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quinta-feira, 12 de abril de 2012

A compulsão de cada um

Geralmente os homens que se tornaram ícones da composição da história da humanidade foram sujeitos compulsivos.

Tenho pra mim que muitos políticos poderosos, empresários que ficaram bilhonários e líderes religiosos de grandes instituições, bem como famosos artistas, padecem dessa terrível doença. Algo que pode muito bem estar ligado a alguma fobia, desejos narcísicos ou de afirmação pessoal.

O livro de Eclesiastes suscita uma interessante reflexão ao relacionar as realizações dos homens com a competição que surge entre eles, considerando como futilidade insistir em tal postura:

“Então, vi que todo trabalho e toda destreza em obras provêm da inveja do homem contra o seu próximo. Também isto é vaidade e correr atrás do vento.” (Ec 4.4; ARA)

De fato, conquistar algo inspirado pelo desejo de superar o seu semelhante trata-se de uma motivação baixa e que contraria o princípio de satisfação das necessidades reais. Ambicionar um carro de luxo para ter um falso símbolo de status social na vizinhança é uma mediocridade tola. Contudo, é através de alvos assim que muita gente procura preencher-se emocionalmente, caindo nas armadilhas do mercado de consumo.

Até aí podemos dizer que a compulsão consumista seria um dos menores males cujo resultado acaba sendo, em via de regra, a adaptação do indivíduo ao sistema em que vive, ocasionando um infeliz endividamento. Só que o problema das compulsões torna-se mais ainda preocupante quando o sujeito vira um sociopata megalomaníaco e começa a influenciar a vida política da coletividade com um comportamento doentio. Então o seu descontrole passa a por em rico o bem estar de uma cidade e até mesmo da nação.

Personalidades históricas como Nabucodonosor, Júlio César, Gengis Khan, Napoleão ou Hitler foram exemplos destrutivos do que a compulsão descontrolada é capaz de causar. Todos eles ambicionavam conquistas militares e provocaram a morte de milhões de pessoas. Insaciáveis, queriam cada vez mais e mais até se depararem com a dura realidade da vida e serem derrotados pela própria egolatria.

Felizmente nem todos chegam ao ponto extremo desses caras. Ainda bem! Porém, há pessoas que estão destruindo a si mesmas e aos que convivem com elas porque simplesmente recusam-se a se tratar.

Um pai de família viciado em corridas de cavalo, um fanático religioso com loucas ambições de santidade (ou de proselitismo), um chefe perfeccionista e uma mulher maníaca por estética que fica até altas horas na madrugada de domingo pra segunda assistindo o Doutor Hollywood na Rede TV, mesmo tendo que levantar bem cedo no dia seguinte para trabalhar, seriam alguns exemplos de gente que carece de paz no seu interior. Suas buscas infrutíferas demonstram que tais pessoas ainda não conheceram a felicidade e a projetam em coisas ilusórias. Construir este ou aquele castelo de areia nunca será o suficiente para suprir o vazio que há nelas.

O Evangelho de João, em seu capítulo 4, fala de uma mulher samaritana que se encontrou com Jesus num poço. Ela havia ido para lá debaixo do forte calor do meio dia e ficou por alguns instantes conversando com o Senhor. Este, percebendo a sua necessidade de busca interior e o quanto ela era infeliz nos instáveis relacionamentos com os homens, ofereceu-lhe metaforicamente uma “água” para saciar a sua “sede” para todo o sempre.

“Quem beber desta água [do poço] tornará a ter sede; aquele, porém, que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna.” (Jo 4.13-14; ARA)

Em outras palavras, Jesus estaria dizendo para a mulher samaritana (e também para todos nós) sobre alguém descobrir em seu próprio interior a fonte de vida, a qual sacia toda a sede de preenchimento. Sede esta que a humanidade tenta resolver com coisas erradas de modo que nenhuma conquista alcançada jamais será suficiente.

Verdade seja dita que dinheiro, poder, fama, carros, popularidade, prestígio, status, ter várias mulheres, frequência em festas, títulos, vitórias em jogos, uma coleção de fotografias, viagens, sensações emocionais produzidas pelas drogas, filhos, uma biblioteca particular ou uma multidão de artigos editados jamais poderão atender ao desejo real de nos unirmos com Aquele que enche todas as coisas. Pois é na sinceridade interior que nos conectamos com o Pai num culto de adoração genuína praticando uma conduta inversa a de Adão quando este escondeu-se da Divina Presença estando ainda no Paraíso (Gn 3.8).

Acredito que o verdadeiro segredo está em nos aproximarmos reverente e corajosamente de Deus, sem reservas. Precisamos desnudar o coração diante do Onisciente confessando ao Misericordioso todas as nossas motivações, inquietações, dúvidas, temores e sentimentos. E mais do que ninguém, o Pai Celestial quer que encontremos a Vida em nós mesmos fazendo do nosso relacionamento com Ele uma fonte vital para sempre.


OBS: A primeira ilustração acima trata-se de um retrato a óleo de Napoleão Bonaparte como o primeiro cônsul francês. Foi pintado por Jean-Auguste-Dominique Ingres (1780-1867). Encontra-se atualmente no Museu de Arte Moderna de Liège, Bélgica. Quanto à segunda ilustração, cuida-se de uma obra do italiano Giacomo Franceschini (1672-1745), mostrando Jesus e a mulher samaritana no Poço de Jacó.

3 comentários:

  1. Rodrigão, acredito que todos nós temos nossas compulsões manifestadas nas suas mais variadas facetas, umas mais DISCRETAS, outras porém, sem PUDOR algum...

    "...o verdadeiro segredo está em nos aproximarmos reverente e corajosamente de Deus, sem reservas...", aqui está um grande dilema difícil de ser resolvido, ainda que momentaneamente consigamos "DOMESTICAR" nossas pulsões/motivações, o que fica nítido é que elas estão na tocaia afoitas por uma oportunidade para mostrar "as caras"!

    FAZ PARTE DO NOSSO SHOW!!!

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  2. Olá, Franklin!

    Como teria dito o apóstolo Paulo,


    "Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto. Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém, o eetuá-lo. Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço. Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim." (Rm 7.15-20; ARA)


    Embora se trate de um texto bem poêmico, considero muito instrutivo para todos nós estas palavras atribuídas a Paulo em sua carta aos Romanos. Pois cuida-se do reconhecimento desta tendência de não conseguirmos nos domesticar, de continuamente falharmos nesta tentação. E aí a postura do profeta Isaías em seu chamado vocacional (cap. 6) também nos ensina quando ele mesmo se considera um pecador e homem de lábios impuros:

    "Então, disse eu: ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!" (Is 6.5; ARA)

    Todavia, é este o reconhecimento que nos faz aproximar de Deus. É nos considerando como miseráveis pecadores que a graça divina manifesta-se de maneira acolhedoura, nos sarando e nos "elegendo":


    "Então, um dos serafins voou para mim, trazendo na mão uma brasa viva, que tirara do altar com uma tenaz; com a brasa tocou a minha boca e disse: Eis que ela tocou os teus lábios; a tua iniquidade foi tirada, e perdoado, o teu pecado." (versos 6 e 7)


    Ora, o que precisou fazer Isaías em troca para ter o seu pecado perdoado? Nada! Ele foi aceito pela graça divina. Reconheceu o seu estado de miséria espiritual e Deus o escolheu como profeta enviado para pregar em sua nação (verso 8).

    Como se vê, Isaías, foi reverente e corajoso. E ainda assim, ele não ficou livre de suas compulsões. Com todas suas limitações, foi um cara usado por Deus para testemunhar perante aquela geração pregando a fé no Etrno, advertindo o povo sobre seus pecados, trazendo incríveis mensagens de esperança e falando surpreendentemente da graça.

    Abraços e valeu pelo seu comentário.

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  3. Em tempo!

    Mesmo que não tenhamos consições de vencer nossas compusões (principalmente o instinto de nos inclinarmos para elas), penso que é necessário buscarmos meios de dominarmos o comportamento como teria dito Deus a Caim:

    "o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo." (Gn 4.7; ARA)

    Ou nas penas de Paulo:

    "E daí? Havemos de pecar porque não estamos debaixo da lei, e sim da graça? De modo nenhum!" (Rm 6.15; ARA)

    Penso que não devemos deixar nos escravizar pelas compulsões ou pelos desejos negativos. Não temos condições de nos dominar totalmente, mas precisamos lutar contra aquilo que nos leva a praticar o mal. E creio que Deus usa até nossa fraquezas ou tendências ruins para o louvor de sua glória, afim de que sirvamos de testemunho para a salvação de muitos.

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