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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O direito do cidadão em receber medicamentos dos governos



Segundo o artigo 196 da nossa Constituição de 1988, a saúde é um direito de todos e uma obrigação do Estado, o que impõe um dever comum aos três entes federativos. E isto certamente inclui o fornecimento de medicamentos necessários ao restabelecimento físico e também psíquico do paciente como explicita o artigo 6º, inciso I, alínea d da Lei n.º 8.080/90.


Entretanto, nem sempre os direitos do paciente são respeitados como deveriam pelo Poder Público. Há prefeituras que, além de ignorarem a responsabilidade estabelecida pela Lei Maior do país, sustentando hipocritamente que não caberia ao município fornecer todo e qualquer medicamento, criam também inúmeras dificuldades ao cidadão caracterizando assim uma hedionda violência institucional. Pois, através de procedimentos injustificáveis, pessoas são prejudicadas e muitas só conseguem obter os remédios de que precisa mediante o proferimento de ordem judicial.

Atualmente, um dos problemas mais comuns que acontece em inúmeras cidades brasileiras seria sobre o fornecimento de medicamentos que não constam na listagem padronizada do SUS. E aí muitos remédios receitados ao paciente, ainda que excepcionais à indigitada relação, podem ser até indispensáveis para a manutenção da saúde ou mesmo da vida de um doente.

É certo que os entes estatais precisam estabelecer algum parâmetro através de uma listagem de medicamentos afim de se evitar abusos como um paciente passar a exigir remédios supérfluos ou desnecessários. Porém, quando um órgão de saúde impõe que o medicamento receitado da pessoa conste obrigatoriamente na lista do SUS, é cometido um tremendo absurdo e desrespeito aos direitos humanos. Isto porque é evidentemente impossível limitar as necessidades de quem se encontra enfermo e tão pouco os prodigiosos avanços da Medicina.

Por sua vez, tem se configurado como outra flagrante violência do Estado os órgãos de saúde exigirem que o paciente apresente receituário passado por médico da rede pública. Pois, se o cidadão procura diretamente um profissional conveniado ao seu plano de saúde, ou mesmo um consultório particular, obtendo por esse meio a receita, ainda assim as prefeituras negam-se a fornecer o medicamento prescrito. Ou seja, mais um absurdo que não podemos tolerar.

Ora, como as unidades emergenciais e ambulatoriais do SUS encontram-se geralmente assoberbadas, exigir que o cidadão doente apresente receituário da rede pública pode causar uma demora no tratamento do paciente e agravar mais ainda a sua saúde. Outrossim, se alguns usuários do sistema único podem recorrer a serviços complementares de saúde, seria até benéfico para diminuir o tempo de espera no atendimento dos hospitais caso o excludente procedimento das prefeituras fosse revisto.

Deve-se considerar também que cada paciente pode querer ser atendido pelo médico de sua confiança capaz de melhor compreender o seu quadro clínico. Trata-se aí de uma identificação pessoal, algo que deve ser respeitado e visto como capaz de contribuir decisivamente para o tratamento da doença sendo que nem sempre um bom diagnóstico será feito através de hemogramas, raio-x, análises da urina e de outros exames. Há profissionais que, por exemplo, conseguem entender o problema da pessoa através de uma simples conversa em consultório de modo que suas conclusões nem sempre serão acompanhadas por outro colega que preste atendimento no caótico SUS onde a estrutura é propositalmente precária.

Esses e outros constrangimentos ocorrem diariamente no nosso país. São situações que só conseguem ser amenizadas pelas decisões do Poder Judiciário que tem obrigado municípios e estados a fornecerem medicamentos e meios de tratamento a quem busca socorrer-se através da tutela jurisdicional. Porém, nem todo cidadão consegue chegar às portas da abarrotada Defensoria Pública e ingressar com sua ação judicial. Muito menos contar com o apoio de advogados dispostos a defender a causa já que, na maioria dos casos, trata-se de uma clientela de condição humilde impossibilitada de pagar pelos honorários do causídico.

Mas até quando o Judiciário vai continuar sendo o lugar de resolver problemas individuais de distribuição/fornecimento de remédios?

Se o Judiciário também condenasse as prefeituras a pagar indenizações por dano moral, além de dar o medicamento, teria algum adianto significativo ou viraria outro paliativo?

Reconhecer o dano moral que quase sempre é in re ipsa certamente não vai ser suficiente.

Considerando todas essas questões, entendo ser muito mais eficiente e adequada a propositura de soluções de alcance coletivo. É certo que as políticas públicas na área da saúde têm sido insatisfatórias porque, a princípio de conversa, votamos muito mal nas eleições a cada ano par. Assim, vejo como uma boa possibilidade de mudança a propositura de ações pelo Ministério Público e/ou por entidades da sociedade civil organizada afim de se buscar uma melhor prestação das normas jurídicas já existentes solucionando para todos o problema. Pois só assim é que mudanças significativas ocorrerão neste nosso Brasil. Do contrário, o assoberbado Judiciário vai ficar permanentemente passando sua toalha no gelo ao ajudar uma minoria ao invés da nação inteira.


OBS: Ilustração encontrada no acervo virtual da Wikipédia em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ritalin-SR-20mg-full.jpg

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