Não é raro o INSS cometer erros nos cálculos de pensões e aposentadorias. Há inúmeros casos no país em que o trabalhador, quando resolve descansar, após longos anos de contribuição, tem a sua renda mensal inicial fixada num valor acima ou abaixo do que realmente tem direito. E, em qualquer das hipóteses, o segurado acaba tendo uma dor de cabeça danada.
Se o beneficiário for aposentado com uma renda menor, basta ele entrar com um processo de revisão para obter tanto o reajuste como a diferença atualizada de tudo quanto deixou de receber nos últimos cinco anos. Porém, caso seja o contrário (quando o INSS calculou uma RMI superior e depois verificou que havia errado), a Previdência exige que a pessoa restitua o que recebera indevidamente. E, para tanto, a autarquia chega a proceder a cobrança através de consignação no benefício mantido ao aplicar friamente os artigos 114 e 115, II da Lei Federal n.º 8.213/91 combinados com o artigo 154, inciso II do Decreto n.º 3.048/99 que assim dispõe:
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:(...)II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;(...)§ 3º - Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito.
Entretanto, a aplicação das normas jurídicas não pode ser feita de maneira literal a ponto de afrontar a dignidade do ser humano. Pois, no caso, há que se levar em conta sempre a boa-fé do segurado e também o caráter alimentar das verbas previdenciárias. Por isso, muita gente já procurou se socorrer da Justiça, tendo muitos obtido êxito nas suas pretensões enquanto outros não.
Felizmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) vem se manifestando quanto à "impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115 , II , da Lei nº 8.213 /91, e 154 , § 3º , do Decreto nº 3.048 /99" (AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO AI n.º 849529/SC. Data de publicação: 14/03/2012). Também num outro julgado relativamente recente, assim decidiu a Turma Nacional de Unificação dos Juizados Especiais Federais (TNU) ao reconhecer a natureza alimentar dos benefícios previdenciários:
"Ementa: DEVOLUÇÃO DOS BENEFÍCIOS RECEBIDOS INDEVIDAMENTE PELO SEGURADO DE BOA-FÉ. OS VALORES AUFERIDOS A MAIOR FORAM RECEBIDOS PELA AUTORA DE BOA-FÉ E POR ERRO EXCLUSIVO DO INSS. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADEDOS ALIMENTOS. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO" (TNU - PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL PEDILEF 200772590034304 SC (TNU) - Rel. JUIZ FEDERAL JOSÉ EDUARDO DO NASCIMENTO - Julgamento: 02/08/2011 - Data de publicação: 18/11/2011)
Há que se levar em conta também, por analogia, esse julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ), que faz a seguinte ressalva sobre à impossibilidade de devolução de valores nas hipóteses de interpretação errônea de uma lei:
Ora, o mesmo acontece nos casos de pagamento a maior do benefício previdenciário em que, dentro do prazo decadencial, o INSS tem o direito de revisar os valores pagos, mas não pode obrigar o segurado a devolvê-los. É como consta neste julgado do 4º Tribunal Regional Federal:
Em que pesem os posicionamentos contrários, entendo que, uma vez evidenciada a boa-fé do beneficiário, este não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, dada a finalidade de prover os meios de subsistência a que se destina uma aposentadoria, auxílio-doença ou pensão. E assim, para que o cidadão não fique sujeito à angustiante "loteria" do Judiciário, melhor solução seria os nossos excelentíssimos parlamentares modificarem a legislação previdenciária em vigor para impedir tais abusos praticados pela Administração Pública.
"(...) quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público”. (REsp 1.244.182/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 19.10.2012)
Ora, o mesmo acontece nos casos de pagamento a maior do benefício previdenciário em que, dentro do prazo decadencial, o INSS tem o direito de revisar os valores pagos, mas não pode obrigar o segurado a devolvê-los. É como consta neste julgado do 4º Tribunal Regional Federal:
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-SUPLEMENTAR. PAGAMENTO INDEVIDO. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. A restituição dos valores pagos a maior pelo INSS em razão de erro administrativo na concessão do auxílio-suplementar não é possível, pois recebidos de boa-fé. Ademais, tendo em vista a natureza alimentar das referidas prestações, a jurisprudência pátria não vem acolhendo a tese da possibilidade de repetição dos valores. Precedente da Terceira Seção deste Tribunal." (TRF-4 - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO : APELREEX 3852 RS 2008.71.12.003852-6 - Data de publicação: 10/02/2010)
Para terminar, ressalto o quanto é indiscutivelmente revoltante um homem ou uma mulher que trabalhou honestamente a vida inteira repentinamente ser surpreendido com a revisão de sua renda mensal em que, após a redução, ainda começa a sofrer contínuos descontos de até 30% (trinta por cento) para ressarcimento ao erário. Principalmente numa época em que o indivíduo passa a ter mais necessidades em razão da idade ou da doença, devendo ser poupado de aborrecimentos, sentimentos de insegurança, perdas financeiras, etc.
Portanto, meus leitores, lutemos contra essas injustiças!
OBS: Imagem acima extraída de uma página da da Agência Brasil de Notícias com créditos autorais a Antonio Cruz.
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