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quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Seja o maior como o menor


"Suscitaram também entre si uma discussão sobre qual deles parecia ser o maior. Mas Jesus lhes disse: Os reis dos povos dominam sobre eles; e os que exercem autoridade são chamados benfeitores. Mas vós não sois assim; pelo contrário, o maior entre vós seja como o menor; e aquele que dirige seja como o que serve. Pois qual é maior: quem está à mesa ou quem serve? Porventura, não é quem está à mesa? Pois, no meio de vós, eu sou como quem serve. Vós sois os que tendes permanecido comigo nas minhas tentações. Assim como meu pai me confiou um reino, eu vo-lo confio; e vos assentareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel." (Evangelho de Lucas, capítulo 22, versículos de 24 a 30; versão e tradução ARA)

Conforme foi abordado no estudo bíblico anterior, após ter Jesus anunciado a traição de um de seus apóstolos, eis que os discípulos passaram a indagar entre si quem pretendia fazer tal coisa (verso 23). No entanto, relata o texto, na sequência, que eles passaram a discutir também sobre a quem, naquele grupo, caberia a posição mais elevada, repetindo a controvérsia narrada nos versos de 46 a 48 do capítulo 9º (conferir também com Mt 18:1-5 e Mc 9:33-37).

É exclusivo de Lucas o registro dessa disputa ocorrida num momento tão especial como a Ceia.  Isso mostra quão longe os discípulos ainda estavam de compreender a essência do ensino de Jesus, mesmo depois de três anos e meio aprendendo sobre o Reino de Deus na companhia amorosa do maior Mestre que o mundo já conheceu. Ainda assim, nosso Senhor não desacreditou e nem desistiu da obra por ele empreendida. Pressentindo o seu iminente martírio e que não estaria mais fisicamente presente com aquele grupo, Jesus mais uma vez se pôs a ensiná-los. Se da outra vez a figura da criança não fora suficiente para terminar com aquela infantilidade de marmanjos (ler o artigo Quem é o maior na dimensão do Reino?, de 29/07/2013), o Mestre faz agora do líder servidor o comportamento padrão para ser seguido dentro da futura Igreja.

Invertendo os valores dos governos terrenos, Jesus propõe que, dentre os seus seguidores, o maior seja como o menor. Não foi vontade do Senhor que a Igreja viesse a se tornar uma coisa hierarquizada onde seus pastores fossem servidos como lideranças dominadoras escondidas atrás de uma falsa autoridade religiosa. Muito pelo contrário, eles se tornariam grandes servindo uns aos outros tal como fizera nosso Mestre com o seu digníssimo exemplo de vida.

Verdade é que, na dimensão do Reino, inexiste qualquer tipo de status mundano. Frequentemente, na Antiguidade, muitos reis vieram a receber o título de "benfeitores" sem que houvesse sequer uma justificativa plausível e, até hoje, algumas pessoas costumam ser honradas publicamente apenas em virtude das altas posições por elas ocupadas. Porém, quando falamos de Reino de Deus, a valorização precisa ser outra. Deve-se cultivar continuamente a humildade interior exercitando o serviço sem buscar interesse próprio. No Reino não há lugar para essa auto-exaltação!

Todavia, as necessidades humanas de reconhecimento e de aceitação não são ignoradas por Jesus. Quanto a isto, os discípulos não tinham que se preocupar achando que deixariam de ser notados por causa de uma vida de serviço ao próximo, como podemos conferir pela leitura dos versos de 28 a 30 acima transcritos. Ninguém seria excluído da comunhão no Reino simbolizada aqui pelo comer e beber à mesa do Senhor. Aliás, a alegria de estar permanentemente numa Ceia torna-se incomparavelmente melhor do que qualquer bajulação particular recebida hipocritamente dos homens.

Ao concluir suas palavras nesta seção, Jesus revela aos seus mais íntimos seguidores um futuro maravilhoso e que inclui o assentar em tronos "para julgar as doze tribos de Israel" (verso 30). Algo que não sabemos bem como se sucederá em detalhes. Mas, segundo o ensino de Paulo, subentendemos que a Igreja, ou as pessoas verdadeiramente consagradas a Deus, vão julgar o mundo e também os anjos (1ªCo 6:2-5).

Penso ser de pouca utilidade para a nossa edificação especularmos sobre o que virá depois na era escatológica, devendo o citado versículo 30 ser aplicado mais para dar sentido contextual ao Evangelho. E, sendo assim, o que posso identificar aí seria uma consequente exaltação do discípulo humilde. Um reconhecimento condizente com o nível de maturidade espiritual desenvolvido pela pessoa sem se tornar uma relação de barganha com Deus.

Aprender com Jesus a ser "como quem serve" deve se tornar o sentido existencial de todo discípulo maduro e que já aprendeu a lição. A magistratura cosmoética que os servos de Deus exercerão no porvir representa também o desempenho de mais um serviço em benefício da própria humanidade, sendo tarefa que exige grande responsabilidade e coração íntegro. Portanto, trata-se de uma "promoção" para trabalhar mais.

Contudo, o momento presente deve ser encarado como uma oportunidade de semeadura do amor fraterno e do cuidado para com os nossos irmãos. O desfecho dessa fase conflitante da história humana certamente virá no tempo certo, mas hoje estamos a escrevê-la por meio das atitudes tomadas no cotidiano e construindo o Reino dentro das nossas relações. Deste modo, precisamos aprender a saborear as tarefas que Jesus nos dá para as executarmos no aqui e agora pois, no exercício de tão importante ministério, experimentamos uma maravilhosa satisfação. A verdadeira realização existencial.


OBS: A ilustração acima refere-se ao ícone Última Ceia pintado por Theophanes Strelitzas, mais conhecido como Theophanes, o Cretense, que foi um artista grego do século XVI cuja data de nascimento é desconhecida. A obra encontra-se no Mosteiro Stavronikita, Monte Athos, Grécia. Extraí a imagem do acervo virtual da Wikipédia conforme consta em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Last_Supper_by_Theophanes_the_Cretan.jpg

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