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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Celebremos a eternidade da Vida!

"Não queremos, porém, irmãos, que sejais ignorantes com respeito aos que dormem, para não vos entristecerdes como os demais, que não têm esperança. Pois, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também Deus, mediante Jesus, trará, em sua companhia, os que dormem". (1 Tessalonicenses 4.13-14; ARA)


Não há como agente apagar da memória a imagem de alguém que partiu. Emocionar-se e lamentar num enterro é algo muito natural. Segundo a Bíblia, assim que Jacó morreu, seu amado filho José "lançou-se sobre o rosto de seu pai, e chorou sobre ele, e o beijou" (Gn 50.1; ARA).

Entretanto, não devemos passar a vida inteira nos entristecendo sem termos esperança. Paulo, em sua carta à igreja em Tessalônica, na Grécia, referiu-se eufemicamente às pessoas mortas como alguém que "dorme". E, com isto, o autor da epístola exorta seus leitores a não se preocuparem com o destino daqueles que já tinham morrido.

Cada cultura e cada indivíduo respondem à morte de uma maneira. Entre diversos povos da África, por exemplo, o morto é considerado alguém que continua a fazer parte da família. Sendo as tribos africanas animistas, é muito comum as pessoas desses países acreditarem que o espírito desencarnado do falecido prosseguirá zelando pelo bem de seus descendentes e cônjuges. E, se não re-encarnarem, receberão uma espécie de "promoção" para um plano superior, passando a viver junto ao Ser supremo, identificado em certas tradições pelos nomes de Olodumaré ou Olorun na língua dos iorubás (um dos maiores grupos étno-linguístico na África Ocidental, composto por 30 milhões de pessoas em toda a região).

Contudo, o importante é que as pessoas consigam se recobrar do trauma da perda, aprendendo a lidar com a ausência e vivendo com uma esperança motivadora. Assim, neste sentido, as palavras de Paulo tornam-se bem confortadoras. Pois, além de compreender a morte como um descanso transitório, deve o seguidor de Jesus ansiar pelo momento em que todos estarão reunidos para sempre com Deus. E a este respeito o apóstolo expõe muito bem o mistério da existência conforme a imagística e o conhecimento de sua época:

"Ora, ainda vos declaramos, por palavra do Senhor, isto: nós, os vivos, os que ficarmos até à vinda do Senhor, de modo algum precederemos os que dormem. Porquanto o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; depois nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com ele, entre as nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e, assim, estaremos para sempre com o Senhor. Consolai-vos, pois, uns aos outros com estas palavras." (1Ts 4.15-18; ARA)

Em cima destes escritos, a Igreja criou inúmeras doutrinas posteriores e muitas delas tornaram-se até alienantes quanto à vida em comunidade. Os padres começaram a abusar desta consolação, projetando a felicidade do homem no céu, ao invés de incentivarem o encontro com a Vida no aqui e agora. Explorado pelos seus patrões e pelos governantes, com amplo apoio dos líderes eclesiásticos, nada mais restou ao trabalhador exceto sonhar com um paraíso após a morte. E para limitar qualquer ação revolucionária dos pobres, ainda criaram as terríveis ameaças acerca da condenação no inferno.

Numa época mais moderna, em que desastres de grandes proporções têm ocorrido juntamente com o desenvolvimento de armas de destruição em massa e mais as profundas mudanças sociais, não há nada mais alienante do que as paranoias apocalípticas. Os discursos sobre a segunda vinda de Jesus têm se tornado verdadeiras sessões de terror como se a qualquer momento o fim do mundo pudesse acontecer. Aí, segundo esta visão teológica, quem estiver vivendo fora dos padrões da Igreja, será destruído.

Lendo os versos de 1 a 11 do capítulo 5 da epístola, entendo que a ideia de uma repentina chegada do "Dia do Senhor" é nada mais do que uma exortação para que a humanidade se prepare para um novo tempo. Trata-se, portanto, de percebermos a nova estação na qual o mundo está entrando para que não sejamos surpreendidos com as mudanças de valores:

"Quando andarem dizendo: Paz e segurança, eis que lhes sobrevirá repentina destruição, como vêm as dores de parto à que está para dar à luz; e de nenhum modo escaparão" (1Ts 5.3; ARA).

Ao analisarmos a História, percebemos que alguns eventos ocorrem com grandes surpresas, sem que as pessoas tenham tempo hábil para prevê-los. No final da década de 80 e início dos anos 90, quem poderia imaginar que as cortinas de ferro da ex-URSS e da Europa do Leste iriam cair? Repentinamente, foram caindo os regimes totalitários e stalinistas um por um semelhantes às peças de um jogo de dominó. Porém, se retrocedêssemos a 1986, por exemplo, ninguém poderia imaginar que o vergonhoso muro de Berlim iria ser derrubado em tão pouco tempo e que a Alemanha, dividida em dois países, voltaria a se reunificar.

Lendo a mensagem de Paulo, é justamente o aspecto libertador daquelas palavras que precisam ser retidas para não nos enganarmos com essas teologias amedrontadoras que, na prática, só prestam para promover as mais nocivas alienações. Realmente temos que estar atentos, procurando perceber o tempo kairótico, aquilo que Deus está hoje fazendo no mundo. E, firmados na esperança, promovermos a vida em comunidade.

"Nós, porém, os que somos do dia, sejamos sóbrios, revestindo-nos da couraça da fé e do amor e tomando como capacete a esperança da salvação; porque Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançar a salvação mediante nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu por nós para que, quer vigiemos, quer durmamos, vivamos em união com ele." (1 Ts 5.8-10; ARA)

Quando vivemos com esta percepção no tempo kairótico, nossa existência torna-se uma eterna aventura. Quer estejamos aqui, ou "dormindo", podemos experimentar a salvação, isto é, uma vida plena e satisfeita pela nossa integração total com o Criador e tudo o que Ele fez de bom. Preocupar-nos com o futuro pessoal ou com a partida dos entes queridos já não deve mais nos afligir porque passamos a celebrar a continuidade da Vida que tem na ressurreição de Cristo Jesus um belíssimo símbolo.

Contrariando o papo sem aterrorizante desses pregadores sem graça que têm por aí, Paulo escreve os versos finais de sua epístola aos tessalonicenses motivando-os para a experimentação da vida comunitária. O seguidor de Jesus é chamado para atuar na edificação de uns dos outros, assumindo sua responsabilidade com os irmãos locais. E. com estas palavras, ele explica o que vem a ser esta celebração da vida:

"Evitai que alguém retribua a outrem mal por mal; pelo contrário, segui sempre o bem entre vós e para com todos. Regozijai-vos sempre. Orai sem cessar. Em tudo, dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco. Não apagueis o Espírito. Não desprezeis as profecias; julgai todas as coisas, retende o que é bom; abstende-vos de toda a forma do mal." (1Ts 5.15-22; ARA)

Por acaso esta última citação não é um excelente exemplo do que significa viver no tão desejado tempo kairótico em que aprendemos a ser gratos e nos alegrarmos sempre?

Complementando o seu estudo sobre a epístola paulina no CBA, Rosalie Koudougueret, bacharel e mestre em Teologia da República Central da África, trás-nos estes oportunos comentários:

"As palavras de Paulo nos lembram os extraordinários privilégios que desfrutamos como crentes, os quais são a fonte de nossa alegria, mas também de nossos deveres e responsabilidade em evitar o mal e pôr em prática a palavra de Deus. Essas palavras são particularmente aplicáveis à igreja hoje, a qual tem sido tão influenciada pelo mundo que agora abriga todos os tipos de males: corrupção, imoralidade, tribalismo [conflitos entre as tribos africanas], divisão, egoísmo e roubo. Além disso, existe uma escassez de profunda e dinâmica oração. Já é hora de a igreja retornar ao seu primeiro chamado para ser 'o sal da terra' e a 'luz do mundo'" (Comentário bíblico africano; São Paulo: Mundo Cristão, 2010, pág 1500)

Que neste feriado do dia 2 de novembro, mundialmente dedicado aos que "dormem", venhamos nos encher de esperança e nos fortalecermos com a luz do nosso Deus! E, confortados, possamos prosseguir confiantes em nossa caminhada, celebrando alegremente a eternidade de todos os seres porque o nosso Criador é a fonte da vida que pulsa no Universo. Bendito seja Ele!


OBS: A ilustração usada neste texto diz respeito ao quadro Ressurreição de Cristo, pintado pelo artista francês Noël Coypel, em 1700.

3 comentários:

  1. Até hoje, no Brasil, o feriado de Finados ainda é uma data triste, mas espero que, futuramente, isto possa ser mudado.

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  2. Rodrigão, pondo de lado o feriado e suas intenções, creio que a maior parte da cristandade remete a eternidade para o futuro quando na verdade já deveríamos estar vislumbrando e equacionando ela no presente!

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  3. De pleno acordo, Franklin! E esta remessa da eternidade para o futuro com recompensas e castigos póstumos faz parte de um antigo instrumento de dominação dos ricos sobre os pobres. É algo que só será mudado através de uma reciclagem intraconsciencial, quando as pessoas experimentarem realmente o amor de Deus lançando fora aquilo que as aprisiona - o medo.

    Abração!

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