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| Vista parcial do Centro de Teresópolis, 2021 |
A recente aprovação da Lei Complementar nº 351, de 19 de dezembro de 2025, que autoriza edificações de até 20 andares em áreas específicas de Teresópolis, reacendeu um debate legítimo sobre o futuro urbano da cidade. Em municípios serranos, onde o relevo, a paisagem e o meio ambiente impõem limites claros ao crescimento, decisões dessa magnitude exigem não apenas técnica, mas também diálogo e transparência.
É preciso reconhecer que existem argumentos urbanísticos consistentes a favor da verticalização. Em cidades montanhosas, a expansão horizontal tende a avançar sobre áreas verdes, encostas e zonas ambientalmente sensíveis, muitas vezes agravando riscos geológicos e dificultando a recuperação ambiental. Concentrar o adensamento em áreas já urbanizadas pode, em tese, reduzir a pressão sobre o território, otimizar a infraestrutura existente e conter o espraiamento urbano.
No entanto, verticalizar não é uma solução neutra ou automática. Teresópolis possui vias estreitas, infraestrutura concebida para outra escala urbana, restrições ambientais e uma paisagem que é parte de sua identidade e vocação turística. O aumento expressivo do gabarito impacta mobilidade, insolação, ventilação, paisagem e demanda por serviços públicos. Em cidades serranas, os limites são duplos: não há espaço ilimitado nem para crescer para os lados, nem para crescer para cima.
Por isso, o ponto central do debate talvez não esteja apenas no mérito da verticalização, mas no processo que levou à aprovação da Lei Complementar nº 351/2025. Alterar parâmetros como gabarito não é um ajuste técnico menor: trata-se de uma mudança estrutural no modelo de cidade.
O Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001) é claro ao estabelecer, como diretriz da política urbana, a gestão democrática da cidade, assegurada por meio da participação da população e de associações representativas na formulação, execução e acompanhamento de planos e projetos de desenvolvimento urbano. O Estatuto também reforça que o Plano Diretor é o instrumento básico da política urbana, devendo orientar o uso e a ocupação do solo.
A Lei Orgânica do Município de Teresópolis segue essa mesma lógica. Ela determina que a política de desenvolvimento urbano seja conduzida pelo Poder Público com garantia de participação popular, e reafirma o Plano Diretor como referência central para o ordenamento territorial, incluindo zoneamento e índices urbanísticos, como o gabarito das edificações.
Nesse contexto, causa preocupação o fato de que a alteração promovida pela Lei Complementar nº 351/2025 tenha sido percebida por muitos cidadãos sem um debate público prévio amplo, transparente e tecnicamente fundamentado. As denúncias na mídia ausência clara de audiências públicas amplamente divulgadas, de participação efetiva dos conselhos municipais e da apresentação pública de estudos de impacto não invalida automaticamente a lei, mas fragiliza sua legitimidade democrática.
Cumprir o rito legislativo interno da Câmara é necessário, mas não é suficiente quando a própria legislação federal e municipal exige participação social qualificada em decisões urbanísticas estruturais. Quando a sociedade toma conhecimento de mudanças dessa natureza apenas após a sanção da lei, instala-se um ruído que compromete a confiança institucional e empobrece o debate.
Teresópolis, assim como muitas cidades brasileiras, enfrenta um desafio complexo: crescer sem perder sua identidade, respeitando seus limites geográficos, ambientais e urbanos, além da vocação turística. Esse equilíbrio não será alcançado com decisões apressadas ou pouco dialogadas. Verticalizar pode ser parte da solução, mas apenas se estiver inserido em uma estratégia urbana clara, com proporcionalidade nas alterações, debatida com a população e alinhada ao Plano Diretor.
Mais do que ser a favor ou contra prédios mais altos, o que se espera é que escolhas dessa magnitude sejam feitas com a cidade, e não apenas para a cidade — com transparência, participação e responsabilidade.
📝Nota: Diante das informações veiculadas pela imprensa sobre a tramitação da recente lei municipal que alterou parâmetros urbanísticos em Teresópolis, registre-se que eventuais questionamentos não se dirigem, necessariamente, ao mérito da verticalização, que pode ser instrumento legítimo de política urbana quando planejada, sustentável e amplamente debatida.
As preocupações concentram-se, sobretudo, na observância do devido processo legislativo, da transparência e da participação popular, princípios exigidos pelo Estatuto da Cidade e pela Constituição do Estado do Rio de Janeiro em matérias de relevante impacto urbano e ambiental.
Nesse contexto, é juridicamente possível — caso identificados vícios formais — que legitimados constitucionais, como o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, avaliem a adoção das medidas cabíveis, inclusive no âmbito do controle de constitucionalidade estadual, sempre como instrumento institucional de aprimoramento democrático e não de negação do desenvolvimento urbano.
📷: Matheus Camacho / Wikipédia , extraída de https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Teres%C3%B3polis_vista_parcial_do_Centro.jpg#mw-jump-to-license

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