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terça-feira, 2 de agosto de 2011

Manifesto do Movimento Nova Friburgo em Transição

Muito interessante esta ideia! Resolvi divulgá-la!




“Os problemas do mundo não podem ser resolvidos por céticos ou cínicos, cujos horizontes sejam limitados por realidades óbvias. Nós precisamos de pessoas que sonhem com algo que nunca existiu”. John F. Kennedy







Um dos maiores desafios na tarefa de reconstrução da cidade de Nova Friburgo, duramente atingida pelo maior desastre ambiental da história do Brasil, é o da provisão de moradias em larga escala e em locais seguros, a partir da adoção de soluções técnicas que não repitam os erros do passado. O desastre ambiental provocado pelas chuvas torrenciais que devastaram a região serrana fluminense, em janeiro deste ano, colocou em foco na mídia mundial a situação de vulnerabilidade em que se encontram nossas cidades, em razão de um desenvolvimento urbano pautado na sobreposição dos interesses privados sobre os da coletividade, trazendo à tona a urgência de reformularmos radicalmente a maneira como nos relacionamos com o nosso habitat. Apesar das tragédias como essa repetirem-se, ano após ano, com frequência e intensidade crescentes, pode-se constatar que as ações do poder público têm se limitado a seus aspectos emergenciais, não resolvendo a questão em termos estruturais.







O Nova Friburgo em Transição tem como propósito inserir o município no Movimento Mundial das Cidades em Transição (Transition Towns), a partir da articulação da sociedade civil organizada e o poder público, para a realização das mudanças necessárias para que a cidade atinja uma situação de sustentabilidade urbana, tornando-se menos vulnerável aos efeitos das mudanças climáticas, crise econômica e/ou energética. Entendemos que todo momento de crise é, também, um momento de novas oportunidades e de possibilidade de correção de rumos. Não se trata, portanto, de apenas construir casas para os desabrigados, mas de repensar essas cidades sob novos enfoques, construindo, ao invés dos imensos conjuntos habitacionais situados em áreas distantes dos locais de trabalhos, bairros planejados sob a perspectiva de criação de ecossistemas sustentáveis.



A proposta básica do movimento é a realização de um projeto-piloto de um ecobairro, de forma que essa experiência possa ser replicada em outros lugares, estimulando uma mudança radical no modelo de urbanização vigente, e promovendo uma repercussão positiva mais imediata em direção à transição desejada, do que apenas a aplicação de uma legislação urbanística que, embora indispensável, apresenta resultados num horizonte mais a longo prazo.







O projeto desse ecobairro poderia ser realizado a partir de um concurso nacional de idéias, onde os primeiros colocados participariam, de forma cooperativa, no desenvolvimento do projeto, a partir de um termo de referência elaborado por uma equipe técnica transdisciplinar (arquitetos, sociólogos, geólogos, engenheiros, geógrafos, antropólogos, economistas, etc.) e representantes dos futuros moradores. Paralelamente, seriam realizadas amplas campanhas ecopedagógicas, especialmente com a população-alvo do projeto (desabrigados e moradores de áreas de risco). Na região existem institutos e oficinas-escolas como o TIBÁ (Instituto de Tecnologia Intuitiva e Bio-Arquitetura), o Instituto Pindorama, o Bambu-Rio, o CECNA, a Mãos de Luz, a Escola da Mata Atlântica etc., que poderiam promover a capacitação de jovens voluntários para trabalhar, sob a orientação de arquitetos e engenheiros, na construção das novas edificações e infraestruturas urbanas, mediante a aplicação de tecnologias sustentáveis e princípios ecológicos como a permacultura.



Numa perspectiva de inversão da atual tendência de urbanização extensiva e predatória, esse novo assentamento urbano deveria ser um ecobairro vertical, dentro da concepção de “cidade compacta”, com uma qualidade urbanística similar à das superquadras de Brasília, mas com várias diferenças:





1.o sistema de circulação deverá privilegiar os pedestres (com calçadas largas e espaços públicos atrativos), os ciclistas (com uma ampla rede de ciclovias e bicicletários públicos), e o transporte coletivo de massa (movido à eletricidade ou biocombustível);



2. a implantação urbanística deverá se adequar as características geomorfológicas locais, tirando partido das declividades topográficas, no intuito de se evitar o uso de elevadores (vide exemplo do Conjunto Pedregulho, de autoria do arquiteto Reidy) e movimentos de terra, através do uso de pilotis;



3. emprego de materiais locais e ecotécnicas construtivas, respeitando-se as características geográficas e culturais do lugar e dos futuros moradores;



4. utilização de energias limpas e renováveis, tratamento biológico do esgoto, separação e reciclagem do lixo, paisagismo produtivo, hortas orgânicas, agroflorestas etc.



5. capacitação de jovens voluntários para trabalhar na construção das edificações e infraestruturas urbanas (a exemplo do Movimento Oasis, em Santa Catarina).



A ideia fundamental é a criação coletiva de uma experiência modelo, radicalmente nova em relação ao status vigente, e que sirva de referência na transição do atual padrão de urbanização predatório e caótico para um modelo de desenvolvimento sustentável, numa espécie de metástase benigna. O momento é altamente oportuno para a concretização dessa proposta, que vem de encontro à realização da Conferência Rio+20 no próximo ano, quando o Rio de Janeiro estará recebendo ambientalistas do mundo inteiro para avaliar os avanços da ECO-92.





Para concluir, podemos acrescentar que a perspectiva de uma transição para um modelo urbano sustentável envolve também, e necessariamente, a transição dos atores sociais, mediante a integração de valores como a cooperação, a convivialidade, a solidariedade, a criatividade e a consciência de pertencimento ao planeta, sob pena de inviabilizarmos a continuidade da vida na Terra.



Contatos através do grupo “Nova Friburgo em Transição”, no Facebook.





Movimento Nova Friburgo em Transição

Nova Friburgo, julho de 2011

Sandra Mara Ortegosa

Um comentário:

  1. Achei louvável a ideia de se construir um eco-bairro! Há muito tempo que já desejei isto, desde que comecei a me envolver com as questões ambientais em 1999.

    Tendo lido ontem à noite o texto, após tê-lo imprimido, fiz algumas observações que penso serem relevantes para considerarmos e refletirmos.

    Primeiro diz respeito à citação do Kennedy. Pois, ao lado dos utópicos, a mente cética vem complementar, auxiliando um grupo de pessoas sonhadoras, levando-nos a observar certos aspectos da realidade e nos preparando para o enfrentamento das questões que, provavelmente, devem surgir.

    Sem dúvida que uma das maiores dificuldades seria a “articulação da sociedade civil organizada e o poder público”. Isto porque o poder público local encontra-se em crise e carecemos de melhores representantes tanto na Prefeitura como na Câmara, sendo muito difícil trabalhar com pessoas que só querem usar a política pra se dar bem. E, mesmo que tenhamos alguma mudança positiva nas urnas em 2012, penso que a política cotidiana feita pelo cidadão precisará mudar.

    É justamente este cidadão comum que vai precisar fiscalizar os políticos, os órgãos oficiais envolvidos com o projeto, contribuir com sua experiência de vida e participar ativamente. E, por sua vez, também será este cidadão comum que irá trabalhar no projeto e ele precisará de uma capacitação, a qual requer tempo.

    Penso que, quando tivermos um eco-bairro já construído, este poderá ou não interagir com a cidade, criando uma necessidade de novos valores ecológicos. Pode ser que se torne mais uma comunidade residencial escondida e edificada na periferia do Centro. Mas pode ser que se torne também uma comunidade importante dentro da cidade e aí sim acredito que da interação podem ser criadas as necessidades ecológicas.

    Vejamos, por exemplo, a questão dos transportes. Atualmente, se este bairro ecológico já existisse, o cidadão só poderia locomover-se com segurança pela sua bicicleta dentro da localidade. Já a frota de ônibus da concessionária FAOL importaria numa violação do projeto, bem como a entrada de outros veículos particulares.

    Refletindo sobre a ideia, veio na minha mente sobre quem seria o publico destinatário deste projeto? As pessoas que perderam suas casas? Seriam ex-moradores de uma comunidade já existente? A ideia seria transformar um bairro que já existe ou criar um novo num espaço ainda não ocupado? E o público alvo seriam pessoas humildes ou gente da classe média? Será possível neste mesmo bairro colocarmos várias pessoas de comunidades diferentes atingidas pelas enchentes sabendo das rivalidades entre as pessoas em razão de problemas com o tráfico de drogas?

    Mais questões vieram à mente. Sobre de onde viriam os recursos financeiros? Qual o custo de cada unidade habitacional? A Caixa Econômica financiaria a aquisição dos imóveis?

    Bem, eu estou suscitando este questionamento não para derrubar a ideia, mas para fortalecê-la, quem sabe até ampliá-la para toda a cidade e discutirmos sobre o seu detalhamento.

    Abraços.

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