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quinta-feira, 22 de abril de 2010

Deus e os preconceitos culturais religiosos

Sem dúvida, Deus sempre nos leva mais além do nosso cotidiano comum para que possamos romper com as nossas limitações pessoais e avançarmos na direção que Ele propõe.

Durante os primeiros anos da Igreja primitiva, a perseguição empreendida por Saulo de Tarso, após a morte de Estevão, serviu para impulsionar a pregação do Evangelho para outros lugares fora de Jerusalém, resultando num maior crescimento da obra de Deus, sendo que, a partir daí, coisas mais incríveis ainda aconteceram nos dias seguintes.

E, se antes a Igreja precisava superar o medo das perseguições das autoridades religiosas judaicas, em uma nova fase tornou-se necessário aos nossos irmãos do passado vencer alguns preconceitos culturais e entender qual a dimensão daquela obra que fora profetizada há muitos séculos pelos profetas (Isaías 56.1-7).

Primeiramente os nossos irmãos do passado foram surpreendidos com a inesperada conversão do jovem Saulo, sendo que muitos demoraram a acreditar neste fato (At 9.26). E suponho que as próprias autoridades religiosas do judaísmo devem ter se sentido frustradas com a conversão de Saulo e, por isso, podem ter recuado provisoriamente as perseguições contra a Igreja de Deus. O autor de Atos dos Apóstolos conta que, naqueles dias, a Igreja alcançou um momento de paz nas regiões da Judeia, Galileia e Samaria, crescendo cada vez mais, e já não se encontrava estabelecida somente em Jerusalém como fora no início.

Pois bem. Nesta época, Pedro permaneceu firme no contexto do seu dia a dia, visitando as comunidades dos irmãos, liberando sobre muitos a unção de cura e de ressurreição que estava sobre ele. E, deste modo, ia consolidando a obra iniciada pelos discípulos, atraindo mais pessoas para se entregarem a Cristo.

Contudo, Pedro necessitava de uma outra experiência para ir mais além das próprias limitações e, deste modo, poder cumprir o glorioso chamado de Deus em sua vida.

Atos diz que, enquanto Pedro estava na cidade portuária de Jope, eis que em Cesareia (uma outra cidade da região da Palestina também marítima), morava um alto oficial do Império Romano chamado Cornélio.

Embora fosse estrangeiro, Cornélio residia entre os judeus e tinha um comportamento íntegro diante de Deus juntamente com toda a sua família. Pois, ao invés de oprimir o povo em nome do dominador romano, ele preferia praticar a caridade e, frequentemente, orava ao Senhor. Porém, apesar de ser estrangeiro, Cornélio deveria ser respeitado pelos judeus em razão de sua alta posição como autoridade e das boas ações que praticava, sendo certo que, naquela época, os estrangeiros eram discriminados pela religião judaica, considerados como pessoas impuras, com os quais não poderiam fazer suas refeições. E a própria lei mosaica impunha distinções alimentares aos judeus com a finalidade de afastar os riscos de assimilação por outra cultura, o que, contextualmente explicava-se porque se tratava da formação de uma nação separada das demais.

Apesar de sofrer todo este preconceito naquela complicada província romana, Cornélio teve uma experiência sobrenatural numa certa tarde quando viu um anjo. Este, ao manifestar-se, mandou que Cornélio enviasse mensageiros até Jope onde estava Pedro e o conduzisse para Cesareia. Temente a Deus, Cornélio obedeceu prontamente a ordem transmitida pelo anjo.

Ocorreu que, no dia seguinte, por volta do meio dia, quando os homens enviados por Cornélio estavam a caminho de Jope, Deus fala com Pedro através de uma visão. O apóstolo viu descer do céu vários animais considerados pela Lei de Moisés como impuros para a alimentação e para o sacrifício. Então, Pedro ouviu uma voz com uma ordem expressa para que ele comesse a carne daqueles bichos. Porém, por três vezes, o ele se recusou a obedecer o que lhe estava sendo falado na visão, mesmo sendo advertido para que não considerasse como coisa comum aquilo que Deus purificou.

Sem ainda entender o significado daquela experiência, chegaram os homens enviados por Cornélio à casa onde Pedro estava hospedado, quando então o apóstolo recebeu uma direção do Espírito Santo para acompanhá-los. Pedro, desta vez, obedeceu à ordem de Deus e, no dia seguinte, partiu com aqueles homens para Cesareia.

Ora, Cornélio estava com o coração totalmente aberto para receber a Palavra de Deus e, espontaneamente, convidou seus parentes e amigos para ouvirem o que Pedro teria para lhes anunciar. E, embora fosse ele um homem piedoso que, continuamente, orava a Deus, não sabemos se de fato Cornélio tinha a concepção sobre a existência de uma única divindade ou se deveria adorar somente a Deus. Por ignorância, ele chegou a se prostrar diante de Pedro a fim de adorá-lo, tão logo o apóstolo chegou em sua casa (At 10:25).

Entretanto, erros ingênuos como esses jamais seriam imputados por Deus, visto que Cornélio estava com o seu coração completamente aberto e preparado para ouvir a mensagem do Evangelho, aguardando apenas que alguém viesse lhe anunciar as Boas Novas.

Quebrando um forte preconceito existentes entre os judeus daquela época, Pedro entrou na casa de um estrangeiro incircunciso e fez ali um breve discurso anunciando Jesus, mas que foi suficiente para salvar a vida daquelas pessoas que estavam presentes e com os seus ouvidos atentos, a ponto de todas elas receberem instantaneamente o dom do Espírito Santo como acontecera anteriormente no dia de Pentecostes (At 10:44-46).

Lendo os versos 36 a 43 do capítulo 10 de Atos, percebe-se que Pedro fez menção do ministério de Jesus ocorrido entre os judeus alguns anos antes, pois se tratava ainda de um fato ainda recente na memória do povo e, na certa, conhecido por Cornélio bem como pelos demais ouvintes (At 10:37-38). Prosseguindo, Pedro falou da morte de Jesus (At 10:39), sua ressurreição (At 10:40-41), da missão recebida para pregar ao povo (At 10:42) e do perdão dos pecados para todo aquele que Nele crê (At 10:43).

Sem que fosse necessário Pedro fazer alguma citação das Escrituras judaicas, o Espírito Santo foi derramado sobre aqueles receptivos ouvintes enquanto o nosso irmão ainda falava. E, mesmo sem eles terem ainda experimentado o batismo nas águas, começaram a falar em línguas e a glorificar a Deus, confirmando que foram, verdadeiramente, convertidos.

Reparem que não foram necessárias muitas palavras para que Cornélio e todas aquelas pessoas em sua casa entregassem suas vidas para Jesus e fossem seladas pelo Espírito Santo. Seus corações estavam verdadeiramente abertos na expectativa de receberem a Palavra de Deus que lhes foi ministrada. E, quando receberam o dom do Espírito Santo, estava mais do que confirmado que aqueles homens estrangeiros tinham sido salvos pela breve pregação de Pedro.

Enquanto que no Pentecostes os discípulos só receberam o dom do Espírito após terem perseverado em oração, por uns dez dias, Cornélio e os seus convidados ficaram cheios da presença de Deus, mesmo no momento em que receberam o Evangelho (At 11:15-16), pois a sede deles era tanta que foram batizados no Espírito imediatamente.

Com isto, Deus estava quebrando todo e qualquer preconceito cultural que pudesse existir naquela época dentro da Igreja, a qual foi formada a princípio por judeus, considerados como guardiões de uma tradição milenar dada por Moisés, tendo sido o povo com o qual Deus manteve um relacionamento durante séculos com a finalidade de preparar o ambiente ideal para a manifestação do Messias.

Até então, muitos certamente pensavam que a salvação fosse apenas para os israelitas que aceitassem a Cristo (At 11:18), não visualizando ainda a extensão ilimitada do plano de Deus que já havia sido, inclusive, profetizada séculos atrás nas Escrituras hebraicas.

Pode-se dizer que Pedro experimentou um considerável crescimento na sua vida espiritual como apóstolo e pregador da Palavra de Deus. Uma experiência que o levou a romper com suas limitações pessoais, sendo conduzido pelo Espírito Santo para alcançar um grau superior de maturidade espiritual para aperfeiçoamento seu e também da Igreja.

Nesta altura, Pedro já não era mais aquele homem inconstante descrito nos Evangelhos. Agora, além da coragem para enfrentar multidões e autoridades manifestada no dia do Pentecostes, Pedro estava se tornando mais compreensivo quanto aos propósitos de Deus.

Nos versos 19 a 20 do capítulo 11 de Atos, Lucas diz que, entre os discípulo que tinham sido dispersos por Saulo, depois da morte de Estêvão, alguns tomaram a iniciativa de evangelizar também os gregos, os quais eram inimigos dos judeus desde os tempos de Antíoco Epifânio. Porém, segundo o texto do versículo 21, a mão do Senhor estava com estes evangelistas, o que confirmou ser de Deus a direção fora dada a Pedro.

Assim como Pedro, também precisamos nos despir dos preconceitos culturais que ainda guardamos em nosso íntimo, afim de que possamos compreender o atual contexto em que Jesus nos comissiona para transmitirmos as Boas Novas a todos os homens, fazendo discípulos de todas as nações.

Embora na atualidade a Bíblia já esteja traduzida para diversos idiomas e existam missões cristãs em praticamente todos os países, precisamos vencer as barreiras culturais também dentro dos nossos relacionamentos interpessoais, penetrando no mundo das pessoas com as quais convivemos.

Entendo que não podemos mais nos fechar dentro das nossas igrejas, criando comportamentos para nos diferenciarmos exteriormente dos de fora e enganarmos a nós mesmos que somos separados do mundo só porque deixamos de ir às festas, tomar banho de mar, ouvir música secular ou de participar de um churrasco com a própria família. Temos que alargar os nossos horizontes e nos tornarmos mais acessíveis.

Infelizmente, muitos de nós cristãos evangélicos ainda confundimos o processo de conversão de alguém com o hábito de frequentar uma igreja. Alimentamos dentro de nós uma visão limitada de Deus, achando que a pessoa ao nosso lado não está sendo trabalhada e aí, quando a levamos para as nossas instituições religiosas, nem sempre a transformamos num discípulo de Jesus, mas sim na seguidora de uma nova cultura – a cultura dos evangélicos brasileiros.

É possível que, quando Pedro chegou na casa de Cornélio, este já estivesse até com o coração convertido, aguardando apenas que alguém lhe anunciasse Jesus. E, da mesma maneira, pode ser que o seu vizinho, parente ou colega de trabalho também já esteja vivendo este processo de conversão na expectativa de apenas ouvirem as Boas Novas. Afinal, Deus não faz acepção de pessoas.
 

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