O 3º Evangelho, ainda no capítulo 10, narra uma interessante história que é exclusiva de Lucas entre os sinóticos. Trata-se do episódio envolvendo as irmãs Marta e Maria, as quais, hospitaleiramente, albergaram Jesus em casa enquanto o Mestre seguia na sua longa peregrinação a Jerusalém visitando diversas localidades no trajeto:
"Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher, chamada Marta, hospedou-o na sua casa. Tinha ela uma irmã chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me. Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada." (Lc 10:38-42; ARA)
Sugiro fazermos este estudo sobre Marta e Maria tentando ver a nós mesmos como se habitássemos aquela casa. Vamos imaginar que, por um dia e uma noite, estaremos hospedando o Senhor em nossa residência e que teremos a oportunidade de ouvir os ensinamentos do maior Mestre que o mundo já conheceu. Ele irá participar um pouco do nosso cotidiano doméstico, sentará à nossa mesa, comerá da nossa comida, dispensará uma atenção especial só para a nossa família, quando o ambiente estiver mais calmo com menos gente, e, ao partir, deixará a sua bênção de paz:
"Se houver ali um filho de paz, repousará sobre ele a vossa paz" (Lc 10:6a)
Recebendo uma visita tão ilustre em nosso lar, certamente outras pessoas da comunidade virão ouvir os seus ensinamentos debaixo do nosso teto. Nós mesmos iremos chamá-las e outros se apresentarão batendo na porta ou acompanhando o pregador. É o que parece ter acontecido com Marta e Maria. Muita gente da aldeia talvez estivesse ali além dos discípulos de Jesus. Contudo, as anfitriãs deveriam servir aqueles convidados e, na certa, tinham muitas tarefas do tipo cozinhar algo para darem de comer, arrumar alguns cômodos da casa, esquentar um chá de hortelã ou trazer água para o tradicional costume judaico da lavagem dos pés.
Não sabemos sobre o que Jesus estava ensinando naquela ocasião, mas é possível perceber que suas palavras tocaram o coração de Maria. Ela não largou os pés do Senhor! Deixou envolver-se de uma tal maneira que pode ter se esquecido do dever que tinha em ajudar Marta a preparar uma refeição para as pessoas. Sua atitude lembrava até o rei Davi se deleitando na casa de Deus como podemos ler no verso 4 do Salmo 27:
"Uma coisa peço ao SENHOR,
e a buscarei;
que eu possa morar na Casa do SENHOR
todos os dias da minha vida,
para contemplar a beleza do SENHOR
e meditar no seu templo."
Marta, porém, apesar de muito esmerada, não foi capaz de prestar a atenção em Jesus. Ela preferia cumprir zelosamente com o seu serviço e, na certa, estivesse se ocupando até demais, que sabe numa atitude de fuga de si própria. Seu comportamento é expresso por uma palavra chave: agitação.
Como já coloquei acima, desconhecemos sobre o que especificamente Jesus estava pregando, mas sabemos da grande extensão do seu ensino com o potencial de penetrar no mais profundo da alma humana, instigando auto-conhecimento, arrependimento dos erros cometidos, a aceitação sem culpa de quem somos e uma nova significação da nossa história. O Senhor não curava somente os corpos físicos dos doentes, mas, principalmente, o interior das pessoas. Suas palavras traziam vida para os ouvintes provocando uma motivação maravilhosamente construtiva e tendo como propósito a edificação do Reino de Deus nas relações do ser humano em todos os níveis.
Curioso, mas algo incomodou Marta de uma tal maneira que ela parece ter interrompido o ensino de Jesus para reclamar da conduta de sua irmã. Assim, buscando analisar o inconsciente da personagem, vejo ali mais do que uma simples queixa. Possivelmente estamos diante de uma luta espiritual que envolvesse o relacionamento familiar das duas, como se, numa mesma casa, um desejasse segurar a evolução do outro.
Assim como existe uma zona de conforto pessoal, podemos dizer que o mesmo ocorre nos meios familiar e comunitário. Não é por acaso que fazemos parte de grupos e há em todos um sentimento de conservação que se opõe a mudanças, o que precisa ser vencido. Se um membro da casa começa a deixar o estado no qual se encontrava, os demais percebem pela intuição e podem trabalhar contrariamente para impedir. Marta não queria ficar só na sua condição ou situação.
Será que muitas das vezes não estamos agindo como Marta? Quando o nosso familiar busca conversão e mudança interior somos capazes de permiti-lo ter a sua própria experiência ou ficamos assediando a sua consciência tentando nos meter nas escolhas que ele/ela pretende fazer? Até que ponto estamos dispostos a deixar o Espírito de Deus trabalhar mansamente nos corações dos nossos filhos, netos, pais, avós, irmãos, irmãs, tios, sobrinhos, cônjuge e amigos? Observem que foi Marta quem parece ter tomado a iniciativa de hospedar Jesus em casa!
O Mestre, porém, era suficientemente experimentado para diagnosticar conflitos dessa natureza. Ele vai à raiz da questão, mostra compreensão quanto à inquietude de Marta e lhe diz algo que nos parece um tanto enigmático:
"Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa".
Afinal de contas, a que o Senhor estava se referindo? Certamente não se trata de nenhum bem material, mais alguma tarefa doméstica a ser executada por Marta ou mesmo algum conhecimento humano que as irmãs não tivessem. O Salvador referiu-se aqui à vida que é eterna. Algo muito mais precioso e que diz respeito à nossa existência no Universo.
Inegavelmente, o Mestre veio nos ensinar a ser livres de quaisquer preocupações, inclusive com o além túmulo. A eternidade é vivida no aqui e agora de modo que Maria soube oportunizar aquele momento aos pés do Senhor agradando-se em ouvi-lo. Era como se o céu estivesse contido ali, o que ela contemplou por aqueles inesquecíveis instantes enquanto sua irmã não.
Para Marta, assim como para muitos de nós, pouco falta. Basta uma só coisa para entrarmos na Divina Presença e que eu chamaria essa condição de receptividade interna. A dedicada anfitriã recebeu Jesus em casa, trabalhou para lhe proporcionar o melhor conforto mas relutava em abrir o coração para suas vitalizantes palavras. Não estava fácil relaxar, como muitas vezes ocorre conosco na nossa caminhada para a Jerusalém de cima. Todavia, o Senhor soube amorosa e pacientemente lidar com aquela resistência.
OBS: A ilustração acima trata-se do quadro Jesus na casa de Marta e de Maria, pintado pelo artista português Vasco Fernandes que teria vivido entre 1475 e 1542. A obra se encontra no centro histórico da cidade lusitana de Viseu, mais precisamente no Museu Grão Vasco que leva o nome do autor. Foi extraída do acervo virtual da Wikipédia em http://pt.wikipedia.org/wiki/Jesus_na_casa_de_Marta_e_Maria
A Paz de Cristo,
ResponderExcluirAMADO IRMÃO RODRIGO
Acabei de visualizar seu texto, e gostei muito do mesmo, objetivo, direto, esclarecedor e super edificante. Ótima reflexão, parabéns!!!
Estamos vivendo tempo finais e difíceis, portanto, é necessário que pessoas se levantem para anunciar a Salvação em Jesus Cristo.
Atalaiar é a ordem nos últimos dias da Igreja de Cristo.
Deus o abençoe!
E continue nesta missão que Jesus lhe concedeu.
A propósito, caso ainda não esteja seguindo o meu blog deixo aqui o convite, acesse o link abaixo:
Fruto do Espírito
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P.S. Convido a conhecer o blog do irmão J.C.de Araújo Jorge.
Mensagens atuais, algumas polêmicas, porém abençoadoras...
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Discípulo de Cristo
O post atual expõe um assunto relevante. A participação do cantor Asaph Borba na JMJ.
Em Cristo,
***Lucy***
Boa tarde, amiga!
ExcluirPrimeiramente, fico feliz pela visita em meu blogue. Não tenho certeza, mas uma de suas páginas já deve estar em minha lista. Acho que a primeira intitulada Frutos do Espírito. Também gosto muito das canções do Asaph Borba. Tenho alguns clips dele replicados neste blogue em anos anteriores.
Sem dúvida precisamos anunciar o Evangelho. Há pessoas famintas e sedentas aguardado a mensagem salvadora do nosso Senhor Jesus. O Reino precisa ser construído nas nossas relações. Nossas famílias, nossas comunidades e nossa nação aguardam pelas boas novas.
Grande abraço e tenha um excelente fim de semana.
Paz!