Na madrugada desta quinta-feira (04/09), ao fazer a leitura devocional dos sete primeiros versos de
Romanos 13, refleti um pouco sobre o que o apóstolo Paulo teria recomendado acerca da importância dos destinatários de sua carta estarem
sujeitos às "autoridades superiores".
É certo que Paulo estava falando de autoridades seculares e não religiosas. Tratavam-se de
homens de Estado como são hoje os representantes dos Três Poderes a exemplo do presidente da república, dos governadores, dos prefeitos, senadores, deputados, vereadores, ministros, desembargadores ou juízes. E creio que a orientação também inclui os ocupantes de cargos subordinados aos quais corresponderia qualquer secretário de governo, o chefe de polícia, outros assessores ou qualquer servidor investido de poderes pelo seu superior hierárquico. Até mesmo aquele simples funcionário de nível técnico responsável por uma repartição (um segurança ou recepcionista) que de maneira alguma podemos desacatar.
Curiosamente, Paulo e os crentes de seu tempo viviam num contexto político bem diferente do nosso. Roma era a capital de um vasto império que, décadas antes de Jesus nascer, havia deixado de ser uma república para tornar-se a ditadura dos divinizados Césares. E, embora tais reis fossem considerados apenas homens pelos cristãos, a legislação pagã da época os qualificava como "deuses" ou "filhos dos deuses", motivo pelo qual a Igreja teria sido martirizada em diversos momentos por recursar-se a participar de qualquer ato de adoração pública a esses governantes.
Todavia, Paulo viu nas autoridades uma espécie
ministério divino. Pois, mesmo sem haver a legitimação democrática dos dias atuais, os imperadores romanos, em via de regra, deviam ser obedecidos. Apesar de toda a perseguição que as autoridades do Império promoviam contra o Evangelho,
a epístola reconheceu nelas a prestação de algum serviço a todos os súditos do monarca, inclusive aos cristãos:
"Pois é serva de Deus para o seu bem (...)" - trecho do verso 4º
Hoje ainda bem que vivemos num Estado Democrático de Direito! Mesmo nas monarquias remanescentes do Ocidente, em todas elas os reis e rainhas sujeitam-se a uma constituição que, por sua vez, limita os direitos da autoridade constituída dando diversas garantias ao povo. Logo
a nossa sujeição na atualidade é bem mais suave visto que as benditas leis permitem até uma proveitosa interação entre o indivíduo e o Estado, podendo qualquer um ingressar na Justiça contra atos lesivos do governo. Assim sendo, um abuso de poder torna anulável a medida adotada pelo agente público que pode ser responsabilizado dependendo do caso.
Preservar o regime democrático é algo que a Igreja deve estrategicamente fazer assim como atuar na defesa da
liberdade religiosa para todos (os mesmos dispositivos constitucionais que asseguram o direito de culto aos outros credos beneficiam o cristianismo). Aliás, não só podemos como muitas vezes também devemos fazer uso irrestrito dos recursos que o sistema coloca à nossa disposição tais como o direito de opinião, as reuniões ao ar livre e até fazer uma manifestação política ordeira nas vias públicas pedindo mais justiça social. Pois, se estamos descontentes com um governante, ou com os parlamentares eleitos,
o povo de Deus tem mais é que ir às ruas expressar sua indignação e expor suas preferências.
Ora, e se um crente decide ser missionário num país que esteja ainda debaixo de uma ditadura?
Bem, nesta hipótese entendo pela necessidade de
sujeição às autoridades do lugar, exceto se houver conflitos entre a vontade de Deus e a dos homens (conf. Atos 5:29). Se você vai viver num regime que proíbe as pessoas de organizarem protestos pacíficos e de se reunirem para fins de culto religioso, seria desaconselhável o cristão nas participar das passeatas, mas
não pode a Igreja deixar de se encontrar para adorar coletivamente o Senhor, ou parar de anunciar o Evangelho, ainda que tenha de fazer tudo isto clandestinamente. Claro que a prudência irá nortear as nossas escolhas específicas em todas essas horas como a definição do horário e do local, a maneira de pregar as boas novas, bem como a conveniência de se suspender uma determinada reunião.
Infelizmente essa tem sido a realidade de muitos dos nossos irmãos em outras partes do mundo onde não há democracia e/ou inexiste a liberdade religiosa.
Quase sempre as maiores perseguições acontecem debaixo dos regimes ditatoriais como na comunista Coreia do Norte e nos países islâmicos mais radicais onde pessoas chegam a ser presas, espancadas, publicamente humilhadas, torturadas com crueldade, mortas e privadas de diversos direitos apenas por seguirem a Jesus Cristo.
Meus amados, louvemos a Deus porque, nesse aspecto, o Brasil ainda é um país muito bom. Por isso insisto em dizer que devemos lutar para que a nossa democracia seja mantida de modo que
vejo com fundada desconfiança essas propostas de reforma política e sobre plebiscito da candidata Dilma. Temo que a sua reeleição deixe o Brasil mais próximo do chavismo venezuelano que, embora não seja uma ditadura declarada, cuida-se de uma perigosa descaracterização do regime democrático conforme conhecemos. Pois, se um presidente consegue concentrar poderes em excesso nas mãos, a proteção aos direitos fundamentais do homem torna-se menor.
Nas mãos do Senhor encontra-se o futuro da Igreja e de toda a humanidade. Não temos que temer o amanhã e nem nos preocuparmos. Contudo, o apóstolo Paulo exortou aos crentes de Corinto afim de que eles não desperdiçassem a oportunidade de se tornarem homens livres (1Co 7:21), sendo que, na época, ainda existia a hedionda escravidão de pessoas. Então, por analogia, posso recomendar hoje a todos os meus irmãos e irmãs que
não negociem nenhuma parcela da liberdade que têm. Jamais prefiram qualquer ditadura à democracia, quer se trate de regime militar, revolução de esquerda, fascismo, "bolivarianismo", ou até uma teocracia eclesiástica porque, além de ser um tiro no pé, o poderio estatal em excesso acaba não contribuindo para os avanços do Reino de Deus.
Oremos pelo Brasil, por suas autoridades e pelos candidatos nestas eleições. Que na hora do voto o cidadão seja iluminado para fazer a escolha certa. O Senhor ama a sua Igreja!
OBS: A ilustração acima refere-se à obra
Government do pintor norte-americano
Elihu Vedder (1836 - 1923), conforme a fotografia de
Carol Highsmith no acervo virtual da Wikipédia em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Governo#mediaviewer/Ficheiro:Government-Vedder-Highsmith-detail-1.jpeg