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terça-feira, 18 de março de 2014

O excesso de criminalização nas relações de consumo




Li recentemente que, na semana passada , na Comissão de Defesa dos Consumidores da Câmara Federal, foi aprovada a proposta legislativa de autoria do deputado do PP gaúcho Renato Molling (foto) que defende equiparar ao estelionatário o comerciante que colocar à venda produto que não possuir em estoque. De acordo com o texto normativo do Projeto de Lei de n.º 6369/13, a pena para esse tipo de conduta poderá chegar a até cinco anos mais multa. E, se o delito for praticado na forma culposa, isto é, se, por engano, o empresário entregar produto diferente do comprado pelo consumidor, a pena prevista será de detenção de um a seis meses, ou multa. Senão vejamos o que consta no inteiro teor do PL:

O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º O art. 66 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 66. ...........................................................
§ 1º ..................................................................
§ 2º Quem oferecer, expor à venda ou comercializar produto que não possui em estoque, na condição de varejista, sem comprovadamente informar o fabricante do produto, no prazo de dez dias da celebração do negócio, ou entregar produto de origem diversa daquela oferecida ao consumidor final:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.
§ 3º Incide nas mesmas penas do § 2º o comerciante que, após informar o fabricante da realização do negócio, não adquirir os produtos.
§ 4º Se o crime é culposo:
Pena – detenção de um a seis meses ou multa.”
Art. 2º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. 

A meu ver, embora a ideia do parlamentar vá de encontro à enorme necessidade de se combater os constantes abusos ocorridos hoje no mercado de consumo, não me parece que seja este o instrumento mais adequado quando os recursos fora da esfera criminal seriam bem mais eficazes para coibir as chamadas práticas abusivas, caso funcionassem a contento. Além do inegável direito às reparações por prejuízos morais e materiais, na hipótese de haver dano, poderia o legislador federal instituir ainda várias penas civis privadas em favor da vítima bem como permitir que os Procons determinem a aplicação de medidas corretivas, conforme tem sido debatido na citada comissão da Câmara quanto às propostas do Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal n.º 8078/90) defendida no PL n.º 5196/13 do Poder Executivo.

Verdade seja dita que, se todos os erros de conduta forem criminalizados, quem acabará respondendo serão os empregados das grandes empresas pois o comerciante não poderá responder na esfera penal pelo que uma terceira pessoa cometeu. A não ser se, comprovadamente, o dono e gerente do estabelecimento estiver agindo dolosamente afim de lesar os consumidores e captar uma grande quantidade de vendas sem possuir estoque ou até mesmo capital. Ainda assim, as maiores vítimas dessas normas draconianas serão os pequenos empresários e não os grandes. Ainda mais quando se tratam de sociedades anônimas.

Se por um lado existem injustiças praticadas pelos fornecedores de serviços, não se pode ignorar a indústria de indenizações que se formou neste país pelo tratamento paternalizado dado ao consumidor que muitas das vezes age também de má fé. Isto sem esquecermos que, em outras situações, os próprios agentes estatais responsáveis por fiscalizar os comerciantes aproveitam-se da criminalização de condutas para extorquir dinheiro de quem trabalha.

Verdade seja dita que o atraso na entrega de um produto jamais pode ser comprado a um estelionato. Neste, o golpista quer unicamente lesar a vítima. Ou seja, o malandro não tem nenhum compromisso com o próximo. Ele apenas quer levantar uma grana e, como se diz na gíria, "meter o pé". Já o empresário que monta o seu negócio para servir o público e ter lucro com a atividade sabe muito bem que depende de uma boa imagem perante o mercado para se manter já que a concorrência tem ficado vez maior e esta, por si só, já promove alguma seleção entre os varejistas em razão dos fatores bom preço e confiança. Portanto, deixar a polícia fora dessa parece ser mais adequado.


OBS: A foto acima refere-se ao deputado Renato Molling (PP/RS). A imagem foi extraída da Agência Câmara com atribuição de autoria a Lúcio Bernardo Jr. conforme consta em http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/INDUSTRIA-E-COMERCIO/463585-VENDER-PRODUTO-QUE-NAO-ESTA-EM-ESTOQUE-PODERA-SER-EQUIPARADO-A-ESTELIONATO.html?utm_campaign=boletim&utm_source=agencia&utm_medium=email

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