A deflagração da operação que levou à prisão do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, adiciona não apenas um capítulo à longa série de turbulências institucionais do estado, mas inaugura um período de absoluta incerteza política, capaz de alterar tanto o clima na Guanabara quanto o tabuleiro eleitoral rumo a 2026.
Historicamente, o Rio de Janeiro convive com instabilidade envolvendo seus governadores — já foram mais de uma dezena afastados, presos ou cassados direta ou indiretamente desde a redemocratização — porém o epicentro dessa vez não está no Executivo, e sim no núcleo de articulação do Legislativo, que vinha sustentando politicamente o Palácio.
Se a prisão se consolidar, o processo de sucessão interna da ALERJ passa a ser decisivo. Uma demora na articulação para substituição pode produzir um vácuo de poder interpretado de diferentes formas: para alguns, oportunidade de reorganização; para outros, risco de paralisia institucional e insegurança jurídica.
A sucessão e o tabuleiro de Castro
O governo Cláudio Castro enfrenta seus próprios dilemas, inclusive um processo sob análise no Tribunal Superior Eleitoral que, caso avance, pode alterar completamente o quadro. A interdependência entre Palácio Guanabara e ALERJ era sustentada por um arranjo político construído nos últimos anos.
Com a detenção do presidente da Casa, o sistema de contrapeso vira incerteza. O que era base, vira dúvida. O que era aliança, vira cálculo.
Os interlocutores do governador tendem a defender a tese da continuidade por preservação institucional: “prende-se o indivíduo, mantém-se o acordo”. Mas política real não se move apenas por fidelidades discursivas — ela se move por projeção de poder.
E o poder, neste momento, está oscilando.
E como isso impacta as eleições de 2026?
A crise abre espaço para reconfigurações narrativas. Os grupos situacionistas tentarão incorporar o discurso de normalidade institucional: “nada muda, o sistema funciona”.
Já setores que se colocam como alternativa tendem a explorar a exaustão pública com esquemas, delações, operações e prisões que se repetem como uma liturgia da política fluminense.
É inegável que esse momento pode favorecer quem já estava em vantagem nas pesquisas pelo simples fato de que os holofotes tendem a se voltar para o Executivo e suas soluções. Entretanto, a crise nunca é monopólio de um polo ideológico — ela se torna ambiente fértil tanto para quem já lidera quanto para quem precisa demonstrar que o modelo todo está esgotado.
Para a chamada “política tradicional”, a estratégia costuma ser minimizar: “Fato isolado, seguimos em frente”.
Para quem se opõe ao arranjo Bacelar-Castro, o discurso poderá se intensificar: “não são peças, é a estrutura”.
O Rio de Janeiro diante de sua encruzilhada
O Rio vive a contradição de ser um estado com potência econômica, cultural e geográfica — e, ao mesmo tempo, com governabilidade fragilizada pela captura de interesses, pela dependência de acordos e pela reincidência das mesmas práticas que atravessam partidos, governos e décadas.
Se o presidente da ALERJ é preso, se o governador é julgado, se as bases se rearranjam sem a sociedade ser ouvida, o problema deixa de ser momentâneo para se tornar sistêmico.
E aqui a narrativa não é apenas sobre a queda de um, mas sobre a insistência de um modelo que opera como se tudo fosse negociável — exceto a transformação.
A crise atual expõe mais uma vez o que a população fluminense já sente na pele: não se trata de trocar nomes, mas de enfrentar o pacto de poder que produz essas crises em sequência, como se fossem eventos naturais.
Talvez a verdadeira pergunta para os próximos dias não seja quem assume, mas quem consegue representar um projeto que não dependa desse ciclo. Quem não trate a corrupção como um defeito individual, mas como uma consequência de um sistema fechado, oligárquico e blindado à participação real.
O Rio de Janeiro só romperá esse ciclo quando surgir — ou quando se fortalecer — uma alternativa que enfrente o que está por trás do enredo, e não apenas seus personagens.








