Há tempos que vários estados e municípios brasileiros têm suas respectivas normas jurídicas que obrigam as agências bancárias a atender os consumidores num prazo máximo estabelecido. Seria o caso, por exemplo, na Lei n.º 4.223/2003 do Estado do Rio de Janeiro em que o atendimento deve ser efetivado no prazo máximo de 20 (vinte) minutos, em dias normais, e de 30 (trinta) minutos, em véspera e depois de feriados.
Apesar disso, os bancos continuam descumprindo a legislação ainda que tenham melhorado relativamente o atendimento nos últimos quinze anos. E, infelizmente, os órgãos de defesa do consumidor pouco têm agido no sentido de fiscalizar as agências bem como incentivar o consumidor a colaborar num monitoramento das condutas ilícitas.
Todavia, não podemos esquecer de que, se o consumidor permanecer aguardando por um longo prazo na fila bancária, tal demora poderá vir a lhe causar danos morais e/ou materiais. E isso já tem sido reconhecido por vários tribunais do país há muito tempo.
Não custa lembrar que, numa decisão relativamente recente, a Egrégia Terceira Turma do STJ entendeu que configura dano moral indenizável a demora desarrazoada no atendimento. Ao analisar um caso concreto, atendendo aos parâmetros que devem ser observados no momento da fixação da verba indenizatória, o órgão julgador do tribunal superior manteve o valor originalmente fixado em R$ 3.000,00 (três mil reais) pelas instâncias inferiores. Eis a ementa do julgado:
“DANO MORAL. ESPERA EM FILA DE BANCO. O dano moral decorrente da demora no atendimento ao cliente não surge apenas da violação de legislação que estipula tempo máximo de espera, mas depende da verificação dos fatos que causaram sofrimento além do normal ao consumidor. Isso porque a legislação que determina o tempo máximo de espera tem cunho administrativo e trata da responsabilidade da instituição financeira perante a Administração Pública, a qual poderá aplicar sanções às instituições que descumprirem a norma. Assim, a extrapolação do tempo de espera deverá ser considerada como um dos elementos analisados no momento da verificação da ocorrência do dano moral. No caso, além da demora desarrazoada no atendimento, a cliente encontrava-se com a saúde debilitada e permaneceu o tempo todo em pé, caracterizando indiferença do banco quanto à situação. Para a Turma, o somatório dessas circunstâncias caracterizou o dano moral. Por fim, o colegiado entendeu razoável o valor da indenização em R$ 3 mil, ante o caráter pedagógico da condenação. Precedentes citados: AgRg no Ag 1.331.848-SP, DJe 13/9/2011; REsp 1.234.549-SP, DJe 10/2/2012, e REsp 598.183-DF, DJe 27/11/2006. REsp 1.218.497-MT, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 11/9/2012.
Vale lembrar que o entendimento das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cível do Estado do Rio de Janeiro há muito tem se inclinado para reconhecer a perda de tempo como uma circunstância capaz de gerar danos morais cujo valor deve ser arbitrado conforme cada caso concreto. Principalmente em se tratando de uma relação de consumo quando o fornecedor de serviços dispõe de um potencial econômico capaz de contratar funcionários e melhorar a qualidade do seu atendimento, a exemplo dos bancos que têm o maior lucro da iniciativa privada neste País.
É certo que não há um valor especificamente fixado em Lei para compensar o dano moral nessas situações pois tanto a caracterização da lesão como o arbitramento da verba indenizatória irão depender do entendimento de cada julgador. Este, ao sentenciar, irá considerar aspectos como o tempo de espera e o desconforto suportado de modo que, se numa agência faltam assentos suficientes, não oferecia água, ou banheiro estava com defeito, tais fatos poderão ser levados em conta.
Recordo que, em março do ano passado, precisei entrar na fila da agência do Bradesco, situada no Centro de Mangaratiba, a fim de pagar uma fatura referente ao cartão de crédito de minha esposa. Porém, devido aos poucos guichês disponíveis da agência, sendo alta demanda do dia, o caixa só me chamou mais de uma hora depois.
Pois bem. Sentindo-me indignado com a situação, entrei com uma ação contra o banco através do Juizado Especial Cível. E, sem haver acordo em nenhuma das duas audiências previstas no rito processual da Lei Federal n,º 9.099/95, foi prolatada a sentença condenando o Bradesco a me pagar a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), conforme a juíza leiga havia determinado:
"Dispensado o relatório na forma do artigo 38 da Lei 9.099/95. Alega a parte autora que esperou na fila do banco réu por mais de uma hora. Em sua contestação a parte ré requer a improcedência do pedido. Existe entre as partes relação de consumo, uma vez que a parte ré é prestadora de serviços. A parte autora, por seu turno, é destinatária final dos serviços, enquadrando-se no conceito de consumidora do artigo 2º, da Lei 8078/90. Em que pesem as alegações que constam da contestação, a parte ré não se desincumbiu do ônus de provar a ausência de falha na prestação de serviço. Há de se observar a Teoria do Risco do Empreendimento, que atribuiu ao fornecedor de bens e serviços o dever de ressarcir quem sofre danos em decorrência da atividade desenvolvida pelo fornecedor/produtor desses bens e serviços. Como se sabe, a Lei Estadual nº 4.223/03 prevê que as agências bancárias situadas no Estado do Rio de Janeiro devem colocar à disposição de seus clientes, pessoal suficiente e necessário para que o atendimento seja efetivado no prazo máximo de 20 (vinte) minutos, em dias normais e 30 (trinta) minutos em véspera e depois de feriados. De fato, os documentos de fls. 12/13, trazidos pela parte autora, demonstram que houve uma demora de mais de uma hora para pagamento de uma conta, circunstância que configura o descumprimento pela ré da Lei Estadual nº 4.223/03. Ressalte-se que, independente do conteúdo da Lei referida, uma longa espera é abusiva e desproporcional. É cediço que a simples inobservância do tempo máximo de espera na fila do banco para atendimento, por si só, não enseja reparação por dano moral. No caso em tela, contudo, está justificada a condenação da instituição bancária ao pagamento de verba indenizatória a título de dano moral, porque o tempo excessivo de espera de mais de uma hora ultrapassa a esfera do mero aborrecimento e caracteriza ofensa à dignidade da parte. Tais fatos geraram angústia e sofrimento que, indubitavelmente, traduzem dano moral. Considero que para quantificação do dano moral deve ser adotado o critério de razoabilidade, para que seja suficiente para a reparação do dano, mas que não caracterize enriquecimento sem causa devendo, portanto, representar uma compensação, e não um ressarcimento dos prejuízos sofridos, impondo ao ofensor a obrigação de pagamento de certa quantia de dinheiro em favor do ofendido, ao mesmo tempo em que agrava o patrimônio daquele, proporciona a este uma reparação satisfatória. Considero, também, que o dano moral tem um caráter pedagógico que objetiva impedir que o fornecedor persista no erro. Assim, levando em consideração as peculiaridades do caso, entendo razoável o valor de R$2.000,00. Isso posto, JULGO PROCEDENTE OS PEDIDOS, na forma do artigo 487, I do CPC, para CONDENAR a parte ré a pagar à parte autora quantia de R$2.000,00 (dois mil reais) a título de compensação pelo dano moral sofrido, com correção monetária e juros de 1% ao mês, a contarem da data da publicação da presente sentença, nos moldes previstos pela Corregedoria Geral de Justiça. Sem custas e honorários, em face do disposto no artigo 55 da Lei 9.099/95. Retifique-se o polo passivo, caso haja requerimento nesse sentido. Anote-se o nome do advogado do réu para fins de publicação, conforme consta na contestação. Projeto de sentença sujeito à homologação, assim, remeto os autos ao MM. Juiz Togado, nos termos do artigo 40 da Lei nº 9.099/95." (Juizado Especial Adjunto Cível da Comarca de Mangaratiba do Estado do Rio de Janeiro.Processo n.º 0001782-20.2018.8.19.0030. Juíza Leiga Dra. Agramara Andrade Agra Illa Lopes. Ato praticado em 28/12/2018. Homologado na mesma data pelo Juiz de Direito Dr. Marcelo Borges Barbosa)
Apesar das quantias de R$ 2.000,00 ou R$ 3.000,00 não serem atrativas para o exercício da advocacia, considerando que não há como se obter honorários satisfatórios em percentuais sobre indenizações tão pequenas recebidas pelos clientes (e não compensará aos consumidores pagar pelos serviços de um advogado segundo os valores da tabela da OAB), nada impede que o consumidor ingresse com sua ação pelos Juizados Especiais. Isto porque, segundo o artigo 9º da Lei Federal n.º 9.099/95, a assistência do advogado é facultativa nas causas de até vinte salários mínimos.
A meu ver, se mais pessoas entrarem com ações semelhantes, os bancos se sentirão pressionados a melhorar o atendimento prestado nas suas agências. Pois, nesse caso, as instituições financeiras terão que modernizar os serviços prestados e contratar mais funcionários a fim de evitarem problemas para si.
Ótima sexta-feira a todos!
OBS: Imagem acima extraída de https://www.cidadesemfoco.com/mp-pi-pede-que-populacao-denuncie-demora-na-fila-de-atendimento-dos-bancos/
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