta está entrando, com desastres ecológicos cada vez mais intensos e frequentes, o mundo precisará voltar-se para uma nova ética por questão de necessidade. Então os líderes dos países, bem como as ONGs que mamam nas tetas do dinheiro público e de empresas poluidoras, terão que arrancar a máscara da hipocrisia nos futuros encontros. Do contrário, se demorarmos muitos, penso que talvez não existirão os próximos 500 anos. Pelo menos para a nossa espécie...

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  9. Esse assunto também me interesso, voltarei depois, mas deixo um link, para alimentar o assunto:
    http://oleododiabo.blogspot.com/2010/04/comentarios-sobre-belo-monte.html

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  10. Oi, Wilma.

    Obrigado pelo link.

    O texto, embora tenha uma visão diferente da minha, contribui para a formação de nossas opiniões e ajuda a aperfeiçoar aquilo que os ambientalistas contrários à hidrelétrica de Belo Monte pensam. Gostei deste trecho:

    "(...) seria interessante que os críticos de Belo Monte, a começar pela senhora Marina Silva, oferecessem uma alternativa viável e que apresentassem estudos sérios e incontestáveis (...)"

    Realmente nós ambientalistas temos a tendência de sermos do contra e não oferecermos uma alternativa. Queremos impedir as hidrelétricas, mas também consumimos energia (neste momento, ao escrever estes comentários, o meu computador e a minha geladeira estão ligados além de que muitos bens que eu utilizo necessitaram do uso da energia para serem transformados). Só que a nossa cultura energívora está destruindo o planeta e isto é fato.

    Assim, eu eu tô com a Marina quando ela fala sobre conter o desperdício e aí não se trata de debatermos restritamente acerca de custos de construções ou de prejuízos referentes aos apagões, bem como das cifras de 19, 30 ou 45 bilhões. Pois se trata-se de uma condição de sobrevivência que a natureza hoje nos impõe, visto que a humanidade já está excedendo os limites da sustentabilidade do planeta e que pode causar danos imensuráveis à vida.

    Obviamente que não me preocupo apenas com uma Belo Monte, mas sim com várias condutas como esta usina e com o modelo de desenvolvimento que, décadas depois dos militares, ainda continua sendo o mesmo. Pois seguimos a mesma linha de crescimento predatório, desperdiçando energia, dispersando-nos equivocadamente pelo espaço geográfico sem planejamento.

    Pergunto: quanto que Belo Monte poderá fornecer de energia para a indústria no Sudeste? Veja, não me refiro à geração na fonte, mas sim para o consumidor.

    Neste sentido, fico a indagar se não sairia mais barato e proveitoso contruirmos usinas menores aqui pelo Centro-Sul do país e que terão impactos menores.

    Também fico pensando se não seria mais inteligente o governo incentivar a expansão de atividades industriais para determiandas áreas onde já existe geração em abundância de energia. Pois, já que existe Itaipu (outra obra infeliz), então por que as fábricas não passam a se instalar no oeste paranaense?

    Enfim, podemos obter mais energia a partir daquilo que já temos e, desta forma, evitarmos a construção de Belo Monte e de tantas outras hidrelétricas de grande porte que vêm por aí.

    Olha, acho que a Marina está com a razão...

    Abraços.

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  11. Em tempo!

    Segue um interessante vídeo que fala a respeito do assunto. Trata-se de um debate, o qual passo a compartilhar aqui:

    http://www.youtube.com/watch?v=cipqE2Vzobs&feature=player_embedded#at=295

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