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| Dilma em julho/2025, no Rio de Janeiro |
Em 18 de dezembro de 2025, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) decidiu, por unanimidade, que a União deve pagar R$ 400 mil à ex-presidenta Dilma Rousseff por danos morais decorrentes da perseguição, prisão ilegal e tortura sofridas durante a ditadura militar (1964-1985), além de assegurar reparações econômicas mensais relacionadas à perda de renda causada pela perseguição política.
Os magistrados entenderam que, embora Dilma já tenha sido reconhecida como anistiada política pelo Estado — incluindo indenizações pagas por comissões de anistia estaduais — essa nova decisão judicial decorre de uma responsabilidade civil distinta da União, que ultrapassa os casos locais e reconhece a abrangência nacional das violações sofridas.
O acórdão reforça ainda que as ações de reparação por violação de direitos humanos na ditadura são imprescritíveis, conforme previsto na jurisprudência brasileira (Súmula 647 do Superior Tribunal de Justiça), pois refletem lesões profundas à dignidade humana que não perdem seu caráter jurídico com o passar do tempo.
1. Tortura, prisão e repressão: a face brutal da ditadura militar
O regime militar brasileiro (1964-1985) foi marcado por uma repressão sistemática a opositores políticos, incluindo prisões arbitrárias, tortura física e psicológica, censura e restrições de direitos civis básicos. Organizações como a Comissão Nacional da Verdade documentaram centenas de casos de abuso estatal, embora muitos ainda aguardem reconhecimento formal e justiça plena.
No caso de Dilma Rousseff, os relatos reunidos nos autos e em comissões oficiais descrevem episódios de tortura física e psicológica, incluindo choques elétricos, pau-de-arara, afogamento simulado, isolamento e ameaças de morte, que deixaram sequelas permanentes e representam violações graves de direitos fundamentais.
2. A indenização como ato de reconhecimento e memória
Embora nenhum valor financeiro possa reconstituir a dignidade de quem foi torturado e preso injustamente, a decisão judicial tem importância muito maior do que a cifra em si. Essa sentença:
- Reconhece legalmente a gravidade das violações cometidas pelo Estado e reafirma que a tortura e a repressão política não podem ser relativizadas ou esquecidas.
- Marca um gesto de responsabilidade institucional e histórica, ao reconhecer que políticas de violência estatal deixaram feridas duradouras nas vidas de cidadãos e cidadãs.
- Contribui para a preservação da memória democrática, ao afirmar que o Estado não renega, mas assume a sua história, inclusive seus episódios mais sombrios.
3. O processo de anistia e verdade no Brasil
Desde o fim da ditadura, o Brasil tem trilhado um caminho complexo de enfrentamento de seu passado:
Comissão de Anistia
Instituída em 2001, a Comissão de Anistia tem papel central no reconhecimento formal de pessoas que sofreram perseguições políticas durante o regime e na concessão de reparações. Em maio de 2025, a própria Comissão reconheceu por unanimidade Dilma Rousseff como anistiada política, concedendo-lhe indenização e um pedido de desculpas formal em nome do Estado.
Comissão Nacional da Verdade
Criada em 2012, a Comissão Nacional da Verdade teve por missão investigar as violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988 e documentar casos de tortura, mortes e desaparecimentos forçados. Seu trabalho foi um marco para a reconstrução da memória histórica e para a legitimação de reivindicações de reparação.
Limitações e desafios
Diferentemente de países vizinhos como Argentina e Chile — que realizaram processos de justiça transicional com julgamentos de perpetradores e comissões amplas de verdade —, o Brasil manteve uma lei de anistia que acabou protegendo muitos agentes do regime, gerando debates contínuos sobre a necessidade de responsabilização criminal e reformas institucionais.
4. Por que a reparação importa além do valor econômico?
A decisão judicial, e iniciativas similares como a indenização à família de Vladimir Herzog ou pedidos de desculpas oficiais do Estado, são passos para:
- Dar voz às vítimas e à sua experiência histórica, superando décadas de silêncio e invisibilização.
- Fortalecer a cultura de direitos humanos no Brasil, servindo de base para a educação pública, políticas culturais e debates democráticos.
- Promover a consciência histórica na sociedade, especialmente entre jovens e futuras gerações, para que os erros e abusos do passado não se repitam.
5. Conclusão: reparação, memória e democracia
A determinação de que a União deve pagar R$ 400 mil a Dilma Rousseff por tortura sofrida na ditadura é mais do que uma vitória jurídica isolada: é um ato de reconhecimento da dignidade humana, um registro oficial de que a violência política deixou marcas inapagáveis e um convite ao país para enfrentar sua própria história com coragem e responsabilidade.
O Estado brasileiro tem, sim, o dever histórico de compensar as vítimas da ditadura militar, mesmo sabendo que tortura, prisões políticas injustas e mortes são irreparáveis na sua totalidade. Ao fazer isso, fortalece a democracia e reafirma valores que são a antítese do autoritarismo: respeito aos direitos humanos, transparência histórica e compromisso com a verdade.
📷: Créditos de imagem atribuídos a Fernando Frazão/Agência Brasil
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