"A profissão de advogado tem, aos nossos olhos, uma dignidade quase sacerdotal" (Rui Barbosa)
Este é para mim o mês das comemorações. Nesta terça-feira (29/04), estou completando vinte anos que recebi a carteira de inscrito na advocacia em uma cerimônia ocorrida em abril de 2005, na 9ª Subseção da OAB/RJ, em Nova Friburgo, cidade do centro-norte fluminense onde me formei e depois me casei.
Desde dezembro de 2011, não estou mais vivendo na região serrana, porém até hoje venho exercendo a advocacia e posso dizer que não é nada fácil pois se trata de uma das profissões mais trabalhosas quando queremos levá-la a sério. Aliás, de modo algum esconderia que, em vários momentos, já pensei em desistir, fazer transição de carreira, me inscrever num concurso, mudar de país, virar um ministro eclesiástico, etc.
Nesse tempo em que tenho exercido a profissão, muita coisa mudou. Há duas décadas atrás, os processos no Brasil eram todos físicos e o máximo que a internet oferecia em nossa atuação perante o Judiciário era o acompanhamento dos andamentos e, às vezes, das decisões que nem sempre estavam integralmente lançadas no sistema, o que já era algum avanço.
Em meus primeiros anos da advocacia, as citações doutrinárias e jurisprudenciais precisavam ser melhor referenciadas, um recurso protocolado na própria comarca demorava dias para chegar ao tribunal (caso não fôssemos até à capital), inexistia o documento digital e nem a assinatura eletrônica. Além do mais, não tinha como escapar de uma audiência presencial, se esta viesse a ser designada, pois os tribunais estavam anos luz de distância das videoconferências hoje realizadas por aplicativos acessível na palma da mão, por meio de um smartphone, como o Zoom e o Teams.
Todavia, as mudanças não demoraram muito a chegar depois que peguei a carteirinha. Recordo que, ainda na segunda metade da primeira década deste século, a Justiça Federal implantou o processo eletrônico no extinto sistema Apolo que era acessado apenas com o login e a senha cadastrada presencialmente pelo advogado, sem nos exigir combinações de letras maiúsculas misturadas com minúsculas, mais símbolos e números, nem a chata autenticação de dois fatores (2FA).
Quanto à legislação, lembro que iniciei os meus estudos na faculdade no Código Civil do Clovis Bevilaqua, de 1916, tendo concluído os estudos quando já vigorava o atual CC, cujo anteprojeto fora idealizado pelo conservador Miguel Reale e sancionado por Fernando Henrique Cardoso, em 2002. Porém, as mudanças na lei processual com o Código de Processo Civil de 2015 considero ainda mais impactantes para a advocacia.
Fato é que a grande maioria de nós advogados exerce a profissão trabalhando com o direito privado, ainda que, na faculdade muitos tenham se apaixonado pelo direito penal. Eu, porém, nunca me interessei por atuar na esfera criminal, apesar de haver pego alguns casos simples de JECRIM, tendo iniciado a minha atuação nas ações de defesa do consumidor e/ou de responsabilidade civil na maioria das vezes perante o Juizado Especial Cível.
Lembro bem que, uns dois anos antes de me formar, era uns dos maiores litigantes do JEC de Nova Friburgo pois já tinha aprendido a peticionar através da matéria de prática jurídica, que é o estágio. Pois não havia a necessidade de constituir um advogado, tendo processado bancos, administradoras de cartão de crédito, empresas de telefonia (principalmente a Vivo e a Telemar) assim como a própria universidade, em causas de até vinte salários mínimos, como previsto no artigo 9º da Lei Federal n.º 9.099/95.
"Art. 9º Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.
§ 1º Sendo facultativa a assistência, se uma das partes comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência judiciária prestada por órgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local.
§ 2º O Juiz alertará as partes da conveniência do patrocínio por advogado, quando a causa o recomendar."
Mesmo tendo por diversas vezes exagerado quanto à caracterização do dano moral eis que, naqueles dois anos de estagiário e de rábula, aprendi a peticionar. Aliás, exercia até o jus sperniandi por meio de embargos de declaração em inúmeras situações quando o juiz julgava o meu pleito improcedente ou parcial procedente, já que ainda não podia assinar os meus recursos à instância superior de maneira que precisava tentar achar algum trecho da sentença que parecesse omisso, contraditório ou obscuro.
Por certo, o tempo faz a gente mudar e amadurecer. Hoje minhas ações de responsabilidade civil já não são tão habituais como foram no início da profissão e, nos últimos oito anos, fui trabalhando mais com o direito público na esfera administrativa, quando laborei por três anos e um mês como advogado de um sindicato de servidores públicos de Mangaratiba. Atuava cobrando resíduos salariais não pagos aos aposentados, horas extras, verbas do abono de permanência, exigindo o cumprimento de direitos coletivos por meio de ação civil pública, a defesa dos funcionários em processos disciplinares, requerimentos administrativos, ofícios da própria entidade de classe, etc.
Não demorou muito e passei a ter uma atuação mais frequente nos estressantes processos eleitorais cujos prazos correm até nos finais de semana e nos feriados quando os políticos estão em campanha. E, da mesma forma como ter defendido o servidor público abriu meus horizontes, o Direito Eleitoral também trouxe muitas experiências novas, quer fosse defendendo os meus candidatos ou atacando seus adversários.
Verdade é que, seja qual for a nossa profissão, precisamos estar sempre abertos para o infinito aprendizado, tentando entender melhor as mudanças que se operam no mundo pois elas se refletirão logo no Direito. Daí não podemos parar de estudar em todos os sentidos, inclusive no aspecto filosófico, para que saibamos analisar as leis e os argumentos jurídicos de uma maneira crítica.
Por fim, o que compartilho como maior frustração da advocacia não é o fato de ainda não conseguir ganhar mais dinheiro como sendo uma consciência posta à locação, lembrando de uma célebre frase de 150 anos do escritor russo Fiódor Dostoiévski, mas, sim, conseguir contribuir melhor para a defesa dos necessitados, aos quais nem sempre podemos nos dedicar integralmente para não comprometer o nosso sustento. Porém, mesmo ciente de que obter decisões judiciais em favor dos mais carentes jamais substituirá a eficiência das boas políticas públicas e menos o crescimento de uma economia na qual haja distribuição de renda, sei o quanto é significativa a oportunidade de ajudar a vida de alguém em um certo momento.
Ótima terça-feira a tod@s! E que Deus ilumine os nossos passos.
OBS: Foto registrada no começo da tarde do dia 28/04/2025 quando estive no Fórum de Pendotiba, situado no caminho da região oceânica do Município de Niterói.