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segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Até quando essas tragédias irão se repetir?!



Pela segunda vez, nesta mesma década (pouco mais de três anos do episódio de Mariana), o país se vê novamente consternado por causa de uma tragédia de grandes proporções provocada pelo rompimento da barragem de uma mineradora ocorrida também em Minas Gerais.

Na tarde de 05/11/2015, havia se rompido uma barragem de rejeitos de mineração controlada pela Samarco Mineração S.A., um empreendimento conjunto das maiores empresas de mineração do mundo: a brasileira Vale S.A. e a anglo-australiana BHP Billiton. O fato causou a destruição do povoado de Bento Rodrigues, situado a 35 km do centro do município mineiro de Mariana. Tratou-se, pois, do maior impacto ambiental da história brasileira, com um número de 18 mortos e uma pessoa desaparecida, além de um volume total despejado de 62 milhões de metros cúbicos de rejeitos, contendo metais pesados, em que a lama chegou ao rio Doce, cuja bacia hidrográfica abrange 230 municípios dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, muitos dos quais abastecem sua população com a água fluvial. E, na época, até o ecossistema marinho foi afetado!

Na última sexta-feira (25/01/2019), porém, outra barragem da mineradora Vale rompeu-se em Brumadinho (MG), em que um mar de lama destruiu casas e vegetação da região, ceifando um número ainda maior de vidas humanas. Conforme informações obtidas no portal de notícias do G1, tem-se até o momento a confirmação dos seguintes números: 60 mortos dos quais 19 foram identificados; 292 desaparecidos; 192 resgatados; 382 localizados; e 135 desabrigados. E, com a retomada das buscas na manhã deste quarto dia da tragédia, mais corpos deverão ser localizados até o final de hoje:

"As buscas por vítimas e sobreviventes do rompimento de uma barragem da mineradora Vale foram retomadas na manhã desta segunda-feira (28) em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. Até as 10h30, 60 mortes e 292 desaparecidos foram confirmados pelas autoridades. Neste quarto dia de buscas, 136 militares de Israel vão reforçar os trabalhos de resgate. Eles se juntam a cerca de 270 brasileiros de vários órgãos que atuam na região da tragédia. A barragem de rejeitos se rompeu na sexta-feira (25) e ficava na mina de Córrego do Fundão. A lama varreu a comunidade local e parte do centro administrativo da empresa. Entre as vítimas estão moradores locais e funcionários da Vale." (extraído de https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/01/28/buscas-por-sobreviventes-seguem-pelo-4o-dia-em-brumadinho-mg.ghtml)

Ora, sabe-se que cerca de 300 funcionários da Vale estavam trabalhando no momento em que houve o rompimento. E, segundo a reportagem citada, o tenente Pedro Aihara, porta-voz dos bombeiros de Minas Gerais, afirmou que o refeitório onde estavam os trabalhadores, no momento da queda da barragem, teria sido arrastado pela lama e pode ter ido parar a "até quilômetros à frente". E esse restaurante coletivo, assim como o centro administrativo da empresa, não estavam situados à montante do empreendimento, mas, sim, à jusante!

O pior de tudo é saber que não estamos livres de outro desastre semelhante. Lendo uma matéria no portal do Jornal Estado de Minas, datada de 07/01/2018, há um total de 50 (cinquenta) barragens de rejeitos sem garantia de estabilidade. Aliás, ao todo, de acordo com o Ministério Público mineiro, citado na matéria, seriam mais de 400 e quase 10% delas apresentam riscos, sendo que a ameaça recai sobre comunidades e fontes de abastecimento de água:

"O medo de ser varrido sem qualquer chance de escapatória por uma onda de rejeitos de minério ficou mais evidente em Minas após o emblemático rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, em 5 de novembro de 2015. E voltou a se tornar pesadelo de gente que vive aos pés desses grandes maciços destinados a represas de resíduos depois que a Barragem de Casa de Pedra, em Congonhas, apresentou infiltrações graves. A estrutura precisou passar por intervenções urgentes e implantar um sistema de evacuação de emergência para que as cerca de 4.800 pessoas que residem a apenas 250 metros do complexo treinassem procedimentos de salvamento. A exemplo dessas comunidades, muitas convivem com o medo de ser dizimadas como em Mariana, onde houve 19 mortes – uma das vítimas nem sequer teve o corpo localizado. Esse tipo de receio persegue diariamente quem mora, por exemplo, abaixo da Barragem de Capão da Serra, em Nova Lima, e vê obras sendo feitas no alto do represamento sem saber a que se destinam. Da mesma forma, habitantes de alguns bairros de Rio Acima, na Grande BH, ameaçados pelos rejeitos tóxicos da barragem abandonada da Mundo Mineração, um perigo que pode contaminar até mesmo o Rio das Velhas e comprometer o abastecimento da Grande BH. De acordo com a procuradora de Justiça e membro da força-tarefa Rio Doce – que acompanha e cobra pelo Ministério Público de Minas Gerais ações após a tragédia do rompimento da Barragem do Fundão –, Andressa Lanchotti, há pelo menos 400 barragens de rejeitos no estado, sendo que quase 10% precisam ser monitoradas de perto devido aos perigos de ruptura, com efeitos graves para o meio ambiente e núcleos humanos. (...) A Feam aponta a existência de 50 barragens sem garantia de estabilidade, nem todas de rejeitos. A falta de informações tem assustado pessoas de comunidades que ficam abaixo da área do represamento de 47 metros de altura da Barragem de Capão da Serra, também conhecida como Barragem de Pasárgada, em Nova Lima, na Grande BH. Há pelo menos 50 residências no traçado considerado de risco. O temor aumentou principalmente quando os operários que faziam as intervenções pintaram grandes seções com tinta branca, marcando locais bem no meio da estrutura de alvenaria que segura 2,23 milhões de metros cúbicos de rejeitos e água sobre suas casas. " ( clique AQUI para ler na íntegra) 

Segundo o ambientalista Nilo D’Avila, coordenador de campanhas da ONG Greenpeace, há semelhanças da tragédia de Brumadinho com a de Mariana, inclusive pelo envolvimento de uma mesma empresa, a Vale. No próprio dia do evento, ele assim afirmou ao jornal Estadão: "Está muito claro que não ficou lição alguma da tragédia de Mariana. É a mesma companhia, o mesmo tipo de acidente".

Em três decisões proferidas recentemente, a Justiça mineira já determinou o bloqueio de mais de R$ 11 bilhões de reais da Vale a fim de reparar os danos à população atingida pelo rompimento da barragem em Brumadinho. A medida foi concedida em sede de ação cautelar antecedente proposta pelo Ministério Público de Minas Gerais e o dinheiro terá que ser usado exclusivamente na reparação dos danos causados às pessoas atingidas pelo rompimento, cabendo à empresa o dever de fornecer acolhimento em hotéis, pousadas, imóveis locados, arcando com os custos e translado, transporte de bens móveis, pessoas e animais, além do custeio da alimentação e do fornecimento de água potável.

Considerando que o rompimento de barragens de rejeitos acontecem no Brasil desde o início do século XIX, eis que, certa vez, bem escreveu o nosso saudoso poeta mineiro, filho da cidade de Itabira, Carlos Drummond de Andrade (1902 — 1987), acerca da Vale, quando esta ainda era uma companhia estatal. E, embora jamais publicado num livro, o seu poema Lira Itabirana chegou a sair numa edição de 1984 do jornal Cometa Itabirano sendo que, há três anos, o texto circula espontaneamente pelas redes sociais da internet:

"O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.

Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!

A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.

Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro?"


Inegavelmente, as palavras de Drummond nos pareceram até proféticas quando houve o desastre de Mariana, sendo que hoje tal lembrança pode e deve contribuir para aumentar o nosso estado de alerta quanto à situação das demais barragens da Vale, bem como de outras mineradoras.

Como ser humano, não posso deixar de me solidarizar com as vítimas de Brumadinho, desejando que as coisas possam ser reparadas (ou compensadas) da maneira mais ampla possível. Porém, como cidadão, irei cobrar dos empreendedores e das autoridades desse país de injustiças que tomem as providências adequadas para tais fatos não mais se repetirem.

Boa semana a todos!


OBS: A primeira ilustração acima trata-se de uma imagem do desastre divulgada pela Presidência da República. Já a segunda foto refere-se ao poeta Carlos Drummond de Andrade já nos anos de sua velhice, na cidade do Rio de Janeiro.

2 comentários:

  1. Olá, Rodrigo!

    Grata pela sua visita e gentil comentário.

    Boa pergunta é o título de seu post! Parece que as pessoas e os governos não aprendem nem à 1ª, nem à 2ª e não falando daquelas barragens, que ameaçam romper. Há k deitar mãos à obra, rapidamente, pke a natureza não esquece as maldades humanas.

    Drummond e sua sabedoria.

    Abraços.

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    Respostas
    1. Oi, CEU.

      Eu que agradeço por seus comentários aqui no blogue.

      De fato o problema das barragens é bem preocupante e exigem medidas preventivas rápidas a fim de que novas situações não aconteçam.

      Lembro do Drummond quando eu ainda era criança pois, com frequência, a TV e o jornal publicavam artigos seus. E foi um dos maiores poetas brasileiros do século XX.

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