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domingo, 6 de agosto de 2023

Poderia ter um plebiscito para o povo decidir sobre a legalização ou não da maconha e outros assuntos polêmicos

 


A primeira semana de agosto foi marcada quando, na ocasião do julgamento de Recurso Extraordinário (RE) n.º 635659, com repercussão geral (Tema 506), em curso no Supremo Tribunal Federal desde 2011, o Ministro Alexandre de Moraes propôs critério para diferenciar usuários de traficantes de maconha. O magistrado afirmou afirmou que o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei Federal n.º 11.343/2006) deixou de punir com prisão o porte de drogas "para consumo próprio", porém sem definir critérios objetivos para diferenciar consumo próprio de tráfico, o que tem ficado a cargo do sistema de persecução penal (Polícia, Ministério Público e Judiciário), que interpreta a norma de formas diversas.


Assim sendo, no Brasil, o porte de pequena quantidade de entorpecentes passou, em muitos casos, chega a ser qualificado como tráfico, com a adoção da punição mais dura e aumentando significativamente o número de encarcerados. Além disso, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem ser consideradas usuárias ou traficantes, dependendo da etnia, de nível de instrução, renda, idade ou de onde ocorrer o fato.


Acertadamente, o Ministro considerou que tal distorção decorre do excesso de discricionariedade para diferenciar usuários de traficantes. E, em respeito ao princípio da isonomia, Xandão destacou a necessidade de que os flagrantes de drogas sejam tratados de forma idêntica em todo o país, afirmando que "o STF tem o dever de exigir que a lei seja aplicada identicamente a todos, independentemente de etnia, classe social, renda ou idade".


Pela proposta de Moraes, devem ser presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas. Inclusive ele chegou a esses números a partir de levantamento que realizou em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017, abrangendo mais de 1,2 milhão de ocorrências com drogas.


Assim sendo, de acordo com o ministro, a autoridade policial não ficaria impedida de realizar a prisão em flagrante por tráfico quando a quantidade de maconha for inferior ao limite. Porém, se tornaria necessário comprovar a presença de outros critérios caracterizadores do comércio ilegal, como a forma de acondicionamento da droga, a diversidade de entorpecentes e a apreensão de instrumentos e celulares com contatos, por exemplo. E, da mesma forma, nas prisões em flagrante por quantidades superiores, o juiz, na audiência de custódia, deverá dar ao preso a possibilidade de comprovar que é usuário.


Nos outros dois votos apresentados anteriormente, o Ministro Luís Roberto Barroso propôs a descriminalização, exclusivamente em relação à maconha, do porte de até 25 gramas ou a plantação de até seis plantas fêmeas para diferenciar consumo de tráfico, até que o Congresso edite lei sobre o tema. Já o Ministro Edson Fachin considera a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, mas entende que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional.


No entanto, o julgamento foi suspenso. Após o voto do Xandão, o relator do RE, Ministro Gilmar Mendes, pediu o adiamento do julgamento para construir uma solução consensual, diante dos novos argumentos e da mudança das circunstâncias desde 2015, quando apresentou seu voto, como a implementação das audiências de custódia. Inicialmente ele havia votado para descriminalizar todas as drogas para uso próprio.


Fato é que o Judiciário está, a passos lentos, tentando fazer o seu papel diante da inércia legislativa já que o Congresso tem sido moroso para normatizar um assunto tão importante. Logo, cabe ao STF ajustar a proporcionalidade de normas penais que tratem de danos abstratos, como é o dano contra a saúde pública supostamente praticado pelo usuário de drogas. Isto porque criminalizar a conduta do consumidor de maconha e demais entorpecentes resulta em estigmatização, o que prejudica os esforços de redução de danos e prevenção de riscos preconizados pelo próprio Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas.


Se assim considerarmos, o STF pode fazer muito pouco para solucionar uma questão que é super delicada, divide a sociedade, mas não pode continuar sendo postergada pelos dois Poderes. Logo, por proposta de um terço, no mínimo, dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional, um plebiscito poderia ser convocado antes da criação de uma norma a fim de que os cidadãos, por meio do voto, tenham o legítimo de aprovar ou não a legalização da maconha quanto ao uso recreativo e para fins medicinais.


Confesso que a ideia não é nova pois já foi defendida por vários parlamentares e políticos de destaque no país como o ex-senador Cristovam Buarque e a atual Ministra do meio Ambiente Marina Silva, quando se candidatou à Presidência da República pela primeira vez em 2010. Inclusive, na época, ela usou um argumento bem sábio, ao ser entrevistada pelo Painel RBS, em Porto Alegre: 


"Não sou favorável [à legalização da maconha]. Pessoas sérias são favoráveis porque acham que ajudaria a combater o tráfico de drogas. Mas, como não é uma decisão do Executivo, mas do Congresso, proponho um plebiscito para a sociedade decidir"


Concluo dizendo que, apesar da complexidade do tema, a questão já está mais do que madura para ser decidida e, quanto mais morosidade houver, maiores serão os conflitos. Logo, como todo poder emana do povo, sendo este soberano, o melhor a ser feito é deixar que o cidadão decida se a maconha deve ou não ser legalizada no Brasil para fins recreativos ou se o seu uso pode ser tão somente para medicamentos.


Igualmente entendo que o mesmo precisa ser feito quanto a outros assuntos tipo a descriminalização do aborto e por que não outra vez a questão do armamento tendo em vista que a população brasileira poderá ter um posicionamento diferente do que foi no referendo de 2005. Até mesmo porque a escolha no pleito de 2022 foi pelo atual presidente que antagonizava com as ideias do antecessor a esse respeito.


Enfim, essa é a minha sugestão para o país nesse ao momento, sempre alertando às pessoas que, ao invés de ficarem propagando fake news de bolsonaristas ignorantes contra o STF e o Ministro Alexandre de Moraes, o nosso querido Xandão, elas deveriam se informar melhor. Pois, como foi exposto acima, o Congresso vem se omitindo quanto à fixação dos parâmetros para diferenciar traficantes de usuários e já deveria ter resolvido há bastante tempo sobre a legalização da maconha.

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