A Conferência do Clima realizada em Belém — a tão aguardada COP30 — carregava desde o início um simbolismo especial. Afinal, discutir o futuro do planeta no coração da Amazônia não era apenas uma escolha geográfica, mas um gesto político que trazia consigo a esperança de que esta fosse a COP capaz de marcar uma virada decisiva.
No entanto, conforme os dias avançaram e os desfechos foram se desenhando, ficou evidente que a conferência oscilou entre avanços técnicos importantes, sinais de esgotamento político e a persistente sensação de que o mundo continua empurrando a crise climática com a barriga.
Um dos elementos que mais chamou a atenção — e já antecipava certa dificuldade — foi a ausência dos presidentes dos Estados Unidos e da China, justamente os dois maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta.
Embora suas delegações estivessem presentes, a ausência física dos chefes de Estado enfraquece simbolicamente qualquer COP. Isto porque a presença de líderes costuma servir para destravar impasses, conferir peso às demandas mais urgentes e demonstrar que o clima é realmente tratado como prioridade estratégica. Logo, quando ambos se ausentam, o recado implícito é duro: outras agendas internas e geopolíticas falaram mais alto que o compromisso climático.
Tal comportamento não é apenas protocolar; é político. Os países mais vulneráveis — sobretudo nações africanas, caribenhas e amazônicas — interpretam essas ausências como falta de seriedade. E com razão. Afinal, é difícil pedir sacrifícios aos que menos contribuíram para o problema quando os maiores responsáveis sequer se dispõem a aparecer pessoalmente.
O caso brasileiro também gerou debate. Lula, anfitrião da conferência, precisou deixar Belém antes do encerramento para viajar à África do Sul, onde ocorreria a reunião do G20. Contudo, a justificativa é compreensível: o G20 tem enorme peso econômico e ambiental. Reúne países responsáveis por cerca de 80% das emissões globais e, em muitos casos, decisões sobre energia, indústria e infraestrutura são tomadas ali muito antes de chegarem ao espaço multilateral da ONU.
A diplomacia brasileira, vale reconhecer, atua fortemente em ambos os campos. Entretanto, a decisão de se ausentar nos momentos finais da COP passou a impressão de prioridade invertida, uma vez que, em conferências climáticas, é justamente no último dia que surgem os acordos mais delicados, os parágrafos mais disputados e as concessões finais — e a presença do chefe de Estado do país anfitrião costuma ter papel decisivo na pressão diplomática. Critica-se que, ao deixar Belém antes da hora, Lula correu o risco de esvaziar parte do simbolismo político que o Brasil tentava exercer como liderança ambiental.
O paradoxo é que G20 e COP não competem entre si — pelo contrário, se complementam. O G20 formula diretrizes macroeconômicas e decisões estratégicas sobre subsídios, energias, combustíveis fósseis e investimentos de grande escala. Já a COP transforma esses entendimentos em dispositivos multilaterais, compromissos formais e instrumentos de implementação. Um define o rumo; a outra define as regras e o sistema global de monitoramento.
- um otimista, em que a conferência serve de virada concreta;
- um intermediário, com avanços parciais;
- um pessimista, em que a COP se torna mais um símbolo de oportunidades perdidas.
Até agora, a leitura mais realista é a intermediária.
Houve avanços na discussão da Meta Global de Adaptação, no detalhamento de indicadores e na ampliação do debate sobre resiliência climática. Porém, o grande gargalo — o financiamento — continua emperrado.
Sem recursos claros, previsíveis e suficientes, todos os compromissos assumidos tornam-se promessas frágeis, dependentes da boa vontade política e de conjunturas domésticas instáveis.
É justamente aí que as ausências de EUA e China pesam mais: sem a liderança dos maiores emissores, dificilmente o volume financeiro necessário se materializa. E, sem financiamento, não há adaptação que se sustente nem transição energética que avance com a velocidade necessária para conter o aquecimento global.
Por isso, a COP30 termina como um espelho do nosso tempo: um mundo consciente da gravidade da crise, mas ainda incapaz de mobilizar a ação política proporcional ao tamanho do problema.
Belém ofereceu ao planeta a oportunidade perfeita para uma guinada histórica — no coração da Amazônia, diante de uma crise que se intensifica ano após ano. Mas entre ausências estratégicas, prioridades divergentes e a eterna disputa por recursos, a conferência acabou ficando aquém da expectativa.
Resta agora acompanhar o desdobramento no G20 e o impacto que suas decisões terão no caminho até a COP31.
Gostemos ou não, os próximos anos definirão não apenas o clima do futuro, mas a capacidade da comunidade internacional de agir com seriedade diante de uma ameaça global que já não admite mais adiamentos.
📷: Tânia Rego / Agência Brasil.



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