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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Um parente genial que nem meu avô conheceu...

 


Nem todos guardam suas histórias de família. Uns não dão o devido valor e outros tão pouco tiveram a oportunidade de que alguém as relatassem quando ainda eram criança.


Nesse ponto, agradeço muito ao meu saudoso avô paterno Sylvio, falecido aos 87 anos, no final de maio de 2005, por ter me contado um pouco da vida de seu pai, dos seus avós paternos e maternos, e até de um bisavô dele que nem mesmo chegou a conhecer. Porém, tratava-se do homem que, praticamente, foi o tutor do seu pai, Francisco Ancora da Luz (meu bisavô), devido ao falecimento precoce do avô dele, Francisco Carlos Ancora da Luz (1858  1888) que, segundo a versão da família, teria morrido antes de completar 30 anos, quando se encontrava construindo uma ferrovia em Minas Gerais, onde contraiu a letal febre amarela.


Entretanto, esse bisavô do avô, chamado Francisco Carlos da Luz (1830  1906), e que seria meu tetravô ou tataravô (corrijam-me se eu estiver errado), teve 75 anos de bastantes realizações, sendo uma figura histórica em Santa Catarina, seu estado de origem.


Pois é. Apesar de ter ido a Florianópolis numa única vez (e há 26 anos), tenho raízes familiares nesse belo trecho do litoral da Região Sul, em que os meus primeiros ascendentes teriam migrado dos Açores para o Brasil, por volta de meados do século XVIII. E foi na localidade de Praia Comprida, bairro do Município de São José, onde Francisco Carlos da Luz nasceu, havendo, tempos depois, representado a então Província de Santa Catarina na Câmara dos Deputados.


Conhecido mais pela sua alta patente no exército brasileiro, por haver chegado ao derradeiro posto de marechal e se reformado somente quando atingiu a compulsória, eis que a menção à carreira militar e aos seus mandatos como deputado geral, de certo modo ofuscam o brilhantismo de Francisco Carlos da Luz nos campos das ciências, da engenharia e das letras, visto ter sido ele também um professor de Matemática, um pesquisador de munições e construção de ferrovias, autor de alguns livros e de vários artigos para jornais sob o pseudônimo M.R., que seriam as iniciais de "Marechal Reformado".


O bom desempenho de Francisco Carlos da Luz como aluno foi notado desde o primeiro ano de seu ingresso na Escola Militar, em 1846, aos 16 anos. Em 1849, foi promovido a 2º Tenente, com carta de engenheiro e de bacharel em matemática, sendo que uma das suas primeiras atribuições como militar foi a de coordenar a implantação de pioneira indústria metalúrgica nacional (fábrica de ferro), em Ipanema, no interior do estado de São Paulo.


Suas promoções foram rápidas dentro do Exército e, ainda como 1º Tenente, na década de 50 do século XIX, chegou a dirigir o Imperial Laboratório Pirotécnico, em Campinhos, no Rio de Janeiro, dedicando-se à sua especialidade que era o fabrico de espoletas e foguetes de alta tecnologia, o que colocou o exército brasileiro em vantagem sobre as corporações militares dos países vizinhos, gerando resultados positivos nos combates da Guerra do Paraguai.


Sendo autor de livros, Francisco Carlos da Luz fez doações frequentes para a Biblioteca Pública de Santa Catarina, inaugurada em 1855. Tais publicações encontram-se no Setor de Obras Raras da instituição juntamente com outros escritores. 


Com o incentivo do pai, José Maria da Luz, o qual era um político regional em Santa Catarina, Francisco Carlos lançou a sua primeira candidatura para a Câmara dos Deputados, pelo Partido Conservador, tendo ficado como suplente. E, antes de terminada a legislatura, assumiu a cadeira na Casa Legislativa. Já, no pleito seguinte, saiu vitorioso e tomou posse como titular na Câmara de Deputados do Império.


Naqueles velhos tempos, os militares, quando ocupavam cargos eletivos, não se tornavam reservistas como ocorre atualmente, desde a diplomação do político. Logo, com o início da Guerra do Paraguai, Francisco Carlos da Luz retornou ao Exército, foi dirigir o Arsenal de Guerra no Rio de Janeiro e só retornou às atividades parlamentares com o fim do conflito armado.


Pode-se dizer que a sua contribuição naquele período crítico não foi nos campos de batalha confrontando-se com o adversário e sim como um cientista. Aliás, Francisco Carlos da Luz não deixou de lecionar, tendo sido regente de cadeira na Escola Superior de Guerra e comandou a Escola Militar onde havia se formado.


Antes de deixar o Exército, já na época republicana, Francisco Carlos da Luz ainda enfrentou um último conflito que foi defender a então capital federal contra os navios rebeldes na Revolta da Armada. Nessa ocasião, ele exerceu o comando geral da Artilharia, mostrando, assim, a sua lealdade ao novo regime.


Como militar reformado, suas últimas atuações foram os artigos políticos publicados no já extinto Jornal do Commercio (1827  2016), sempre usando o pseudônimo M.R., até que veio a falecer em 1906, no Rio de Janeiro, por motivo de complicações numa cirurgia.


Com o tempo, o velho marechal acabou esquecido no Rio, mesmo tendo vivido por muitos anos na capital do país e a defendido na Revolta da Armada. Porém, recebeu muitas homenagens em seu estado, dando nome a um forte situado em São Francisco do Sul, no qual foi inaugurado o busto das fotos desse artigo, na data recente de 15/12/2016. 



Uma curiosidade sobre minha família do lado paterno é que tanto o pai, quanto o avô e o bisavô de meu avô Sylvio tiveram o primeiro nome de Francisco. Meu pai manteve essa tradição e se chamava Francisco Carlos Ancora da Luz, havendo, por coincidência, falecido prematuramente aos 36 anos, em setembro de 1983. Dois anos depois, em 1985, passei a ser criado pelo meu avô.


Desde Francisco Carlos da Luz até o meu pai, todos se aplicaram à área das ciências exatas e apenas meu avô não foi engenheiro, mas cursou dois anos essa faculdade e depois passou para a antiga Escola Militar de Realengo, vindo a escolher a arma da artilharia. Já o meu pai, não desejou e nem pôde entrar nas Forças Armadas porque era diabético.


É possível que toda essa inclinação de meus antepassados próximos para a engenharia tivesse uma influência também do lado materno pois a esposa do marechal, Maria Bárbara de Moraes Âncora (1826  1905), era filha de outro engenheiro militar, o português Firmino Herculano de Morais Ancora (de 1790 — 1862), construtor do Palácio das Princesas, em Pernambuco. Logo, os genes devem ter se combinado juntamente com o ambiente doméstico propício ao estudo das exatas.


Quando estudante, confesso ter sido bom com os números e até fui selecionado pela escola para disputar uma Olimpíada de Matemática no primeiro ano do segundo grau (atual ensino médio), mais precisamente no segundo semestre de 1991. Não acertei nenhuma questão, mas valeu pela experiência. Ainda assim, não tive dificuldades nessa matéria quando cursei meus exames de vestibular, mas preferi casar-me com as ciências humanas. Aliás, de todas as disciplinas aprendidas antes da faculdade, preferi História, coisa que meu pai, engenheiro mecânico, também gostava.


OBS: Imagens acima extraídas de https://www.saofranciscodosul.sc.gov.br/noticia/3950/busto-em-homenagem-a-marechal-luz-e-inaugurado 

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