Aqui em Mangaratiba, após a saída das empresas de ônibus Expresso Mangaratiba e Viação Costeira do transporte intermunicipal de passageiros, as quais foram substituídas pela Expresso Recreio, muita gente comemorou a mudança tendo em vista que passamos a usufruir de veículos mais novos, confortáveis e com uma frequência muito menor de defeitos. Porém, um grupo minoritário de consumidores, que são os usuários cadeirantes (e seus familiares), tem se queixado da falta de acessibilidade ao serviço prestado à população, a exemplo da reclamação de uma mãe que foi divulgada pela edição de 03/07 do blogue Notícias de Itacuruçá:
"Revoltante e ter que passar por isso toda as vezes que preciso sair de Mangaratiba para outra cidade. Cheguei aqui em Mangaratiba, ponto final, com o meu filho que é cadeirante e fui informada que não tem ônibus de duas portas para ele viajar. E agora o que fazer? Será que Mangaratiba não tem pessoas com necessidades especiais ou o meu filho é uma raridade? Agora eu pergunto, para que serve esse ônibus da Expresso Recreio que atua em Mangaratiba? E para completar acabei de saber que a Costeira em breve vai deixar de circular no município. Depois que isso acontecer, ai mesmo que eu estou ferrada. Aí mas uma pergunta ,cadê os meus direitos de ir e vir? Me sentindo de saco cheio no ponto final de Mangaratiba!" (clique AQUI para ler a postagem em sua origem)
Acontece que, de acordo com o artigo 5º da Lei Federal n.º 10.048, de 08 e novembro de 2000, os veículos de transporte coletivo produzidos após doze meses da publicação da referida norma, deveriam ter sido planejados de forma a facilitar o acesso a seu interior das pessoas portadoras de deficiência, sendo que, segundo o parágrafo 2º do dispositivo em questão, os proprietários dos ônibus em utilização tiveram o prazo vencido de cento e oitenta dias, a contar da regulamentação, "para proceder às adaptações necessárias ao acesso facilitado das pessoas portadoras de deficiência". E, por sua vez, pelas determinações contidas no artigo 16 da Lei Federal n.º 10.098, de 19 de dezembro de 2000, os veículos de transporte coletivo passaram a ser obrigados a cumprir "os requisitos de acessibilidade estabelecidos nas normas técnicas específicas".
Com o Decreto Federal n.º 5.296, de 02 de dezembro de 2004, o qual veio regulamentar ambas as leis, foram estabelecidas as seguintes disposições quanto ao transporte coletivo rodoviário:
"Art. 38. No prazo de até vinte e quatro meses a contar da data de edição das normas técnicas referidas no § 1o, todos os modelos e marcas de veículos de transporte coletivo rodoviário para utilização no País serão fabricados acessíveis e estarão disponíveis para integrar a frota operante, de forma a garantir o seu uso por pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.§ 1o As normas técnicas para fabricação dos veículos e dos equipamentos de transporte coletivo rodoviário, de forma a torná-los acessíveis, serão elaboradas pelas instituições e entidades que compõem o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, e estarão disponíveis no prazo de até doze meses a contar da data da publicação deste Decreto.§ 2o A substituição da frota operante atual por veículos acessíveis, a ser feita pelas empresas concessionárias e permissionárias de transporte coletivo rodoviário, dar-se-á de forma gradativa, conforme o prazo previsto nos contratos de concessão e permissão deste serviço.§ 3o A frota de veículos de transporte coletivo rodoviário e a infra-estrutura dos serviços deste transporte deverão estar totalmente acessíveis no prazo máximo de cento e vinte meses a contar da data de publicação deste Decreto.§ 4o Os serviços de transporte coletivo rodoviário urbano devem priorizar o embarque e desembarque dos usuários em nível em, pelo menos, um dos acessos do veículo.Art. 39. No prazo de até vinte e quatro meses a contar da data de implementação dos programas de avaliação de conformidade descritos no § 3o, as empresas concessionárias e permissionárias dos serviços de transporte coletivo rodoviário deverão garantir a acessibilidade da frota de veículos em circulação, inclusive de seus equipamentos.§ 1o As normas técnicas para adaptação dos veículos e dos equipamentos de transporte coletivo rodoviário em circulação, de forma a torná-los acessíveis, serão elaboradas pelas instituições e entidades que compõem o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, e estarão disponíveis no prazo de até doze meses a contar da data da publicação deste Decreto.§ 2o Caberá ao Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO, quando da elaboração das normas técnicas para a adaptação dos veículos, especificar dentre esses veículos que estão em operação quais serão adaptados, em função das restrições previstas no art. 98 da Lei no 9.503, de 1997.§ 3o As adaptações dos veículos em operação nos serviços de transporte coletivo rodoviário, bem como os procedimentos e equipamentos a serem utilizados nestas adaptações, estarão sujeitas a programas de avaliação de conformidade desenvolvidos e implementados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO, a partir de orientações normativas elaboradas no âmbito da ABNT."
Apesar das leis em comento terem quase dezessete anos e o regulamento praticamente treze, eis que as concessionárias do transporte coletivo continuaram adquirindo ônibus sem adaptação para usuários cadeirantes! Até hoje as frotas das empresas não estão totalmente acessíveis sendo uma verdadeira afronta o descumprimento da legislação aplicável que foi até muito tolerante com os prazos de adaptação.
Assim sendo, tendo em vista que a Expresso Recreio em Mangaratiba, tal como muitas outras empresas que operam no Estado do Rio de Janeiro, encontra-se em mora quanto às exigências legais, resta ao usuário do transporte intermunicipal requerer ao Ministério Público a adoção de providências através de suas Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva. E, no plano individual, considero possível a propositura de ações judiciais protegendo os interesses do consumidor com necessidades especiais, inclusive formulando pedidos de indenização pelos danos morais sofridos em decorrência da violação.
Além do mais, nada impede que as associações de moradores, de defesa dos direitos dos deficientes físicos, de defesa do consumidor, bem como os Procons, as câmaras municipais e as assembleias legislativas tomem as medidas cabíveis nas esferas jurídica e política. Por isso, a expedição de ofícios, a realização de reuniões transparentes com os empresários do transporte, a convocação de audiências públicas e a abertura de uma CPI numa casa legislativa também são possibilidades de atuação capazes de produzir um acordo com força executiva.
Tendo em vista que já estamos quase em 2020, creio que chegou a hora de haver uma política inclusiva firme de acessibilidade em todo o país que obrigue os empresários de ônibus ao cumprimento inegociável das leis. Já não podemos mais protelar isso pois se trata de uma flagrante injustiça sendo a qualidade dos serviços de transporte rodoviário incompatível com o nível de desenvolvimento já alcançado pelo Brasil.
Lutemos pela causa com determinação!
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