Apesar de ainda não ser algo regrado no ordenamento jurídico do país, eis que, aos poucos, as candidaturas coletivas vão se tornando uma realidade dentro da política brasileira, ainda que a maioria das pessoas nem tenha noção sobre o que vem a ser isso.
Na verdade, quando o eleitor vai às urnas escolher o seu representante para o Legislativo, ele vota em apenas um candidato "oficial" que seja do seu agrado e cuja foto aparecerá na maquininha antes de ele/ela apertar a tecla de confirmação. Porém, não há nada que impeça uma determinada candidatura ser apresentada ao público como um futuro "mandato coletivo" onde outros integrantes, por um comum acordo entre si, estarão de alguma forma compondo o gabinete do futuro parlamentar eleito.
Lembro bem o quanto nas eleições gerais de 2018 essa estratégia deu certo para alguns novos movimentos propositivos que surgiram na política brasileira mas que ainda não se tornaram partidos políticos (e nem sei se seria uma boa termos uma multiplicidade de agremiações partidárias). Logo, como a legislação exige que o candidato esteja filiado há seis meses antes do pleito numa legenda, tais grupos souberam encaixar os seus representantes em nominatas com viabilidade eleitoral onde seriam competitivos e teriam chances de conquistar a cadeira.
Todavia, o fato de não haver ainda um regramento a respeito, acabam surgindo uns problemas jurídicos posteriores como ocorreu com a jovem deputada federal Tabata Amaral, eleita pelo PDT de São Paulo com 264.450 sufrágios, tendo sido a sexta mais votada em seu estado. Pois sendo ela antes pertencente ao chamado Movimento Acredito, o qual tem como objetivo combater a polarização política no país, eis que os posicionamentos da parlamentar acabaram entrando em choque com as disposições estatutárias do tradicional partido trabalhista fundado pelo saudoso Brizola, quando houve a votação da reforma da Previdência. Isto porque o PDT fechou posição contrária às emendas constitucionais propostas pelo presidente Jair Bolsonaro enquanto a deputada preferiu concordar com o texto principal da reforma.
Não nego que uma "candidatura coletiva" possa, em tese, desestabilizar a unidade que os partidos brasileiros não têm e nunca tiveram. A meu ver, se um vereador, deputado ou senador não votar de acordo com a orientação partidária, deve de fato sofrer punições conforme estiver previsto no estatuto, sujeitando-se, se for o caso, até mesmo à perda do mandato. Logo, qualquer coletivo que lance a sua candidatura por um partido deve submeter-se às regras estatutárias internas do mesmo, o que, por sua vez, pode vir a ser atenuado por meio de transparentes negociações prévias, dentro das possibilidades do próprio regramento da agremiação, a exemplo do velho aforismo "o combinado não sai caro".
Assim sendo, acompanhando a evolução da política e da sociedade, defendo que possamos prosseguir com as candidaturas coletivas nas eleições deste ano, quer sejam elas ligadas a algum movimento ou não. E, diga-se de passagem, vejo aí uma incrível oportunidade para que partidos sem uma representação sólida num município ou estado, até seis meses antes das eleições, possam lançar candidatos por meio de outra legenda, tendo em vista que, a partir do pleito de 2020, já não teremos mais as coligações proporcionais.
Embora o fim das coligações entre partidos para a escolha dos vereadores e deputados poderá enfraquecer e até representar o fim dos partidos pequenos, induzindo à fusão e à incorporação de legendas (vejo isso como um fortalecimento da política), suponho que os mandatos coletivos dariam uma sobrevida aos movimentos progressistas que ainda não conseguem formar uma nominata competitiva. Então, se o partido X, numa determinada cidade, possui apenas um nome com chances reais de ser eleito vereador, por que não encaixar previamente aquele candidato numa outra legenda que já possua mais candidatos com um potencial maior de votos?
Dando um exemplo concreto, falarei brevemente daqui de Mangaratiba onde, até o momento, a esquerda local ainda não foi capaz de se estruturar para ocupar um espaço na Câmara, apesar do PT ter eleito dois vereadores em 2016 que, neste ano, disputarão a reeleição por outras agremiações. E, neste sentido, questiono por que as forças progressistas da cidade não poderiam lançar os seus candidatos a vereador por uma única legenda com a qual tenham certo nível de identidade ideológica?!
Se voltarmos aos tempos do bipartidarismo, como foi na maior parte do regime militar (quando também era proibido registrar um partido de ideologia comunista), eis que alguns movimentos de esquerda apoiaram candidatos pelo antigo MDB. E, inclusive, houve várias correntes ideológicas que participaram dessa sigla histórica do nosso país até à volta do pluripartidarismo, significando para nós que já existia um outro tipo de "mandato coletivo" por organizações condenadas à clandestinidade como eram o PCdoB, o PCB, a CST (atual PSTU) e o extinto MR-8.
Enfim, ainda que se diga não haver nada novo debaixo do sol, podemos considerar os mandatos coletivos como momentâneas inovações capazes de revitalizar a nossa débil política e que, por isso, não podem ser ignorados pelos partidos. Principalmente se a candidatura visar reunir diversas pessoas com conhecimento e experiência em áreas específicas, pertencentes a diferentes setores sociais, sem trazerem conflitos entre um movimento externo e a legenda.
Que esses mandatos coletivos venham para corrigir as mazelas políticas em todo o nosso país!
ResponderExcluirVejo isso como um começo. A meu ver, a formação de partidos verdadeiramente democráticos, transparentes e que respeitem as decisões locais seria o ideal. Infelizmente, para se traçar um plano estratégico para o futuro, há que se aproveitar hoje as brechas da "velha política". É o que o movimento Acredito fez
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