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domingo, 5 de fevereiro de 2012

Sábado no Corcovado

Quando criança, na companhia de meus pais e familiares, passeei bastante pelos principais pontos turísticos do Rio, dentre os quais os morros do Corcovado e do Pão de Açúcar. Visitar estes lugares pra mim é como relembrar a infância, fazer um mergulho no passado e empreender uma releitura da paisagem geográfica sob o olhar de um homem adulto.

Para minha esposa Núbia, porém, estes lugares são uma novidade. Quando criança, seus pais não tinham condições econômicas de levá-la para conhecer esses maravilhosos cartões postais do Rio de Janeiro que muitos cidadãos do município e suas adjacências jamais pisaram a planta dos pés. Tanto é que ela só veio a subir de bondinho no Pão de Açúcar quando passamos uma tarde de março de 1999 fechando o verão no teto da Urca, indo logo depois ao Jardim Botânico. Aquele ano foi só o início do nosso namoro.

Desta vez, tomamos a decisão de subir o Corcovado repentinamente.

Eram umas nove da manhã quando o telefone tocou e a secretária do médico perguntou se Núbia poderia ir ao seu consultório pela manhã, chegando às 11 horas em Ipanema. Não apresentamos restrições e, após nos arrumarmos com rapidez, pegamos um ônibus que sai da frente do nosso prédio do Grajaú em direção ao Leblon passando pelo túnel Rebouças. Então, com menos de 50 minutos, já estávamos desembarcando num ponto da Lagoa Rodrigo de Freitas.

Terminada a consulta com o homeopata, ficamos aguardando o coletivo de volta ao Grajaú na rua Visconde de Pirajá pensando no que faríamos durante a quente tarde deste último sábado. Liguei pra minha mãe, mas ela falou que não seria possível almoçarmos em sua casa porque a empregada não tinha vindo trabalhar. Então, quando menos esperávamos, passou um ônibus com destino ao bairro Cosme Velho onde fica a estação do trenzinho que segue em direção ao Corcovado transportando os passageiros para ver o monumento considerado uma das maiores maravilhas do mundo – a estátua do Cristo Redentor.

Em dezembro de 2011, cheguei a telefonar pra empresa responsável pela estrada de ferro do Corcovado afim de obter melhores informações sobre o passeio, mas o atendimento não fora satisfatório e estava muito difícil conseguir falar com alguém por aquele meio de comunicação. E eu só queria saber o preço da passagem, confirmar se eles aceitam cartão de crédito ou não para a compra do bilhete do trem, bem como se haveria algum tipo de desconto para quem é morador do Rio. Só que, na ocasião, apenas descobri o salgado valor da tarifa de R$ 43,00 (quarenta e três reais).

Sem a informação completa, fomos com a cara e com a coragem. Na carteira, eu deveria ter quase R$ 40,00 (quarenta reais) mais os cartões de crédito e da conta do ITAÚ. Porém, segui contentando-me apenas com a possibilidade de obter as informações que desejava, esperando também ver uns casarões antigos da localidade. Pois, mesmo se não conseguisse levar Núbia desta vez, poderia retornar numa próxima oportunidade com mais planejamento e aproveitaríamos para almoçar em Cosme Velho, poupando a mulher de ficar o sábado na cozinha. E demos a sorte de embarcar num ônibus ainda vazio em Ipanema porque, no caminho, o veículo foi enchendo de turistas.

Ao chegarmos em Cosme Velho, logo no começo da tarde, almoçamos num restaurante bem simples pelo preço de um estabelecimento mais requintado. O local oferece comida a quilo e pude preparar o meu prato dentro da dieta saudável que sigo sem linguiça, feijoada, frituras ou carne misturada com queijo. E, geralmente, gosto de colocar uma saladinha de alface com tomate, de modo que, neste sábado, juntei esta opção com batata calabresa, feijão, cenoura e um único pedaço de carne assada mais um mate pra matar a sede. Mesmo assim, minha consumação chegou a R$ 22,00 (vinte e dois reais).

Pensando bem, até que valeu a pena comer naquele restaurante. Inclusive porque a decoração de lá tem tudo a ver com o nosso país. No lugar tinha bambus, várias plantas, um muro de pedras e quadros exóticos formando um ambiente rústico agradável. Principalmente para o turista estrangeiro que deseja se sentir no Brasil.

Deixamos o restaurante e fomos à bilheteria da estação do Corcovado. Logo que chegamos, um monitor luminoso anunciava que a próxima partida do trem seria às 18. Os motoristas das vans que fazem ponto por ali tentavam convencer os turistas sobre a impossibilidade de usarem aquele meio de transporte no momento. Mesmo assim, fui falar pessoalmente com os funcionários da empresa já que o objetivo de minha ida ali era o de buscar informações para um futuro passeio. E, tendo constatado a possibilidade de pagar a curta viagem com o cartão Visa, insisti para que verificassem também se, por acaso, teria como encaixar duas pessoas antes da hora prevista já que Núbia não estava disposta a ficar esperando até este horário desde duas da tarde (e nem tínhamos uma quantia em dinheiro no bolso pra pagar outro transporte).

Para minha surpresa, a empresa tinha dois lugares vagos no trem das 14:20, contrariando a informação de que a próxima partida seriam às 18 horas. Então, como eu já estava ali e com o cartão de crédito em mãos, foi "sopa no mel". Comprei os bilhetes e fomos para o local de embarque disputando espaço com os turistas ali presentes, dentre os quais a maioria parecia ser de argentinos. Junto conosco subiu uma galera de Buenos Aires que estava veraneando no Rio à bordo de um cruzeiro marítimo.

Interessante foi que a maioria dos visitantes falava espanhol e não reparei a presença de nenhum norte-americano entre eles. Tinha até uns japoneses e também brasileiros vindos de diversas partes do país e daqui do Rio. No restaurante também notamos a mesma coisa, exceto uns franceses que se sentaram numa mesa ao lado da nossa. E acho que a explicação para uma maior frequência de argentinos, mesmo com o real caro, é que as pessoas do Hemisfério Norte já devem estar trabalhando ou estudando visto que as férias escolares por lá costumam ser mais extensas no meio do ano.

Confesso que já não me lembrava bem do passeio de trenzinho até o Corcovado. Quando criança, não apreciava suficientemente a paisagem pois ansiava por chegar logo lá em cima. Desta vez, contudo, busquei degustar cada momento. Tanto o percurso por dentro das matas do Parque Nacional da Tijuca como a vista que se tem da cidade do Rio de Janeiro. Até o final, são feitas duas paradas para que as outras duas locomotivas possam trafegar já que todas compartilham os mesmos trilhos. E vi muitos pés de jaca no caminho, coisa que os argentinos que estavam conosco desconheciam. Quase lá no desembarque, pegamos um trecho do qual era possível avistar o Maracanã em obras sendo preparado a um alto custo para a Copa de 2014.

Da época de minha infância até 2012, houve mudanças lá no Corcovado. Notei a construção de um elevador permitindo o acesso de pessoas com dificuldades de locomoção uma vez que antes era necessário subir escadas até o monumento do Cristo. Também soube que os automóveis e táxis já não estão podendo ir até o final da estrada de rodagem, o que obriga as pessoas a dependerem do transporte alternativo de vans. Porém, ambas as mudanças pareceram-me justas e adequadas tendo em vista a restrição de espaço.

Buscando apreciar cada local do mirante, consegui reconhecer inúmeros pontos da cidade e do estado. Lá de cima consegue-se ver as praias da Zona Sul do Rio: Flamengo, Botafogo, Copacabana, Ipanema e Leblon. E também pudemos reconhecer as de Niterói: Icaraí, Charitas, Piratininga, Camboinhas e Itaipu, além de um pedaço da Lagoa de Maricá que é em outro município. Olhando para a baía da Guanabara e a Serra do Mar, foi possível visualizar sem dificuldades o Dedo de Deus, situado entre os municípios de Guapimirim e Teresópolis, além de outros picos do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, como a Pedra do Sino e mais alguns pertencentes a Petrópolis. Até mesmo os de Nova Friburgo, como o Caledônia e Três Picos de Salinas apareciam já bem distantes ao fundo do pouco conhecido vale do rio Macacu. Com facilidade, identificamos o Pão de Açúcar, o hipódromo, a catedral carioca com sua arquitetura moderna e a arrojada a Ponte Rio-Niterói.

A multidão de turistas nos surpreendeu lá no trecho do mirante que fica de frente para o rosto da estátua. Era gente que não acabava mais e, sinceramente, não dava para ficar à vontade apreciando a paisagem. Umas pessoas nos incomodaram pedindo para sairmos de onde estávamos e elas tirarem foto umas das outras, agindo com uma enorme ansiedade como se o registro do momento fosse coisa mais importante do que degustar o presente. E para caminhar estava bem difícil em certos locais.

Outra coisa que não gostei foi dos preços e das condições de pagamento da cantina e do restaurante lá no Corcovado. Uma latinha de refrigerante custou-nos R$ 4,50 (quatro reais e cinquenta centavos). Um roubo! Sem falar que o estabelecimento nem aceitava cartões.

Ainda que o comerciante não esteja obrigado a vender seus produtos e serviços debaixo de um tabelamento, acho que valores excessivos não devem ser cobrados. Principalmente se, por razões ambientais, existem restrições para uma ampla concorrência ou para a entrada de ambulantes. E aí digo também que é até burrice os comerciantes de lá cobrarem tão caro e não aceitarem cartão de crédito. Isto porque, se as coisas fossem mais acessíveis no Corcovado, o turista permaneceria por mais tempo lá em cima consumindo. Sem esquecer do detalhe que, nos Estados Unidos, onde a dedução no imposto de renda é mais ampla do que no Brasil, muitos norte-americanos preferem realizar suas despesas usando o cartão para não terem que colecionar notas ficais quando fazem suas declarações à receita.

Infelizmente, acabamos não entrando para ver a capela que tem dentro da estátua. Para a perplexidade de Núbia, estavam cobrando a entrada de pessoas pra visitarem uma igreja. Um absurdo! Preferimos não pagar e, com isto, ficamos apreciando as coisas só do lado de fora.

Com certeza que situações como esta me causaram indignação. E o que muito me chateou foi o fato do cidadão do Rio de Janeiro não contar com uma tarifa promocional no trenzinho durante todos os meses como costuma ocorrer no meio do ano, demonstrando o insatisfatório envolvimento da Prefeitura para incentivar o turismo interno. Só que, como nós estávamos a passeio, preferi não me estressar. Afinal, o sábado foi feito para descansarmos de modo que até um cidadão consciente, às vezes, precisa cessar temporariamente com o seu ativismo social diante de fatos comuns do cotidiano ou de coisas que possam lhe trazer aborrecimentos.

Voltamos de trenzinho felizes com o passeio. Ainda no retorno, não deixei de me deliciar com aquela inesquecível paisagem em meio ao verde, dispensando também um tempinho para conversas com outros visitantes no local. Um casal de Curitiba, na estação do Corcovado, compartilhou conosco sobre a viagem turística que estavam fazendo ao Rio e nos deram informações a respeito de como ficou a região do litoral paranaense com a tragédia das chuvas do ano passado, lugar que visitamos em julho de 2001 quando fomos à paradisíaca Guaraqueçaba. Depois, quase na hora de desembarcar do vagão, fiquei conversando com um argentino sobre aspectos da mecânica do trem e terminamos falando mal dos nossos políticos latino-americanos que amam roubar o dinheiro público (eis aí uma boa semelhança com nossos hermanos). E nisto, já deveriam ser mais de 17 horas.

Às 18 horas, eu e Núbia já estávamos de volta ao Grajaú, graças ao transporte direto da linha de ônibus 422 que liga o nosso bairro ao Cosme Velho. Fomos até a casa de minha mãe. E, beneficiados com o horário de verão, comemos uma pizza marguerita por perto com o dia ainda claro. E assim encerramos o sábado satisfeitos pelo que experimentamos, mesmo sem termos levado a máquina fotográfica.




OBS: A ilustração acima e o vídeo do Youtube foram extraídos através da página da empresa responsável pelo trem do Corcovado em http://www.corcovado.com.br/index_por.html

5 comentários:

  1. Muito bacana esse passeio Rodrigão, já fiz ele também quando estive aí no Rio.

    Aliás, usei e abusei de quase todos os pontos turísticos da cidade maravilhosa.

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  2. Sábado legal, hein?

    Sabe que eu nunca fui ao corcovado? Já subi no bondinho do pão-de-açucar mas lá anida não fui, apesar de morar há tantos anos aqui no Rio. Na verdade, não frequento muito a zona sul da cidade. Mas agora, com meu filho crescendo um pouco mais, vou ter uma boa "desculpa" para fazer o passeio. rss

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  3. Prezado Franklin e Eduardo,

    Obrigado aí pelos comentários de vocês!

    Realmente foi um ótimo sábado, sendo que eu prefiro ainda fazer longas caminhadas, visitar cachoeiras e recantos da natureza. Só que, com minha esposa e o problema que ela tem no joelho não dá. E resolvi satisfazer este desejo dela, buscando aproveitar o máximo daquele momento.

    E já que estou modando aqui no Rio, vou aproveitar para conhecer abusivamente outros pontos turísticos da cidade. Na medida do possível, é claro.

    Quero ainda ficar conhecendo isto aqui como a palma da minha mão!

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  4. Edu,

    Não acredito que você morando aqui no Rio nunca foi ao Corcovado!

    Mas não vou falar nada. Afinal, gosto muito de natureza e ainda não visitei o Parque Estadual da Pedra Branca, sendo que tenho muita vontade de explorar uns locais de Guaratiba e praias daquela região que ainda não conheço a exemplo de Grumaria, felizmente protegida da especulação imobiliária.

    Tomara que você fala logo o passeio e que também possamos nos encontrar um dia pra tomarmos um café pessoalmente já que estamos morando no mesmo município agora.

    Abração.

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  5. Em tempo!

    Minha próxima subida de bondinho, se Deus assim permitir, vai ser no Morro do Alemão.

    Já me informei sobre como chegar até lá. Deve-se pegar o trem até Bonsucesso e depois o teleférico.

    Agora com a "pacificação", novos roreiros turísticos vão surgindo no Rio. Mesmo assim, eu questiono bastante esta política de segurança pública do governo estadual.

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