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quarta-feira, 2 de junho de 2010

O contrato e a parceria entre a CAARJ e a UNIMED precisam ser revistos pela OAB!

No final de março do presente ano, minha esposa, Sra. Núbia Mara Cilense, firmou contrato de plano de assistência à saúde, coletivo por adesão, com a UNIMED – RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA, através da ACCESS CLUBE DE BENEFÍCIOS e a CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (CAARJ), cuja vigência iniciou-se em 01º/05/2010.

Em 12/05/2010, quando ela foi fazer uma ultrassonografia do abdômen, descobriu-se a presença de saco gestacional com um embrião sem batimentos cardíacos em seu útero, sugerindo um preocupante caso de uma gestação interrompida de aproximadamente oito semanas.

Durante o referido exame, o profissional de saúde que realizou o ultrassom orientou a minha esposa que procurasse seu ginecologista com urgência afim de que fossem tomadas as providências necessárias para tratar do problema.

Em 20/05/2010, por determinação do ginecologista, Dr. Noberto Louback Rocha, Núbia submeteu-se a uma ultrassonografia pélvica transvaginal, em que configurou um quadro com impressão de aborto retido, contendo o laudo imagens do útero e a seguinte análise:

“Útero gravídico, de contornos regulares, forma e dimensões normais.
Saco gestacional na cavidade uterina, de parece irregulares e contornos imprecisos.
Embrião sem batimento cardíacos, com comprimento cabeça-nádega de 21,9 mm.
Colo uterino fechado.
Ovários tópicos, de forma e dimensões normais”

Em 21/05/2010, após o ginecologista tomar conhecimento do segundo exame, encaminhou minha esposa para internação hospitalar afim de proceder o esvaziamento uterino através da curetagem, com a indicação clínica de abortamento retido baseando-se nos dois exames de ultrassonografia.

Entretanto, fomos surpreendidos na tarde daquela sexta-feira de intensa aflição psicológica quando a UNIMED negou a autorização sob a equivocada justificativa de que minha esposa estaria em carência contratual até o dia 30/07/2010, sustentando que a sua quebra só poderia ocorrer por motivos de “acidente pessoal ou morte iminente”. Tal decisão contrariou frontalmente o disposto no art. 12, inciso V, alínea c da Lei Federal n.º 9.656/98, a qual fixa o prazo máximo de 24 horas para a cobertura em casos de urgência ou emergência.

Precisando de uma solução urgente para que fosse imediatamente retirado de seu organismo o embrião morto, eis que, em 22/05/2010, Núbia internou-se no Hospital Maternidade de Nova Friburgo (HMNF), unidade municipal de saúde pertencente ao Sistema Único de Saúde (SUS), onde permaneceu até o dia 27/05/2010.

De acordo com o prontuário médico fornecido pelo hospital público, somente em 26/05/2010 foi realizado o procedimento de curetagem na minha esposa, tendo ela padecido até então de cólicas e sangramentos vaginais no leito da enfermaria, sofrimento este que poderia ter durado apenas um dia, caso a UNIMED tivesse autorizado a sua internação em sua unidade hospitalar aqui no Município de Nova Friburgo.

Em 23/05/2010, cheguei a entrar em contato com a Ouvidoria da OAB/RJ, através do site da autarquia na internet, enviando também uma mensagem ao Presidente Wadih Damous por um outro formulário semelhante que é disponibilizado virtualmente na página. Porém, a resposta recebida no meu e-mail foi insatisfatória, tendo a CAARJ apenas se limitado a encaminhar a minha mensagem à Gerência da Access Clube:

“(...)Recebemos seu e-mail com muito apreço, em atenção a sua solicitação, já encaminhamos para a Gerência da Access Clube.
À CAARJ agradece seu contato, e coloco-me à disposição no que for necessário.
Atenciosamente,
George Costa
Atendimento ao Cliente CAARJ(...)”

Ora, a conduta adotada pela UNIMED é gravíssima pois o diagnóstico de aborto retido configura um estado de inegável risco para a paciente, o que determina a cobertura de atendimento na forma do art. 35-C, inciso II da Lei n.º 9.656/98:

Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:
(…)
II – de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional;
(destacou-se)

Recusando-se a patrocinar um atendimento de urgência, a UNIMED atentou contra a dignidade humana, o que configura um flagrante desrespeito à saúde e à vida das pessoas, pois ampliou a situação de grande aflição psicológica e de angústia em que se encontrava uma paciente, obrigando-a a se socorrer através do caótico sistema público de saúde que, notoriamente, funciona de modo bem precário no nosso país.

Entendendo a curetagem uterina como procedimento de urgência, assim se posicionou a Décima Sétima Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, reconhecendo ser necessária a realização do referido tratamento em casos de aborto retido e a configuração dos danos morais no julgamento da apelação cível de n.º 2005.001.04557:

“INDENIZATÓRIA – SEGURADORA DE PLANO DE SAÚDE – DANO MORAL CONFIGURADO – Configura situação de emergência a necessidade de realização de curetagem após aborto retido. A recusa da ré em continuar no patrocínio do atendimento de urgência afigura-se atentatória da dignidade humana. A comprovação do dano moral decorre da própria natureza humana (...) Circunstâncias corretamente analisadas pela sentença impugnada. Improvimento do recurso” (TJERJ. 17ª Câmara Cível. Apelação n.º 2005.001.04557. Rel. Des. Edson Vasconcelos. Julgado em 11/05/2005. - destacou-se

Igualmente assim posicionou-se a Segunda Câmara Cível do Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao julgar o apelo de n.º 2008.001.07903, conforme se lê na ementa a seguir transcrita:

“APELAÇÃO. Obrigação de fazer cumulada com dano moral. Plano de Saúde. Quadro clínico de aborto retido, com recomendação de internação. Procedimento de urgência, cuja carência (24 horas) já se encontrava cumprida. Negativa injustificada. Dano moral configurado, diante do agravamento da aflição psicológica e da angústia em que se encontrava a apelante. Verba arbitrada em R$ 15.000,00, por se mostrar razoável às circunstâncias do caso. Provimento do recurso.” (TJERJ. 2ª Câmara Cível. Apelação n.º 2008.001.07903. Rel. Des. Jessé Torres. Julgado em 05/03/2008) - negritou-se

Tal posicionamento dos órgãos fracionários do Tribunal Estadual vem de encontro ao entendimento de que a tentativa do plano de saúde em descaracterizar a curetagem em caso de aborto como procedimento de urgência, ou emergência, configura infração à Lei Federal n.º 9656/98, de modo que a OAB/RJ não pode deixar de repudiar com veemência a conduta praticada pela UNIMED de maneira que precisa ser revisto o contrato celebrado entre a CAARJ e a tal empresa.

A situação à qual minha esposa e eu nos submetemos a ponto de precisarmos nos socorrer do caótico sistema único de saúde não pode ser minimizada e nem desconsiderada pela OAB para fins de avaliar a relação entre a CAARJ e a UNIMED. Do contrário, nós advogados estaremos nos esquecendo de manter uma conduta fraterna e solidária, o que é fundamental entre os integrantes de uma mesma categoria do profissionalismo liberal.

Por outro lado, fico perplexo com a situação de vulnerabilidade social em que nós advogados nos encontramos hoje em dia a ponto de nossos cônjuges e familiares, bem como outros colegas, terem o atendimento negado pelo plano de saúde numa situação evidentemente de urgência. É inadmissível que a esposa de um inscrito nos quadros desta autarquia, que paga em dia não só a mensalidade do plano de saúde como a anuidade da OAB, ter que procurar o SUS numa situação de urgência.

No caso específico de minha esposa, nem era conveniente ingressar com uma ação judicial de obrigação de fazer, pois, mesmo que uma decisão antecipatória da tutela jurisdicional fosse concedida aqui na Comarca de Nova Friburgo, a citação e a intimação da parte ré teria que ser efetivada na cidade do Rio de Janeiro, o que, certamente, demoraria alguns dias até que a UNIMED procedesse a internação de Núbia no seu hospital.

Ressalto que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, ao julgar recentemente a apelação cível no processo n.º 2007.51.01.003490-4, no qual a Agência Nacional de Saúde (ANS) é parte, eis que a 6ª Turma Especializada do TRF2 desproveu o recurso interposto pela Santa Casa de Misericórdia, a qual tentou afastar a sua obrigação de ressarcimento ao SUS, entendendo o órgão jurisdicional ser procedimento de urgência a curetagem pós-aborto, não se sujeitando à carência de 180 (cento e oitenta) dias:

“EMENTA: RESSARCIMENTO AO SUS. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 32 DA LEI Nº 9.656/98. SÚMULA Nº 51 DESTE TRIBUNAL. QUESTÕES DE ORDEM CONTRATUAL. LEGALIDADE DA COBRANÇA. 1. O ressarcimento ao SUS é devido dentro dos limites de cobertura contratual, e sua imposição é prevista em lei amoldada à Carta Maior. Ademais, hoje o tema é objeto da Súmula nº 51 deste Tribunal, e as Turmas estão vinculadas a tal entendimento, por força da súmula vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal. (...) 3. De outro lado, o procedimento consubstanciado no AIH nº 2720299103 (curetagem pós-aborto) não está sujeito à carência de 180 dias, por ser caso de urgência ou emergência. (...) Sentença mantida.” (TRF2. 6ª Turma. Rel. Juíza Federal Convocada Carmen Silvia Lima de Arruda. Julgado em 15/03/2010)

Conforme se lê no inteiro teor do voto proferido no julgamento do recurso da Santa Casa na Justiça Federal, obrigar que a mulher já traumatizada com a perda do filho ter que esperar o prazo de carência contratual para o procedimento de curetagem viola o princípio da dignidade humana agasalhado pela Carta da República:

“Por óbvio, não se pode exigir que a mulher, já traumatizada com a perda de um filho, fique a mercê de prazos de carência contratual e espere mais de vinte e quatro horas para a retirada dos restos do produto da concepção. Tal conduta não seria condizente com o princípio da dignidade humana, valor fundamental eleito pela Carta Maior.”

Neste sentido, entendo que cabe à OAB/RJ importar-se com a relevante questão suscitada neste texto para que nenhum dos segurados do plano da UNIMED/CAARJ, ao necessitarem de qualquer tipo de internação de urgência, fiquem submetidos a uma injusta situação de aflição psicológica e de angústia por causa da lesiva conduta adotada pelas operadoras dos planos de saúde em tais ocasiões.

Felizmente, Núbia agora está se recuperando e, apesar de tudo o que sofremos no mês passado, extraímos uma experiência de vida com toda esta situação, o que, certamente, contribui para o meu crescimento espiritual como cristão. Nas vezes em que visitava minha esposa na enfermaria do Hospital Maternidade, durante o apertado horário de meia hora, entre 14:00 e 14:30, sem que lhe assegurassem o direito a um acompanhante, aprendi um pouco mais sobre o amor ao próximo e solidariedade com as demais mulheres que se encontravam lá internadas, sendo a maioria delas de condição bem humilde. Pude mais uma vez confirmar o quanto o pobre neste país padece por causa da indiferença dos nossos políticos e fiquei perplexo quando soube através das próprias pacientes que uma gestante em trabalho de parto não conseguiu vaga ali, pelo que precisou ser levada de ambulância para ter o filho no distante município de São João de Meriti.

Entretanto, apesar do ganho de experiência espiritual, não deixo de lutar para que a OAB/RJ, através do seu presidente, Sr. Wadih Damous, não considere minha reivindicação como um mais caso corriqueiro das relações de consumo, devendo a OAB compreender que os advogados inscritos nos seus quadros, bem como os seus cônjuges e familiares, encontram-se numa preocupante condição de vulnerabilidade, sendo indispensável a adoção de medidas urgentes capazes de rever o contrato e até mesmo a parceria celebrada com a UNIMED, afim de evitar que novos casos semelhantes tornem a ocorrer.

4 comentários:

  1. Prezado Rodrigo,
    Sensibilizei-me com seu relato sobre essa terrível experiência de grave lesão à dignidade humana.
    É bem verdade que não vi nenhuma anuência da OAB quanto ao procedimento da UNIMED, mas concordo contigo que precisamos cobrar na nossa Ordem uma apuração do caso, bem como uma resposta oficial declarando que tal procedimento não se repetirá.
    A OAB não pode deixar isso sem uma providência.
    Solidariamente,
    Rodrigo Guimarães

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  2. Muito obrigado pelo seu apoio e incentivo, Rodrigo. E embora eu tenha verificado depois deste artigo que o caso já está sendo contemplado na ação civil pública de n.º 2006.001.033570-5, em curso perante a 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital, a OAB, na qualidade de contratante dos serviços da Unimed, tem poderes de exigir a prestação de um serviço mais adequado já que se trata de um consumidor em potencial.

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  3. Estou passando por isso, fiz o convênio porque estava grávida, no primeiro ultrassom constou óbito retido, estou em período de carência, não sei o que fazer, o sus me mandou passar no convênio e o convênio no sus... meu psicólogico tá abalado, era um muito planejado... tenho direto a atendimento de curetagem por lei??? Obrigada

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    1. Bom dia.

      Recomendo entrar com uma ação pedindo a chamada tutela de urgência pois a sua situação deve ser caracterizada como urgência cuja carência é de 24 horas.

      Geralmente as operadoras dos planos de saúde tentam colocar as curetagens como procedimento eletivo ou só atendem na emergência quando a situação da paciente está gravíssima (febre alta, infecção). Por isso, recomendo entrar logo com essa ação que, inclusive, pode ser ajuizada hoje mesmo no plantão judiciário para que a operadora do plano faça a internação, a curetagem e todos os procedimentos necessários.

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