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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

O Rio não poderá negar água para São Paulo!




Sou um ambientalista carioca, vivo aqui no litoral sul-fluminense e, a princípio, não concordo com a transposição das águas dos rios já que se trata de uma medida altamente danosa para a natureza pois importa numa inevitável perda de vasão. Principalmente quando se trata de suprir a demanda de uma outra bacia hidrográfica.

No primeiro semestre do ano, Alckmin propôs interligar a represa de Jaguari, na bacia do Paraíba do Sul com a de Atibainha, construindo uma estação de bombeamento e um túnel num trecho de serra. Confesso que, na época, não me agradou a ideia do governador paulista, entendendo ser necessário primeiramente buscar outras alternativas menos agressivas para o meio ambiente, as quais importariam no combate ao desperdício e no reaproveitamento da água já utilizada. Também me preocupou o fato de que essa transposição poderia afetar o consumo da região metropolitana do Rio de Janeiro que depende essencialmente do sistema Guandu, o qual, por sua vez, é abastecido pelo Paraíba.

Acontece que o sistema Cantareira está numa situação bem crítica em que a Sabesp já está fazendo uso controlado da chamada reserva técnica da represa sendo que, recentemente, a Justiça determinou que a ANA e o Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo revejam as vazões de retiradas, proibindo também a captação de água da segunda parte do volume morto dos reservatórios Jaguari, Jacareí e Atibainha, abaixo da cota de 815 metros e 777 metros.

Conforme previsto na Lei Federal n.º 9.433/97, "em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais" (art. 1º, III). Ou seja, diante de crises como esta que São Paulo está atravessando, o abastecimento das cidades, mesmo feito precariamente, deve prevalecer sobre outros interesses. Inclusive em relação à manutenção de uma vazão mínima que é importante para se preservar os ecossistemas na foz dos rios.

O fato é que nós cariocas também retiramos água do Paraíba do Sul bombeando este precioso líquido para o rio Guandu de onde a Cedae faz o tratamento e a distribuição para as unidades consumidoras do Rio de Janeiro. E, devido a isso, a foz do Paraíba já sofre há décadas com o avanço do oceano sobre a região de São João da Barra no norte fluminense. Logo, se a ANA passasse a proibir essa necessária transposição, a Cidade Maravilhosa ficaria praticamente sem nenhuma alternativa e teria que dessalinizar a água do mar.

Pois é, meus leitores, a coisa é complicada. Devido ao aquecimento global, estamos vivendo agora uma primavera atípica e que está sendo quase tão quente quanto foi o verãozão deste ano. Uma época que deveria ser chuvosa aqui no Sudeste e com índices pluviométricos moderados, está se apresentando bem seca neste mês de outubro. E, se continuar assim, faltam previsões sobre como poderá estar o sistema da Cantareira no fim do ano, não tendo como a Sabesp evitar o esgotamento da primeira parte da sua reserva técnica antes de 30 de novembro.

Assim, com muita cautela, opino favoravelmente à transposição de águas da bacia do Paraíba do Sul para o sistema Cantareira, desde que o uso das águas se dê parcimoniosamente e em situações bem extremas (quando a Sabesp já estiver utilizando a segunda parte da reserva técnica). Só que jamais poderemos nos esquecer que São Paulo precisa tomar medidas urgentes como reduzir o seu consumo, combater a poluição dos mananciais, adotar normas punitivas contra o desperdício/mau uso e promover a reutilização nas casas, escolas, empresas, órgãos do governo, etc.

Finalmente, por ser a água um recurso natural limitado e dotado de valor econômico, ainda que considerada como "bem de domínio público", não seria injusto o mais rico ente da federação compensar financeiramente o Rio de Janeiro por uma eventual transposição do Paraíba do Sul. Afinal, estamos falando de algo que pode impactar tanto a nossa economia como o conforto da população carioca, além de gerar prejuízos ambientais consideráveis. Portanto, não se trata nem de lucrar em cima da necessidade dos paulistas, mas, sim, de manter as coisas num certo estado de equilíbrio.


OBS: Foto acima Divulgação/Sabesp.

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