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quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Remédio em casa ou atenção farmacêutica?




Nos últimos anos, muitos políticos e candidatos nas eleições passaram a defender propostas do tipo "Programa Remédio em Casa" que seria a entrega de medicamentos no domicílio do paciente.

Sabemos que, como decorrência da aplicação do artigo 196 da Constituição Federal, pode-se afirmar que a Assistência Farmacêutica é uma política pública integrante do direito à saúde, a qual deve ser executada em cooperação pelos três entes estatais. Através da gradual evolução dos serviços prestados, os cidadãos passaram a receber medicamentos das prefeituras, conforme previsto na listagem de SUS e, em alguns casos, mediante ordem judicial (há várias ações neste sentido tramitando na Justiça brasileira bem como na Comarca de minha cidade).

É fato que a distribuição de remédios nem sempre é satisfatória nos municípios brasileiros. Aqui em Mangaratiba, por exemplo, uma pessoa que sofre de várias enfermidades pode ter que percorrer duas ou três unidades de saúde atrás de medicamentos, os quais nem sempre estão disponíveis no local. Às vezes, quando se trata de paciente que recebe medicações por meio de medida judicial (ou por acordo celebrado com a Defensoria Pública) todos são entregues no setor de farmácia da Prefeitura, situado atualmente no prédio antigo do "Mendoncinha". Mas, nos casos comuns, o paciente tem que procurar numa unidade dispensadora que pode ser um posto de saúde de bairro ou num local de saúde voltado para uma área específica de tratamento, a exemplo de um balcão existente no CAPS.

De fato, muitos problemas poderiam ser reduzidos com um programa de entrega domiciliar de medicamentos em quantidades suficientes para o período de 90 dias aos portadores de patologias crônicas, ou estáveis e controlados clinicamente, desde que em acompanhamento no SUS. Pois não discordo de que isso pode garantir o acesso mais efetivo aos medicamentos e organizar o atendimento contínuo aos portadores de doenças crônicas, proporcionando mais conforto aos pacientes que sejam de idade bem avançada, com dificuldades de locomoção, ou que possua necessidades especiais.

Por outro lado, sabe-se que a entrega domiciliar de medicamentos necessita de disponibilidade orçamentária e de um bom planejamento das prefeituras. E, embora haja benefícios consideráveis, quando compreendidos do ponto de vista do paciente, como a redução da taxa de abandono dos tratamentos e a diminuição dos deslocamentos até às farmácias dos postos de saúde, eis que o conforto em excesso cria um novo prolema. Trata-se da perda de contato do farmacêutico.

Pouca gente deve saber do que se trata a Atenção Farmacêutica, a qual não pode ser confundida com a Assistência Farmacêutica, sendo que esta é considerada gênero enquanto aquela espécie. Por atenção farmacêutica entende-se que é o conjunto de ações promovidas por um farmacêutico, em colaboração com os demais profissionais de saúde, visando promover o uso racional dos medicamentos e a manutenção da efetividade e da segurança do tratamento. Logo, seria uma área dentro da Assistência Farmacêutica que foca suas atividades no usuário de medicamentos, inclusive humanizando mais o processo de tratamento e construindo uma relação feita em acordo entre o paciente e o farmacêutico, na qual este realiza as funções de controle do uso dos remédios com habilidades e conhecimentos apropriados.

Na prática, a Atenção Farmacêutica corresponde ao acompanhamento do tratamento medicamentoso também pelo farmacêutico buscando alcançar resultados que melhorem a qualidade de vida do paciente, tendo por base as disposições gerais da Resolução n.º 585/2013 do Conselho Federal de Farmácia e da Resolução n.º 338/2004 do Ministério da Saúde. É algo que pode aumentar as chances de cura/controle da enfermidade, ajuda a eliminar ou reduzir os sintomas, bem como pode prevenir o surgimento de novas doenças ou de outras condições indesejáveis suportadas pela pessoa numa terapia de uso contínuo.

Para tanto faz-se necessário que os municípios tenham programas envolvendo a atuação dos farmacêuticos, de preferência em todos os bairros ou distritos, no sentido de que sejam prestadas orientações ao público através de atendimentos individuais ou em grupo. Devem ser criadas Farmácias Populares Comunitárias nas quais seriam realizados os atendimentos (individual ou coletivo), processando ainda a manipulação e/ou a dispensação de produtos e correlatos com as finalidades profilática, curativa, paliativa, estética ou para fins de diagnósticos.

Assim, acredito que, com essa nova metodologia sanitária, a saúde nos municípios poderá dar um salto de qualidade e a um custo relativamente baixo. É algo que cada cidade pode começar a por em prática bastando que haja consultas e palestras feitas por um farmacêutico. Então, numa etapa posterior, podem ser criadas as Farmácias Populares, as quais se fariam presentes nos bairros e podem centralizar toda a distribuição de medicamentos no Município, livrando os pacientes de terem que buscar seus remédios nas diversas unidades do SUS.

Concluindo, a Atenção Farmacêutica não precisa necessariamente excluir um Programa de Remédio em Casa, o qual é muito útil e adequado para quem se encontra acamado. A entrega domiciliar pode ser aplicada para casos que forem excepcionais e que jamais deixariam de ser acompanhados pelo profissional de farmácia, quer seja por meio de visitas via PSF ou convocando a presença do familiar para uma consulta. Afinal, trata-se de valorizar o serviço de quem se especializou numa área do conhecimento humano e que muito pode ajudar de maneira holística na terapia dos pacientes. Principalmente quando o indivíduo faz uso de diversas substâncias receitadas por mais de um médico.

Para finalizar, compartilho que, em minha cidade, tramita o Projeto de Lei Municipal de n.º 06/2015 apresentado pelo vereador José Maria de Pinho (PSB), o qual propõe implantar o Programa Municipal de Atenção Farmacêutica na Rede Pública de Saúde de Mangaratiba. Caso venha a ser aprovado, nosso município poderá desenvolver uma inovadora metodologia de educação sanitária que promova o uso correto de medicamentos objetivando uma melhora na qualidade de vida dos pacientes.  Para que a sociedade fique ciente e participe mais das atividades do Legislativo, reproduzo a seguir o texto normativo da proposição. Compartilhem!


Art. 1º - Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a implantar o Programa Municipal de Atenção Farmacêutica na Rede Pública de Saúde de Mangaratiba.

Art. 2º - Para os efeitos desta lei, considera-se atenção farmacêutica o conjunto de ações promovidas por um farmacêutico, em colaboração com os demais profissionais de saúde, visando promover o uso racional dos medicamentos e a manutenção da efetividade e da segurança do tratamento.

Art. 3º - Os médicos e demais profissionais da Rede Pública de Saúde deverão encaminhar os pacientes que necessitem de acompanhamento farmacoterapêutico para os serviços de atenção farmacêutica.

Parágrafo Único – Considera-se acompanhamento farmacêutico o processo no qual o farmacêutico se responsabiliza pelas necessidades do usuário relacionadas ao medicamento, por meio da detecção, prevenção e resolução de problemas relacionados aos medicamentos, de forma sistemática, contínua e documentada, com o objetivo de alcançar resultados definidos, buscando a melhoria da qualidade de vida do usuário.

Art. 4º - Caberá ao Programa Municipal de Atenção Farmacêutica promover orientações terapêuticas em todas as regiões distritais e nas localidades mais populosas de Mangaratiba nas quais haja alguma unidade de saúde.

Art. 5º – Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a criar farmácias comunitárias para prestar assistência farmacêutica e orientação sanitária individual ou coletiva, onde se processe a manipulação e/ou a dispensação de produtos e correlatos com finalidade profilática, curativa, paliativa, estética ou para fins de diagnósticos.

Art. 6º - O Poder Executivo Municipal regulamentará através de decreto a presente lei no que for necessário para a sua aplicação, no prazo de noventa dias.

Art. 7º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.


OBS: Foto acima extraída de http://www.vilavelha.es.gov.br/midia/paginas/farm%C3%A1cia.JPG

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