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sábado, 18 de agosto de 2018

Esclarecimentos sobre a ação movida em face do prefeito interino de Mangaratiba



Caros amigos,

Neste mês de agosto, além de haver questionado a candidatura do deputado Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República perante o Tribunal Superior Eleitoral, conforme expus na postagem anterior, também ingressei com a ação popular de n.º 0007058-32.2018.8.19.0030. Trata-se de um processo movido em face do senhor Vitor Tenório Santos, o "Vitinho", o prefeito interino daqui de Mangaratiba, município do litoral fluminense onde voto e sou morador desde agosto de 2012.

Por coincidência, ambos os casos guardam certa semelhança com a famosa Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 402, movida pelo partido político Rede Sustentabilidade contra o então presidente do Senado, Renan Calheiros. Na ocasião, o Supremo Tribunal Federal (STF) afastou o parlamentar da linha sucessória do presidente da República Michel Temer, tendo em vista que tratar-se de um réu na "Operação Lava Jato". 

O caso do Vitinho é o seguinte. Em 29 de julho do corrente ano, sendo ele Vereador Presidente da Câmara Municipal de Mangaratiba, o mesmo veio a tomar posse de forma interina, do cargo de Prefeito Municipal, em decorrência do indeferimento do registro de candidatura do ex-Prefeito eleito nas eleições de 2016, Sr. Aarão de Moura Brito. Pois, inobstante ter seu registro inicialmente deferido e eleito democraticamente nas últimas eleições municipais, o o alcaide anterior sofreu a perda do mandato que exercia por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no julgamento do recurso especial eleitoral nº. 0000234-21.2016.6.19.0054.

Assim, como o indeferimento do registro em matéria eleitoral resulta na cassação de toda a chapa candidata, o vice-prefeito eleito não pode tomar posse do cargo. E, com isso, por expressa previsão da Lei Orgânica deste Município, conforme consta em seu artigo 86, coube a sucessão pelo Vereador Presidente da Câmara Municipal:


"Art. 86 - Em caso de impedimento do Prefeito e do Vice - Prefeito, ou vacância do cargo, assumirá a administração municipal o Presidente da Câmara. Parágrafo único - A recusa do Presidente da Câmara, por qualquer motivo, a assumir o cargo de Prefeito, importará em automática renuncia à sua função de dirigente do Legislativo, ensejando, assim, a eleição de outro membro para ocupar, como Presidente da Câmara, a chefia do Poder Executivo."

Ocorre que o então presidente da Câmara, hoje prefeito interino deste Município, responde a processo criminal em segunda instância que tramita perante a 4º Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, tratando-se dos autos de nº. 0018163-33.2017.8.19.0000. De acordo com a denúncia do Ministério Público, já recebida pela Desembargadora Relatora, ao edil é imputada a suposta prática do crime previsto no artigo 298 do Código Penal, por dezesseis vezes. E o referido processo é conexo ao de nº. 0018465-33.2015.8.19.0000, o qual condenou o ex-prefeito Evandro Capixaba a 52 anos de prisão, junto com mais 41 denunciados, algo que causou enorme lesão ao erário público municipal.

Assim sendo, pelo princípio da simetria constitucional, o qual é um princípio federativo que exige uma relação simétrica entre os institutos jurídicos da Constituição Federal, as Constituições dos Estados-Membros e as Leis Orgânicas dos Municípios, considerei que o mesmo raciocínio jurídico aplicado pelo STF aos sucessores do Presidente da República deve valer também para os presidentes das casas legislativas que sucedem os governadores dos estados e prefeitos dos municípios. Ou seja, se o vereador presidente de uma Câmara Municipal for réu em ação penal, a exemplo do que atualmente ocorre aqui em Mangaratiba, o mesmo não deve suceder o prefeito na hipótese de haver vacância do cargo deste e do seu vice.

Deste modo, questionei como pode um indiciado pela prática de atos tão graves assumir a gestão do erário municipal contra o qual é acusado de haver atentado?

É verdade que, sem a condenação definitiva, deve-se presumir a sua inocência de quem é acusado num processo penal. Entretanto, não se está a julgar o direito do réu ao exercício de função para a qual foi democraticamente eleita como vereador, tampouco a torná-lo inelegível, mas sim a moralidade e risco de lesividade ao erário público em se manter num cargo de tamanha importância pessoas acusadas de haver lhe causado prejuízos tão sérios.

Como é cediço, os Tribunais brasileiros acertadamente têm relativizado o princípio da presunção de inocência quando se está em voga o interesse da coletividade, mormente quando não se está a condenar antecipadamente alguém, como o caso em questão. Daí, não pode ser visto como mais importante a vontade desesperada de um político de manter-se em cargo para o qual não foi eleito, e sequer concorreu, quando este é acusado de haver causado danos gravíssimos ao erário público e, portanto, à coletividade.

No caso do Município de Mangaratiba, tenho sustentado que a lide em questão recai sobre os conflitos dos interesses particulares de uma única pessoa contra o interesse público de cerca de 41.000 habitantes e 36.000 eleitores. E digo interesses particulares porque, infelizmente, os primeiros 30 dias de gestão do prefeito em exercício não contaram com a prática de atos esperados de um governo interino e, portanto, temporário e precário. Pois entendo que foram praticados inúmeros atos imorais que só demonstram o desespero do gestor provisório em ser eleito a todo custo na eleição suplementar marcada pelo TSE para o dia 29/10, sem medir esforços e prejuízos ao erário público para benefício próprio. Por exemplo, foram 739 nomeações em um único Diário Oficial (DOM 838, de 31/07), o que considero um verdadeiro recorde em nomeações! Nem os outros prefeitos cassados, Aarão de Moura Brito e Evandro Capixaba, ousaram ir tão longe. Sem contar a manutenção de servidores nomeados nas Secretarias de Saúde, Educação, Defesa Civil e Procuradoria Geral do Município...

Portanto, na busca de proteger o direito do povo local (que já sofreu com a cassação de dois prefeitos nos últimos 3 (três) anos, bem como em relação ao erário público e à moralidade administrativa, foi que, no dia 09/08 ingressei com essa ação popular. Requeri, em sede de liminar, a imediata destituição de Vitinho do cargo de prefeito interino daqui da cidade. 

De acordo com o saudoso Hely Lopes Meireles, a ação popular é prevista constitucional no artigo 5º, LXXIII, da Lei Maior, tratando-se de "instrumento de defesa da coletividade, por meio do qual não se amparam direitos individuais próprios, mas sim interesses da coletividade, sendo o beneficiário da ação não o autor, mas a coletividade, o povo". Pois, através de tal ação, é possível a direta participação do cidadão na vida política do ente público e a fiscalização da sua gerência, quando em dissonância com a moralidade e a legalidade. Basta que o autor da demanda esteja em pleno gozo dos seus direitos políticos.

Ora, na semana seguinte ao ajuizamento da ação, isto é, na última segunda-feira (13/08), o Juiz da Comarca de Mangaratiba, Dr. Marcelo Borges, determinou que houvesse primeiramente vistas ao Ministério Público para que então fosse apreciada a liminar por mim requerida no processo. E, em seu douto parecer, o nobre Promotor emitiu um posicionamento favorável à causa a fim de que fosse destituído o vereador do cargo de prefeito interino "até que seja julgada a ação criminal 0018163-33.2017.8.19.0000, quando poderá ser avaliada a possibilidade de retornar ao cargo". Segundo a fundamentação do Parquet,

"Ainda que se trate de tema novo e certamente permeado por interpretações diversas, não se pode negar que vai ao encontro dos anseios da sociedade no sentido de administrações públicas transparentes, probas, eficientes e impessoais, concretizados pelo Art. 37 da Constituição da República. Conforme trazido pelo autor popular, o Supremo Tribunal Federal através de seu Plenário, ao analisar decisão liminar proferida na ADPF 402 confirmou seus termos, no sentido de que o fato de ser réu em ação criminal perante o próprio tribunal impedia o senador Renan Calheiros de substituir o Presidente da República em impedimentos eventuais. Em apertada síntese entendeu-se que o dirigente máximo da nação e seu vice são eleitos diretamente pelo povo para exercerem suas funções constitucionais e no caso de seu impedimento momentâneo quem ocupar suas funções, não tendo sido eleito para aquela função, necessita atender a todos os requisitos existentes, incluindo o de não figurar como réu em ação penal perante o Supremo Tribunal Federal." (fl. 315 dos autos da ação popular)

No tocante à simetria, o entendimento da Promotoria foi o seguinte:

"Ainda que não seja expressa a adoção dos princípios e normas insculpidos na Constituição da República, seria obrigatória sua observância e utilização, sob pena de nulidade de eventuais atos praticados. Com a evolução social e o necessário combate aos atos que atentam contra a moralidade administrativa e boa fé é mais do que natural que sejam totalmente encampados nossos princípios constitucionais mais relevantes. Da mesma forma que ocorreu no julgamento da ADPF 402, nos parece que o Prefeito e seu vice são eleitos pela população local, que os conhece e deseja que sejam seus governantes, chefes do poder Executivo local. No caso dos Vereadores, os mesmos também são eleitos pela população, entretanto, para funções diferentes, inclusive pertencendo a poder diferente. A impossibilidade de que tanto o Prefeito eleito quanto seu vice possam prosseguir com seu mandato natural é uma situação excepcionalíssima e por tal raridade se determina tanto pela nossa Constituição da República, quanto pela Lei Orgânica do Município de Mangaratiba, que sejam substituídos por representante de outro poder. Ocorre, que como salientado pelo Supremo Tribunal Federal, quem ocupar o cargo precisará possuir todos os requisitos necessários, além de não responder a ação criminal, pois tal fato macularia sua administração, sendo o próprio motivo do afastamento do chefe do executivo. Ressalte-se ainda, que contrariamente ao Prefeito, que é eleito pela população, o presidente da Câmara Municipal é eleito por seus pares somente. De tamanha importância é o exercício do mandato que a Lei Orgânica do Município estabelece no caso do afastamento do Prefeito ser impossível ao seu vice recusar assumir o cargo, gerando eventual recusa a imediata extinção do mandato, fato que não ocorre com o Presidente da Câmara, que se manteria Vereador e somente seria afastado da presidência do mesmo (...) Tal distinção ocorre justamente em razão do princípio da separação de poderes e do fato de que o presidente da Câmara Municipal assumir a chefia do Poder Executivo é um ato de maior fragilidade e não obrigatório ao interessado." (fls. 320 a 322 dos autos da ação popular)

A respeito da situação específica do prefeito, o MP fez estas considerações, referindo-se à proibição de não realização de nomeação de mais ocupante de cargo comissionado, excetuando para as funções que de fato sejam de chefia, direção e assessoramento, conforme fora já determinado numa ação civil pública em curso perante à Comarca de Mangaratiba:

"Devemos ressaltar ainda, que o processo criminal em trâmite no Tribunal de Justiça (0018163-33.2017.8.19.0000) já teve sua Denúncia recebida em 13/12/2017 e apura justamente a prática de atos que visavam fraudar licitações, o que somente tende a gerar descrédito nos atos praticados pelos demandados. Como ressalta ainda o autor popular, o atual Prefeito interino logo após assumir o cargo, mesmo estando em plena disputa eleitoral, optou por nomear nada menos que 739 assessores diversos. Além do claro uso da máquina estatal em benefício próprio, o que será discutido em demanda eleitoral específica, tal fato ainda descumpriu decisão liminar proferida na ACP 0005739-34.2015.8.19.0030 (...) O descumprimento de decisão judicial com a nomeação de grande número de pessoas às vésperas de eleição suplementar somente nos vem reiterar a necessidade de impedimento de réus em ações criminais a assumirem cargos de Prefeito." (fls. 322 a 323 e 325 da ação popular)

Com o retorno ao magistrado da Comarca, este se declarou impedido, visto que, na hipótese de afastamento do prefeito interino do Município, ele assumiria a função de responder pelo Poder Executivo:

"A lei orgânica Municipal não estabelece a ordem de sucessão no caso de vacância do cargo de Prefeito, além do Presidente da Câmara. Por outro lado, pela aplicação simétrica do artigo 80 da CRFB é possível concluir que após a retirada do Presidente da Câmara, caberia ao juiz da Comarca o ingresso no cargo de forma interina. Desse modo, há evidente impedimento deste juiz no presente processo. Assim, DECLARO-ME IMPEDIDO, Encaminhe-se ao Juiz Tabelar."

Agora o caso aguarda uma decisão do juiz tabelar que responde pela Comarca de Seropédica, tendo sido o feito já redistribuído para lá. E, como há um pedido de liminar pendente de apreciação, espera-se que, na próxima semana, tenhamos notícias a respeito.

Vamos aguardar e torcer para que a Justiça defira a liminar requerida!

9 comentários:

  1. Em tempo!

    A respeito da ordem sucessória, eis que o Brasil se organiza politicamente em três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário; e adota o sistema presidencialista, de forma que o chefe do Poder Executivo é eleito e não possui ingerência nos demais poderes e vice-versa (separação de poderes).

    Em caso de vacância no cargo de Prefeito, assume o cargo o vice-prefeito, também eleito em pleito majoritário, razão pela qual ele mantém-se no cargo até o fim do mandato eletivo de 4 (quatro) anos.

    Entretanto, o mesmo não ocorre com o chefe do Poder Legislativo quando este sucede a chefia do Executivo. Convocam-se novas eleições imediatamente após a sucessão, que é, portanto, temporária e provisória.

    Isto porque trata-se de uma exceção ao sistema de governo presidencialista e à própria democracia, vez que assume a chefia do Poder Executivo quem não foi eleito para tanto.

    E, por ser uma exceção constitucional, deve ser tratada com o cuidado que ela exige. Se não se admite a interferência de um Poder em outro, quanto mais que o Chefe de um chefie o outro, razão pela qual razoável se faz intensificar a atenção com o cumprimento dos requisitos constitucionais pertinentes.

    A hipótese, portanto, é de cautela máxima com a definição de quem, por exceção, é chamado a responder por Poder diverso daquele para o qual foi eleito.

    O que certamente não faz nenhum sentido é admitir que alguém possa ocupar normalmente determinado cargo, quando não possui a moralidade razoavelmente esperada.

    Nunca podemos esquecer de que o homem público tem que ser probo e zelar pelo direito e pelos princípios da administração pública, e não para fins pessoais. Logo, é inadmissível que o erário público sofra danos devido aos devaneios individuais, de homens públicos ou não. E, por tal razão, foi que na ADPF 402, ajuizada pelo Partido Rede Sustentabilidade, buscou-se a fixação pelo STF de interpretação sobre sucessão da chefia do Poder Executivo Federal por quem possuir contra si denúncia recebida pelo Supremo.

    Tomara que essa ação seja bem sucedida e possa contribuir para moralizarmos o Brasil no âmbito dos estados e dos municípios!

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  2. Boa noite, Rodrigo!

    Se entendi o k você escreveu, sei tão pouco de Direito, creio que sua atitude é de salientar e louvar. As "palmadas" têm de ser dadas, doa a quem doer.

    Beijos e bom domingo.

    PS: deixei umas palavrinhas no post anterior.

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    1. Olá, CEU.

      Fato é que ninguém pode estar acima da Lei. Se até um ex-presidente não escapou da Justiça...

      Li seeu comentário na outra postagem. Sábias palavras.

      Ótimo final de domingo e uma excelente semana,

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  3. Que seja feita JUSTIÇA pois é o que Mangaratiba e o Brasil mais precisam.

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  4. Boa tarde.
    Me explique por favor.
    Ele pode ser vereador, e não prefeito.
    Se for eleito, como fica??

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    1. Bom dia, Cris.

      No caso do senhor Vitor Tenório dos Santos, ele foi eleito vereador, mas, como houve uma dupla vacância no Executivo, a Lei Orgânica do Município prevê que o presidente da Câmara é quem deve assumir provisoriamente a Prefeitura até que haja as eleições suplementares e o novo prefeito tome posse.

      No entanto, eu é quem estou argumentando que, pelo fato do prefeito em exercício ser réu numa ação penal, o mesmo deve ser afastado da linha sucessória do prefeito municipal. Porém, tal ação não o impede de ser candidato

      Caso eleito, como não houve nenhuma impugnação á sua candidatura pelos partidos políticos e nem por outro legitimado a impugnar candidaturas, ele assume mesmo sendo réu.

      No meu entender, réus também não poderiam ser candidatos a cargos do Poder Executivo por aplicação do art. 86 da Constituição e que, pelo princípio da assimetria, pode ser aplicado aos estados e municípios. Todavia, entendo fundamental haver uma ação de impugnação que só os legitimados conforme a legislação eleitoral podem fazer pois pessoas físicas apenas têm o direito dar notícia de inelegibilidade.

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  5. Quem são os candidatos a prefeito a Mangaratiba com a renúncia do atual prefeito Vitor Tenório

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  6. Bom dia.

    Ainda não tenho informações confirmando uma eventual desistência da chapa Vitinho e Cecília. Porém, a disputa permanece com os demais:

    Alan Bombeiro

    Evando Rezende

    Cledson

    Emil

    Carla da Máquina

    Vamos aguardar!

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