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segunda-feira, 28 de agosto de 2023

É preciso compreender a independência funcional do magistrado e a escolha de um ministro do STF feita pelo Presidente com base na Constituição



Parte da esquerda tem feito críticas ao novo ministro do STF, Cristiano Zanin, e até mesmo ao próprio Presidente Lula por haver indicado o seu ex-advogado de defesa para compor o órgão mais elevado da Justiça brasileira. 


Mal iniciou seus trabalhos, Zanin, votou contrariamente à descriminalização do porte de maconha e de outras drogas para consumo pessoal, tendo, ainda, sido contra uma ação que relata violência da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul contra indígenas da etnia Guarani Kaiowá. Ou seja, assumiu posicionamentos que, em tese, estariam dentro do campo conservador.


Entretanto, é preciso levar em conta que, mesmo um ministro do STF, possui independência funcional, a qual é uma prerrogativa inafastável de qualquer membro da magistratura. Isto porque vivemos numa sociedade pluralista sendo que o artigo 41 da Lei Orgânica da Magistratura é claro ao prever que "o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir".


Reconheço que pessoas leigas talvez não compreendam o valor desse importante princípio aplicável a diversos agentes públicos na emissão de suas convicções pessoais, sendo preciso considerar também que a escolha de um ministro do STF não deve ser feita por razões ideológicas. Ou seja, não tem cabimento um presidente dizer que indicará alguém que seja "terrivelmente evangélico".


Pois bem. Já ouvi pessoas dizendo que Lula terá que indicar uma mulher negra de esquerda para substituir a Rosa Weber que se aposentará neste ano. Porém, é necessário frisar que a escolha de um ministro para o STF não se dá por razões ideológicas. 


Como se sabe o STF é composto por onze ministros, todos brasileiros natos (art. 12, § 3º, inc. IV, da Constituição Federal), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 70 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/1988), e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único, da CF/1988). Ou seja, embora a nomeação se dê pelo Presidente da República, os requisitos estabelecidos pela Carta Magna é que o nomeado tenha "notável saber jurídico e reputação ilibada".


Em nosso idioma, o vocábulo "notável" diz respeito a toda pessoa renomada, destacada e famosa por suas obras ou feitos. Trata-se de quem, à evidência, produziu obras de relevância para o meio jurídico e cujo conteúdo a tornaram insigne. Sem a produção de obras não há, portanto, notabilidade possível, pois somente se nota os feitos de uma pessoa pelo que ela efetivamente produziu em termos técnicos. De acordo com o constitucionalista José Afonso da Silva, para ser Ministro do Supremo Tribunal Federal "se é notável o saber jurídico que se requer, por seu sentido excepcional, é porque o candidato deve ser portador de notoriedade, relevo, renome, fama, e sua competência ser digna de nota, notória, reconhecida pelo consenso geral da opinião jurídica do país e adequada à função" (Comentário contextual à Constituição. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, pág. 533).


Percebe-se que o constituinte não autorizou que a escolha de um ministro deva ser feita por razões ideológicas conforme havia optado o ocupante anterior do Palácio do Planalto quando externou o seu interesse por indicar um ministro que fosse "terrivelmente evangélico" e, consequentemente, um conservador. Lula, apesar das críticas que recebeu por haver nomeado justamente o seu ex-advogado de defesa, não sujeitou o Dr. Zanin a uma submissão de pensamento quanto às questões apoiadas pelo seu grupo político e suponho que tenha sido motivado pela competência profissional do jurista.


Enfim, certamente muitos de nós que defendemos propostas, ao nosso ver, progressistas, iremos seguir discordando das decisões do novo magistrado que consideramos conservadoras. Contudo, precisamos compreender que, como qualquer magistrado, o Dr. Cristiano Zanin é livre para formar o seu convencimento, exigindo-se apenas que ele apresente os fundamentos de fato e de direito nas suas decisões.

2 comentários:

  1. Oi, Rodrigo!
    Não me parece correto Lula da Sila, Presidente, ter indicado o seu ex-advogado de defesa para o mais elevado cargo da Justiça brasileira. Me parece coisa combinada. As medidas de Cristiano Zanin têm de ser democráticas e deixar de puxar a brasa à sua sardinha, como se diz por cá.
    Abraços e boa semana.

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    1. Olá, CEU

      Obrigado pela leitura e comentários.

      A meu ver, as decisões do novo magistrado da Corte Suprema mostrou justamente independência do modo de pensar da autoridade que o nomeou para o cargo. OU seja, seriam decisões conservadoras no sentido inverso de um governo que consideramos progressista.

      Independentemente das posições, o fato de Cristiano Zanin ter sido advogado de defesa do presidente, de fato acaba constituindo um certo peso como se sugerisse um suposto favorecimento, muito embora não haja grau de parentesco ou de amizade íntima, no sentido de um frequentar a residência do outro, que desabonasse a nomeação.

      Pode-se supor que Lula teria indicado o seu ex-advogado de defesa talvez por conhecer sua capacidade e profissionalismo e que isso o teria levado a concluir como o profissional mais capacitado para estar no órgão mais elevado do Poder Judiciário do país.

      Quanto a uma decisão judicial ser democrática, penso que as atividades dos juízes, inclusive dos tribunais superiores, devam ser técnicas, diferentemente dos governantes e dos legisladores. Estes sim precisam estar respaldados no que a coletividade deseja pois foram eleitos pelo sufrágio popular para expressarem os desejos e reivindicações dos eleitores. Já o Judiciário e o Ministério Público seguem, a meu ver, outro direcionamento.

      Um abraço e volte sempre.

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