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sábado, 16 de outubro de 2010

Horário de verão outra vez

Lembro que eu ainda tinha meus nove anos de idade quando o José Sarney obrigou os brasileiros e brasileiras a adotarem o horário de verão. O ano era 1985 e eu tive que levantar mais cedo para ir à escola.

Até hoje o argumento do governo tem sido a economia de energia nos horários de pico, mas sabemos muito bem que o país lucra muito pouco se comparado com o tamanho da produção brasileira. Quando chega o verão e a vazão dos rios aumenta, tal contenção acaba se tornando até desnecessária.

É meio complicado para um ecologista não apoiar o horário de verão, mas tenho argumentos que podem ser avaliados.

Um dos meus motivos é que perdemos mais ainda a noção do tempo. Por exemplo, é comum algumas pessoas esquecerem que os bancos e as repartições públicas já fecharam mesmo o dia estando ainda claro.

No mundo antigo, a hora era percebida de maneira bem diferente do que nos dias de hoje. O relógio era solar e, conforme a estação do ano e o grau de latitude da região (o distanciamento da linha do Equador), cada hora poderia ter mais ou menos do que 60 minutos. Era um tempo mais orgânico, digamos assim.

Lendo as versões mais antigas da Bíblia, como a tradução de João Ferreira de Almeida, por exemplo, é comum encontrarmos nas narrativas do Novo Testamento o autor utilizando termos como a "terceira hora do dia", "hora sexta" ou "hora nona". É o que se lê no relato da crucificação do Senhor e no discurso de Pedro ocorrido no dia Pentecostes:

"Já era quase a hora sexta, e, escurecendo-se o sol, houve trevas sobre toda a terra até à hora nona" (Evangelho segundo Lucas 23.44; ARA)

"Estes homens não estão embriagados, como vindes pensando, sendo esta a terceira hora do dia." (Atos dos Apóstolos 2.15; ARA)

Nos tempos de Jesus, a primeira hora do dia começava a ser contadas quando o dia amanhecia. E, conforme a época em cada região, isto poderia acontecer antes ou depois das seis horas da manhã do nosso horário artificial. Então, quando o sol se punha, terminava o dia começando outro de modo que tanto no inverno quanto no verão o dia tinha sempre suas doze horas, mas estas poderiam ser mais longas ou mais curtas.

Isto não fazia parte apenas da concepção dos escritores gregos do Novo Testamento, mas também dos judeus. Pois é o que podemos depreender do próprio relato da criação do mundo que também faz parte da Torá judaica:

"E viu Deus que a luz era boa; e fez separação entre a luz e as trevas. Chamou Deus à luz Dia e às trevas, Noite. Houve tarde e manhã, o primeiro dia." (Gênesis 1.4-5; ARA)

Nos tempos de hoje, as pessoas trabalham tão concentradas em ambientes fechados que nem ao menos param pra assistirem o por do sol. Dentro de um shopping center (principalmente nesses modelos de prédios muito utilizados até os anos 80 e 90), um consumidor pode ficar totalmente alienado quanto à passagem do tempo, o que não me parece ser um hábito saudável.

Mas já que teremos mais um ano com horário de verão (parece que nem Dilma ou Serra pretendem mudar isto), temos aí uma grande oportunidade para podemos não só assistir o por do sol como também caminharmos no final das tardes, encontrarmos pessoas na rua e nos curarmos do stress. Um excelente momento de relaxamento e de meditação.

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