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domingo, 13 de outubro de 2013

De volta à Ilha Grande



Quando eu ainda estava morando em Nova Friburgo, no outro lado do estado, escrevi o artigo Saudades da Ilha Grande, de 11/12/2010, lembrando as duas ocasiões anteriores em que havia estado lá. Desde o mês de agosto do ano passado, porém, vim então residir em Muriqui, uma localidade praiana no litoral sul-fluminense de onde é possível avistar a parte leste da ilha. Deste modo, passei a me situar numa distância de apenas meia hora da cidade de Mangaratiba de onde partem as barcas para lá diariamente às oito da manhã. Só que apenas contemplava-a de longe e não conseguia tomar a iniciativa de viajar novamente.

Assim, catorze meses depois de estar vivendo tão perto da Ilha Grande, a ponto de olhar para ela quase sempre quando andava pela orla marítima, finalmente decidi tirar um tempinho para viajar neste curto feriado do dia 12/10. Dei um direcionamento ao meu desejo e, após ter feito umas pesquisas na internet, escolhi um roteiro que ainda não havia realizado nas outras duas vezes que tinha estado na ilha, em janeiro de 1999 e de 2001. Resolvi então subir até o Pico do Papagaio afim de ter uma vista panorâmica da região desenvolvendo melhor o meu conhecimento geográfico, pelo que fiz o cuidadoso planejamento para ir e retornar na mesma data conforme os horários da barca. Com a ajuda do Google, descobri sites que atestavam as boas condições do caminho, a distância a ser percorrida até o cume e afastando os riscos de acontecer o que houve na vez quando me perdi no Parque Nacional da Tijuca, em junho de 2012.

Desta vez, deixei minha esposa previamente ciente do que pretendia fazer, levei o celular e fui bem cedinho tomar uma condução de Muriqui para Mangaratiba. Chegando ao atracadouro das barcas, cerca de uma meia hora antes, fiquei perplexo com o gigantesco tamanho da fila. Pessoas aguardavam em pé somente para comprar o bilhete sem terem a certeza se conseguiriam entrar no veículo por causa da lotação máxima de mil passageiros. Era gente com mochila, portando barracas de acampamento, muitos grupos de jovens, casais de namorados e famílias com crianças. Por ter direito à prioridade, um senhor idoso desavisadamente embarcou antes das filhas deixando-as preocupadas se entrariam lá ou não para se encontrarem com o pai. A empresa nem ao menos foi capaz de construir uma sala de espera coberta e com assentos para proporcionar um mínimo de conforto aos usuários como existe no Rio de Janeiro e em Niterói, num serviço prestado pela mesma concessionária de transporte.

Mas como eu estava passeando, deixei aquele mal momento de lado. Fui logo construindo um plano alternativo em minha mente. Se não conseguisse ingressar na embarcação, poderia fazer uma caminhada na região rural de Ingaíba ou então pegar uma das vans de Mangaratiba até Junqueira e de lá contratar algum barqueiro para me atravessar até à Ilha de Guaíba. Em todos os casos, eu estaria explorando novos recantos paradisíacos.

Felizmente deu para todo mundo entrar no veículo, mas saímos com uns trinta minutos de atraso sem que houvesse mais assentos disponíveis. A velha embarcação apitou, deu meia volta e partiu deixando para trás a Enseada do Saco onde está Mangaratiba. Ficando no lado direito, avistei Conceição do Jacareí, último distrito mangaratibense antes de Angra dos Reis. Procurei prestar a atenção em cada detalhe afim de me situar cada vez mais dentro da geografia regional.

Dentro de uns noventa minutos de viagem, chegamos à Enseada de Abraão que é a principal porta de entrada para a Ilha Grande, mas a minha passagem pela vila acabou sendo bem rápida. Fui direto pegar a estrada de terra que segue para a praia de Dois Rios. O caminho para o Pico do Papagaio fica bem no comecinho desse trajeto sendo que não tive dificuldade para encontrar a trilha. Havia uma placa indicando-a e a minha atenção estava bem focada no que pretendia alcançar.

A subida ao Pico do Papagaio é um mergulho no verde! Realmente o seu aspecto estava como lido na internet. Tudo bem cuidadinho, sinalizado e com orientações suficientes para o turista respeitar o meio ambiente. Podemos dizer que a única dificuldade ali seria a subida que é íngreme. Afinal, você vai estar saindo do nível do mar, no cais da Vila do Abraão, até atingir uma altitude de seus 982 metros.

No trajeto, há alguns córregos, mas é bom levar uma garrafinha d'água para o caso de alguma necessidade. Até mesmo porque, no topo do pico, não há nada para beber. No trajeto, deve-se ficar atento com as muitas pedras e raízes das árvores para evitar um tropeço. Alguns animais silvestres podem surpreender aparecendo durante a caminhada e algo que notei logo no início foi o som dos bugios (Alouatta guariba clamitans), conhecido também como "macaco barbado". O barulho que eles fazem mete um pouco de medo, mas saiba que tal primata da fauna brasileira não é nenhum gorila africano. Aliás, desconheço qualquer relato de turista que tenha sido atacado por macacos na Ilha Grande.

Se tivesse visto um bugio ali, seria a primeira vez que encontro um bicho desses solto na natureza. Já pude observar em outras ocasiões micos e saguis. Desta vez, entretanto, tive que me contentar só com pássaros e esquilos, sendo estes exóticos ao bioma da Mata Atlântica e foram indevidamente introduzidos na ilha pelo homem. Todavia, por já estarem adaptados, penso que talvez seja melhor o Inea mantê-los no ambiente do local. Os danos provocados por essas criaturinhas que lembram os personagens do Tico e Teco dos desenhos animados de Walt Disney parecem ser menores até do que os causados pelos micos-estrelas oriundos das matas da Bahia e de Goiás. Estes também foram importados para os ecossistemas do Sudeste.

Não nego que a conquista do pico foi árdua, bem sacrificante, mas foi algo que valeu a pena. O cenário de lá é incrível e, dependendo do dia, dá para ver até a Pedra da Gávea no Rio de Janeiro e o Dedo de Deus entre Guapimirim e Teresópolis. Neste último sábado, contudo, as nuvens só permitiam que eu avistasse as ilhas da Baía de Sepetiba, o Pico do Frade, entre Angra dos Reis e a cidade paulista de Bananal, além das serras de Campo Grande, a Marambaia, e a "muralha" de montanhas que separa os dois estados sendo protegida pela extensão do Parque Nacional da Serra da Bocaina. Dentro da ilha, reconheci fácil a Vila do Abraão, a praia de Lopes Mendes, Dois Rios e outros paraísos mais.

Apesar de sua elevada altitude, o Pico do Papagaio não é o ponto mais elevado da Ilha Grande. Maior do que ele é o Pico da Pedra D'Água com 1.031 metros. Só que a trilha de acesso para lá encontra-se fechada devido à política ambiental do Inea. Aliás, pude constatar que vários caminhos foram retirados dos roteiros turísticos de lá por conta do atual governo estadual fortemente influenciado pelo Carlos Minc nas questões ecológicas preservacionistas. Verifiquei que, atualmente, já não se pode mais dar a volta toda na ilha pois o trajeto entre a Parnaioca e o Aventureiro tornou-se restrito aos funcionários da Reserva Biológica Estadual Praia do Sul permitindo-se a visitação apenas de pesquisadores autorizados. Aliás, as normas tais normas já existiam antes porque o Decreto de criação da unidade é de 1981. Só não eram cumpridas.

Se for para o bem da natureza, amém. Posso dizer que achei a gestão territorial da ilha muito boa neste sentido se comparada com a realidade da maioria dos parques estaduais do Rio de Janeiro a exemplo dos Três Picos, Desengano e o Cunhambebe, todos com uma considerável área florestal no continente. Porém são unidades que continuam carecendo de uma melhor atenção do Poder Público sendo certo que dinheiro da atividade petrolífera é o que não falta ao Palácio da Guanabara.

Tendo me despedido das pessoas que encontrei no Pico do Papagaio, retornei para a Vila do Abraão. Cheio de fome fui almoçar no primeiro restaurante simples que achasse aberto. Ainda assim, os preços não estavam nada baratos. O prato individual mais acessível custou R$ 15,00 (quinze reais) fora a gorjeta e fiquei surpreso com o valor de R$ 7,00 (sete reais) cobrados pelo suco de laranja.

Na volta, a fila da barca estava menor do que na ida. Foi fácil comprar o bilhete e não houve atrasos na partida cujo horário é às 17 horas e 30 minutos. Contudo, peguei o mar bem mais agitado e, quando os passageiros precisavam ir ao banheiro, tinham que tomar cuidado por causa da instabilidade do veículo em meio às ondas. Quando cheguei a Mangaratiba já estava de noite.

Posso dizer que valeu a pena o passeio e ter feito tudo com planejamento e uma boa dose de segurança. Arriscar-me por trilhas que não estão no roteiro turístico como havia feito no Parque da Tijuca, no ano passado, foi o suficiente para aprender a lição. Afinal, se eu tivesse perdido a vida ali naquela travessura não autorizada entre os bairros Grajaú e Alto da Boa Vista, quantos lugares bonitos não estaria hoje privado de visitar? Mas graças a Deus que, pela sua infinita misericórdia, estou aí para contar novas aventuras.


OBS: Foto extraída da página do Inea na internet mostrando a vista do Pico do Papagaio conforme consta em http://www.inea.rj.gov.br/unidades/pqilhagrande_o_que_fazer.asp

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