Páginas

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Estamos voltando aos tempos da vingança privada e da barbárie?!




Achei estarrecedora a notícia sobre o covarde espancamento da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, 33 anos, vítima de um boato na internet que a acusava levianamente de sequestrar crianças para rituais de magia negra. Ela havia sido linchada na tarde de sábado por moradores de uma comunidade do Guarujá, litoral paulista, foi conduzida ao hospital pelos bombeiros mas, nesta manhã, não resistiu aos ferimentos e veio a falecer.

As imagens da agressão chegaram a ser registradas por um cinegrafista amador sendo bárbaras as cenas gravadas no vídeo. Segundo a polícia, inexiste qualquer prova de que Fabiane estivesse praticando esse absurdo delito contra os menores e tão pouco existiria o acontecimento a ela atribuído:

"Não tem nem minimamente a possibilidade, suspeita de que ela teria feito alguma coisa assim. Não existe esse fato de criança sequestrada para ser usada em magia negra", declarou o delegado Claudio Rossi.

Contudo, os agressores de Fabiane nem ao menos investigaram a autoria e a materialidade da informação propagada numa rede social, a qual continha sua foto apontando-a como sendo uma criminosa. E, movidos pelo ódio, executaram brutalmente uma mulher mãe de família sem que ela tivesse direito a um julgamento justo com contraditório e ampla defesa. As pessoas que amarraram seus pés e a golpearam deram-lhe um torturante destino que o nosso ordenamento jurídico de modo algum admite como pena. Pois nem os piores bandidos podem sofrer castigos corporais ou serem sentenciados à morte por expressa vedação constitucional.

Ora, o fato é que esses comportamentos são histericamente motivados pela mídia, sobretudo a televisiva. Embora nenhum jornal policial incentive diretamente a sociedade a praticar atos desse tipo, eis que a maneira como são noticiados os revoltantes crimes hediondos faz com que o cidadão não espere pelas desacreditadas instituições estatais e resolva fazer (in)justiça com as próprias mãos. E isto ainda recebe uma forte contribuição do heroísmo dos filmes onde os personagens tomam a iniciativa de perseguir bandidos por sua conta e risco. Então, com o poder de divulgação das redes sociais de internet, o problema torna-se mais ainda potencializado.

Enfim, nada justifica a barbárie ocorrida no Guarujá, devendo o Estado e os grupos mais influentes da sociedade combaterem condutas assim e suas causas. Pois vale lembrar que nenhuma civilização floresceu sem que houvesse o respeito pelo monopólio estatal da jurisdição. Mesmo quando surgiram as antigas cidades-reinos da Mesopotâmia, no terceiro milênio antes de Cristo, vale ressaltar que cabia unicamente ao monarca a competência para decretar a pena de morte de alguém (§ 48 das Leis de Eshnunna).

A violência sofrida por Fabiane mostra-nos o quanto a sociedade pode se tornar perversa, imediatista e intolerante. Em pleno século XXI, o povo brasileiro ainda se encontra vulnerável a emocionalismos histéricos em que qualquer um hoje em dia está correndo o risco de ser linchado na rua por causa de falsos boatos. Logo, precisamos urgentemente trabalhar pela mudança desse comportamento perigoso, promovendo a pacificação das pessoas por meio da racionalidade e da elevação ética em nível consciencial.


OBS: Imagem acima oriunda de reprodução no Youtube.

Um comentário: