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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O destino das vítimas depois da tragédia


Fazem hoje nove dias que Nova Friburgo sofreu a maior tragédia de sua história na madrugada de 12/01/2011 que, segundo a historiadora da Universidade Cândido Mendes, professora Janaína Botelho, foi o nosso 11 de setembro.

Os telejornais ainda falam da cidade, mas com menos frequência e intensidade do que na semana anterior. Agora as atrações do Big Brother e dos campeonatos estaduais passam a estar mais na mente do telespectador e a grande tragédia climática da Região Serrana do Rio de Janeiro tende a ser esquecida com o tempo. Daqui alguns dias, seremos esporadicamente lembrados em alguma matéria ou outra, ocuparemos alguns minutos da "Retrospectiva 2011" do Globo Repórter no final do ano e seremos citados quando outros possíveis acontecimentos semelhantes ocorrerem no nosso país.

Foram centenas de mortos e milhares de pessoas desabrigadas ou desalojadas na Região Serrana do Rio de Janeiro. Pessoas que perderam suas casas e pertences, sendo que muitas delas não podem nem mais retornar para o imóvel onde se encontravam porque suas residências estão interditadas pela Defesa Civil.

O que será das vítimas desta tragédia daqui alguns meses? Como sobreviverão? Onde que tais famílias poderão reconstruir suas vidas?

É lamentável que, enquanto uma parte do público se sensibiliza e resolve colaborar com suas doações e com o valoroso trabalho voluntário, há pessoas que buscam extrair proveitos com a catástrofe, enquanto a grande maioria do povo brasileiro assiste a TV anestesiada. E os carniceiros aos quais me refiro não se resumem apenas aos comerciantes que inflacionam temporariamente os preços das águas e dos mantimentos, ou dos oportunistas que dão um jeitinho de acumular doações indo em cada ponto de de distribuição com o apoio de entes da família, aproveitando-se da ausência de medidas burocráticas. Estes, porém, são café pequeno perto das nossas autoridades políticas que são verdadeiros lobos.

Muitas doações têm chegado, felizmente, e agora a cidade precisa saber administrar a captação, o armazenamento e a distribuição, bem como as atividades dos voluntários. É lógico que, dentro destas ações, há políticos querendo apenas aparecer e, com isto, retardam a distribuição dos produtos. Outros desejam beneficiar A, B ou C por razões eleitorais, escolhendo locais que nem sempre têm uma estrutura tão adequada quanto outros. Para piorar, ainda tem aqueles safados que, na certa, pensam em meter a mão nesses bens para embolsar uma grana já que nem semrpe dá para fazer um controle.

Porém, nada disso deixou-me mais perplexo do que ter tomado ciência da má notícia em que a Justiça autorizou a desapropriação de uma localidade chamada Fazenda da Lage para a Prefeitura construir lá 3.000 moradias, sendo que, ali, conforme noticiado pela edição de 18/01/2011 do Jornal Nacional, sofreu deslizamentos de terra. Diz o texto da reportagem exposta na internet que:


"Uma área em Nova Friburgo já foi desapropriada para a construção das casas. É o terreno de uma antiga fazenda, afastado 14 quilômetros do Centro e ainda com poucas moradias ao redor. Região que também foi prejudicada pelos deslizamentos. No local, serão erguidos 3 mil apartamentos. Mas a destruição que se vê também nos acessos mostra o tamanho do desafio que as autoridades terão pela frente".
Fonte: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/01/governador-do-rio-diz-que-moradias-serao-construidas-pelo-minha-casa-minha-vida.html


Embora a matéria do JN não diga precisamente onde é que a Prefeitura pretende construir as novas habitações, suponho que se trate mesmo da Fazenda da Laje, situada na região dos distritos de Riograndina e Conselheiro Paulino, aqui em Nova Friburgo. E tudo isto pretende ser feito com recursos do projeto "Minha Casa, Minha Vida" do Governo Federal e contribuições do Governo Estadual.

Mesmo sabendo dos riscos, muita gente que ficou desabrigada aqui em Nova Friburgo vai acabar aceitando adquirir uma unidade habitacional no suspeito projeto da tal Fazenda da Lage. Afinal, essas pessoas não têm onde morar e, mesmo que recebam o "alguel social", não poderão continuar vivendo para sempre deste benefício e, no futuro, elas escolherão entre sair da cidade, morar em casas populares ou se amontoarem em favelas mais próximas.

Num período de calamidade pública, a Prefeitura fica dispensada das licitações e pode fazer comrpa direta. O orçamento público também acaba ficando mais flexível conforme os interesses dos governantes. Logo, alguma construtora será escolhida para fazer as obras e o resto do que vai acontecer nos bastidores acho que não preciso nem dizer. Porém, o que mais me assusta é a escolha de um local que, a princípio, está me parecendo um lugar bem impróprio para a ahabitação popular, uma suposta área de risco.


Estes dias recebi um e-mail de um agente do IBAMA questionando as habitações irregulares da seguinte maneira: "Essas construções têm aprovação da prefeitura? Elas serão retiradas dali? Seus proprietários serão responsabilizados? Ou tudo isso vai ser debitado na conta do AQUECIMENTO GLOBAL?"

A mais pura verdade é que os políticos, afim de ganhar votos nas eleições, permitem que as pessoas construam em locais impróprios. Quando o morador ou a construtora quer a todo custo fazer edificações num determinado lugar, sempre aparece um vereador ou funcionário picareta que vai facilitar as coisas dentro da Prefeitura. Então, como as tragédias não têm tempo certo para acontecer, pode-se dizer que, durante alguns anos tudo corre bem, mas depois, quando o mal acontece, os políticos culpam as chuvas.

Homens hipócritas, corruptos e assassinos! Até quando teremos que tolerá-los?! Até quando a população brasileira vai ficar assistindo a TV anestesiada e incapaz de relacionar as tragédias naturais ao planejamento criminoso das cidades?!

Daqui a pouco mais de um mês, começa o Carnaval e, junto com o futebol, o nosso povo vai se distraindo até o final do ano. E tem também as novelas e outras atrações da telinha, sem nos esquecermos também dos líderes religiosos enganadores que se associam com os políticos para amansar as massas, fazendo com que a religião torne-se aquilo que os filósofos do século XIX já diziam ser "o ópio do povo" (Karl Marx, 1844).




OBS: As imagens utilizadas acima foram extraídas do álbum do IBAMA Nova Friburgo no Picasa: http://picasaweb.google.com/ibamanovafriburgo/TrajediaEmNovaFriburgo#5563628807110339170

3 comentários:

  1. Concordo, Rodrigo esses acontecimentos não podem ficar esquecidos. Se os acontecimentos presentes servirem de lição para o futuro, agora ao planejar a reconstrução urbanística da ‘nova’ Nova Friburgo critério de mobilidade, sustentabilidade e sócio-diversidade, moradias perto de empregos, etc, têm que ser considerados. Todos os moradores de áreas de risco terão de ser retirados, independente de sua condição sócio-econômica. Além de serviços municipais de alertas serem implantados e integrados ao sistema nacional existente e a ser implantados para terem maior eficiência. Em outras localidades estes serviços de alerta tem poupado de risco e mortes milhares de pessoas. Veremos se essas lições e projetos bem sucedidos, como o implantado em Florianópolis por Jaime Lerner podem servir de orientação para bem aplicar todos os recursos públicos disponibilizados e a disponibilizar. Os pareceres de especialistas em geotecnia terão que ser considerados em processos que lidem direta ou indiretamente com o uso do solo. Transparências terão que ser exigidas. Todos os segmentos da sociedade civil devem ser convocados a participar. Tudo deve ser realizado e preparado para enfrentar eventos climáticos extremos, já previstos, nos próximos anos. Recursos e bons técnicos não faltam, não vamos ‘querer errar’ novamente. Os Atos de Deus não devem ser usados como "ópio do povo", conforme Karl Marx disse e vc citou.

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  2. Estou de acordo com seus comentários, caro amigo! Podero, entretanto, que sistemas de alerta apenas atenuam a situação, permitindo que o morador possa conviver com o risco. Contudo, é preciso que, através de estudos transparentes, o risco seja dosado e, em determinados casos, haja a remoção dos moradores para outros locais.

    Entretanto, verdade seja dita que a Região Serrana do Rio de Janeiro não tem condições de suportar uma taxa de povoamento tão densa como se vê nos dias de hoje, o que é agravado pela má distribuição da população no território dos municípios. E aí, governo nenhum tem a coragem de promover políticas de migração para outras áreas do Estado, pois interessa aos prefeitos manter e aumentar a população de seus respectivos municípios.

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  3. Em tempo!

    Embora eu creia em Deus e me situe um pouco distante do comunismo, considero a célebre frase do ateu Karl Marx. Poucas são as igrejas que promovem a libertação da consciência popular. Neste sentido, sou admirador de dois caras do nosso tempo que foram capazes de romper com o sistema religioso, mas continuam seguindo formes os passos do Messias Jesus. Um é o ex-frei Leonardo Boff. O Outro é o Caio Fábio que veio do meio evangélico. Ambos têm uma visão ecológica admirável. Leonardo Boff mais ainda. Particularmente penso que Jesus concorda com a frase de Marx.

    Saudações!

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