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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

"Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não vos assusteis"



Dando sequência aos estudos bíblicos sobre o livro de Lucas, eis que iniciamos, nesta terça-feira (29/10), a abordagem do pequeno "apocalipse" de Jesus também chamado de Sermão Profético e que se se encontra presente nos três primeiros evangelhos (Mt 24-25; Mc 13; Lc 21:5-38). Algo que, segundo a tradição dos sinóticos, teria ocorrido no Monte das Oliveiras, de frente para o Templo de Jerusalém.

No artigo "não ficará pedra sobre pedra", tratamos do tema da destruição do 2º Templo judaico, um fato histórico que ocorreu no ano 70 da nossa era poucas décadas depois da morte de Jesus, quando as tropas do general romano Tito invadiu a Cidade Santa. Assim, na intimidade do ambiente discipular, tendo em vista a predição feita pelo Mestre, seus seguidores o perguntam sobre quando aquele acontecimento sucederia e também que "sinal" revelaria a aproximação do cumprimento da profecia (Lc 21:7). Ao respondê-los, nosso Senhor pareceu demonstrar mais preocupação com os falsos messias e profetas mentirosos do que com os acontecimentos catastróficos conforme podemos observar através das seguintes palavras:

"Respondeu ele: Vede que não sejais enganados; porque muitos virão em meu nome, dizendo: Sou eu! E também: Chegou a hora! Não o sigais. Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não vos assusteis; pois é necessário que primeiro aconteçam estas coisas, mas o fim não será logo. Então, lhes disse: Levantar-se-á nação contra nação, e reino, contra reino; haverá grandes terremotos, epidemias e fome em vários lugares, coisas espantosas e também grandes sinais do céu." (Evangelho de Lucas, capítulo 21, versículos de 8 a 11; versão e tradução ARA)

Verdade é que secas, enchentes, furacões, doenças, tremores de terra, tsunamis, guerras, atentados terroristas, revoltas populares e badernas nas ruas são coisas que compõem a nossa realidade cotidiana nesta era atual da humanidade. Os cataclismos naturais, por exemplo, fazem parte do próprio movimento da Terra embora muitos deles tenham hoje a frequência e a intensidade aumentadas por causa da nossa ação danosa sobre o meio ambiente (aceleração do efeito estufa). Quanto aos conflitos bélicos e políticos, não podemos jamais perder a consciência de que o mundo passou mais tempo lutando do que em paz. Saibamos que, no final da Idade Média, França e Inglaterra brigaram durante um século na Guerra dos Cem Anos. E isso vem se repetindo em todos os períodos históricos até que as próprias armas de destruição em massa e, principalmente, a bomba atômica tornaram-se uma espécie de freio/disciplina dos conflitos militares juntamente com os diretos humanos. Pois, se esse nocivo armamento das potências for algum dia usado, certamente que não restarão vencedores.

Há 2000 anos atrás, quando discursou sobre o fim do Templo e do mundo, Jesus preveniu os seus discípulos contra qualquer baboseira apocalíptica que surgisse. E essa era também uma preocupação dos líderes das comunidades cristãs da época em que os evangelhos teriam sido escritos. Após a destruição do Templo no ano 70, uma nova revolta contra Roma foi preparada na década de 30 do século II por Simão Bar Kochba, o qual se auto-proclamava messias e era assim aceito pelos seus seguidores. Devido à insanidade daquele líder, os judeus foram novamente massacrados e expulsos da Terra Santa pelo então imperador Adriano. Logo, era preciso prevenir a Igreja para não embarcar numa canoa furada. O messianismo vivido por Jesus foi antes de mais nada humilde e pacífico como já pude tratar numa outra postagem sobre a sua entrada em Jerusalém montado num burrinho, a qual não considero como triunfalista.

Creio que esses alertas proféticos do Mestre também têm a ver com os outros momentos da Igreja posteriormente aos séculos I e II, bem como com a nossa atualidade. Ainda hoje há oportunistas tirando proveitos através de um sensacionalismo alarmista e desviando pessoas do verdadeiro foco da mensagem do Evangelho. São os falsos pregadores do terceiro milênio que, mesmo usando o nome de Jesus, associam as notícias dos jornais com o cumprimento de uma profecia específica como se estivessem adivinhando algo. Aliás, pode-se dizer que, ultimamente, o meio evangélico ficou impregnado dessas besteiras a ponto de uns saírem por aí divulgando que Bush, Obama, Bento XVI, o papa Francisco, a Dilma e até o cantor irlandês Paul David Hewson, o Bono Vox da banda U2, fossem o "anticristo". No ano passado, então, por causa de uma absurda interpretação das tradições dos antigos maias, inventaram que o mundo acabaria em 2012, o que rendeu até um filme de catástrofe dirigido pelo cineasta Roland Emmerich. Ou seja, há toda uma indústria que se mantem por causa das preocupações com o "fim do mundo".

Penso que, nessas horas, precisamos refletir e termos a mesma sobriedade com a qual agia Martinho Lutero, o qual tinha os pés no chão diante de qualquer histeria escatológica. Conta uma lenda popular na Alemanha que, certa vez, teriam perguntado ao ilustre reformador da Igreja sobre o que ele faria caso soubesse que o mundo iria acabar no dia seguinte. A isto Lutero respondeu com sensatez e demonstrou fé no amanhã dizendo: "Eu plantaria uma macieira hoje!"

No texto paralelo de Marcos, do qual Lucas depende, há um detalhe justaposto à passagem em estudo que talvez não interessasse ser transmitido ao leitor gentílico do 3º Evangelho. É que muitos judeus daquela época esperavam por um período de sofrimento antes da vinda do Messias. Então, neste sentido, Jesus caracterizou as guerras e os terremotos como o princípio das dores de um parto (Mt 24:8; Mc 13:8), algo que deve ser compreendido mais como uma mensagem de esperança e de encorajamento para enfrentarmos o presente. Pois o que segue depois do nascimento com vida de um bebê é justamente a alegria da mãe pela chegada de mais um ser no mundo. Toda a agonia da gestante sofrida antes de dar a luz é superada pela genitora.

Assim também penso que devemos caminhar crendo na plenificação do Reino de Deus que já se encontra no nosso meio e em nós (Lc 17:20-21), como pude abordar no artigo Um reino que vem sem aparência visível. Nosso presente ainda marcado pelos sofrimentos, em decorrência da errada conduta humana, um dia há de se converter num tempo de amor e de justiça. As coisas não permanecerão para sempre do jeito como se encontram. Deus está no controle da História e somos chamados por Cristo para escrevê-la através da vivência construtiva do Evangelho nas nossas relações pessoais. Portanto, meus amigos, não desanimemos de plantar árvores! Quer ocorra um incêndio na floresta e tenham sido derrubadas as matas pela motosserra, precisamos crer que a terra devastada ainda pode virar um bosque ambiental ou um delicioso pomar orgânico de fruteiras. Jamais desistamos e nem nos deixemos alienar porque o fim dos tempos é também um novo começo.


OBS: A imagem acima trata-se de uma foto que mostra a infantaria nas trincheiras com máscaras de gás durante a 1ª Guerra Mundial conforme extraí do acervo da Wikipédia em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Australian_infantry_small_box_respirators_Ypres_1917.jpg

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